sábado, janeiro 31, 2009

Ténis, versão azul

O desporto não tem que ser visto como (quase sempre) é visto o futebol; podemos admirar mesmo as modalidades menos "fáceis" — este texto foi publicado no Diário de Notícias (30 de Janeiro), com o título 'Geometria azul'.

Confesso que me sinto cada vez mais distante das análises do desporto que as televisões propõem. No caso concreto do futebol, é uma tristeza verificar que dois em cada três comentários se fixam no “policiamento” das decisões dos árbitros, alheando-se do jogo jogado e transformando cada erro de arbitragem num rol de insinuações e suspeições... Quanto mais não seja como forma de contraponto emocional (o espectador também tem direito aos seus estados de alma), direi que foi através da televisão que aprendi a conhecer e admirar um desporto tão diferente como é o ténis. Acima de tudo, a televisão deu-me a possibilidade de sentir que o ténis se joga numa paisagem de delicada e muito sofisticada geometria, seja por causa da austeridade do seu rectângulo, seja pela precisão milimétrica que se exige aos seus praticantes. Daí que gostasse de partilhar com o leitor a beleza austera desta imagem do Open de Ténis da Austrália. Desde logo porque contraria a convenção dos clássicos courts verdes; depois porque faz coincidir um gesto de vitória com aquilo que será o seu complemento mais paradoxal: uma solidão imensa, desenhada em tons de azul.

Sobre memórias da TV dos anos 50

Mais uma referência ao catálogo dos Art Of Noise. Desta vez avançamos um pouco no tempo até 1986, ano em que editam o álbum In Visible Silence, em cujo alinhamento incluem uma versão do genérico da série televisiva Peter Gunn, de finais dos anos 50. O original, de Henry Macini, surge numa adaptação que evoca memórias e sons de 50, para tal contrubuindo a presença de Duane Eddy na guitarra. Aqui fica o teledisco de Peter Gunn, segundo os Art Of Noise.

Em conversa: Zé Pedro (3)

Publicamos hoje a terceira parte da publicação de uma entrevista com Zé Pedro, dos Xutos & Pontapés que evoca os 30 anos da banda, celebrados este mês. A entrevista serviu de base a um artigo publicado no suplemento DN Gente, a 10 de Janeiro.

Como é que os futuros elementos dos Xutos & Pontapés se conhecem?
O Kalú vem de um anuncio de jornal... Eu entretanto tinha ficado muito amigo do Pedro [Ayres Magalhães] e dos Faíscas... Zangaram-se com o Ramalho, e ficaram sem baterista. O que se faz? Mete-se um anuncio no Música & Som, que saía sabe-se lá quando... Metemos o anuncio com o número de telefone da casa dos meus pais. Fizeram entretanto as pazes, o Ramalho voltou. E começaram a chover telefonemas lá para casa. E o Pedro diz-me para ir guardando os telefonemas, que ainda acabava a ter uma banda e podia precisar de um baterista... Chegaram nove ou dez telefonemas com bateristas para a banda punk, que em principio seriam os Faíscas. O Kalú telefonou duas vezes... E refilou. E quando fui escolher o baterista ficou aquele. Tinha ligado duas vezes, devia estar interessado...

Ias então formar uma banda...
Íamos formar uma banda. Isto na altura em que havia o Zodíaco, na Infante Santo. Era um bar underground e aberto à malta toda. Chegámos a ter data agendada. O baixista seria o Zé Leonel. Eu estava a dar uns primeiros passos na guitarra. O Kalu supostamente seria o que teria mais experiência, que vinha de uma banda de baile. E o cantor era o Paulo Borges, que depois vai formar os Minas e Armadilhas. Nessa altura começaram a aparecer os primeiros fanzines. E também a cena do Brown’s. Começam a abrir coisas no Bairo Alto. Há ali um circuito das tascas... Isto já em 80/81...

