quinta-feira, dezembro 31, 2009
Madonna em 47 telediscos (13)
Smith + Mapplethorpe
Os filmes da década (40)
Ingmar Bergman, 2003
Foi a década em que perdemos Ingmar Bergman: o seu derradeiro filme, Saraband [trailer americano], possui o carácter discreto de um verdadeiro monumento artístico. Por um lado, apresenta-se como um prolongamento de Cenas da Vida Conjugal (1973), acompanhando o envelhecimento do par interpretado por Liv Ullmann e Erland Josephson [foto de rodagem, com o realizador]; por outro lado, é apenas uma produção televisiva que acabou por passar em salas com projecção digital, por directa imposição do próprio Bergman (a esse propósito, é sempre bizarro encontrarmos "cinéfilos" que confundem a experimentação tecnológica com o cinema americano, além do mais diminuindo o próprio cinema americano). Em boa verdade, estamos perante um desses filmes demasiado próximos dos seres e das suas emoções, como se, por vezes, o pudor nos aconselhasse a fechar os olhos — mas não o fizemos.
Os concertos do ano
Foram poucos os concertos que vi em 2009. Mas os poucos foram, invariavelmente, bons. Aquí ficam cinco momentos que ficaram na história deste ano em palco.
Gustavo Dudamel / Orq. Juvenil Ibero Americana
(Auditório Fundação Gulbenkian)
A estreia pública de mais uma orquestra inspirada no ‘el sistema’ venezuelano (e que na verdade conta com varios elementos da Simón Bolivar) foi “o” acontecimento em palco do ano! O entusiasmo dos músicos (e do maestro Dudamel) criou imediata empatía com uma plateia que, ao intervalo, já os aplaudía como se fosse fim de uma noite de triunfo. No final do concerto, entre os encores, a plateia até dançou!
Whale Watching Tour
(Teatro Maria Matos)
Nico Muhly e restantes figuras-chave da Bedroom Comunity trouxeram a Lisboa uma digressão que, como poucas, sublinha o tom da música do momento. Uma música que existe acima dos géneros, que cruza referências, desde as que chegam de escola clásica à folk, com as electrónicas pelo caminho… Que regressem tão breve quanto possível.
Ciclo Stockhausen
(Auditório Fundação Gulbenkian)
Foram três tardes consecutivas, com filmes e concertos. O cinema a recordar episódios de diversas etapas da vida e obra de Karhleinz Stockhausen. Os concertos a visitar seis partes do ciclo Klang (entre elas, uma em estreia mundial). Uma rara oportunidade para ouvir música do século XXI ao vivo num palco português.
Valery Gergiev / Orq. Teatro Marinsky de São Petesburgo
(Coliseu dos Recreios)
Uma das grandes orquestras russas do nosso tempo e um dos maestros mais aclamados da actualidade num programa de excepção que nos transportaram para compositores e peças que ajudaram a inventar a música do século XX. Debussy e Stravinsky numa noite de grande nível.
Três Cantos
(Campo Pequeno)
O encontro em palco de Sérgio Godinho, José Mário Branco e Fausto Bordalo Dias resultou numa série de noites de comunhão de experiências, visitando obras que marcaram os últimos 40 anos da música portuguesa. Não faltaram os “clássicos”. Mas ficou claro que o presente ainda é quem marca a agenda de cada um dos três cantautores em palco.
Panda Bear no Lux a 12 de Fevereiro
As canções do ano (7)
Imagens do teledisco de I’m Not Your Toy.
Acontecimentos 2009: Beatles Remasters
Figuras do ano: Sean Penn
Os discos da década (38)
Madonna
Confessions on A Dance Floor, 2005
O reencontro de Madonna com ecos da música que fazia a banda sonora das noites de Nova Iorque em inícios de 80, a colaboração com Stuart Price (na produção), o simple dos Abba em Hung Up e um alinhamento claramente focado numa relação da canção pop com a música de dança são apenas alguns dos argumentos que deste disco fizeram o melhor álbum de Madonna desde Ray Of Light.
Os telediscos de Madonna não se encontram na rede do YouTube. Ali pode contudo ver imagens da actuação na cerimónia de entrega dos Grammys em 2006, ao som de Hung Up, em parceria com os Gorillaz.
