sábado, maio 31, 2014

Karlheinz Böhm (1928 - 2014)

Celebrizado pelo seu papel de imperador nos filmes de Sissi, com Romy Schneider, o actor alemão Karlheinz Böhm faleceu no dia 29 de Maio em Grödig, Salzburg, Áustria — contava 86 anos.
Filho do maestro Karl Böhm e da cantora lírica Thea Linhard, começou a sua carreira em finais dos anos 40, tornando-se muito popular graças à trilogia de Sissi (1955-56-57), com Romy Schneider, em que interpretou o papel do Imperador Francisco José. O sucesso desses filmes trouxe-lhe diversos e importantes papéis na produção de língua inglesa, com destaque para Peeping Tom/A Vítima do Medo (1960), obra-prima de Michael Powell centrada na figura de um homem que filma as mulheres que assassina, registando os momentos da sua agonia — Böhm surge no genérico como Carl Boehm. 


Em Hollywood, o seu título mais importante foi o épico de Vincente Minnelli, sobre a Segunda Guerra Mundial, Os Quatro Cavaleiros do Apocalipse (1962). Nos anos 70, a sua figura está ligada à afirmação do "novo cinema" alemão graças aos filmes em que Rainer Werner Fassbinder o dirigiu, entre os quais se incluem Effi Briest (1974) e O Direito do Mais Forte à Liberdade (1975). A partir do início da década de 80, dedicou-se por inteiro ao apoio humanitário das populações da Etiópia, tendo fundado a organização Menschen für Menschen — o seu trabalho nesse campo valeu-lhe, em 2007, o Prémio Balzan.

>>> Obituário em The Guardian.

Sob o signo de Beethoven

LUDWIG van BEETHOVEN
por Andy Warhol (1987)
* Quinta, 29 Mai 2014, 21:00 - Fundação Gulbenkian, Grande Auditório
> Daan Janssens — (... revenir dans l'oubli...)
> Ludwig van Beethoven — Sinfonia nº9, em Ré menor, op. 125, «Coral»

Combinação insólita, porventura pouco apelativa para alguns espectadores (havia sinais dispersos de incómodo no intervalo...), a meu ver muito interessante: precedendo a Nona de Beethoven, o Coro e a Orquestra Gulbenkian, com direcção de Paul McCreesh (que iniciou as suas funções na temporada que está a terminar), interpretaram uma composição (de cerca de 15 minutos) do belga Daan Janssens, encomendada pela própria Fundação. Não se tratou de uma encomenda abstracta mas, como o próprio Janssens refere no programa, de uma proposta de Risto Nieminen (director do Serviço de Música), no sentido de criar uma obra para ser escutada num programa conjunto com aquela sinfonia.
Daan Janssens
O resultado foi um concerto em dois tempos claramente contrastados, cada um obedecendo a uma dramaturgia de crescente inquietação, unidos pela mesma noção de progresso (aproprio-me do termo aplicado por João Pedro Louro, no seu texto de apresentação da obra de Beethoven). Se podemos arriscar uma "actualização" da renovada sedução da monumental Nona Sinfonia, diremos que a sua aliança de "beleza e terror" [Jan Swafford] nos projecta num especialíssimo espaço de celebração, em tudo e por tudo distinto das noções correntes de espectáculo que se vão esgotando na produção de clímaxes mais ou menos artificiais — a música de Beethoven é uma matéria que desenha a possibilidade de um destino, tanto quanto o desejo de o questionar e superar.
Será que a marca de McCreesh já se vislumbra na performance da Orquestra Gulbenkian? Difícil dizê-lo, naturalmente, até porque, sem que isso belisque as qualidades do maestro, importa não esquecer que não estamos perante um conjunto de músicos à procura da sua "identidade". Em todo o caso, dir-se-ia que McCreesh optou por acentuar as arestas da própria obra, não temendo impelir a orquestra para os mais arriscados ziguezagues sonoros e emocionais — foi o derradeiro concerto da Orquestra nesta temporada e o mínimo que se pode dizer é que as expectativas para 2014/15 são as melhores.

A imaginação dos livros

A Book Culture, livraria da Broadway, tem uma nova campanha elaborada sob o signo de uma bela frase panfletária: "A imaginação chegou lá primeiro". Concebidos pela agência Y&R, os anúncios [sugere-se um click para ampliação] são um pequeno prodígio de... imaginação.

