domingo, maio 31, 2009

"Toy Story 3", a um ano de distância

É um caso extremo de uma campanha que começa com mais de um ano de antecedência: no site de cinema da Apple, é possível encontrar, desde já, o primeiro trailer de Toy Story 3, filme a ser lançado em 3D. No site oficial do filme, anuncia-se também o relançamento, em Outubro, por período limitado, de Toy Story e Toy Story 2, agora a três dimensões. Dito de outro modo: para a aliança Disney/Pixar, o 3D tornou-se muito mais do que um apêndice dos respectivos filmes — é mesmo uma componente essencial de toda a sua estratégia de entertainment.

sábado, maio 30, 2009

Hampson: versatilidade e dramatismo

O barítono norte-americano Thomas Hampson encerrou a temporada de canto 2008/09 da Fundação Gulbenkian — com o Grande Auditório a acolher muito público, embora sem esgotar, foi um magnífico concerto que nos levou do património germânico (Hampson é um sofisticado intérprete de Mahler) até ao século XX americano (com temas de Samuel Barber). Acompanhado ao piano pelo meticuloso Wolfram Rieger, Hampson deu uma lição de versatilidade, indissociável de uma cuidada avaliação das nuances dramáticas das peças interpretadas. Exemplo modelar: os contrastes emocionais de Die drei Zigeuner, Franz Liszt.

>>> No registo aqui inserido, Hampson (também com Rieger) interpreta Revelge, do ciclo Des Knaben Wunderhorn, de Mahler, precisamente um dos temas ouvidos no concerto da Gulbenkian.


>>> Hampsong Foundation.

Nome: Boetticher

O nome de Budd Boetticher (1916-2001) é, por certo, um dos mais sistematicamente esquecidos na paisagem do grande cinema clássico americano e, muito em particular, nas memórias da sua produção de série B. Aliás, basta atentarmos nesta edição do seu filme A Marca do Terror/The Tall T (1957) para percebermos como a sua herança permanece mais ou menos ignorada — a capa do DVD nem sequer refere o seu nome.
A Marca do Terror integra o "ciclo Ranown" da obra de Boetticher, isto é, um conjunto de seis westerns realizados entre 1956 e 1960, com Randolph Scott no papel principal e produção de Harry Joe Brown. Centrado numa viagem particularmente atribulada de uma diligência, é um filme bem típico de uma época em que o género começava a dispensar as ilusões do heroísmo clássico, por um lado colocando em cena histórias de crescente desencanto moral, por outro lado celebrando a solidão irreparável de novas personagens centrais — nesta perspectiva, Randolph Scott é um muito directo antepassado de actores como Charles Bronson e Clint Eastwood, do mesmo modo que Boetticher antecipa o cepticismo de um autor como Sam Peckinpah. Além do mais, a geométrica precisão da sua mise en scène distingue-o como genuíno retratista das relações humanas e dos seus equívocos nunca apaziguados. Em resumo: um grande cineasta que importa (re)descobrir.

>>> Budd Boetticher no Senses of Cinema.
>>> Sobre Randolph Scott.
>>> Budd Boetticher: a última entrevista.

Orchestral Manouvers In The Dark, 1979

Foi em Maio de 1979 que, com o selo da Factory Records, se estrearam em disco os Orchestral Manouevers In The Dark (que mais dia menos dia acabaram simplesmente referidos como OMD). A banda, de Liverpool, era um caso um tanto distinto entre os outros nomes que então faziam a história pós-punk da cidade, apostando num formato pop electrónico e não escondendo um evidente encanto pelos Kraftwerk. Aqui fica a memória do seu single de estreia Electricity, no teledisco da época.



Orchestral Manouevers In The Dark
'Electricity', 1979

Crystal Stilts: todas as imagens

Que imagens podem caber num teledisco? A resposta é: todas. A deliciosa ilustração desse princípio, podemos encontrá-la neste teledisco dos Crystal Stilts, banda de garage rock de Nova Iorque cuja iconografia integra, com contagiante alegria, todo um imaginário muito sixties, reconvertido para os contrastes deste nosso mundo digital — a canção chama-se Love Is a Wave; a direcção do teledisco tem assinatura do colectivo Army of Kids.

"Saving Grace": elogio da impureza

Saving Grace é uma das melhores séries televisivas da actualidade, sempre na corda bamba entre o realismo mais cru e uma dimensão fantástica e onírica, porventura transcendental — este texto foi publicado no Diário de Notícias (29 de Maio), com o título 'O anjo de Oklahoma'.