E voltando ao que acabariam por ser os Xutos...
O Tim vem de Almada. Havia a ligação porque os UHF tinham começado lá. O Zé Leonel, tinha passado para vocalista e faltava-nos um baixista. Eu ia fazendo as músicas. Já havia umas letras... A Morte Lenta é dessa altura. O Dados Viciados também... Eu gostava de quebrar as regras do quatro por quatro, às vezes só para ser diferente. O Zé Leonel tinha visto o Tim a tocar guitarra de caixa. E foi-lhe perguntar se ele gostava de tocar baixo. Foi tudo muito rápido. Marcamos o ensaio... O enctontro com o Kalú foi na Trindade. Para o reconhecer ele disse que levava uma T-shirt do Lou Reed. O Tim conheço-o, estava sentado na Senófila.

E chega a noite da estreia... A 13 de Janeiro de 1979...
O Pedro Ayres decide acabar com os Faíscas, Tem uma conversa comigo. Diz-me que vai acabar com o grupo, e que aproveitávamos a festa, que ele já tinha outros projectos. Era o Corpo Diplomático... Diz-me que tinhamos de ir lá tocar e aproveitar a oportunidade... Que era eu que tinha de ficar a tomar conta do punk. Coisas de guerrilheiros... Eram as coisas que planeávamos, à volta de muito abssinto, misturado com cerveja. Tivemos até um contrato assinado pelos dois, em mortalhas, e com sangue! Conseguimos falar com o Tim. Marcámos um ensaio na Senófila. O Kalú estava na primeira semana na tropa. E como não havia telemóvel, fui para a porta do Ralis, para ver se o apanhava a sair... Tinhamos de ir ensaiar, que havia concerto à noite... Tinha passado o Natal e há já um tempo que não falávamos. Fazemos o ensaio, a correr, antes de jantar. Tinhamos a reserva na Senófila. Colamos ali umas quatro músicas... Fomos jantar. E só tocámos [já nos Alunos de Apolo] às duas da manhã... Foram para aí quatro músicas em seis minutos... Era eu que dava as saídas. Já chega... vai outra. Tocámos os Dados Viciados, outra que nunca chegámos a gravar. E acho que tocámos uma homenagem ao Bo Didley, que era o Bo Tás À Rasca, que também nunca gravámos... E mais uma que está esquecida... Devemos ter tocado aí um bocadinho de cada uma. Não tocamos nem metade das músicas! Ninguém assobiou nem ninguém bateu palmas... A festa estava animada. Os Faíscas tocaram o reportório deles. Nós tocámos tão rápido! Mas fomos festejar como sendo uma grande banda...

Já tinham o nome encontrado nessa noite. Como surgiu?
O Gimba também fazia parte desta trupe. À partida ele também teria uma hipotética banda comigo. Mas eram aquelas bandas de café, que nunca chegámos a tocar juntos... Há uma série de nomes em cima da mesa. E aparece um que é Beijinhos e Parabéns. E trocou-se logo para Xutos & Pontapés.

E a banda vai iniciando a sua história...
Entretanto o Zé Leonel sai. O Kalú tocava numa banda de baile onde tocava também o Francis, que acaba a entrar na banda. Depois vamos buscar outra vez o Zé Leonel e estamos os cinco a funcionar uns meses. Depois acabou mesmo por sair. Estávamos em sintonias diferentes... O Francis habituou-nos a, musicalmente, tornarmo-nos mais sólidos. Mas a certa altura já não tinha nada a ver comigo e entrámos num conflito grande. Mas enquanto ele lá esteve, foi extraordinário na maneira como elevou a fasquia musical dos Xutos. E eu tive de me esforçar...

(continua)

O escritório (6)

Terminamos hoje a visita a parte das salas da West Wing com um espaço adjacente à Sala Oval. Chega-se ali saindo pela porta à equerda da secretária do presidente, logo depois de um pequeno vestíbulo para abre um pequeno escritório. Esta é hoje conhecida como a sala de jantar do presidente, dominada por uma mesa onde frequentemente ele toma as suas refeições. Na imagem, Reagan e o então vice presidente Bush, em 1988.