Cannes 2014: Rossellini

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A secção "Cannes Classics" há muito que deixou de ser um mero repositório de curiosidades mais ou menos "antigas". Com o incremento do restauro de filmes, visando novas cópias digitais, o festival tem servido de montra para muitos títulos que, afinal, correspondem a uma memória já distante das mais jovens gerações de espectadores — este ano, por exemplo, assinalou-se o 30º aniversário de Paris, Texas, de Wim Wenders (Palma de Ouro em 1984). Esta imagem a preto e branco pertence a Angst/O Medo (1954), de Roberto Rossellini, segundo Stefan Zweig, com Ingrid Bergman e Mathias Wiedman, por certo um dos momentos mais emblemáticos entre os clássicos (re)vistos em 2014 — uma crise conjugal encenada como exposição cruel da ambivalência dos corações humanos; para a história, hélas!, ficou também como o filme que consumou a ruptura do casal Bergman/Rossellini.

sexta-feira, maio 30, 2014

A surpresa da noite chamou-se... Bruce

Foto: J Girão / DN
A subida ao palco de Bruce Springsteen durante a atuação dos Rolling Stones no Rock in Rio resultou na única verdadeira surpresa de um concerto competente, mas que pouco acrescentou aos que o grupo tem apresentado nos últimos tempos.

"Era sabido que Bruce Springsteen estava em Portugal a passar férias (e quem se recorda da edição de 2012 do Rock in Rio lembrar-se-á que o seu concerto foi elogiado como um dos melhores da história do festival). Ninguém imaginava que Springsteen voltaria tão depressa ao Palco Mundo na Cidade do Rock. Mas aconteceu à quarta canção do alinhamento do concerto dos Rolling Stones que fechou o segundo dia da edição deste ano do festival. De guitarra nas mãos Springsteen entrou em palco para, ao lado dos Rolling Stones, cantar o clássico Tumblin' Dice. Foi assim o primeiro de vários convidados, mas certamente aquele que maior reação causou na plateia de 90 mil que enchia o recinto. E, pelas conversas que se escutavam depois, à saída do recinto, "o momento" maior da noite."

Pode ler aqui o texto completo.

quinta-feira, maio 29, 2014

Son Lux — novo EP

O novo EP de Son LuxAlternate Worlds — é mais uma espantosa demonstração da sua capacidade de criar teias melódicas e estruturas rítmicas de envolvente sensualidade. Aqui está o tema Build A Pyre (Begin Again), em magnífico teledisco dirigido por Geoff Hoskinson — dir-se-ia fogo que arde e não se sente...

Cannes 2014: Rússia

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O evidente desencanto no novo filme de Andrey Zvyagintsev, Leviathan, face ao presente da sociedade russa corre o risco de encerrar o seu labor na dimensão de um panfleto "anti-Putin" (aliás, citado através de um retrato que aparece numa cena). A desmontagem da corrupção no interior do aparelho de Estado é especialmente contundente, mas importa, creio, não perder de vista que as agruras da política se enredam no fôlego bíblico do trabalho de Zvyagintsev (aliás, inspirado no Livro de Job). O que ele filma é a vulnerabilidade do humano face à devastadora presença do Mal — Putin é um detalhe importante, mas é apenas um detalhe.

Maya Angelou (1928 - 2014)

A Conceit

Give me your hand

Make room for me
to lead and follow
you
beyond this rage of poetry.

Let others have
the privacy of
touching words
and love of loss
of love.

For me
Give me your hand.

M. A.

* * * * *

Personalidade multifacetada, com uma obra que vai do romance à poesia, passando pelo teatro e cinema, a americana Maya Angelou faleceu no dia 28 de Maio, na sua casa de Winston-Salem, Carolina do Norte — contava 86 anos.
Celebrizada pelo primeiro livro autobiográfico que publicou, I Know Why the Caged Bird Sings (1969), desenvolveu uma actividade artística, social e política sempre marcada pela história dos negros na sociedade americana e pela defesa dos direitos civis, tendo trabalhado com Martin Luther King, Jr. e Malcolm X. Como actriz, participou em vários filmes e séries de televisão (incluindo Raízes, 1977), tendo realizado o filme Down in the Delta (1988) e assinado diversos argumentos, quer para cinema, quer para televisão. Em 2011, Barack Obama condecorou-a com a Medalha Presidencial da Liberdade. O seu sétimo livro autobiográfico, Mom & Me & Mom, fora publicado em 2013.

>>> Maya Angelou em 1994, no programa Sesame Street.


>>> Lembrando Maya Angelou — site da Casa Branca.
>>> Obituário no New York Times.

10 escolhas pessoais para lembrar
em dia de concerto dos Rolling Stones


Os Rolling Stones colocaram cinco canções a votação para que, mais logo, um dos instantes do alinhamento do seu concerto no Rock In Rio surja de uma votação popular. Para o público português estão a votos os temas Start me up (de 1981), Angie (1973), Miss you (1978), (I can't get no) satisfaction (1965) e Sympathy for the devil (1968), havendo uma sexta hipótese, que pede a quem prefira outra canção que a indique e, claro, vote nela.

Resolvi deixar aqui um Top 10 de canções dos Rolling Stones, sabendo que a que coloco em primeiro lugar, e que foi aquela na qual votei, quando teve edição em single foi creditada a Bill Wymann. Mas é a minha canção preferida dos Rolling Stones.