A evolução da série Saving Grace (Fox Life), uma criação de Nancy Miller com Holly Hunter no papel de uma detective da polícia de Oklahoma City, é um surpreendente caso de inteligência e contenção. Dir-se-ia que o próprio dispositivo original não poderia resistir muito para além do imediato efeito de surpresa. De facto, como sustentar o tom cru de série policial, ao mesmo tempo que a personagem central, Grace Hanadarko, é alguém que recebe as visitas regulares de Earl (Leon Rippy), um anjo que tenta redimi-la dos seus pecados?
O certo é que, já em plena segunda temporada, Saving Grace conseguiu a proeza de manter a sua lógica inicial, sem alienar nenhuma das componentes originais. A mais discreta, porventura também a mais intensa, dessas componentes tem a ver com a memória do atentado terrorista perpetrado em 1995 por Timothy McVeigh, veterano do exército dos EUA, que matou 168 pessoas e feriu mais de 800 (foi, até ao 11 de Setembro de 2001, o mais violento acto terrorista em território americano). De facto, por Saving Grace perpassa o sentimento amargo de uma comunidade ainda à procura da recomposição dos seus laços afectivos e simbólicos. Obviamente, com a sua existência convulsiva, a própria Grace surge como uma figura frágil e errática, paradoxalmente a tentar fazer valer algum princípio de ordem social e também os valores da solidariedade humana.
Deste modo, Saving Grace escapa por completo ao moralismo de muitas narrativas televisivas (veja-se a miséria formal a que chegaram as telenovelas) que tudo encenam em função de uma noção de “pureza” que, em boa verdade, ninguém sabe enunciar. Bem pelo contrário, Saving Grace é uma história de gente maravilhosamente “impura”, isto é, comovente e próxima de nós. Incluindo o anjo.

sexta-feira, maio 29, 2009

New York, New York (por Jorge Colombo)

Este é um desenho de Jorge Colombo: uma paisagem novaiorquina que tem a particularidade, necessariamente emblemática nos dias que correm, de ter sido executada num iPhone, através do programa de desenho Brushes. Ou como se prova que a nova idade dos telemóveis — porventura a nossa iPhone-new-age — está a contaminar as mais variadas instâncias da experiência humana, incluindo o desenho à mão (ou "com os dedos": finger painting).
Foi desse modo que Jorge Colombo desenhou a capa [aqui ao lado] da edição com data de 1 de Junho da revista The New Yorker: aconteceu durante uma hora, em frente do Museu de Madame Tussaud, em Nova Iorque, qual pintor do século XIX postado face a uma cena urbana (em baixo, pode ver-se o video que dá conta da progressão do trabalho). No sumário desta edição, vale a pena destacar ainda, entre outros temas, o comentário político de Jeffrey Toobin sobre o confronto de discursos Obama/Cheney, a crónica de Stephen Faris dedicada ao impacto de Roberto Benigni nos EUA e a crítica de John Lancaster a dois livros que tentam desmontar a "psicologia" do sector bancário.

Cannes digital

No Festival de Cannes, e de forma algo paradoxal, alguns dos sintomas mais pertinentes da evolução digital do cinema encontraram-se na secção de clássicos — este texto foi publicado no Diário de Notícias (26 de Maio), com o título 'Digital ajuda a redescobrir os clássicos'.

A propósito da passagem da cópia restaurada de Pedro o Louco (1965), de Jean-Luc Godard, na secção ‘Cannnes Classics’, Serge Toubiana, director da Cinemateca Francesa, lembrou um célebre texto de Louis Aragon fazendo o elogio do filme no momento da sua estreia. Aragon exaltava a relação do cinema moderno com a pintura. E concluía com uma afirmação entusiástica: “Godard é Delacroix”.
Acontece que Pedro o Louco foi rodado no formato Techniscope, criado em 1963 pelo departamento italiano da Technicolor. Com um diferente aproveitamento do negativo (com apenas duas perfurações por fotograma, em vez das tradicionais quatro), o Techniscope visava uma significativa poupança de película, ao mesmo tempo que favorecia um grão na imagem susceptível de criar novas estéticas visuais (foi opção de Sergio Leone, por exemplo, em 1966, em O Bom, o Mau e o Vilão). O Techniscope não desapareceu, mas a sua passagem a outros formatos mais correntes tem dado origem a cópias que nem sempre respeitam os valores cromáticos dos originais. Em Cannes pudemos rever Pedro o Louco como se estivéssemos… em 1965.
A importância de ‘Cannes Classics’ está bem expressa na variedade de nomes este ano evocados, incluindo Luchino Visconti (Senso, 1954), Joseph Losey (Acidente, 1967), e Georges Franju (Les Yeux sans Visage, 1960). Houve até uma cópia de um dos mais políticos “filmes de sketches” dos tempos que antecederam Maio 68: Loin du Vietname (1967), com episódios de Joris Ivens, Jean-Luc Godard e Alain Resnais, entre outros. Como complemento, ‘Cannes Classics’ deu também a ver alguns trabalhos documentais sobre diversos cineastas em momentos específicos da sua evolução: entre os nomes abordados estavam Henri-Georges Clouzot, Pietro Germi, Jean-Luc Godard e François Truffaut (estes dois últimos no período de lançamento da Nova Vaga, através do filme Les Deux de la Vague, de Emmanuel Laurent).
Na maior parte dos casos, as cópias restauradas para formato digital visam o DVD. De facto, o espaço dos “clássicos” já deixou de ser minoritário no mercado, tendo ampliado de forma significativa o número dos seus consumidores. Nalguns casos, essas mesmas cópias serão objecto de reposição nas salas. Quer isto dizer que esta edição de Cannes ajudou a reabrir uma curiosa perspectiva: a de que o processo de digitalização do cinema, actualmente em curso, não diz respeito apenas aos filmes do presente e ao seu possível carácter experimental. O digital está também a criar novas relações, para novos públicos, com a memória viva do cinema.