Ao longo da história, esta sala mudou várias vezes de função. Nos anos 70 começou por ser a sala da secretária pessoal do presidente Nixon. Durante a administração Carter (na imagem), foi o seu escritório pessoal.

Em tempos era aqui que se instalava o Secretário do Presidente, cargo semelhante ao do actual Chief of Staff. Este era o aspecto do seu gabinete de trabalho, em 1946.

Son Lux: um prodígio de Nova Iorque

FOTO Sébastien Barriol

Para a NPR, o Top 10 dos grandes artistas desconhecidos de 2008 é liderado por Son Lux — nome de banda mas, no fundo, mais um caso prodigioso de um one-man-show: Ryan Lott. Com 29 anos de idade, Lott trabalha numa produtora publicitária de Nova Iorque, compondo pequenas bandas sonoras para anúncios de televisão e rádio, mas define-se como "produtor de hip hop". A sua música, simples e intrigante, feita de intimismo romântico e linhas agrestes de trip hop, tocada por uma fúria experimental que integra uma espantosa solidez de estruturas, é um continente que se desbrava num misto de euforia e contemplação. O seu álbum de estreia chama-se At War with Walls & Mazes. Este é o teledisco de Break, dirigido por Finbar Mallon.



>>> Top 10 de "desconhecidos" na NPR.
>>> Blog de
Son Lux.
>>> Son Lux no
MySpace.

5º canal — Mais televisão? Que televisão?

O aparecimento de um quinto canal de televisão no espectro português (re)coloca algumas questões vitais: sobre opções de programação e, antes disso, sobre a própria viabilidade económica d etal conjuntura — este texto foi publicado no Diário de Notícias (30 de Janeiro), com o título 'À espera do quinto canal'.

A abertura do concurso para um quinto canal de sinal aberto coloca algumas questões que vale a pena tentar equacionar. Em boa verdade, são questões pelo menos tão antigas quanto o aparecimento da televisão privada em Portugal. Podem resumir-se em dois vectores principais. Primeiro: qual o futuro do conceito (dominante) de televisão generalista? Segundo: qual a viabilidade económica, não apenas desse quinto canal (seja ele qual for), mas da conjuntura, “quatro + um”, que for criada?
A primeira interrogação remete-nos para uma certeza: o desenvolvimento da televisão privada (e com isto quero dizer: desenvolvimento com lucros) não tinha que ser feito através da degradação galopante dos nossos modelos de ficção (o império das telenovelas) nem com a imposição de matrizes de “espectáculo” enraizadas na obscena exploração da dignidade humana (Big Brother e seus derivados). Mais ainda: tal desenvolvimento também não precisava de ser “sancionado” por todas as formas de mimetismo, dos concursos ao futebol, que a televisão pública tem assumido em relação aos operadores privados.
Sobre a segunda dúvida, não creio que alguém possa apresentar previsões seguras sobre as relações (absolutamente vitais) entre cinco canais e um bolo publicitário que não cresce por meras boas vontades. E ainda menos num cenário de crise internacional como é aquele que se vive em todas as áreas de produção e consumo.
Significa isto que a simples ideia de um quinto canal é, em si mesma, nefasta? Não é esse o meu ponto de vista. Em todo o caso, o mais básico pragmatismo manda que se diga que vivemos num contexto em que esse “salto para a frente” pode transformar-se num gesto de absoluto irrealismo criativo e financeiro.
Vale a pena relembrar uma ideia simples, mas que poucos efeitos tem tido nas opções globais dos canais existentes: o aumento da oferta — através das dezenas, porventura centenas, de escolhas que o cabo proporciona — tem mostrado que há também uma importante diversificação da procura. Dito de outro modo: julgar que o público se reduz a uma massa amorfa à espera da próxima “cena de nu” em telenovela ou do novo concurso de “cultura geral” é não querer lidar com a pluralidade e a fragmentação desse mesmo público.

sexta-feira, janeiro 30, 2009

"Slumdog Millionaire": ele e ela (cont.)