In Another Land (1967)
Uma das canções do álbum Their Satanic Majesties Request, talvez o mais atípico dos títulos da discografia dos Rolling Stones mas, de longe, o meu disco preferido da sua obra. Trata-se do expoente máximo da etapa em que o grupo aderiu às cores e formas caleidoscópicas do psicadelismo e corresponde a um tempo em que Brian Jones era certamente timoneiro maior na condução dos destinos da música do grupo. Aqui a voz era de Bill Wyman. Foi editado como single, mas ninguém deu por ele...

She’s A Rainbow (1967)
Uma vez mais o mesmo álbum de 67 que, um dia, quando as memórias estiverem cansadas de recuperar as mesmas canções dos Stones ou nova vaga psicadélica andar por aí, será devidamente reconhecido como uma das obras-primas da discografia dos Rolling Stones. Na verdade descobri a canção numa versão dos World of Twist. Mas, como quase sempre, o confronto com a original abriu outros horizontes. Foi assim que descobri o Their Satanic Majesties Request.

Paint It, Black (1966)
Single de apresentação do belíssimo álbum Aftermath, editado em 1966. A canção abria horizontes às sensações cromáticas de uma instrumentação diferente (nomeadamente a presença do sitar) e colocava os Rolling Stones num caminho de afinidades para com as movimentações psicadélicas que então começavam a emergir entre alguns clubes de Londres e São Francisco. Descobri esta canção numa outra versão, nos tempos do pós-punk, pelas Mo-Dettes. 

2000 Light Years From Home (1967)
Prometo que não junto mais nenhuma canção do alinhamento de Their Satanic Majesties Request a este Top 10. Mas este foi o single com maior expressão da etapa psicadélica dos Rolling Stones. Transcende em muito as formas clássicas da canção pop, sugere um patamar de viagem para além das fronteiras dos domínios habituais da canção. Voltaram a tocá-la em palco, mas só na versão em disco esta experiência parece tão completa (porque sónica e texturalmente bem complexa).

Lady Jane (1966)
Outra das canções do alinhamento de Aftermath, Lady Jane é uma entre as várias baladas construídas com um apurado sentido de elegância que os Stones gravaram em meados dos anos 60. O tema foi usado como lado B do single Mother’s Little Helper, mas merecia ter conhecido um estatuto de maior divulgação (poderia, nesse caso, ter sido um dos seus clássicos da época).

She’s So Cold (1981)
Esta é mesmo uma escolha pessoal por uma razão muito simples: corresponde ao primeiro single dos Rolling Stones que comprei. A canção serviu em 1980 de cartão de visita para o álbum Emotional Rescue, um dos últimos títulos verdadeiramente significativos (como álbum) da obra dos Rolling Stones (depois deste álbum só o mais recente A Bigger Bang se mostrou ao nível do que tinham feito nos sessentas e setentas). 

The Last Time (1965)
Depois de uma série de versões, foi com esta canção, assinada por Mick Jagger e Keith Richards, que os Rolling Stones editaram o seu primeiro original no formato de single. Com um balanço irresistível, e tendo partido da vontade em trabalhar um tema de gospel, a canção chegou ao primeiro lugar na tabela de singles no Reino Unido. 

Rocks Off (1972)
A faixa de abertura de Exile On Main Street convida-nos a entrar num álbum que, pelas mais variadas (e todas elas justificadas) razões mora entre os maiores da história do rock’n’roll. A canção traduz como uma clássica composição de alma rock’n’roll ganha corpo através de um trabalho de arranjos mais elaborado e traduz um tempo de enorme vitalidade criativa para o grupo.

Have You Seen Your Mother Baby Standing In The Shadow (1966) 
Uma das mais agitadas e empolgantes entre as canções “dançáveis” dos Rolling Stones. Foi gravada em 1966, no início das sessões das quais surgiria o alinhamento de Between The Buttons. Foi uma das primeiras canções a ter um pequeno filme para a apresentar na televisão, sendo por isso parte da pré-história dos telediscos.

Emotional Rescue (1980)
O tema-título do álbum que assinalava a entrada dos Rolling Stones nos anos 80 mostrava mais um momento de ousadia para além da zona de conforto que definiu grande parte da sua discografia. O trabalho da secção rítmica define a pulsação que conduz o tema e Mick Jagger canta num falsetto invulgar, mas arrebatador. 

A lista poderia continuar. Juntando canções como I Wanna Be Your Man, Play With Fire, Ruby Tuesday, It’s All Over Now, Miss You, Route 66, Harlem Shuffle, além dos clássicos maiores que toda a gente conhece.


A propósito da passagem dos Rolling Stones por estes lados, fica aqui um texto originalmente publicado na edição de 25 de maio do DN.