Monteverdi, segundo Murcof

Regressamos ao álbum Private Domain, gravado por um colectivo liderado por Iko e que conta com uma série de colaborações, reinventando peças de compositores de outros tempos numa linguagem que é a do nosso tempo. Hoje vemos imagens, em estúdio, ao som da abordagem de Murcof a um madrigal de Monteverdi (1567-1643), a que chamou Amor. O trabalho apresenta clara familiaridade com o trabalho que Murcof criou em The Versailles Sessions, aí evocando a música e os espaços da corte de Luis XIV.

Sigur Rós em estúdio

Os Sigur Rós estão a trabalhar num novo álbum de originais no seu estúdio na Islândia. Segundo declarações que o NME revela, o disco será "melódico, mas menos barulhento" que os anteriores. A edição nunca acontecerá antes de 2010.

Digressão retoma a estrada a 8 de Junho

Depois de sucessivas notícias de cancelamentos de concertos, soube-se ontem que Dave Gahan, o vocalista dos Depeche Mode, foi submetido a uma operação de urgência depois de lhe ter sido disgnosticado um tumor maligno, entretanto já removido. O cantor está já em reciuperação, devendo a digressão dos Depeche Mode retomar a estrada a 8 de Junho, em Leipzig, segundo revela o site Pitchfork.

A segunda geração

O sucesso que os filmes Star Trek obtiveram na primeira metade dos anos 80 semeou definitivamente um novo futuro para o universo criado por Gene Roddenberry na televisão. E em 1986 a Paramount lançou o desafio, convidando inclusivamente o criador da saga a regressar a bordo. Estreada em 1987, a nova série Star Trek: The Next Generation acabaria por ser o êxito esperado, mantendo-se em produção durante sete épocas e abrindo espaço para o aparecimento de outras séries. A tripulação da nova Enterprise D, e uma acção que decorre cem anos depois da conhecida na geração original, teve depois uma passagem pelo cinema, em quatro filmes que não traduziram no grande ecrã os feitos conquistados pela série.

Uma escolha sem pontaria

Discografia Duran Duran - 65
'Falling Down' (single, 2007)

A primeira amostra do trabalho de colaboração entre os Duran Duran, Timbaland e Justin Timberlake a chegar à Internet revelou o pujante Nite Runner. Ficavam claros os sinais de que o novo álbum, ainda em última fase de trabalho em estúdio, levaria os Duran Duran por outros terrenos, na verdade não tão estranhos a memórias de relações antigas da banda com as linguagens do disco e funk. Contudo, a escolha para o primeiro single revelou uma opção mais convencional, apontando para a balada mid-tempo Falling Down. Os resultados obtidos pelo single deram depois razão a quem defendera outra escolha, revelando Falling Down a segunda pior classificação de um single da banda na tabela britânica (nº 52), ultrapassado apenas por Someone Else Not Me... Apesar de uma edição em CD, na maioria dos territórios o single teve apenas edição digital. As edições em CD incluem, uma delas, uma gravação ao vivo de Reach Up For The Sunrise e, a outra, uma série de remisturas de Falling Down.



O teledisco de Falling Down assinala o reencontro do grupo com um registo visual como há muito não acontecia. Realizado por Anthony Mandler, reflecte sobre a outra face da fama, sublinhando uma das ideias centrais do álbum Red Carpet Massacre.

Beethoven: 1 + 9

JOSEPH KARL STIELER: Ludwing van Beethoven, 1820

Longos e calorosos aplausos a fechar a noite de ontem, no Grande Auditório da Fundação Gulbenkian — sob a direcção de Lawrence Foster, Orquestra e Coro Gulbenkian interpretaram as Sinfonias nº 1 e nº 9, de Ludwig van Beethoven, traçando assim um arco de diferenças e complementaridades capaz de nos fazer sentir como, entre as duas obras (separadas por um quarto de século, de 1799 a 1824), se assiste a uma fulgurante reconversão dos próprios cânones sinfónicos, desembocando na irrupção da voz humana no andamento final da "Nona". Com Turid Karlsen (soprano), Nadine Weissmann (meio-soprano), Michael König (tenor) e Alexander Vinogradov (baixo) nesse final apoteótico, o concerto acabou por ter a sua dramaturgia própria, numa viagem de (re)descoberta de uma época fulcral de transformação da música germânica e europeia.

>>> O mesmo programa repete hoje, no mesmo local, às 19h00.

quinta-feira, maio 28, 2009

7 x Anne Sofie von Otter (6)

Enquanto aguardamos o lançamento do novo Bach de Anne Sofie von Otter (com cantatas e árias), sugerimos uma breve deambulação pela sua dis-cografia, celebrando a delicada sofisticação e os espantosos contrastes da mezzo-soprano sueca.

[1] [2] [3] [4] [5]

Para muitos intérpretes líricos, Jacques Offenbach permanece como uma espécie de paisagem de revisitação cíclica e, mais do que isso, de pedagógica depuração. As suas operetas, em particular, definem um património de libertação, musical e moral, através das armas primitivas do humor, da ironia e, por vezes, do cruel sarcasmo. Tudo isso, claro, sem nunca alienar uma fundamental pulsação poética. Em 2002, Anne Sofie convocava algumas das referências mais emblemáticas de Offenbach, incluindo Les Contes d'Hoffmann, La Belle Hélène, Barbe-Bleue e, inevitavelmente, La Périchole. Com acompanhamento de Les Musiciens du Louvre, sob a direcção de Mark Minkowski, o resultado é um dos seus álbuns mais deliciosamente lúdicos e etéreos, sem por um momento alienar o rigor e a subtileza emocional do seu canto.