Rodagem de SLUMDOG MILLIONAIRE:
Danny Boyle (ao centro) e Loveleen Tandan (à direita)

A nomeação de Danny Boyle para os Oscars, como realizador do filme Slumdog Millionaire, tem suscitado algum debate de ideias. Como referi em post anterior, há quem considere que a não-nomeação da co-realizadora Loveleen Tandan representa uma forma de discriminação: a crítica Jan Lisa Huttner defende mesmo que é importante fazer pressão sobre a Academia de Hollywood no sentido de alterar a regra (só pode haver um nome nomeado na categoria de melhor realização) que "justifica" tal omissão. Nesse post escrevi:

>>> Tentando contrariar esta lógica, a crítica Jan Lisa Huttner tem chamado a atenção no seu blog The Hot Pink Pen — empenhado na defesa dos direitos de mulheres realizadoras e argumentistas — para o anacronismo da regra, considerando mesmo que se está a perder a oportunidade histórica de nomear a primeira mulher de cor para melhor realização (...) <<<

Estas palavras levaram um dos nossos visitantes, Wellington Almeida, a dirigir-me um mail. Eis a sua argumentação:

>>> Não tenho aqui muito a dizer e nem vou entrar em dissertações sociológicas a respeito das disparidades semânticas que uma palavra possa vir ter e vou directo ao assunto: como grande apreciador dos seus textos — sejam eles peças jornalísticas ou mesmo as "informais" aqui no blogue — acho extremamente perigoso que o senhor use este eufemismo "de cor" para designar a raça "negra". Já há muito tempo muita tinta é gasta sobre este tema (negro? preto?) e nem estou a fazer suposições sobre suas políticas pessoais, mas esta quase que "suavização" da palavra NEGRO torna-se inequivocadamente ofensiva para mim. Quero dizer, estão a perder a oportunidade histórica de nomear a primeira mulher de cor para melhor realização mas...de que cor? <<<

* * * * *

1. Começo por esclarecer que o eufemismo “de cor” não designa a raça “negra”: Loveleen Tandan é indiana e tem a pele castanha. Aliás, num artigo da Newsweek em que é referida a não-nomeação de Tandan como co-realizadora, Ramin Setoodeh escreve uma frase de certeira ironia: “[O filme] Slumdog está cheio de rostos castanhos (brown faces) mas, no palco dos Oscars, praticamente todas as pessoas que forem receber prémios por ele têm rostos brancos.”

2. O “anacronismo da regra” a que me refiro — e que Jan Lisa Huttner aponta — decorre, não da cor da pele seja de quem for, mas apenas do facto de não ser possível nomear mais do que uma pessoa na categoria de melhor realização (mesmo quando, como é o caso de Loveleen Tandan, alguém aparece citado no filme como “co-realizador”).

3. Foi a própria Jan Lisa Huttner a referir-se à situação utilizando a expressão “of colour” (“de cor”). A citação está disponível no IMDb: “Ao longo de 80 anos, apenas três mulheres foram nomeadas para o Oscar de melhor realização — Lina Wertmuller, Jane Campion e Sofia Coppola — e apenas dois homens de cor: John Singleton e Ang Lee, que ganhou por Brokeback Moutain. Se Loveleen Tandan for co-nomeada pelo seu trabalho em Slumdog Millionaire, então será a primeira mulher de cor a ser nomeada para o Oscar de melhor realização e, se ganhar, será a primeira mulher a receber tão grande honra.”

4. O meu texto contém um erro de citação: a expressão “primeira mulher de cor” deveria surgir entre aspas, desse modo remetendo para o discurso de Jan Lisa Huttner.

5. A questão de fundo que se coloca está exemplarmente resumida por Wellington Almeida quando pergunta: “(...) estão a perder a oportunidade histórica de nomear a primeira mulher de cor para melhor realização mas...de que cor?” A resposta directa à sua pergunta é: de cor castanha. Mas, de facto, cada palavra e cada expressão está muito longe de se esgotar no discurso de um indivíduo, seja ele quem for, ou nas suas intenções. Podemos reavaliar a complexidade semântica, simbólica, política e afectiva de tais questões através de um didáctico artigo de William Safire (‘On language; people of color’), publicado em 1988 em The New York Times — depois de comentar as muitas convulsões históricas das expressões que se referem à cor da pele, o autor conclui assim: “Quando usada por brancos, people of color [pessoas de cor] transporta normalmente uma conotação amigável e respeitosa, mas não deverá ser usada como sinónimo de negro [black]; refere-se a todos os grupos raciais que não são brancos.”

