sábado, abril 30, 2011

Ernesto Sabato (1911 - 2011)


Figura ímpar das letras argentinas, cidadão politicamente empenhado que, na sequência do desmantelamento da ditadura militar, presidiu à Comissão Nacional para o Desaparecimento de Pessoas, Ernesto Sabato faleceu na madrugada de 30 de Abril, vitimado por uma bronquite — completaria 100 anos no dia 24 de Junho.
O seu primeiro livro, Uno y el Universo (1945), apresentava um conjunto de ensaios filosóficos sobre o conflito entre a humanidade e a evolução tecnológica. Publicou o primeiro romance, El Túnel, em 1948, de imediato obtendo um grande reconhecimento internacional. Seguiram-se títulos como Sobre Héroes y Tumbas (1961), El Escritor y sus Fantasmas (1963), Diálogos con Jorge Luis Borges (1976) e a autobiografia Antes del Fin (1998). À frente da Comissão Nacional para o Desaparecimento de Pessoas, Sabato coordenou os trabalhos de investigação sobre a repressão da ditadura militar do general Jorge Videla (1976-1983), recolhendo testemunhos relacionados com 8960 desaparecidos e a existência de 340 centros de detenção ilegal e tortura, culminando, em 1984, com a edição do relatório Nunca Más. Nesse mesmo ano, foi galardoado com o Prémio Cervantes.

>>> Obituário no jornal El Pais.

Filme sueco vence Festival de Tribeca


O filme sueco She Monkeys, de Lisa Aschan, arrebatou o prémio de ficção do Festival de Tribeca — já apresentado em Berlim (secção 'Generation'), centra-se na relação de amizade de duas adolescentes, tendo como pano de fundo o mundo das acrobacias equestres. Bombay Beach, de Alma Har'el (Israel/EUA), venceu a secção documental. A lista completa de prémios pode ser consultada no site do festival.

Para acabar com o 25 de Abril

Jornal "República", 26 de Abril de 1974
(em baixo: cartaz de Vieira da Silva)
Afinal de contas, na paisagem televisiva, qual o saldo das "comemorações"? De que falam as televisões quando falam do 25 de Abril? E porque falam tanto... e dizem tão pouco? — este texto foi publicado no Diário de Notícias (30 de Abril).

1. Esperei com alguma ansiedade que, no dia 25 de Abril, algum político se referisse à necessidade (politica, hélas!) de pensar o que somos, e o que queremos ser, sem esquecer o poder imenso que as linguagens televisivas adquiriram na nossa sociedade... Silêncio. Nada. Zero. Consideram, talvez, que um país audiovisual dominado por telenovelas, incluindo as “jornalísticas”, é o paraíso cultural prometido pelo 25 de Abril.

2. Através da sistemática desvalorização de qualquer memória, as televisões gastaram 34 anos (a primeira telenovela começou a ser emitida em 1977) a criar um espaço de valores narrativos cuja futilidade acabou por contaminar tudo e todos. Hoje em dia, qualquer gritaria à frente de uma manifestação é promovida como “fenómeno sociológico”. Aliás, a regra é: qualquer gritaria, nem que seja uma dúzia de arruaceiros à porta de um estádio de futebol, deve existir como facto incontornável do nosso quotidiano.
Podem fazer-se muitos e esforçados programas “sérios” para “explicar”, “ensinar” e “divulgar” o 25 de Abril... Em boa verdade, não passam de exercícios de desculpabilização, desesperadamente empenhados em emprestar à televisão a consciência social que ela, globalmente, deixou de querer ter. Na prática, qualquer espessura histórica do 25 de Abril vai-se desvanecendo em festivas caricaturas que, entre outras coisas, reduzem a minha geração (os que foram adolescentes nos anos 60/70) a uma galeria de patetas alegres. Já nem se supõe que estávamos vivos antes do 25 de Abril. Raiva? Amor? Sofrimento? Alegria? Sim, alegria?... Antes, ninguém sentiu nada. Fomos todos umas marionetas que, agora, enfim, podem ser redimidas pela “libertação” das redes sociais.
Dramaticamente, esta estupidez generalizada decorre, em grande parte, do falhanço simbólico da mesma geração (a minha, entenda-se). Fico, por isso, contente que o 25 de Abril esteja a agonizar entre festejos “populares”, reportagens “objectivas” e estudos “televisivos”. Talvez se comece, finalmente, a falar de outra coisa. De quê? Sugiro: a televisão que temos.