>>> JACQUES OFFENBACH, Arias and Scenes.

Solidão e exílio dos novos vampiros

Nem a pose operática de Bela Lugosi nos filmes de Tod Browning, nos anos 30 de Hollywood, nem os dentes ameaçadores de Christopher Lee nas produções da Hammer Films, na Inglaterra das décadas de 50/60 — os vampiros de Deixa-me Entrar (título inglês: Let the Right One In) são adolescentes, quase ainda crianças. Depois de Twilight/Crepúsculo, esta produção sueca com assinatura de Tomas Alfredson ilustra o perverso "rejuvenescimento" de um género que, por assim dizer, recuou às suas mais primitivas origens poéticas.
O resultado é uma delicada fábula de amor e morte (noblesse oblige) que se deixa ler também como uma desencantada crónica sobre a solidão de personagens com inevitáveis conotações sociológicas com o nosso presente. Dir-se-ia que as crianças/adolescentes das novas histórias de vampiros são exilados de um mundo em que as mais diversas instituições — a começar pela escola e pela família — têm a sua autoridade simbólica dramaticamente enfraquecida. Insolita-mente, isto quer dizer também que por um filme como Deixa-me Entrar perpassa um dramático realismo social.

Cairo, algures no futuro...

Juntos respondem como Yas, mas na verdade não são mais que o afegão Mirwais Ahmadzaï (sim, ele mesmo, o produtor que trabalhou com Madonna em Music e American Life) e a libanesa Yasmine Hamdan (na foto). Pop do Médio Oriente, com tempero electrónico e sabor ao presente global, o álbum de estreia Arabesque já tem edição digital, estando a caminho, para breve, o lançamento "convencional". Aqui fica o teledisco de Get It Right, com acção projectada no Cairo, num futuro próximo.

Blur em nova antologia

Os Blur vão acompanhar o seu regresso aos palcos com uma antologia em CD duplo, para já com edição apontada ao mercado norte-americano. Tem por título Midlife: A Beginers Guide To Blur e não se esgota num alinhamento unicamente feito de singles, recolhendo entre o catálogo do grupo alguns temas extraídos do alinhamento de vários álbuns. O disco tem edição marcada para 28 de Julho.

Um museu para Magritte

O museu dedicado a Hergé não é o único que abre as portas em Bruxelas no próximo dia 2. Situado em plena Place Royale, o Museu Magritte, integralmente dedicado ao pintor surrealista belga, integra cerca de 200 telas, 50 fotos e 15 outros objectos de arte menos fáceis de classificar. O museu inclui ainda no seu arquivo perto de cem documentos e 40 filmes, oito deles permanentemente pojectados na exposição.

Um Yacht a caminho

Chamam-se Yacht. São uma dupla ele e ela. E editam a 28 de Julho o seu álbum de estreia, de título See Mistery Lights. A dupla é mais uma apota do catálogo da editora DFA. São de Portland, no Oregon, e estão neste momento a acompanhar Patrick Wolf em digressão. Entre as referências, segundo a sua página no MySpace, apontam nomes tão distintos como os de Carl Sagan, Steve Reich ou Arthur Russell.

Here & Now: Nik Kershaw

Outro dos nomes incluídos no alinhamento do festival Here & Now 2009 é Nik Kershaw, figura com alguma visibilidade no cenário mainstream pop de 1983 e 84. Fica a evocação ao som de The Riddle, tema-título do seu segundo álbum, em 1984. O teledisco... Bom, era "moderno" naquela altura...



Nik Kershaw
'The Riddle', 1984

quarta-feira, maio 27, 2009

Susan Graham "à la française"

Ontem, ao fim da tarde, o Grande Auditório da Fundação Gulbenkian acolheu o penúltimo concerto de canto da temporada 2008/09. A mezzo-soprano norte-americana Susan Graham apresentou uma das suas grandes especialidades, "la mélodie française", do século XIX ao século XX, passando por Georges Bizet, Gabriel Fauré, Reynaldo Hahn, Erik Satie, Francis Poulenc, etc., etc. A interpretação de La Fiancée Perdue, de Olivier Messiaen, bastaria para definir o alcance, paradoxalmente contido, da sua voz, oscilando sem ostentação da ironia ao mais depurado (melo)dramatismo. Destaque também para o conciso e elegante acompanhamento do pianista escocês Malcolm Martineau que víramos, na temporada anterior, com Magdalena Kozéna e Angelika Kirchschlager.

>>> Em 2008, em concertos no Brasil, Susan Graham interpretou vários standards de George Gershwin/Ira Gershwin — eis o registo de The Man I Love e Nice Work If You Can Get It.