6. O meu texto contém um segundo erro, este de avaliação de linguagem. De facto, ao traduzir a expressão em causa (de cor), embora a tenha assumido no sentido que decorre do seu contexto de enunciação (americano), não tive em consideração os inevitáveis efeitos — simbólicos e de leitura — que podem ser arrastados pela passagem de uma língua para outra.

7. Wellington Almeida escreve que não faz “suposições” sobre as minhas “políticas pessoais”. Pelo contrário, creio que o pode e deve fazer, sobretudo quando, como é o caso, tenta fazer algo a que atribuo a máxima importância: a interpretação dos subtextos simbólicos que um discurso — por vezes, uma simples palavra — pode arrastar. Repudio todas as formas de racismo, pelos actos e pela escrita. Mas as declarações de princípio não devem impedir o reconhecimento de erros como aqueles que cometi. Por eles me penalizo, apresentando as minhas desculpas.

Conto de Verão

Regressamos hoje a Skeletal Lamping, o mais recente álbum dos Of Montreal e, em concreto, ao novo single dele extraído. Trata-se de An Eluardian Instance, que surge neste teledisco de Jesse Ewles.

Disco dos Sigur Rós no 'The Independent'

Os Sigur Rós vão editar um novo álbum. Na verdade, uma compilação. Sai amanhã, mas não chegará às prateleiras das lojas, uma vez que é uma edição exclusiva para o jornal britânico The Independent. Tem por título We Play Endlessly, e recolhe, num alinhamento de nove temas, faixas editadas desde 2004. O grupo está entretanto a preparar o lançamento de um novo DVD, com o filme de um concerto londrino na digressão do ano passado. O DVD será lançado ainda este ano.

O escritório (parte 5)

Mantemo-nos no piso inferior da West Wing, hoje com visita a uma das salas que certamente mais visitas diárias deverá contar entre os funcionários da “ala” executiva. Trata-se da cantina, oficialmente designada como Mess Hall. É um complexo que envolve três salas, sob gestão da marinha. A sala principal, com o aspecto de um pequeno restaurante, foi remodelada em 2006.

Bill Clinton, e alguns dos funcionários da Mess Hall, na pequena cozinha que serve a “cantina” da Casa Branca. A cozinha é uma divisão pequena, rectangular e estreita, com comunicação com a sala de jantar feita através de uma janela e um balcão de serviço.

Houve ocasiões em que a Mess Hall seriu para pequenas festas ou cerimónias, certamente de cariz mais privado, entre o presidente e os funcionários da West Wing. Nesta imagem, de 1963, vemos John e Jackie Kenndy numa ocasião festiva.

Memórias remisturadas

Discografia Duran Duran - 52
'Strange Behaviour', 1999 (compilação)

Em 1998 os Duran Duran estavam já fora do catálogo da EMI, com liberdade para pensar o seu futuro. Entretanto, a editora encetara uma série de operações centradas na obra que o grupo para si regstara desde 1981. O primeiro sinal dessa nova era chegou, em finais do ano, com Greatest. O episódio seguinte, já em Março de 1999, surgiu na forma de nova antologia, desta vez um CD duplo. Com o título Strange Behaviour (uma expressão retirada da letra de Skin Trade), a compilação recolhe uma série de remisturas. Na sua maioria são as versões dos máxi-singles editados desde 1981. Mas a eles o alinhamento juntou outras remisturas, algumas até então apenas usadas em discos promocionais. O CD 1 inclui os temas que correspondem à formação original, documentando o período 1981-84. O CD 2 apresenta remisturas realizadas entre 1986 e 1993. Entre o alinhamento surgem duas absolutas novidades: a Night Mix de Planet Earth e uma outra remistura inédita de Hold Back The Rain. O booklet, desdobrável, explora imagens de telediscos da banda.