Pet Shop Boys, 1991


Fazia história, ouvindo-se nas rádios e passando nas televisões há precisamente 30 anos. Cruzando duas canções distintas, em concreto Where The Streets Have No Name (sim, dos U2) e I Can’t Take My Eyes Out Of You (de Frank Valli), os Pet Shop Boys assinavam mais um clássico na sua discografia. Aqui fica o teledisco.



Pet Shop Boys
‘Where the Streets Have No Name (I Can't Take My Eyes off You)’ (1991)

Da Polónia dos anos 50 e 60


Um nome para talvez descobrir. Grazyna Bacewicz... Compositora polaca, que Krystian Zimerman redescobre em três Quintetos para Piano, em edição da Deutsche Grammophon.

Foi uma das maiores compositoras do seu tempo, a sua obra maior datando das décadas de 50 e 60 do século XX. Proeminente como o fora Nadia Boulanger antes da II Guerra Mundial (hoje muito recordada pelos notáveis que foram seus alunos) ou como hoje o é Sofia Gubaidolina. Grazyna Bacewicz (1909-1969) conheceu contudo o silêncio para cá da cortina de ferro, fechando muita da sua notoriedade (e da sua música) a espaços do antigo bloco de Leste. O centenário do seu nascimento chamou atenções. E Krystian Zimmerman, que já conhecia a música da compositora polaca desde os dias em que estudara, tomou importante papel na evocação da sua obra. Neste disco encontramos obras de música de câmara compostas entre os anos 50 e 60 através das quais nos é permitido um contacto com um nome que, assim, rompe o eventual muro do esquecimento. É uma música que tanto expressa um lirismo como um sentido de agressividade, como a própria em tempos o descreveu. Os quintetos para piano números 1 a 3 que aqui ouvimos dão-lhe razão.

A caminho de novos rumos...

Discografia Brian Eno - 7
'Another Green World' (álbum), 1975



Após dois álbuns a solo que ainda reflectiam vivências próximas dos universos glam rock, ao terceiro disco Brian Eno procurou rumos mais adiante. E em Another Green World assina uma das mais desafiantes entre as colecções de canções que podemos escutar na discografia pop/rock de meados dos setentas. Em estúdio contou com a colaboração de músicos como John Cale, Phil Collins ou Robert Fripp, sendo que em várias canções o próprio assegurou toda a instrumentação. É um disco de formas menos geométricas, de arranjos elaborados, de texturas e melodias que cativam e pedem atenção.

sexta-feira, abril 29, 2011

E chega o oitavo filme...


Mais um filme de Seamus Murphy para as canções do mais recente álbum de PJ Harvey. Desta vez ao som de Bitter Branches.

O musical, segundo Jake Shears

O vocalista dos Scissor Sisters, Jake Shears, criou um musical baseado nos livros Tales Of The City, de Amistead Maupin. A estreia tem lugar em San Francisco, a 18 de Maio.

Novas edições:
Vários, Kitsuné: Parisien


Vários
“Kitsuné: Parisien”

Kitsuné Maison

3 / 5


Retratos de Paris? Não “o” retrato de Paris mas, antes “um” retrato da Paris dos nossos dias. É esse o fio condutor de mais um título editado pela Kitsuné, mas fora da série Kitsuné Maison que tem representado uma das mais interessantes histórias da pop recente, num comprimento de onda atento aos terrenos electro e indie (e suas cercanias). Este volume exterior à série toma Paris como o objecto a retratar através de uma série de temas de projectos musicais parisienses do nosso tempo. Uma selecção co-assinada pelo timoneiro da editora (Gildas Loaëc) e por ‘André’ Saraiva, figura ligada às festas que têm feito história sob o nome desta editora local. O panorama não se afasta do que é a linha habitual das antologias Kitsuné Maison, talvez com mais evidente representação de ideias pop, não deixando contudo de lado uma sempre presente relação com a música de dança. Se Desorbitée (Exotica) ou Adelaïde (Destin) traduzem ecos de tradições pop francesa dos oitentas, já temas como Gangsta Rap (Total warr) ou Recession Song (Yan Wagner) são ecos de linhas mais actuais. Em conjunto fazendo assim o mais interessante retrato Kitsouné dos últimos tempos.