SOUND + VISION: + 1 milhão

No dia 8 de Julho de 2007, o SOUND + VISION iniciou a contagem de visitantes através do Extreme Tracking. Hoje, 27 de Maio de 2009, menos de dois anos passados (690 dias, para sermos exactos), o valor dessa contagem — incluindo reloads — ultrapassou um milhão (quase 800 mil se não considerarmos os reloads).
Vale a pena recordar que este blog arrancou há menos de quatro anos, a 3 de Setembro de 2005, tendo acumulado até à data de início da presente contagem quase 800 mil visitantes. Na prática (e se, por uma vez, nos é permitida a linguagem fria dos números): estamos à beira dos 2 milhões de visitantes. Obrigado pela vossa presença.

Depois do zero...

Os Yeah Yeah Yeahs têm já um segundo single a extraír do álbum deste ano It's Blitz. Depois de Zero, eis que entra em cena Heads Will Roll, que hoje apresentamos em teledisco oficial.

O recordista

Gonzales bateu há poucos dias o recorde do concerto mais longo de sempre. O site Pitchfork revela que foi em Paris, num evento non-stop de 27 horas e três minutos, que incluiu a dada altura um barbeiro a fazer a barba ao músico, em plena actuação...

Rufus na ópera

Está confirmada a 10 de Julho a estreia, em Manchester (Reino Unido), de Primma Donna, a primeira ópera de Rufus Wainwright. A música e os arranjos são assinados pelo próprio. A encenação é de Daniel Kram, a cenografia de Anthony McDonell e a direcção de orquestra de Pierre-André Valade. A ópera conta a história de uma diva do canto lírico em vésperas de regresso aos palcos. O papel principal, Madame, cabe a Janis Kelly (soprano).

Um museu para Hergé

Abre finalmente a 2 de Junho, nos arredores de Bruxelas, um museu inteiramente dedicado ao criador de TinTim. O Museu Hergé será contudo mais que apenas uma evocação de imagens e referências das aventuras do herói da BD que criou em 1929 e vai lembrar a vida e obra de Hergé, num edifício desenhado por Christian de Portzamparc. Aqui fica, para já, a maquete do projecto, cuja construção se iniciou em 2007.

Here & Now: ABC

Mais uma evocação de outro dos nomes do cartaz do festival que nos visita esta sexta-feira no Pavilhão Atlântico. Memória hoje por conta dos ABC, claramente o mais interessante dos nomes do cartaz, com When Smokey Sings, single extraído do álbum Alphabet City, de 1987.



ABC
'When Smokey Sings', 1987

terça-feira, maio 26, 2009

Na companhia de Lars von Trier

Que ficou da experiência extrema de Antichrist, em Cannes? Como lidamos com os filmes que experimentam a vulnerabilidade das nossas próprias fronteiras? — este texto foi publicado no Diário de Notícias (25 de Maio), com o título 'A solidão de Lars von Trier'.

Órgãos sexuais em actividade. Uma amputação (sexual, também). A carne trespassada. Enfim, um clima de apocalipse, tudo tendo por cenário um espaço chamado Eden. E ainda um título esclarecedor: Antichrist. Assim é o filme com que o dinamarquês Lars von Trier esteve em Cannes.
Espantoso filme, digo eu, capaz de nos fazer repensar todas as certezas sobre o que seja o espaço conjugal, o êxtase de dois corpos, enfim, a simples crença no acto humano de comunicar. Em todo o caso, não me quero fingir ingénuo e reconheço, serenamente, que Antichrist só pode dividir os seus espectadores, acentuando diferenças de sensibilidade, clivagens éticas e contradições filosóficas.
Mas é isso mesmo que deixa a sensação de o filme ter sido “engolido” com mais ou menos dificuldade, entrando no limbo das coisas de que não se fala muito e que, por indiferença ou hipocrisia, se deixam existir na sua solidão. Que diabo (quando vir o filme, o leitor compreenderá que a evocação de Satanás também não tem nada de deslocado)! Em 1972, por causa da lendária “cena da manteiga”, O Último Tango em Paris irrompeu na nossa querida Europa como a heresia que ia repor o reino da barbárie. Agora, a contundência de Antichrist nem sequer evoca a palavra tabu… Em boa verdade, “tabu” passou a ser um mero sinónimo do silêncio dos treinadores de futebol sobre o seu futuro profissional.
Os mais cândidos tentarão garantir-me que estamos mais evoluídos: vivemos em sociedades mais abertas e, por isso, experiências tão extremadas como Antichrist são integradas com mais ou menos agitação, mas sem trauma. Será assim? Não levarão a mal que deixe uma dúvida metódica: a de que a placidez dos confrontos de ideias reflecte uma profunda e inquietante apatia argumentativa e uma indiferença generalizada pelo simples acto de pensar. Na sua conferência de imprensa em Cannes, Lars von Trier garantiu que Antichrist era produto do seu estado depressivo. Como eu o compreendo.

Eles, ela e o robot

Os noruegueses Röyksopp acabam de extrair um segundo single do seu mais recente álbum. A escolha elegeu desta vez o tema The Girl and The Robot, colaboração com Robyn. Aqui fica o teledisco.

St. Etienne em reedições

Os St Etienne acabam de ver lançadas no mercado duas edições especiais de velhos discos seus. Uma delas devolve aos escaparates o seu álbum de estreia Foxbase Alpha (1991), em versão expandida em dois discos, com cinco inéditos. Ao mesmo tempo é editado Continental, uma antologia criada expressamente para o mercado japonês em meados dos anos 90 e que agora tem lançamento global com quatro inéditos.