Mais de 50 anos ao serviço do rock'n'roll

Em maio de 1962 um grupo de jovens músicos juntava-se para um primeiro ensaio no Bricklayers Arm, “um pub chungoso no Soho”, como descreve Keith Richards na sua autobiografia. Como ele mesmo ali descreve, chegou com uma guitarra, ao que uma “empregada de bar típica, uma velha loira de maus modos, poucos fregueses, cerveja morta” olhou para o músico e apontou para o primeiro andar. Era lá em cima... Ouvia-se um boogie woogie ao piano e o som animou o guitarrista. Da formação futura da banda estiveram ali Mick Jagger e Brian Jones. Poucas semanas depois (e ainda longe da formação que depois faria os discos... e a história) surge um primeiro convite para um primeiro concerto. Uma outra jovem banda, os Blues Incorporated, que tinha data agendada no mítico Marquee (em Londres), recebera entretanto um convite para uma emissão em direto na BBC. Passa a data... E, ao telefone, Brian Jones tenta acertar todos os detalhes... Mas faltava um pormenor... O nome. E que nome? No chão, à sua frente, tinham um disco de Muddy Waters. A primeira faixa do disco The Best of Muddy Waters chamava-se Rollin’ Stone... The Rolling Stones? Porque não? Mais de 50 anos depois está claro que não podiam ter escolhido melhor.

Há um ano o grupo celebrou meio século de vida discográfia, oficialmente contada a partir do momento em que editaram o seu primeiro single, Come On, versão de um original de Chuck Berry lançado a 7 de junho de 1963 pela Decca Records. Cinco meses depois gravavam um tema de Lennon/McCartney – I Wanna Be Your Man – e somavam o seu primeiro top 20. Em fevereiro de 64 Not Fade Away dava-lhes um primeiro grande êxito. E em junho desse mesmo ano, o primeiro inédito que editavam em single no Reino Unido – All Over Now – dava-lhes o primeiro número um.

Mais de meio século depois a obra dos Rolling Stones transformou-se num dos pilares centrais da cultura rock. Depois de uma breve etapa de devaneio psicadélico (que lhes deu o atípico Their Satanic Majesties Request, em 1967, que um dia será devidamente reconhecido como um dos seus discos mais criativos) e da morte de Brian Jones, o grupo procurou caminhos rock’n’roll de reencontro com a alma dos blues que os inspirou na origem (o que não os impediu de, por exemplo, experimentar um flirt com o disco sound em finais dos setentas).

A última vez que editaram um álbum de originais foi em 2005 (com o muito aclamado A Bigger Bang). Foi o 29º álbum de estúdio de uma carreira que cruzou décadas e em cada uma conquistou novas gerações de seguidores. Em outubro de 2012 apresentaram Doom and Gloom, o primeiro dos dois inéditos que registaram em Grrr!, a antologia com a qual assinalaram as suas Bodas de Ouro (um segundo single inédito, One More Shot, surgiria já em 2013).

Depois de alguns (poucos) concertos comemorativos em 2013, este ano os Rolling Stones regressaram à estrada com a 14 on Fire Tour. A etapa europeia desta digressão, que integra a presença em palco de Mick Taylor (guitarrista do grupo entre 1969 e 74), começa dia 26 em Oslo (Noruega) e segue, depois, para Lisboa.