Bowie... em exposição


O Museum Of Arts and Design, de Nova Iorque, apresenta este ano uma exposição dedicada à obra de David Bowie. Inaugura dia 9 de Maio e junta o seu trabalho em vídeo à obra no cinema, propondo inclusivamente um programa em paralelo com a exibição de títulos marcantes da sua filmografia. Na sequência de imagens deste post, momentos dos telediscos de Life On Mars e Loving The Alien e do filme The Man Who Fell To Earth, de Nicolas Roeg.

Em contagem decrescente (5)


O space shuttle Endeavour, já na plataforma, à espera do final da contagem descrescente para a missão número 134 deste programa espacial da Nasa.

Os rostos de Lena Vazhenina


Para descobrir na fotografia de moda (através do FashionProduction): o trabalho de Lena Vazhenina sobre os rostos – como se, subitamente, o "espelho da alma" se transfigurasse num mapa incerto, marcado pelo uso e pela imaginação, pelo desgaste simbólico e pela especulação utópica. Ou ainda: como se a representação do corpo espelhasse a fragilização de todas as nossas identidades.

quinta-feira, abril 28, 2011

Os amigos do robot


Um novo single surge do alinhamento do álbum de estreia de Shit Robot. A escolha apontou a Losing My Patience, tema no qual participa Alex Taylor, dos Hot Chip. Aqui fica o teledisco.

McCartney revisitado

Paul McCartney vai juntar mais títulos à campanha de reedições da sua discografia a solo encetada no ano passado com um lançamento bem nutritivo para o clássico Band on The Run, editado com os Wings. Os próximos dois títulos a reeditar são McCartney e McCartney II, ambos em formato remasterizado e com extras.

Novas edições:
Everything Everything, Man Alive


Everything Everything
“Man Alive”

Geffen / Universal

2 / 5


Nem todas as boas perspectivas que muitas vezes se levantam num (ou num par) de singles se concretizam em pleno na hora de chegar o álbum. E o primeiro longa duração dos Everything Everything é um caso mais a assinalar. A banda, de Manchester, na verdade contava já com quatro cartões de visita no formato de single, o mais antigo, Suffragette Suffragette, remontando já a uma edição (apenas em vinil) em 2008. Foi contudo ao som de canções como Photoshop Hansome ou MY KZ, UR BF que, entre 2009 e 2010 o grupo captou algumas atenções (ao ponto mesmo de ver a Geffen a convidá-los a integrar o seu catálogo). Os singles revelavam uma personalidade interessada na exploração de caminhos vários da música pop com gosto pronunciado por uma linguagem rítmica elaborada e uma vontade em abraçar várias realidades e caminhos num espaço só... Man Alive é agora uma montra alargada desta mesma agenda de ambições, porém sem a mesma capacidade em arrumar as ideias como o fizeram as canções acima citadas. Se a carteira de interesses da banda parece vasta e o gosto pelo desafio está entre as suas preocupações, já a capacidade em gerir tanta informação acaba por se manifestar num álbum mais desnorteado que afinado a um rumo. No fundo, com mais olhos que barriga. De onde se verifica uma vez mais que, nem sempre, mais é melhor...

Gentes do delta

Chama-se Alejandro Chaskielberg, é argentino e acaba de vencer a Iris de Ouro, por uma série de fotografias que olham cenas da vida de comunidades nas margens do Delta do Rio Paraná. As fotos foram tiradas num período de dois anos durante os quais o fotografo conviveu com estas comunidades. Ele é assim o Sony World Photographer of The Year.

Em contagem decrescente (4)


A um dia do lançamento do space shuttle Endeavour, mais três imagens (da Nasa) que observam de perto momentos dos meses de preparação para o voo vividos entre a tripulação e a vasta equipa técnica que a acompanha.

quarta-feira, abril 27, 2011

O mercado segundo Don DeLillo [citação]


Quem fala é Vija Kinski, "chefe de teoria" de Eric Packer. No romance Cosmopolis, de Don DeLillo, Kinski explica a Packer a vertigem digital do dinheiro e a mecânica do seu próprio mercado:

>>> (...) You apply mathematics and other disciplines, yes. But in the end you're dealing with a system that's out of control. Hysteria at high speeds, day to day, minute to minute. People in free societies don't have to fear the pathology of the state. We create our own frenzy, our own mass convulsions, driven by thinking machines that we have no final authority over. The frenzy is bare noticeable most of the time. It's simply how we live.