Para reviver Brideshead

Acaba de chegar ao DVD no mercado português o filme Reviver o Passado em Brideshead, nova adaptação de um romance de Evelyn Waugh, que nos anos 80 deu origem a uma das mais aclamadas séries da história da ficção televisiva britânica. Esta nova adaptação, realizada por Julian Jarrold, reencontra a essência de uma drama que tem por centro a família aristocrata Marchmain (e o opulento palácio em Brideshead, onde reside), que divide o protagonismo da história com o jovem e ambicioso Charles Ryder. Tal como no romance e na série de 1981, o poder do dinheiro, os desejos e traições, são os condimentos centrais da narrativa. Esta nova adaptação opta contudo por ser menos subjectiva no desenho do triângulo amoroso entre Ryder e os irmãos Sebastian e Julia, filhos da matriarca que rege Brideshead sob devota e implacável moral católica. O filme explora abertamente a homossexualidade de Sebastian, caracterizando todavia como nunca passando de um patamar platónico a sua ligação com Sebastian, motor principal de um desencanto que o lança numa rota de auto-destruição que acompanha outros episódios que assistem ao desmoronar de uma família e um velho poder. Nota final para o desempenho absolutamente esmagador de Emma Thompson, como Lady Marchmain, num papel que domina o filme. A edição em DVD limita a sua oferta de extras à presença de um trailer.

Here & Now: Kim Wilde

Kim Wilde é um dos nomes que esta semana nos visita, integrando o cartaz do festival Here & Now. A sua música ganhou recentemente uma nova geração de admiradores depois de Cristophe Honoré ter usado o clássico Cambodia numa cena marcante do filme Em Paris. Aqui fica essa mesma canção, que se fez notar logo quando foi editada 1981, no seu teledisco original.



Kim Wilde
‘Cambodia’, 1981

De Spock a realizador

O sucesso de Star Trek: The Wrath Of Khan garantiu a solidez da presença da saga no grande ecrã e um novo “episódio” rapidamente teve ordem para avançar. Com realização de Leonard Nimoy, Star Trek III: The Search For Spock (1984) é uma continuação directa da história do filme anterior. A tripulação chefiada por Kirk desvia, contra ordens oficiais, a nave Enterprise, lançando-se numa corrida contra o tempo, para tentar salvar Spock, cujo corpo fora deixado no planeta Genesis, mas cujo ‘katra’ (alma ou algo parecido, à moda vulcaniana), ficara salva na mente de McCoy.

As estrelas de Cannes

CANNES TV (20 de Maio de 2009)

De que modo o Festival de Cannes (13/24 de Maio) foi uma parada de estrelas? Ou melhor: hoje em dia, onde estão as estrelas? — este texto foi publicado no Diário de Notícias (24 de Maio), com o título 'Será que o "glamour" morreu?'.

Foi um tema latente desta 62ª edição do Festival de Cannes: o esvaziamento simbólico das estrelas de cinema. Porventura por pudor, ninguém o enunciou de forma tão clara, mas no quotidiano todos o pressentiram. Como se algo ameaçasse o aparato montado em torno da passadeira vermelha e do lendário acesso ao Palácio, através dos seus não menos lendários degraus (“la montée des marches”).
Há uma maneira simples de explicar este misto de desencanto e nostalgia. Tem a ver com a transferência, também ela simbólica, da aura das estrelas. Ou ainda: duas das vedetas mais badaladas deste festival foram um veterano do rock (Johnny Hallyday, actor do filme Vengeance, de Johnnie To) e um jogador de futebol (Eric Cantona, figura central de Looking for Eric, de Ken Loach). Dir-se-á que tal evidência resultam também da sua dimensão nacional e do facto de há muito tempo pertencerem ao imaginário popular francês. Sem dúvida. Mas a sua ascenção acontece a par de uma cada vez maior dificuldade do cinema em evocar (ou invocar?) o glamour clássico.
É certo que acabámos por ter Angelina Jolie na passadeira vermelha. Sintomaticamente, não para apresentar um filme, uma vez que veio apenas acompanhar o marido, Brad Pitt, um dos nomes do elenco de Inglourious Basterds, de Quentin Tarantino. Aliás, para além dos magníficos filmes que Cannes 2009 nos ofereceu, importa reconhecer que não tivemos um único construído a partir do apelo específico de uma estrela. Nem mesmo Almodóvar, com a “sua” Penelópe Cruz, que continua fixado no espelho, a filmar os seus fantasmas. Para mais, fingindo que ainda tem o fulgor de outros tempos.

segunda-feira, maio 25, 2009

E fez-se luz...

Os norte-americanos Grizzly Bear editam hoje o seu muito esperado Veckatimest (na verdade, o nome de uma pequena ilha no Massachussets). Para assinalar a chegada de um dos álbuns mais aguardados do ano, aqui fica o teledisco de Two Weeks, com realização de Patrick Daughters.

Novos sons dos The Sounds

Os suecos The Sounds estão de regresso. A 2 de Junho editam o álbum Crossing The Rubicon, que assim chega três anos depois de Dying To Say This To You.