Novas edições:
Owen Pallett, In Conflict


Owen Pallett

“In Conflict”
Domino Records
5 / 5

No meio de um panorama onde tanta música surge de todos os ângulos possíveis, com uma esmagadora maioria de autores de canções a fazer pouco mais que reutilizar modelos, acolher (e eventualmente assimilar) heranças ou mesmo decalcar fórmulas, são raros os casos em que uma voz se destaca pela firme expressão de uma identidade diferente. Sem querer fazer contas a quantos entre os “diferentes” por aí fazem discos no nosso tempo, a verdade é que em Owen Pallett podemos encontrar um deles. Descobrimo-lo há quase dez anos, quando gravava discos sob a designação Final Fantasy e colaborava regularmente com os Arcade Fire ou Hidden Cameras, todos eles seus compatriotas (canadianos). A edição dos álbuns Has A Good Home (2005) e, sobretudo o magnífico He Poos Clouds (2006) colocaram-no no mapa dos cantautores do novo século, desde cedo ficando claro que a sua “voz” procurava um caminho particular, que tinha na sua relação com o violino (como instrumento principal) e na criação de loops as suas ferramentas primordiais. Em 2010 passou a gravar com o seu nome, numa altura em que os seus serviços como arranjador de cordas começaram a ser solicitados por tantos como, entre outros, os Pet Shop Boys, Duran Duran, Last Shadow Puppets ou The National. Este ano ouvimo-lo no cinema quando, ao lado de Win Butler, assinou a banda sonora de Her, de Spike Jonze (que lhe valeu inclusivamente uma nomeação para o Oscar de Melhor Banda Sonora). Agora, e ao mesmo tempo que apresenta um single com Daphni (na verdade um dos alter-egos do mesmo músico que muitas vezes conhecemos como Caribou) regressa aos discos em nome próprio. E em In Conflict apresenta uma belíssima coleção de canções nas quais, ao juntar uma mais expressiva carga instrumental (electrónicas, baixo e bateria) encontra um patamar quase pop. A sua forma de compor (que deve muito a um modo de entender uma construção de elementos por camadas de acontecimentos) e uma relação segura com a voz conhecem aqui um espaço de maior luminosidade e fulgor rítmico, de que podemos tomar como paradigma em Song For Five and Six, que serviu de single de antecipação. Longe de repetir os caminhos desta canção, o alinhamento segue contudo a vontade de explorar as potencialidades dos recursos e mostra como, depois de em 2006 ter concebido em He Poos Clouds um conjunto de composições que podíamos juntar como nos ciclos dos tempos de Schumann e Schubert, agora em Owen Pallett encontramos uma voz capaz de encontrar as sensações da pop numa música que em nada segue tendências, denominadores comuns ou lógicas que não as que o músico decide executar (e que não deixa de lado um saber cenográfico que, dos espaços ambient à sugestão de música orquestral, refletem a solidez do labor do arranjador que, desta vez, trabalhou para si). Monumento pela reinvenção da canção, In Conflict será certamente um dos discos de canções de sabor mais apurado que vamos escutar este ano.

Cannes 2014: Austrália

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David Gulpilil interpreta Charlie, em Charlie's Country ("Un Certain Regard"), tendo escrito o argumento em colaboração com o realizador, Rolf de Heer. Célebre actor australiano — revelado em 1971, em Walkabout, de Nicolas Roeg — o trabalho de Gulpilil tem envolvido uma sistemática afirmação da cultura aborígene. Daí que a sua presença neste filme, interpretando uma personagem a viver uma angustiada deriva de desenraizamento, imposta pelo governo, tenha uma importante dimensão simbólica. Rolf de Heer (que descobrimos também em Cannes, em 1996, com o magnífico The Quiet Room) filma-o como um símbolo, justamente, mas nunca o reduzindo a uma abstracção "panfletária", antes sublinhando ponto por ponto, gesto a gesto, a sua cruel solidão.

Para ouvir: Andrew Bird canta Handsome Family



Andrew Bird vai editar na próxima semana um disco de versões de temas dos Handsome Family, com o título Things Are Really Great Here, Sort Of... Este Tin Foiled é um dos temas que vamos encontrar no alinhamento do disco.

Como representar a violência doméstica?

É bem verdade que, por vezes, neste mundo saturado de estereótipos mediáticos, as campanhas em torno de temas familiares e sociais se ficam pela impotência das boas intenções... O que não quer dizer que essa seja uma boa razão para desistir de as fazer. Eis um bom exemplo, inesperado e perturbante, porventura discutível, mas no melhor sentido — a proposta merece ser valorizada, pensada e discutida. Trata-se de um clip da ManKind Initiative, organização do Reino Unido de apoio a vítimas de violência doméstica.
Ao interrogar-se sobre o(s) modo(s) de representação da violência doméstica, o pequeno filme, concebido pela agência Dare e realizado por David Stoddart, questiona, afinal, a própria construção do nosso olhar — é um bom exemplo de como as imagens não possuem significações absolutas, existindo sempre na conjugação, concreta ou imaginada, de um contexto e um observador.

quarta-feira, maio 28, 2014

Bunny Yeager (1929 - 2014)

BUNNY YEAGER, auto-retrato (1960)
Modelo e fotógrafa, personalidade decisiva na evolução formal e iconográfica das imagens de pin-ups, a americana Bunny Yeager faleceu no dia 25 de Maio, em North Miami, Florida — contava 85 anos.
Linnea Eleanor Yeager entrou na história quando, depois de uma breve carreira como modelo, decidiu começar a fazer as suas próprias imagens. Tendo como principal inspiração a figura de Marilyn Monroe (tradicionalmente citada como a primeira pin-up), assinou muitas das lendárias fotografias de Bettie Page para a Playboy e também o célebre portfolio de Ursula Andress, saindo das águas do oceano em Dr. No / 007 - Agente Secreto (1962), o primeiro filme de James Bond.
Bettie Page
Ursula Andress
O reconhecimento do seu trabalho terá tido um momento decisivo em 2010, quando o Museu Andy Warhol organizou a exposição 'The Legendary Queen of the Pin-Up'. Em 2012, Petra Mason dedicou-lhe o livro Bunny Yeager's Darkroom: Pin-up Photography's Golden Era, com prefácio de uma das suas herdeiras, Dita Von Teese; Mason lançará em Outubro Bettie Page: Queen of Curves, com cerca de 250 imagens assinadas por Yeager.