Cosmopolis está a ser adaptado ao cinema por David Cronenberg, numa produção conjunta do cineasta (Toronto Antenna Ltd) e Paulo Branco (Alfama Films) – estará pronto em 2012.

Oscars marcados para 26 de Fevereiro de 2012


Os Oscars referentes à produção de 2011 vão ser atribuídos no dia 26 de Fevereiro de 2012 – a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood deu a conhecer o calendário dos seus próximos prémios, a culminar na habitual cerimónia no Kodak Theater. As nomeações serão divulgadas cerca de um mês antes, a 24 de Janeiro; a entrega das distinções nas áreas técnica e científica ocorrerá a 11 de Fevereiro.

Poly Styrene (1957 - 2011)


Segundo as palavras lendárias da revista Billboard, foi o "arquétipo da moderna feminista punk": figura emblemática da banda X-Ray Spex, a cantora e compositora inglesa Poly Styrene faleceu em Sussex, no dia 25 de Abril, vitimada por cancro da mama – contava 53 anos.
De seu nome verdadeiro Marianne Joan Elliott-Said, viveu, segundo as suas próprias palavras, a adolescência de "uma hippie descalça". Terá sido um concerto dos Sex Pistols que a levou a colocar um anúncio num jornal, convocando quem com ela quisesse formar uma banda punk – foi assim que, em 1976, nasceram os X-Ray Pex [video]. Depois da dissolução da sua formação original, Poly prosseguiu, a solo, lançando-se em 1980 com o álbum Translucence. Com o passar dos anos, a sua música adquiriu uma sonoridade diferente, mais jazzy e contemplativa. O seu derradeiro registo surgiu no passado mês de Março de 2011, com o título Generation Indigo.
O nome "polystyrene" designa uma das mais frequentes formas de plástico, comercializada em grande escala a partir da década de 1950 – na sua forma sólida, é o material correntemente empregue nas caixas de CDs e DVDs.


>>> Obituário na BBC.

Em tempo de Primavera


Assinam como Erland & The Carnival e são um projecto que junta nomes como Simon Tong (que já passou pelos Verve ou pelos The Good, The Bad and The Queen) ou o vocalista Gawain Erland Cooper. Têm um segundo álbum a caminho, do qual este Springtime é um aperitivo. Aqui fica o teledisco.

Mais uma campanha de reedições

A EMI vai reeditar a obra dos Smashing Pumpkins editada em disco entre 1991 e 2000. Ao longo dos próximos dois anos serão reeditados os álbuns de originais que então fizeram a história da banda, aos quais se juntam as antologias Pieces Iscariot (1994) e a caixa The Aeroplane Flies High (1996). Um best of faz ainda parte desta campanha.

Novas edições:
Architecture in Helsinki, Moment Bends


Architecture in Helsinki
“Moment Bends”

Coop

4 / 5


Chegam de Melbourne, na Austrália e têm uma discografia que já somou alguns títulos marcantes, assim como remisturas assinadas para nomes que vão de uns Cut Copy ou Midnight Juggernauts a uns Metronomy ou El Guincho. Já caminharam por trilhos mais ousados. Não necessariamente experimentais, mas rítmica e melodicamente mais distantes dos domínios que fazem o centro de gravidade das linguagens da música pop. Mas ao seu quarto álbum, quatro anos após Places Like This, os Architecture In Helsinki aventuram-se por caminhos menos angulosos para enfrentar, de peito, uma ideia luminosa de pop solarenga. Já tinha havido um primeiro sinal de alerta, há dois anos, através do belíssimo single That Beep, que adivinhava novos caminhos através de uma canção de garrida e quente pop. Moment Bends toma That Beep como ponto de partida e define agora, num alinhamento feito de onze temas, uma das mais agradáveis colecções de momentos pop que o ano já escutou até agora. Ao som de Desert Island, que exala evidente travo estival, o disco trilha um percurso em tons maiores, a cada canção somando-se nova experiência num comprimento de onda não muito distante, o todo traduzindo, mesmo sob alguma diversidade nas formas, uma segura coerência. Moment Bends é um álbum de som polido, de arestas mais redondas, de formas finais mais sofisticadas. Mas, ao mesmo tempo, um festim de sensações directas, como mandam a melhores tradições da canção pop.