Um disco de transição

Um dos próximos títulos da série 33 1/3 vai evocar o álbum Another Green World, o disco de 1975 no qual Brian Eno encontramos Brian Eno dividido entre a continuação de uma relação com a canção pop/rock (que vinha de trás, desde os dias em que militara nos Roxy Music) e a vontade em descobrir novas formas mais próximaItálicos do silêncio que o levariam a outros destinos pouco depois. O terceiro álbum pop, a solo, de Brian Eno, é abordado em texto por Geeta Dayal, jornalista que já publicou textos em jornais e revistas como o New York Times, a Wire, a Wired ou Bookforum. Para o seu livro, Geeta entrevistou Brian Eno, assim como alguns dos que colaboraram na gravação deste álbum editado em 1975. O reencontro com este episódio no passado levou a jornalista a tentar descobrir até que ponto terá sido um elo de ligação para eventos futuros na história da música electrónica. A publicação está prevista para Setembro.

Scarlett à la Gainsbourg

Scarlett Johansson vai editar um novo disco em Setembro, resultado de uma parceria com Pete Yorn. Gravado em 2006, ou seja antes do álbum de estreia que a apresentou no ano passado, Break Up é, como revelou o USA Today, um disco inspirado pelos duetos de Serge Gainsbourg com Brigitte Bardot (no final dos anos 60). O álbum incluirá oito originais da autoria de Pete Yorn e uma versão de I Am The Cosmos, de Chril Bell.

Com (mais) vitaminas de acção

O clima contemplativo do filme que estreou Star Trek no cinema foi sol de pouca dura e não teve descendência. E quando chegou luz verde para avançar para um segundo filme, entre os objectivos estava a construção de uma história com mais ingredientes de acção. Sob direcção de Nicholas Meyer, o filme Star Trek: The Wrath Of Khan (1982) seguiu as normas pedidas e, de facto, resultou na bilheteira. Narrativamente o filme estabelece uma ponte para uma herança da série original, recuperando a personagem de Khan (e o próprio actor Richard Montalbán) do episódio de 1967 Space Seed. No centro da acção mora ainda um dispositivo de terraformação de planetas, que Khan procura desviar. A história, retomando a tripulação original, abre um tríptico que teve depois continuação directa nos dois filmes seguintes. O filme revela ainda os uniformes novos da tripulação e um design actualizado nas naves, que se manteria fixo durante os restantes "episódios" da geração original no grande ecrã.

domingo, maio 24, 2009

Haneke ganha Cannes

Com a vitória de Das Weisse Band, de Michael Haneke, o júri do 62º Festival de Cannes, presidido por Isabelle Huppert, teve a coragem elementar de distinguir um grande filme europeu -- e empenhado em lidar com os fantasmas da história europeia.
Foi também uma noite grande para o cinema português, sobretudo se entendermos que a identidade desse cinema passa por todos os filmes que invistam numa metódica resistência à formatação televisiva: Arena, de João Salaviza, ganhou a Palma de Ouro da secção de curtas-metragens, prémio atribuído por um júri presidido por John Boorman.
Foi o seguinte o palmarés oficial:

* PALMA DE OURO
Das Weisse Band, de Michael Haneke (Alemnha)

* GRANDE PRÉMIO
Un Prophète, de Jacques Audiard (França)

* PRÉMIO EXCEPCIONAL DO JÚRI
— Alain Resnais [foto]

* INTERPRETAÇÃO FEMININA
— Charlotte Gainsbourg, em Antichrist, de Lars von Trier (Suécia)

* INTERPRETAÇÃO MASCULINA
— Christoph Waltz, em Inglourious Basterds, de Quentin Tarantino (EUA)

* REALIZAÇÃO
— Brillante Mendonza, por Kynatai (Filipinas)

* ARGUMENTO
— Mei Feng, por Spring Fever, de Lou Ye (Chinaa)

* PRÉMIO DO JÚRI (ex-aequo)
Fish Tank, de Andrea Arnold (Reino Unido)
Thirst, de Chan Wook-Park (Coreia do Sul)

* Prémio Vulcain / Comissão Superior Técnica da Imagem e do Som

— Aitor Berenguer, técnico de som de Map of the Sounds of Tokyo, de Isabel Coixet (Espanha)

Curtas-metragens

* PALMA DE OURO
Arena, de João Salaviza [foto] (Portugal)

— MENÇÃO ESPECIAL: The Six Dollar Fifty Man, de Mark Albiston e Louis Sutherland (Nova Zelândia)

Câmara de Ouro

O júri da Câmara de Ouro (que escolhe a melhor primeira obra de todas as secções do certame) foi presidido pelo actor e realizador Roschdy Zem (França).

* CÂMARA DE OURO
Samson and Delilah, de Warwick Thornton (Austrália)

— MENÇÃO ESPECIAL: Ajami, de Scandar Copti e Yaron Shani (Israel/Alemanha)

"Un Certain Regard"

O júri da secção "Un Certain Regard" foi presidido pelo realizador italiano Paolo Sorrentino.