Os filmes da década (39)
8 Mulheres
François Ozon, 2002
É um filme de varias heranças assimiladas, contando com um elenco de excepção que cruza varias gerações de grandes actrizes francesas. François Ozon junta Jacques Demy e Douglas Sirk com uma pitada de Alfred Hitchcock. Cor, música e humor numa história em ambiente fechado, em volta de oito mulheres, na quadra do Natal.
Imagens do trailer de 8 Mulheres.
David Levine (1926 - 2009)
Morreu David Levine, um dos mais geniais caricaturistas do século XX, especialmente conhecido através do seu trabalho nas páginas de The New York Review of Books.
Nascido em Nova Iorque, a 20 de Dezembro de 1926, ambicionou ser pintor e, de facto, até ao começo dos anos 60, produziu um conjunto de trabalhos sobre a zona de Coney Island e as suas personagens mais características, num tom de serena contemplação que alguns observadores consideram paradoxalmente contrário à contundência de muitas das suas caricaturas. Começou a colaborar em 1963 na New York Review, com a qual manteve uma ligação regular até 2007. A sua obra encontra-se dispersa por muitas outras publicações, incluindo The New York Times, The Washington Post, Rolling Stone, Time, Newsweek, Playboy e The New Yorker. John Updike, escritor por ele várias vezes retratado, dizia que os seus desenhos possuem a virtude de um "conforto" contrário ao desespero dos nossos tempos, transmitindo-nos o "sentido de alguém que observa".
Levine sofria de uma doença que, nos últimos anos, tinha afectado seriamente as suas faculdades de visão; veio a falecer a 29 de Dezembro de 2009, no New York Presbyterian Hospital, vitimado por cancro da próstata. Em termos quantitativos, só na New York Review, o seu legado ascende a 3800 desenhos.
>>> Obituário em The New York Times.
>>> A galeria de David Levine em The New York Review of Books.
quarta-feira, dezembro 30, 2009
A vanguarda segundo Jacques Demy
Para o melhor e para o pior, passámos a associar o vanguardismo cinematográfico “apenas” às grandes transformações tecnológicas. É óbvio que, desde as lentes grandes angulares usadas por Orson Welles em O Mundo a Seus Pés (1941) até às manipulações digitais dos irmãos Wachowski na trilogia Matrix (1999-2003), muitos gestos criativos são inseparáveis da integração mais ou menos experimental de novos instrumentos técnicos. Em todo o caso, nenhum desses instrumentos garante, por si só, qualquer diferença artística, muito menos qualquer marca de génio.
O caso de Jacques Demy serve de exemplo esclarecedor, tanto mais que o seu nome fica quase sempre “esquecido” quando inventariamos os nomes emblemáticos da Nova Vaga francesa: Godard, Resnais, Rivette, etc. Dir-se-ia que Demy foi um cineasta artesanal, entregue a uma missão que, para muitos, nas últimas décadas, se tornou impossível: revitalizar a tradição do género musical numa época (a partir dos anos 60) em que a decomposição dos modelos de Hollywood já se mostrava irreversível.
Mais de quarenta anos passados sobre Os Chapéus de Chuva de Cherburgo e As Donzelas de Rochefort, percebemos que Demy não estava apenas a homenagear os clássicos de Hollywood (mesmo quando o fez de forma explícita, convidando Gene Kelly para contracenar com Catherine Deneuve e Françoise Dorléac em As Donzelas de Rochefort). O seu trabalho apostava numa relação peculiar entre música, canto e (melo)drama, relação essa que teve no compositor Michel Legrand um decisivo colaborador.
Quando vemos ou revemos estes filmes, compreendemos que Demy nos convocava, não para um artifício mais ou menos fútil, mas para um peculiar realismo da fantasia. Para ele, as deambulações musicais são também uma via de entrada nos enigmas da alma. Anacrónico? Talvez. E, por isso, vanguardista.
Nolan + DiCaprio: a cena do crime
>>> Site oficial de Inception.