Nova Iorque (de outra maneira)

Este pequeno texto, que apresenta uma proposta diferente de “guia turístico” de Nova Iorque, foi originalmente publicado na edição de 16 de Abril do DN Gente.:

Pode ser um guia turístico. Mas, mais que isso, é como um retrato diferente da cidade de Nova Iorque. O livro, assinado por Miles Hyman e Vincent Rea, integra-se na colecção de "guias" com chancela da Casterman e da Lonely Planet que propõem visitas a cidades cruzando a lógica dos roteiros turísticos com a BD. Neste caso vive-se a descoberta de uma Nova Iorque vivencial, que é palco de acontecimentos centrais no panorama da música popular do nosso tempo. Texto e imagem em sintonia, num mapa feito de gentes e lugares que vibram como a cidade que os acolhe.

Em contagem decrescente (3)


Mais três imagens de bastidores dos preparativos para uma nova missão do space shuttle Endeavour, que parte para o Espaço na próxima sexta-feira. Os astronautas testam aqui os seus fatos espaciais, essenciais sobretudo para as operações fora da nave que terão de efectuar.

terça-feira, abril 26, 2011

O 25 de Abril nunca existiu

JOSÉ MALHOA
Fado, 1910
1. Quase todos os comentadores de futebol existem contaminados pela epidemia do determinismo: nada do que acontece num jogo pode escapar ao racionalismo mais primário e fundamentalista. Pois se as equipas até marcam golos quando não estão a dominar os jogos... Que escândalo! Que injustiça!

2. Seria apenas banal se essa filosofia de causalidades pueris não se tivesse instalado, como um ditadura das significações, em todos os domínios da televisão. Assim, enfiamo-nos há décadas no buraco ideológico em que continuamos a escavar na mesma caricata perplexidade. Afinal, o 25 de Abril foi "bom" ou "mau"? O sucesso X ou a tragédia Y são fruto (ou culpa) do 25 de Abril? A história deixou de ser um devir plural e contraditório – passou a ser tratada como um boletim do totoloto em que talvez acertemos na nossa redenção.

3. Comemora-se o 25 de Abril e ninguém fala de cultura. Cultura televisiva, antes do mais, já que é essa a cultura dominante. Tão dominante que conseguiu impor a ilusão de que só a "ópera", o "bailado" e outras excrescências intelectuais são culturais... Em boa verdade, um dos valores realmente radicais do 25 de Abril – tudo é cultural – foi reduzido a pó: a televisão determina todos os dias as nossas formas de ver, construir narrativas, colocar problemas e pensar, mas consegue essa proeza trágica de existir como se fosse o oráculo da transparência. Onde está um político sem medo de enfrentar esta conjuntura?

A IMAGEM: Viktor Koen, 2007


Corporate Meetings Magazine
Maio 2007

As gerações do narcisismo


VIKTOR KOEN / The New York Times, 25/04/2011

Num misto de ironia e crueldade, a ilustração de Viktor Koen cristaliza o que está em jogo: o narcisismo (musical) das novas gerações. Ou ainda: o modo como as canções de sucesso das últimas três décadas reflectem um narcisismo militante (complemento a ter em conta: temperado por uma sistemática agressividade). Exemplo? “It’s personal, myself and I” (Black Eyed Peas).
Vale a pena ler o artigo de John Tierney, no New York Times, dando conta do estudo científico que sustenta tais asserções. Vale a pena, sobretudo, avaliar os limites da visão banalmente sociológica, televisivamente panfletária, de qualquer geração.
O material de trabalho foi o Billboard Hot 100. O seu objecto: a epidemia narcisista. Os seus limites? Os que derivam de qualquer visão parcelar... Afinal de contas, como o artigo também recorda, em 1968 os Rolling Stones cantavam... Sympathy for the Devil!

Outras monarquias...


Os Monarchy, que se preparam para lançar em Maio o seu álbum de estreia, têm novo single. Trata-se de I Won’t Let Go. Aqui fica o teledisco, realizado por Roy Raz.

Shearwater na Sub Pop

Os Shearwater, projecto que em tempos nasceu como vida em paralelo aos Okkervil River (mas entretanto ganhou identidade separada), acabam de assinar pela Sub Pop. Um novo álbum deverá chegar em 2012.