>>> Obituário no New York Times.

O linchamento de António José Seguro

OTTO DIX
Veterano Ferido
1922
a) Não tenho especial admiração pelo discurso político de António José Seguro — vejo mesmo nele a condensação de um estilo (partilhado por inúmeras personalidades de esquerdas e direitas) em que se dispensam as dificuldades inerentes ao pensamento político, optando antes pela gestão de soundbytes mais ou menos anódinos, produzidos para reprodução imediata no espaço televisivo. E a que, como bem sabemos, esse espaço corresponde com diligente euforia.

b) Dito isto, há qualquer coisa de macabro no modo como, no espaço de 24 horas, a sua vitória nas eleições para o Parlamento Europeu foi imediata e mediaticamente transformada numa tragédia que só pode desembocar no seu linchamento político. Os primeiros sintomas de tal processo emergiram na noite eleitoral. Nas televisões (e nas rádios), a maior parte dos repórteres enquistava-se numa única inquietação: "Porque é que a vitória do PS foi este tão grande desastre?"

c) Um observador incauto, chegado nesse momento ao nosso país, ligaria as televisões e rapidamente concluiria que estávamos a viver sob uma ditadura de PSD/CDS. Enganava-se, como é óbvio. Nada disto decorre de qualquer dispositivo censório, mas do triunfo de uma lógica (anti-)jornalística que deixou de ter qualquer paixão pela complexidade dos factos — o que nela se procura, e obsessivamente persegue, são as fissuras que podem transformar qualquer efeito de real no seu contrário.

d) Seguro ganhou as eleições? Pois bem, talvez se possa dizer que essa vitória não passa de... uma derrota. Este jornalismo "polémico" é, de facto, inimigo de qualquer hipótese de polemização — a polémica exige pensamento e argumentação, numa palavra, trabalho. Ora, em casos como este, trata-se apenas de criar ruído. Com o efeito perverso de, infantilmente, tudo reduzir a um determinismo grosseiro de "vencedores" e "vencidos". Faltou perguntar, por exemplo: "Porque é que a derrota do PSD/CDS foi este tão grande desastre?" — na certeza de que a apreciação da conjuntura política apenas através de tal pergunta seria, do mesmo modo, profundamente redutora.

e) É muito provável que, de uma maneira ou de outra, António José Seguro tenha os seus dias políticos contados. Não é isso que está em causa. É, isso sim, o facto de a política ter passado a ser vivida apenas através deste alarido mediático, predominantemente televisivo, em que tudo se reduz a saber quem, no meio do fogo cruzado de especulações e soundbytes, cai primeiro. A queda é mesmo um dos sintagmas preferidos da actual comunicação social, desse modo alimentando uma noção politicamente catastrofista, moralmente niilista, de qualquer dinâmica social. Talvez que a ausência das urnas de mais de 6 milhões de portugueses se possa explicar também por esta tão triste miséria cultural.

Cannes 2014: Godard / 3D

[Ferrara]  [mitologias]  [Nicole]  [Eden]  [rostos]  [ecrãs]  [Inverno]  [Marcello]  [personagens]  [livros]  [país]  [Cronenberg]  [star]  [família]  [Marion]  [Godard / Roxy]  [reflexos]  [pensar]  [Godard / OH]  [maternal]  [Godard / Bonnard]  [escrita]  [criação]  [fábula]  [Téchiné]  [Godard / livros]  [Sarajevo]

Para Godard, o 3D no cinema não decorre de uma qualquer nostalgia da pintura renascentista. Não se trata de caucionar o cinema pela pintura. Daí que Adieu au Langage esteja mais próximo do labor de Orson Welles com a profundidade de campo — lembremos não apenas o emblemático Citizen Kane/O Mundo a seus Pés (1941), mas também o quase sempre esquecido The Magnificent Ambersons/O Quarto Mandamento (1942) —, do que de qualquer derivação pictórica, ainda menos das aventuras contemporâneas de "super-heróis". No limite, duas mãos, a água e algumas folhas secas podem ser suficientes para conferir ao ecrã a espessura de uma aparição que desafia a respiração do próprio espaço. O cinema reinventa-se, assim, como regresso ao sagrado da imagem.
THE MAGNIFICENT AMBERSONS (1942)

Um brinde por uma noite no Lux

O canadiano Owen Pallett regressou ontem a palcos portugueses para assinalar, com um concerto no Lux, o dia do lançamento de um novo álbum de temas originais.