Os melhores de 2009: Livros
O esbater progressivo das fronteiras entre os géneros musicais não se limita à criação. Ou seja, a obras capazes de juntar mundos outrora de costas voltadas, como o foram um Songs From Liquid Days de Philip Glass, um I Was Looking At The Ceiling And Then I Saw The Sky de John Adams, um Alina de Arvo Pärt, uma Sinfonia Nº 3 de Gorecki ou, mais atrás ainda no tempo, um Hymnen de Karlheinz Stockhausen ou uma Missa de Leonard Bernstein – às quais se juntaram nos últimos tempos novas e visionárias contribuições por figuras como Ambrose Field, Osvaldo Golijov ou Murcof – o ano trouxe um livro que, mais que qualquer outro antes publicado, juntou melómanos de vivências musicais distintas numa demanda comum. Assinado por Alex Ross, crítico da New Yorker, O Resto É Ruído (no original The Rest Is Noise) é uma visão da música do século XX capaz de entender que a história tanto escuta as contribuições de nomes como Stravinsky, Bartók, Schoenberg, Stockhausen, Sibelius, Shostakovich, Prokofiev, Ligeti, Orff, Reich ou Glass, como os Velvet Underground ou Sonic Youth. Resultado: pôs muito boa gente, de “escola” feita na cultura pop/rock a dar por si a descobrir a música clássica. Duas outras notas para dois outros livros que ajudaram a ler sobre música este ano: a luminosa auto-biografia de John Adams e uma visão que integra Arthur Russel no contexto cultural da cena nova-iorquina de 70 e 80 em Hold On To Your Dreams.
1. O Resto é Ruído, de Alex Ross
2. Hallelujah Junction – Composing an American Life, de John Adams
3. Hold On To Your Dreams, de Tim Lawrence
4. Galileo’s Dream, de Kim Stanley Robinson
5. Invisível, de Paul Auster
6. A Música da Fome, de Le Clézio
7. The Moon, Came To Earth, de Philip Graham
8. Design For Obama, de Aaron Perry Zucker e Spike Lee
9. Contos Completos, de Truman Capote
10. Com a Cabeça na Lua, de Asimov, Clarke, Heinlein e outros…
Barthes — palavras póstumas, tão longe, tão perto: uma escrita que labora, incansável, sobre a transparência e as suas ilusões, as significações e o seu impensado. Entre coisas redigidas na urgência deste nosso presente e coisas vindas de passados (e edições) mais ou menos distantes, o ano de leitura deixa-nos uma certeza: é possível ler, continuar a ler, para além da "velocidade" ilusória e fragmentária de muitas formas de consumo na Net. Foi também o ano para reescrever o nome de: Nuno Bragança.
1. Journal de Deuil, de Roland Barthes
2. Carnets du Voyage en Chine, de Roland Barthes
3. Obra Completa 1969-1985, de Nuno Bragança
4. Ofício Cantante, de Herberto Helder
5. Les Voyageurs du Temps, de Philippe Sollers
6. Invisible, de Paul Auster
7. Caim, de José Saramago
8. Un Coeur Intelligent, de Alain Finkielkraut
9. The Time Traveler's Wife, de Audrey Niffenegger
10. Francis Bacon (catálogo Tate)
As canções do ano (6)
Imagens do teledisco de Add This Song.
Acontecimentos 2009: Kindle
Figuras do ano: James Cameron
Os discos da década (37)
Bodily Functions
Herbert, 2001
Apoiado sob uma série de princípios e pressupostos que determinaram regras pelas quais a música ganhou forma, o disco deu à música house o seu episódio mais revolucionário em largos anos. Aceitando o “erro” como parte da identidade humana do acto de criar, Herbert usa o sampling em favor de uma nova forma de entender a construção musical e encontra canção como inesperada meta.
Imagens do teledisco de Suddenly (com a voz de Dani Sciciliano), um dos temas de Bodily Functions.