Novas edições:
Low, C'Mon


Low
“C’Mon”

Sup Pop

4 / 5


Passaram quatro anos sobre a edição de Drums and Guns e, no reencontro com os discos, os Low arrumam (pelo menos momentaneamente) a pulsão política que atravessavas as canções do álbum de 2006 e reencontram, no novo C’Mon um espaço de demanda mais interior, em canções que sublinham uma vez mais as marcas de identidade de um trio que muitas vezes é apontado como referência maior do slowcore. C’mon é um disco tranquilo, tanto na forma das canções como no modo como o grupo as encara enquanto espaço com arestas bem contornadas, capazes de sugerir patamares de relacionamento com diversas referencias que moram entre a genética da sua identidade. A atmosfera é de sentida melancolia, mas o tom que abraça as canções sugere conforto, mesmo se as palavras expressam reflexões onde a dor possa ocasionalmente conhecer algum protagonismo. Ao nono álbum os Low parecem ter encontrado um lugar próprio que tanto expressa todo um quadro dramático como o molda a melodias que afagam e aconchegam. É entre medos e sonhos que moram estas canções. E, do apelo quase clássico do absolutamente irresistível (e imeadiatamente acessível Try To Sleep) ao melodismo quente, conduzido pelas guitarras acústicas, de Something’s Turning Over, seguindo por um alinhamento onde as vozes de Alan Sparhawk e Mimi Parker dividem protagonismo entre canções, C’Mon é um disco que, sem a necessidade de uma agenda esteticamente ousada, sugere pequenos instantes de encanto. Renovando, uma vez mais, a relação da banda com uma linguagem feita de suaves tons menores. E garantindo aos Low mais um episódio feliz numa discografia sempre recomendável.

Quando menos pode ser mais


Com Moon afirmou uma filiação num espaço da ficção científica mais próximo das história que lemos nos livros que das que nos últimos anos têm chegado aos ecrãs. Agora, Duncan Jones confirma em pleno que essa sua estreia não era ocasional episódio de (boa) inspiração, mas antes uma etapa num processo de demarcação de um lugar no cinema de ficção científica onde, mais que de efeitos visuais e manobras tecnológicas, o cinema vive antes de uma boa narrativa que vive pela força de uma ideia.

Código Base, a segunda longa-metragem de Duncan Jones é isso mesmo: uma boa ideia. Que o realizador encena segundo (e repetindo a lógica que suportava Moon) um relativo minimalismo de recursos, desta vez somando todavia ingredientes suficientes para assegurar uma potencial comunicação com uma plateia mais vasta.

Estamos num comboio, a caminho de Chicago... Na verdade tudo se passou horas antes, à carruagem indo parar, qual intruso dentro de um outro corpo, um soldado cujas memórias mais recentes passavam por missões no Afeganistão. Instalado num hospedeiro (que é professor de história e viaja com uma colega), o soldado tem nas mãos a missão de descobrir quem foi o responsável pelo atentado que, nessa manhã, havia destruído o comboio, matando todos os que seguiam naquela carruagem, anunciando novas explosões, ainda mais graves, e para breve, na cidade. O soldado (interpretado por Jake Gyllenhaal), confuso a principio, vai tomando consciência da missão, o movimento virtual pendular entre a carruagem (onde regressa várias vezes) e uma cápsula onde retoma os sentidos após cada novo episódio desta missão em curso.

Contudo, não é no plano da acção que vive a alma de Código Base. Mas antes no jogo emocional que se estabelece entre o soldado em missão e a operacional que o “comanda” à distância, as verdades da missão e da sua situação somando dados que o levarão a tomar decisões que Duncan Jones joga depois a favor de uma reflexão não muito distante de tantas que a literatura de ficção científica já fez sobre a noção de viagem no tempo. O Código Base de que se fala no filme não é contudo uma máquina do tempo. É uma realidade digitalmente criada por computador usando supostas regras da matemática e da física, com algum parentesco com uma ideia central ao Relatório Minoritário de Philip K. Dick que Spielberg levou ao cinema em 2002. Porém, contra a artilharia de produção desse filme, Duncan Jones consegue ir mais longe na arte de nos fazer perder dentro de uma história, seguindo aquela que, ao fim de dois filmes, parece ser uma regra em construção em volta da sua identidade autoral e que defende que menos pode ser mais.