* Prémio ‘Un Certain Regard’ – Fondation Groupama Gan pour le Cinema
Dogtooth, de Yorgos Lanthimos (Grécia)

* Prémio do Júri
Police, Adjectiv, de Corneliu Porumboiu (Roménia)

* Premio Especial do Júri (ex-aequo)
No One Knows About Persian Cats, de Bahman Ghobadi (Irão)
Le Père de Mes Enfants, de Mia Hansen-Love (França)

Cannes 2009: 24 de Maio

Depois de Jacques Audiard (Un Prophète), Alain Resnais (Les Herbes Folles) e Xavier Giannoli (À l'Origine), terminou a representação francesa no 62º Festival de Cannes com Enter the Void, de Gaspar Noé -- foi o menos interessante dos quatro filmes e também um sintoma dos equívocos "técnicos" de algum cinema contemporâneo.
O ponto de partida do filme de Noé consiste em "encenar" a visão de... um morto. Mais concretamente, o herói de Enter the Void permanece, para além da morte, como uma espécie de olhar angelical que, literalmente, paira sobre a cidade e, em particular, vigia os destinos da sua irmã. É um estratagema sugestivo, mas não passa disso: Noé filma como se tivesse que esgotar todas as piruetas possíveis da câmara, nos interiores, nas ruas, "penetrando" nas zonas mais inesperadas de cenários ou objectos. Pelo caminho, vai dispensando as personagens, reduzidas a figurantes do seu próprio virtuosismo. Ou como se prova que contar uma história é um problema que não se resolve apenas através da "invenção" de um dispositivo técnico.

O ensaio geral

Foi há 40 anos. Lançada a 18 de Maio de 1969, a missão Apollo 10 representava o último dos vôos orbitais lunares tripulados necessários para o teste de todos os sistemas que deveriam permitir, pouco depois, a chegada da primeira missão tripulada ao solo lunar. Sem o impacte mediático da Apollo 8 (a primeira a levar uma tripulação a orbitar a Lua, ainda por cima com noite de Natal passada lá longe), a Apollo 10 teve contudo um papel fulcral no assegurar de uma série de leituras e ensaios que garantiram o sucesso da Apollo 11, poucas semanas depois. A bordo da cápsula Apollo seguiram os astronautas Tom Stafford, John Young e Gene Cernan. Na imagem, a pequena cápsula em órbita lunar, no momento do rendez vous com o módulo lunar.

Música de fé e devoção

Vários compositores dedicaram grande parte da sua obra à expressão de uma devoção de cariz religioso. Messiaen é frequentemente apontado como um dos exemplos maiores de uma relação artística com a transcendência entre os compositores do século XX. Não é caso único e o britânico John Tavener (n. 1944) é autor de uma obra que toma a sua fé igualmente como referência central a muitas das composições. Membro da igreja Ortodoxa, Tavener conta entre as peças de referência com uma obra para orquestra, violoncelo solista e um soprano que reflecte sobre a protecção da Mãe de Deus, referência concreta a um dos dias santos no calendário ortodoxo. The Protecting Veil é uma das obras mais vezes gravadas entre o repertório de Tavener e nasceu de uma encomenda feita em finais dos anos 80 pela BBC, tendo os Proms (concertos promenade) como primeiro destino. A estreia ocorreu nos Proms de 1989, com a London Symphony Orchestra, com o viloncelista Steven Isserlis como solista). Entre as gravações disponíveis conta-se uma, pela Orquestra do Ulster, dirigida por Takuo Yuasa, com Maria Kliegel (violoncelo) e Eileen Hulse (soprano), editada em 1999 pela Naxos.

John Tavener nasceu em Londres em 1944 e é descendente diecto do compositor britânico do século XVI John Taverner. Ganhou nototiedade em finais dos anos 60 quando estreou a cantata The Whale, com a London Sinfonietta, obra que em 1968 gravou e editou pela Apple Records, onde lançou outras peças pouco depois. Nos anos 70 interessou-se pela igreja ortodoxa, convertendo-se a ela em 1977. A sua música é muitas vezes comparada à de Arvo Pärt mas na verdade a eventual proximidade não vai muito além da relação entre a obra e a religião e algumas afinidades formais (que mesmo assim o integram por vezes entre a “família” de autores de uma área muitas vezes designada por minimalismo sagrado). A obra de Tavener transcende muitas vezes as fronteiras de género e comunica para vários públicos com facilidade. Em 2004 chamou Björk para com ela gravar Prayer Of The Heart (editada em disco no catálogo da Naxos), na verdade um das mais interessantes momentos da obra da cantora na presente década. A sua obra recente mantém a fé como centro gravítico, mas alargou horizontes a reflexões sobre outras religiões.

Como explicam as notas no booklet da edição de 1999 de The Protecting Veil, na Naxos, esta obra revela uma música “intensamente estilizada, geometricamente formada e de carácter meditativo”. Há uma ligação directa entre a obra e a evocação da Mãe de Deus, segundo a tradição de uma festa ortodoxa que remonta ao início do século X. A festa assinala uma visão que terá dado força e protecção aos cristãos, nas vésperas de um confronto militar que terminou com uma derrota dos sarracenos. John Tavener tenta, como descreve o texto, “captar o que considera ser o poder quase cósmico da Mãe de Deus”, que na música é representada pelo som do violoncelo. The Protecting Veil é uma obra frequentemente apresentada em versão de concerto. A imagem (em cima) documenta uma experiência recente com músicos da orquestra da BBC e estudantes de dança da Universidade de Stanford, criando juntos uma abordagem de música e dança a esta composição de Tavener.



Imagens de uma animação digital qure toma como banda sonora um dos momentos de The Protecting Veil, de John Tavener.