Os filmes da década (38)
Duncan Jones, 2009
Talvez o melhor filme de ficção-científica dos anos zero, assinala um reencontro com o protagonismo da narrativa (contrariando o primado do espectáculo visual que tem caracterizado o género desde o advento de nova tecnología digital). Com claras referências em clásicos como 2001 Odisseia no Espaço de Kubrick, O Cosmonauta Perdido (no original Silent Running), de Douglas Trumbull, Solaris, de Andrei Tarkovsky ou Outland: Atmosfera Zero, de Peter Hyams, é um solo para um actor e uma história de solidão, com uma revelação arrepiante pelo meio… Magnífica estreia para Duncan Jones.
Imagens do trailer de O Outro Lado da Lua.
terça-feira, dezembro 29, 2009
"Avatar" e os outros espaços (5/10)
Face a Avatar, de James Cameron, gostaria de defender a ideia segundo a qual a "descoberta" do 3-D é uma asserção historicamente fraca. Dito de outro modo: a história do cinema contém toda uma genealogia dramática do espaço, por vezes de enorme complexidade conceptual, que está muito para além da "ilusão" óptica — dez fotogramas para nos lembrarmos.
[1] [2] [3] [4]
Terá sido por reacção enraizada nas mais primitivas resistências ao cinema como "espectáculo-de-feira" (que o foi, literalmente) que herdámos um outro preconceito valorativo: o de que a beleza da imagem cinematográfica apenas se pode aproximar da pureza da fotografia e, por extensão, da excelência da pintura. Em boa verdade, o cinema está cheio de filmes pesadamente académicos que "imitam" códigos figurativos da pintura. No fotograma, a beleza provém de outros valores, tanto mais que até mesmo o plano mais fixo e mais longo remete para algo que se transfigura perante os nossos olhos, nem que seja a sensação primordial da duração. Neste instante da cena final da primeira longa-metragem de Tarkovski, está expresso o segredo, afinal transparente, desse estado de coisas: não uma fotografia "bonita", não uma evocação "pictórica", mas algo que flui, levando-nos a sentir a diferença infinita dos instantes. Será preciso acrescentar que Tarkovski foi também um mestre da luz como aquilo que nunca se aquieta? Dito de outro modo: a beleza do cinema nasce dos movimentos da luz. Ou ainda: daquilo que a pintura pensou e a fotografia fixou — o cinema pensa através do movimento que recusa fixar-se.
Michael Jackson: o luto digital
Os melhores de 2009: Filmes
CINEMA: Kate Winslet filmada por Sam Mendes: símbolo de um cinema em que os actores ainda contam, ou o rigoroso contrário da violenta impessoalização de Transformers. O que não significa que a "tecnologia" seja o inimigo a abater. Bem pelo contrário: Benjamin Button é um esplendoroso ser híbrido, nascido da insólita contaminação do acto de representar pela digitalização da imagem. Afinal de contas, é o corpo (e a sua voz) que continua a desafiar o olhar (e a escuta) dos grandes cineastas — veja-se Jeanne Balibar filmada por Pedro Costa.
1. Revolutionary Road, de Sam Mendes
2. Estado de Guerra, de Kathryn Bigelow
3. Depois das Aulas, de Antonio Campos
4. Che, de Steven Soderbergh
5. O Delator!, de Steven Soderbergh
6. Ne Change Rien, de Pedro Costa
7. O Estranho Caso de Benjamin Button, de David Fincher
8. Um Conto de Natal, de Arnaud Desplechin
9. Sacanas sem Lei, de Quentin Tarantino
10. Andando, de Hirokazu Kore-eda
DVD: Apesar das muitas edições interessantes, e mesmo não esquecendo a reforçada abertura aos clássicos e às cinematografias exteriores ao espaço anglo-saxónico, o mercado do DVD continua a apresentar uma imagem mais ou menos caótica — algumas grandes campanhas para blockbusters e, depois, um pano de fundo de "salve-se quem puder". Nenhuma pedagogia, nem sequer meramente comercial... com coisas fascinantes no meio do turbilhão.