Imagens do trailer de 'Código Base'

Em contagem decrescente (2)


Enquanto continua a contagem decrescente para mais uma missão do Space Shuttle (que deverá descolar da plataforma 39 no Centro Kennedy, na Florida, esta sexta-feira), aqui ficam imagens, da Nasa, que revelam momentos da preparação dos astronautas para esta missão.

segunda-feira, abril 25, 2011

The Antlers: simples & rock


Uma capa simples, mas envolvente, para um simples disco de rock, radical na sua simplicidade: Burst Apart é o reencontro com The Antlers [foto: Shervin Lainez], banda novaiorquina, de Brooklyn, alicerçada no génio criativo de Peter Silberman (voz, guitarras, acordeão, teclados), muito bem acompanhado por Michael Lerner (bateria, percussão) e Darby Cicci (teclados, trompete, banjo). Dois anos passados sobre Hospice, este é ainda um álbum habitado por um tocante desencanto poético, negro ma non troppo – para escutar nas páginas da NPR.


>>> Recordando Hospice, com o admirável teledisco de Two, realizado por Ethan Segal e Albert Thrower.


>>> Site oficial de The Antlers.
>>> The Antlers no MySpace.
>>> The Antlers - Frenchkiss Records.

Gonzalo Rojas (1917 - 2011)


Nome grande da poesia chilena contemporânea, galardoado com o Prémio Cervantes (2003), Gonzalo Rojas faleceu no dia 25 de Abril, em Santiago do Chile, cerca de dois meses depois de ter sofrido um grave acidente vascular cerebral – contava 93 anos.
Na juventude, até ao começo da década de 40, esteve ligado ao grupo surrealista 'Mandrágora', vindo a publicar o seu primeiro livro de poemas, La Miseria del Hombre, em 1949. Em 1973, na sequência do golpe que derrubou o governo de Salvador Allende, impondo uma ditadura militar, exilou-se, tendo leccionado em várias universidades, nomeadamente em Rostock (antiga RDA); embora tenha podido regressar ao Chile em 1979, o regime manteve-o afastado do ensino. Antes do Cervantes, recebeu o Prémio Nacional de Literatura do Chile e o Prémio Rainha Sofia de Poesia Ibero-Americana (este atribuído pelo Rei de Espanha), ambos em 1992. Entre os títulos marcantes da sua obra incluem-se Contra la Muerte (1964), Transtierro (1979) e Materia de Testamento (1988).

Qué se ama cuando se ama?

Qué se ama cuando se ama, mi Dios: la luz terrible de la vida
o la luz de la muerte? Qué se busca, qué se halla, qué
es eso: amor? Quién es? La mujer con su hondura, sus rosas, sus volcanes,
o este sol colorado que es mi sangre furiosa
cuando entro en ella hasta las últimas raíces?

O todo es un gran juego, Dios mío, y no hay mujer
ni hay hombre sino un solo cuerpo: el tuyo,
repartido en estrellas de hermosura, en partículas fugaces
de eternidad visible?

Me muero en esto, oh Dios, en esta guerra
de ir y venir entre ellas por las calles, de no poder amar
trescientas a la vez, porque estoy condenado siempre a una,
a esa una, a esa única que me diste en el viejo paraíso.

[antologia de poemas em A media voz]

>>> Obituário no jornal El Pais.

"48": outras imagens para o 25 de Abril




De que falamos quando falamos do 25 de Abril? Ou ainda: que imagens mostramos para falarmos do 25 de Abril? E sobretudo: como mostramos essas imagens? – este texto foi publicado no Diário de Notícias (24 de Abril), com o título 'As fotografias e os seus corpos'.