Publiquei já na edição online do DN um texto sobre este concerto onde se pode ler:

"De cálice de champagne na mão, e já a caminho do final da noite, Owen Pallett brindava aos que compareceram na noite de ontem no Lux (Lisboa), para um concerto que assinalou o dia do lançamento do seu novo álbum de estúdio. "Hey, feliz dia de lançamento para mim", disse, bebendo de um trago, sorrindo e acrescentando, logo depois, que estava feliz por poder assinalar a data da edição do novo In Conflict em Lisboa, sem que faltassem depois os elogios à plateia. Não eram muitos os que ali estavam, os suficientes contudo para fazer da sala inferior do clube lisboeta um espaço devidamente "composto". Certo sendo que os que ali estiveram constataram uma vez mais não só quão única é a linguagem (e a sua expressão performativa) de Owen Pallett como o músico canadiano (que nos últimos anos tem trabalhado mais como arranjador de cordas e autor de bandas sonoras para cinema) é um dos cantautores do nosso tempo que leva mais adiante a ideia de pensar novas formas de abordar (formal e instrumentalmente) a canção.

Podem ler aqui o texto completo.

A Europa e a impotência da esquerda

A. Em artigo publicado no jornal Le Monde, Vibeke Knoop Rachline (correspondente em França do jornal norueguês Aftenposten), reflecte sobre o choque das eleições para o Parlamento Europeu, sublinhando o inquietante impacto dos partidos populistas: "A sua mensagem pró-nacional, anti-europeia, anti-imigrantes, anti-islão, anti-integração é extremamente preocupante". Mais ainda: observando os números terríveis da abstenção um pouco por todo o lado (em Portugal, não votaram mais de 6 milhões de eleitores), Rachline enuncia uma conclusão simples e contundente: "A própria ideia da Europa, baseada na paz e na cooperação para além das fronteiras, já não convence".

B. Neste contexto, como ler esta primeira página do Libération? Como um sintoma da impotência argumentativa a que, globalmente, chegou o imaginário da esquerda. Recorrendo à figura da República Francesa, o jornal proclama a necessidade de "reagir" à vitória da Frente Nacional... Com quê? Com um grito enraizado no romantismo remoto da própria República. Que se ignora aqui? Um factor discursivo: a extrema-direita ganhou, afinal, através do empolamento panfletário de uma ideia transversal a todas as sociedades europeias: o conceito político da "Europa" chegou a um estado de extrema debilidade conceptual. Daí o seu slogan: "Não a Bruxelas. Sim à França" (aliás, convocando também a iconografia de outra heroína nacional: Joana d'Arc).


C. Há outra maneira de dizer isto: julgar que se podem combater — e, antes do mais, sinalizar — as ameaças anti-democráticas de forças como a Frente Nacional através de uma militância enraizada numa simbologia ancestral corresponde a um não enfrentamento de uma questão nuclear, tristemente confirmada pelos resultados deste acto eleitoral: a união económica da Europa (mesmo que estivesse a viver dias radiosos...) não gera, por si só, uma união cultural enraizada nos mais sólidos ideais democráticos. "Reagir" contra a Frente Nacional e os discursos populistas é, por certo, uma necessidade — mas como fazê-lo se não houver a lucidez rudimentar de olhar para a Europa do nosso presente como uma "união" iludida pela sua própria ideologia unitária?

Nota - Em Portugal, já nem se trata de reagir contra o que quer que seja. Aparentemente, no espaço mediático (há mais algum?...), a possibilidade de António Costa suceder a António José Seguro é a única questão do momento... Triste redução de tudo o que acontece a um combate de "famosos"! A fulanização pueril das tragédias políticas é mesmo uma lei portuguesa contra a qual ninguém reage — a começar pela esquerda, que vive enredada na mais perigosa das crenças: a de que a história lhe legou o primado de uma razão transcendente e inquestionável.

terça-feira, maio 27, 2014

Cannes 2014: Sarajevo

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Filme de episódios, Les Ponts de Sarajevo (sessão especial, extra-competição) revisita um século de história da cidade, desembocando na guerra de 1992-95 e nas suas sequelas urbanas, afectivas e simbólicas. Esta imagem de uma das histórias poderá condensar o que perpassa pelo filme. Esperando a bola que passou para além da rede, as crianças coexistem na imagem com o cemitério que evoca a guerra. Ou seja: há também estranhos planos subjectivos dos mortos — são promessas de vida.