1. Gimme Shelter, de Albert e David Maysles, e Charlotte Zwerin
2. Nos Lábios Não, de Alain Resnais
3. Jacques Demy (3 filmes)
4. Jacques Torneur (4 filmes)
5. Eric Rohmer ('Seis Contos Morais')
6. Eric Rohmer ('Comédias e Provérbios')
7. Eric Rohmer ('Contos das Quatro Estações')
8. Madonna - Celebration (The Video Collection)
9. Mad Men (primeira temporada)
10. O Feiticeiro de Oz (edição 70 anos)
Muitos filmes em estreia, muitos mais os que não chegaram às salas, os festivais representando cada vez mais um espaço fundamental para ver outro cinema… Aqui ficam dez filmes e dez DVD que marcaram um ano cheio de imagens.
CINEMA: Independentemente dos feitos técnicos que fizeram as notícias (os 3D e por aí adiante), houve cinema q.b. para ver em 2009… E sabe bem chegar ao fim do ano e verificar que entre a lista dos melhores moram algumas primeiras obras de novos realizadores. É o caso de Moon (entre nós estreado como O Outro Lado da Lua), primeira longa-metragem de Duncan Jones, filme que devolve a ficção científica a um patamar mais feito de ideias que de feitos digitais. É uma obra de impressionante solidez narrativa, um solo para um actor e todo um conjunto de variações criadas em seu redor, com cereja em cima do bolo na soberba banda sonora de Clint Mansell. Sem dúvida o filme do ano… Nesta lista de dez títulos destaque-se ainda uma outra estreia: a de Kit Hung, num filme que cruza histórias e personagens entre o ocidente e o oriente, com um cuidado visual (e música bem escolhida) que justificava estreia comercial por estas bandas… Outra estreia que há muito tarda é a de Lake Tahoe, premiado em Berlim em 2008 e ainda sem a merecida atenção local.
1. O Outro Lado da Lua, de Duncan Jones
2. Soundless Wind Chime, de Kit Hung
3. Deixa-me Entrar, de Tomas Alfredson
4. Histórias de Caçadeira, de Jeff Nichols
5. Fig Trees, de John Greyson
6. Lake Tahoe, de Fernando Eimbcke
7. Andando, de Hirokazu Koreeda
8. Milk, de Gus van Sant
9. Morrer Como Um Homem, de João Pedro Rodrigues
10. Gran Torino, de Clint Eastwood
DVD: O destaque inevitavelmente para o melhor documentário sobre um músico editado nos últimos tempos. Cruzando o espaço de vida pessoal com o universo profissional, explicando (sem se dar por isso) quem é o protagonista e quem música faz, o retrato de Philip Glass por Scott Hicks é um espantoso panorama sobre uma das figuras mais marcantes dos últimos 50 anos. A lista passa por outros dois documentários (um sobre Patti Smith outro, mais antigo, sobre Harvey Milk), uma ópera de Messiaen, a espantosa série televisiva Mad Men, o telefilme Recount (ainda por exibir entre nós) e uma pequena selecção de longas-metragens com história. Destaque aqui para a espantosa colecção de extras explicativos do filme em questão que chegam com A Caminho de Idaho, só agora com edição local, que define um modelo que muitos outros títulos deveriam seguir.
1. Glass: A Portrait in 12 Parts, de Scott Hicks
2. Patti Smith: Dream Of Life, de Steven Sebring
3. Mad Men, série criada por Mathew Winer
4. A Caminho de Idaho, de Gus Van Sant
5. Recount, de Danny Strong
6. Saint François d’Assisse (Messiaen), de Misjel Vermeiren
7. Os Tempos de Harvey Milk, de R. Epstein e R. Schmiechen
8. E Tudo o Vento Levou, de Victor Fleming
9. Aelita, de Yakov Protazanov
10. Quem Tem Medo de Virginia Woolf?, de Mike Nichols
As canções do ano (5)
Imagens do teledisco de Last Of The Englis Roses.
Figuras do ano: Tina Fey
Acontecimentos 2009: Agua na Lua
Os discos da década (36)
Merryweather Post Pavillion
Animal Collective, 2009
A banda cuja obra é talvez a mais marcante e influente dos anos zero fecha a década com a sua obra-prima. Um disco que representa o aprofundar definitivo de uma demanda que os acompanhou álbum após álbum, criando uma identidade que vive de uma forma muito pessoal de juntar heranças tão distintas quanto o psicadelismo, o minimalismo e um interesse pela construção de um todo através da soma de fragmentos.