Em vésperas de mais um 25 de Abril, não deixa de ser sintomático que tenha sido um objecto de cinema a lançar nos circuitos audiovisuais algumas imagens “diferentes” das memórias do Estado Novo. Falo de quê? Das fotografias dos prisioneiros da PIDE que constituem a matéria de base do filme 48, de Susana Sousa Dias, estreado nas salas escuras na passada quinta-feira. De facto, o imaginário televisivo que domina o nosso espaço social há muito gerou (e impôs) uma série de lugares-comuns que tende a representar a ditadura salazarista como uma colagem de símbolos maniqueístas onde só há “bons” e “maus” sem qualquer espessura carnal.
O tema nuclear de 48 é, justamente, essa carnalidade que, para além (ou aquém) das ideologias, permite perceber que a verdade de cada ser humano passa sempre pela singularidade do corpo. E não há nada de banal em tal opção, quanto mais não seja porque se trata de evocar, em particular, as torturas a que muitos dos protagonistas foram sujeitos. Em vez de cair na retórica televisiva (um microfone à frente de um entrevistado encarregado de “explicar” as imagens de arquivo), Susana Sousa Dias aposta numa tensão radical: de um lado, nas imagens, as fotografias do arquivo da PIDE, mostrando os rostos duros e sofridos dos prisioneiros; do outro, no som, as vozes daqueles que estão nas fotografias.
Tal opção envolve uma consciência das linguagens audiovisuais que, todos os dias, as televisões tentam minimizar. Assim, no espaço televisivo, a maior parte dos dispositivos favorece a ilusão de que combinar imagens “informativas” com sons “descritivos” é um acto espontâneo, espontaneamente vocacionado para uma verdade inquestionável. Para além da percepção determinista do mundo à nossa volta, semelhante atitude tenta retirar aos que produzem e montam as imagens qualquer dever de responsabilidade (em relação à complexidade do real).
Ora, justamente, 48 parte de uma questão visceralmente cinematográfica (e de que as televisões, por um qualquer decreto divino, quase sempre se julgam dispensadas). A saber: como enfrentar a densidade histórica de uma imagem? Mais do que isso: como lidar com o facto de qualquer imagem ser, não um objecto congelado na história, mas sim um elemento que renasce e, num certo sentido, se reinventa cada vez que sobre ela se deposita um novo olhar?
E há um espantoso efeito que nasce de tudo isto: subitamente, as imagens da PIDE deixam de existir como testemunhos frios, mais ou menos “esgotados” na sua condição de documentos históricos, para renascerem através da vida que as vozes do filme lhes devolvem. É essa, afinal, a genuína dimensão política deste filme invulgar: não a colagem a qualquer discurso normativo (televisivo ou partidário), mas sim a apropriação da herança (fotográfica) da PIDE para construir uma outra visão, tão política quanto cinematográfica.

Suavemente


Mais um teledisco criado para uma das canções do mais recente álbum dos Strokes. Este é Call Me Back, um dos melhores momentos do disco.

The Knife com álbum em 2012

O duo sueco Ths Knife está finalmente a trabalhar num novo álbum que, segundo avançam no seu site oficial, será editado no próximo ano. Recorde-se que o seu mais recente álbum de originais foi o magnífico Silent Shout, de 2006, ao qual se seguiu um disco ao vivo e, depois, a ópera Tomorrow, In a Year.

Novas edições:
About Group, Start & Complete


About Group
“Start & Complete”

Domino / Edel

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Não lhes chamaremos um super-grupo... Mas pela frente temos uma banda que nasce em paralelo a outros projectos, juntando quatro músicos numa experiência comum. À frente do comando das operações está Alexis Taylor, a voz dos Hot Chip, que assina a maioria das canções que escutamos. Com ele encontramos Charles Heyward (This Heat), John Coxon (Spiritualized) e Pat Thomas (que tocou já com outros músicos, entre eles Derek Bailey), pela agenda de trabalhos passando uma ideia de trabalho simples e directo. De resto, o álbum foi gravado num só dia em estúdio, mantendo assim as ideias mais próximas dos primeiros impulsos. E assim nasce Start & Complete, um pequeno ciclo de canções que vivem em terreno algo distinto do que, apesar do protagonismo de Taylor, conhecemos nos Hot Chip. A personalidade da sua voz é evidente e demarca desde logo um terreno, mas à sua volta encontramos teclas diferentes, guitarras e uma pulsação rítmica distinta. Estamos em clima pop, mas ocasionalmente entra em cena um discreto travo jazzy. Há uma tranquilidade entre estas canções, que nascem sem a necessidade de cativar atenções em esferas pop ou a vontade em ser catalisador de energias na pista de dança. São canções de alma informal, claras no melodismo, simples nos arranjos (onde, contudo, se repetem vezes demais as mesmas soluções instrumentais). Pelo meio encontramos uma longa versão de You’re No Good, de Terry Riley, um dos momentos verdadeiramente cativantes num alinhamento que, mesmo com alguns instantes agradáveis, nunca nos mostra senão o resultado de uma interessante experiência.

Em contagem decrescente


Parece poster de um filme de ficção científica. E, na verdade, foi mesmo baseado num poster promocional de Star Trek. Contudo, não é senão uma imagem que anuncia o próximo voo do programa Space Shuttle. Na rampa 39 está já o Endeavour, a partida agendada para esta sexta feira.