Novas edições:
Royksopp & Robyn, Do It Again


Royksopp & Robyn 
“Do It Again”
Dog Triumph
3 / 5 

É um verdadeiro encontro de “estrelas” da pop e das eletrónicas made in Escandinávia. A acompanhar uma digressão conjunta, a sueca Robyn (que entre nós chegou a abrir um concerto de Madonna e tem assinado uma doscografia pop que tem merecido aclamação entre públicos indie) e os noruegueses Royksopp (uma das forças maiores da geração do seu país que ganhou visibilidade internacional na alvorada do século) acabam de apresentar um mini-álbum composto e gravado em modo de constante partilha de ideias entre ambos. Editado sob o título Do It Again, o disco – de apenas cinco temas, dois deles contudo com perto de dez minutos de duração cada – acaba por ser uma muito fiel expressão do que a soma das partes poderia desde logo sugerir, com espaço de surpresa maior no instante em que as almas de ambos realmente se diluem e geram um espaço de diálogo do qual emerge uma canção que bem que poderia ser o mote para um mais profundo trabalho a três (os Royksopp são um duo, acrescente-se). Trata-se de Monument, o tema de abertura do disco, uma longa composição em regime de placidez (que não chega contudo ao patamar do ambiental) na qual se reconhece a face texturalmente mais elaborada e cenicamente cuidada do som dos Royksopp (como nos mostraram, por exemplo, no álbum Junior) e sobre a qual a cantora sueca encontra paisagens diferente daquelas a que está habituada. Essas, por outro lado, estão evidentes no motor de luminosidade pop (eletrónica) dançável que brota do excelente tema título (candidato a ser um dos grandes hinos pop do ano), em tudo na linha de alguns dos seus temas como, por exemplo, o irrsistível Call You Girlfriend. O alinhamento apresenta ainda em Sayit um pouco imaginativo furacão para pista de dança, quase em flirt com heranças do techno, em Every Little Thing uma canção mid-tempo menos surpreendente (mas de produção tecnicamente muito competente) e, a fechar, nova incursão por paisagismos eletrónicos, que quase evocam memórias de um Jean Michel Jarre nos dias de Oxygene. Como experiência de diálogo é um disco que lança possibilidades aos músicos que envolve. E os temas que abrem e fecham o disco deixam claro que, nesse caminho, poderão ir bem mais longe se assim o desejarem.

PS. Este texto foi originalmente publicado na edição inline do DN

Sound + Vision Magazine
hoje às 18.30 na Fnac Chiado


O Sound + Vision Magazine está hoje uma vez mais na Fnac Chiado, hoje tendo como um dos seus focos a realização (recente) de mais uma edição do Festival de Cannes, onde esteve João Lopes. O novo disco de Owen Pallett, que hoje é apresentado em Lisboa, é outro dos temas em agenda. Com os autores deste blogue estará ainda Luís Pinheiro de Almeida para apresentar o seu novo livro 'Biografia do Ié Ié'.

Owen Pallett está hoje em Lisboa

O músico canadiano atua hoje no Lux, pelas 22.00, onde irá apresentar canções do álbum In Conflict, que acaba de editar.

A propósito do regresso publico hoje no DN uma entrevista com o músico, na qual se fala, entre outros assuntos, dos seus vários trabalhos (recentes) como arranjador de cordas e como autor de música para cinema. Ali se diz, a dada altura:

Dos trabalhos de colaboração como arranjador não levou "absolutamente nada" para a sua música. São, como explica, trabalhos para "fazer dinheiro", que envolvem naturalmente algum gozo e também "alimentam o ego" porque há sempre quem lhe diga que é "um génio". E confessa: "Gostava de fazer dinheiro com a minha música tal e qual faço com os arranjos de cordas!"

Podem  ler aqui o texto.

Lugares do mercado do sexo

Redlands, California (2012)
Michael Max McLeod é um fotógrafo que se tem dedicado aos lugares em que o sexo, nos EUA, é objecto de troca mercantil — o chamado adult entertainment. Como o próprio McLeod explica ao site Feature Shoot, trata-se de uma espécie de "assombramento" que ele persegue, deparando com cenários de estranho despojamento e inquietação, conservando sempre uma não menos estranha intensidade humana, mesmo quando não há qualquer presença de corpos — talvez mesmo sobretudo quando não há corpos visíveis. São marcas de um invulgar labor fotográfico, capaz de dar conta dessas zonas em que o imaginário sexual de uma época (a nossa) se transfigura em gélida oferta mercantil, em última instância conciliando a exposição jornalística e a interrogação filosófica.

Nova Orleães, Louisiana (2013)
Austin, Texas (2013)
Amarillo, Texas (2013)

>>> Site de Michael Max McLeod.

segunda-feira, maio 26, 2014

Cannes 2014: Godard / livros

ADIEU AU LANGAGE (2014)
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Como sempre, em Godard, o filme Adieu au Langage discute os limites da própria expressão humana através da escrita. Reencontramos, assim, um dos mais regulares e obsessivos efeitos de assinatura do cinema "godardiano". A saber: a-personagem-que-lê (que, por vezes, como acontece em Atenção à Direita, pode ser o realizador). Eis um prazer que o tudo-digital ignora: tocar no papel, aceder à sensualidade das palavras tácteis.

O DESPREZO (1963)
PEDRO O LOUCO (1965)
ALPHAVILLE (1965)
DEUX OU TROIS CHOSES QUE JE SAIS D'ELLE (1967)
LA CHINOISE (1967)
ATENÇÃO À DIREITA (1987)