Imagens do teledisco de My Girls, um dos singles extraídos de Merryweather Post Pavillion.
Os filmes da década (37)
O Fantasma
João Pedro Rodrigues, 2000
A longa-metragem de estreia de João Pedro Rodrigues revelou desde logo um cinema atento ao seu poder narrativo e apoiado por uma soberba direcção de fotografia. Coloca-nos numa Lisboa afastada das ruas principais, de noite, revelando-nos a história de desejo obsessivo que tem por protagonista um joven que trabalha na recolha de lixo.
Imagens do trailer de O Fantasma.
segunda-feira, dezembro 28, 2009
Os discos da década (35)
Amy Winehouse, 2006
Como se fosse um conto moral para gente crescida: tudo começou, algures, quando Amy Winehouse sentiu a vocação e se entregou a uma "dieta" juvenil de Sarah Vaughan. Resultado: um estilo que integra o misto de dor e ironia do seu modelo, muito bluesy, permitindo-lhe reinventar a tradição das grandes jazz singers, sem menosprezar uma ligeireza paradoxal, tendencialmente pop. Depois da estreia, com o fabuloso Frank (2003), lançado quando Amy tinha 20 anos, Back to Black sinaliza uma maturidade porventura demasiado precoce, mas também de esplendorosa depuração. Rehab, Me & Mr. Jones e Love Is a Losing Game [registo de 2006, em baixo] são clássicos para o futuro mais ou menos distante.
Visconti + Magnani + Madonna
Jaoui/Bacri: elogio dos actores
Há duas referências cinéfilas, enraizadas nos tempos heróicos da Nova Vaga, que nos podem ajudar a situar o trabalho de Agnès Jaoui e Jean-Pierre Bacri, sobretudo enquanto argumentistas. A primeira provém do cinema social de Claude Chabrol (lembremos o recente A Comédia do Poder, com Isabelle Huppert): as suas histórias mais ou menos policiais nunca perderam uma dimensão de testemunho dos “usos e costumes” e, em boa verdade, é possível ler algumas das principais transformações da sociedade francesa nos últimos cinquenta anos através dos seus filmes; a segunda é Eric Rohmer (autor da série clássica “Seis Contos Morais”, a que pertence A Minha Noite em Casa de Maud): privilegiando a fala como matéria narrativa, a sua obra expõe as euforias, contradições e impasses das palavras.
Jaoui e Bacri não têm o gélido desencanto moral de Chabrol nem procuram a perversa teatralidade que distingue o cinema de Rohmer. Talvez possamos definir o seu trabalho através de uma sistemática atenção às relações humanas (sociais e familiares) e, em particular, um evidente prazer na procura das palavras com que nos revelamos aos outros, porventura a nós próprios. Nessa perspectiva, o título original do novo filme da dupla possui uma luminosa ironia. De facto, Deixa Chover chama-se Parlez-moi de la Pluie. Ou seja, trata-se de um pedido (“fale-me da chuva”) que envolve a necessidade de falar, mas ao mesmo tempo pressente que as palavras podem ser irremediavelmente perturbadoras (mais do que uma mera conversa sobre a chuva...).
Estamos perante um universo que não se confunde com os símbolos mais mediáticos do actual cinema francês. Não encontramos, aqui, a ambição espectacular das grandes evocações biográficas (recordemos os títulos recentes sobre Edith Piaf ou Coco Chanel) e escusado será dizer que este é um terreno estranho às grandes máquinas de produção de que “Astérix” se tornou o modelo de maior sucesso. Deixa Chover distingue-se pela continuada relação com um património cinematográfico em que o retrato social é um valor narrativo essencial, contaminado por componentes mais ou menos melodramáticas. Exemplifica uma estratégia que, em última instância, procura valorizar o trabalho dos actores. Que é aquilo que Agnès Jaoui e Jean-Pierre Bacri, metodicamente, continuam a ser.
Os melhores de 2009: discos
Foi um ano cheio de muitos e bons discos. E o difícil foi mesmo escolher listas de apenas dez! Aqui ficam, as listinhas da praxe em três frentes: pop/rock (e afins), música portuguesa e clássica (e universos ao seu redor)…
POP/ROCK: As unanimidades por vezes são perigosas, mas há muito tempo que se não via tamanha concentração de escolhas em torno de um mesmo disco. E o vencedor é mesmo Merryweather Post Pavillion, dos Animal Collective. O disco na verdade fecha uma década ao longo da qual a banda norte-americana seguiu um trilho muito pessoal, em busca de uma linguagem que não só encontrou como acabou por dominar. O álbum deste ano é a sua obra-prima e representa um dos títulos de síntese mais marcantes do que foi o som dos anos zero. Na lista dos dez mais do ano as escolhas passam depois pelo projecto Discovery, uma aventura em paralelo de elementos dos Vampire Weekend e Ra Ra Riot a experimentar outra forma de, com electrónicas na manga, explorar os caminhos da canção. Murcof voltou a brilhar, desta vez num disco que junta às suas demandas texturais e minimalistas os ecos da corte de Luis XIV em Versalhes. Os Grizzly Bear são os campeões indie do ano, com um disco que soube levar as canções a novos patamares nas formas e arranjos (Nico Muhly a ajudar). Julian Casablancas registou a solo o grande sucessor que há muito faltava para o álbum de estreia dos Strokes. DM Stith (no campeonato Sufjan Stevens) foi a revelação do ano. Sufjan, já agora, confirmou visões que se adivinhavam nas entrelinhas de Illinois num filme-com-música sobre uma auto-estrada em Nova Iorque. Os Girls e o álbum que se chama Album foram outra das boas notícias do ano, abrindo janelas a heranças da cultura pop californiana. Os Pet Shop Boys deram-nos o seu melhor álbum desde 1991! E David Sylvian não consegue fazer um disco menor!
1. Animal Collective, Merryweather Post Pavillion
2. Discovery, LP
3. Murcof, The Versaillhes Sessions
4. Grizzly Bear, Veckatimest
5. Julian Casablancas, Phrazes For The Young
6. DM Stith, Heavy Ghost
7. Sufjan Stevens, B.Q.E.
8. Girls, Album
9. Pet Shop Boys, Yes
10. David Sylvian, Manafon
MÚSICA PORTUGUESA: Se 2008 foi o ano das revelações, 2009 trouxe as confirmações. B Fachada cumpriu em pleno, primeiro com um álbum de boas surpresas e, no fim do ano, com novo disco verdadeiramente surpreendente, o que dele faz neste momento um dos mais interessantes autores da nova música portuguesa. O ano trouxe ainda a conclusão, em grande forma, do díptico a solo, ao piano, de António Pinho Vargas. Sérgio Godinho, José Mário Branco e Fausto levaram a disco o inesquecível concerto a três. O Real Combo Lisbonense despertou curiosas memórias de uma música portuguesa esquecida. Os Quais fizeram de um meio disco uma ideia inteira. Francisco Ribeiro trouxe novas visões numa música de vistas largas. Tiago Sousa mostrou uma espécie de autobiografia em vinil. Bernardo Sassetti continua a assinar grandes bandas sonoras. Os Micro Audio Waves prosseguem um interessante diálogo com a canção, desta vez em cena. E Samuel Úria fechou o ano com uma bela mão cheia de canções.
1. B Fachada, B Fachada
2. António Pinho Vargas, Solo II
3. Três Cantos, Três Cantos ao Vivo
4. Real Combo Lisbonense, Real Combo Lisbonense EP
5. Os Quais, Meio Disco
6. Francisco Ribeiro, Desiderata – A Junção do Bem
7. Tiago Sousa, Insónia
8. Bernardo Sassetti, Um Amor de Perdição
9. Micro Audio Waves, Zoetrope
10. Samuel Úria, Nem Lhe Tocava
1. Ambrose Field, Bring Dufay
2. Bernstein: Marin Alsop, Mass
3. Brahms: John E. Gardiner, Symphony Nº 3
4. Braga Santos: Álvaro Cassuto, Integral das Sinfonias
5. Adams: David Robertson, Doctor Atomic Symphony
6. Schubert: David Fray, Moments Musicaux / Impromptus
7. Arvo Pärt, In Principio
8. Lang: Paul Hiller, The Litte Match Girl Passion
9. Corrigliano: JoAnn Palletta, Mr. Tambourine Man
10. Rota: Marzio Conti, Symphonies
Entre novidades e reedições, velhinhos bem conservados e alguns simpáticos agitadores juvenis, muito pop e alguns desvios ditos clássicos ou jazzísticos, uma coisa é certa: em tempos de dominação da cultura televisiva, não foi esta a música que nos deram a ver/escutar. A prova? Quase deixou de haver telediscos nas televisões generalistas, enquanto a MTV se converteu aos horrores da reality TV. Entretanto, proliferam os clones dos concursos, por vezes tentando imitar Michael Jackson. Você disse Michael Jackson? Darkness falls across the land...
The Beatles, Remasters
Keith Jarrett, Paris/London Testament
Cecilia Bartoli, Scarificium
Anne Sofie von Otter, Bach
Madonna, Celebration
Girls, Album
Antony and the Johnsons, The Crying Light
Flaming Lips, Embryonic
Bob Dylan, Together Through Life
Yeah Yeah Yeahs, It's Blitz
O planeta a quem o habita
É verdade que, na essência, a história não traz nada de surpreentemente novo… Mas não deixa de ser significativo que, num ano em que se discute o futuro de uma política ambiental para a Terra e chega ao fim uma década que raras vezes conheceu dias sem a palavra guerra nos noticiários, entre em cena um filme que coloca, precisamente, uma visão ecologista e uma perspectiva anti-belicista no tutano da acção.
Entre um novo contingente de recrutas para a equipa de segurança que acompanha a missão mineira chega um paraplégico, ex-marine, a quem é confiada uma missão: entrar numa comunidade nativa, ganhar a confiança da população e no fim passar para a companhia mineira os… "planos da pólvora" (ou seja, o plano de uma árvore gigantesca que serve de abrigo à comunidade mas que mora sobre o mais rico jazigo do mineral que os humanos querem extrair). Há dois cenários em jogo: ou Jake Sully (o antigo marine) convence os Na’vi a deixar a árvore, ou a força bruta entra em cena… E como chega Jake ao povo nativo, neste mundo onde a atmosfera é venenosa para os humanos? Projectando a sua mente num corpo de um Na’vi clonado… um avatar.
No fundo, na essência (e reconhecendo naturalmente as devidas distâncias) parece haver um possível parente próximo da narrativa que suporta Avatar. Chama-se Dune (sim, o de Frank Herbert, que serviu de base ao mais atípico dos filmes de David Lynch)… Como? Conta a história de um mundo distante que chama atenções exteriores pelos seus recursos naturais que são explorados tal como numa mina se extrai um minério. Um mundo que é dominado por forças ocupantes, aos nativos (os Fremen) não restando senão uma vida de resistência… Até que chega alguém, que começa por ser um elemento da força ocupante. Alguém que se vê inesperadamente do outro lado da barricada… Que aprende os modos de vida da população local e acaba como seu líder na revolta contra o opressor… Tudo isto com um subtexto ecologista por fundo, aqui com um deserto em lugar do verde das florestas de Pandora.
Nas entrelinhas correm, depois, piscadelas de olho a alguns episódios anteriores na vida cinematográfica de James Cameron, nomeadamente o seu Aliens. Uma das sequências perto do fim (não se diz mais para não “estragar” a história a quem ainda não viu o filme) evoca a luta final entre Ripley e o alien, já de regresso à nave-mãe. Mais curiosa é a caracterização frágil e apaziguadora da personagem interpretada por Sigourney Weaver, nos antípodas da Ripley de que se falava há pouco.
O que há de mesmo muito mau em Avatar é… a música (de James Horner), com percussões tribais a fazer do retrato musical dos Na’vi um cliché supostamente africano… Com uma canção ainda pior (como seria possível?) que a de Celine Dion a fechar os créditos finais. E por vezes tão a soar a Titanic que a dada altura se chega a pensar que a grande árvore dos Na’vi até se vai afundar…
As canções do ano (4)
Imagens do teledisco de Audacity Of Huge.