2008: a fotografia em livro(s)

Helen Mirren fotografada por Snowdon, em 1995 — é uma das fabulosas imagens de Vanity Fair - The Portraits, um dos grandes livros de fotografia editados em 2008. Por sua vez, o livro integra a lista das melhores edições do ano escolhidas pela revista American Photo. Entre outros, surgem ainda Annie Leibovitz, Erwin Olaf, Henri Cartier-Bresson & Walker Evans (reunidos num álbum sobre a América no período 1929-1947), Joshua Lutz e Jonas Bendiksen — capas, algumas reproduções e comentários no site da revista.

"Second Life": o filme

Depois de várias reflexões suscitadas pela campanha de lançamento de Second Life, é tempo de abordar o filme — este texto foi publicado no Diário de Notícias (29 de Janeiro), com o título 'Um filme sem dimensão humana'.

Infelizmente, repete-se com Second Life uma situação que, ao longo de décadas, tem marcado muitos filmes portugueses. O seu lançamento contribuiu para instalar um clima de conflito primário (em especial na Net) que nada tem a ver com o confronto de ideias. E quando o produtor Alexandre Valente fala em “revolucionar o panorama do cinema português” está, porventura com alguma ingenuidade, a criar problemas a si próprio.
De facto, quatro décadas passadas sobre a revolução sexual dos anos 60 (37 anos depois de O Último Tango em Paris), só por profundo logro simbólico se poderá pensar que há alguma “ousadia” em meia dúzia de planos anódinos de nus femininos. Qualquer melodrama (muito vestido) feito por Douglas Sirk na década de 50 envolve mais risco e perturbação.
Por perverso paradoxo, a história de Second Life — um homem que morre e “sobrevive” para a segunda vida a que se refere o título — está longe de aplicar um modelo simples. Na sua estrutura não linear, remete mesmo para as experiências mais ousadas (essas sim) do cinema dos anos 60, nomeadamente para clássicos de Alain Resnais como O Último Ano em Marienbad. Mas não são os modelos que fazem os filmes: Second Life é uma penosa colecção de cenas desgarradas, praticando todos os pecados (tempo dilatado, diálogos pesadamente “literários”, cenas sem motivação dramática) que o senso comum mais ignorante tende a atribuir ao cinema português “intelectual”.
Tudo isto é tanto mais triste quanto Second Life, desde a fotografia (Acácio de Almeida) à música (Bernardo Sassetti), revela um simples mérito de produtor: saber reunir profissionais com talento. Não basta, como é óbvio. Como não basta ir buscar nomes da televisão que, além de não serem capazes de inscrever no ecrã a mais discreta chispa de representação, nunca são objecto de qualquer verdadeiro trabalho de direcção. É a coisa mais penosa em qualquer filme: sentir que quem representa (vestido ou despido) está reduzido a uma função pobremente decorativa, sem dimensão humana.

quinta-feira, janeiro 29, 2009

Justin Vernon, aliás, Bon Iver

É uma daquelas bandas de uma só pessoa (mas com outras a ajudar...). Mais exactamente: Justin Vernon (nascido em Eau Claire, Wisconsin, em 1981) é um sobrevivente de alguns grupos de rock mais ou menos alternativo. O projecto Bon Iver — nome "copiado" da expressão francesa bon hiver (bom inverno) — nasceu de uma vontade de revisitação de memórias remotas da folk, devidamente consagradas em For Emma, Forever Ago (2008), álbum auto-produzido e gravado durante um retiro de três meses nas montanhas do Wisconsin. Sobre os resultados, podemos evocar referências fundadoras que vão desde o sentido dramático da música de Bob Dylan até ao intimismo magoado de Nick Drake. Mas serão sempre referências escassas — o que conta é a serena gravidade de uma música de paciente elaboração, capaz de conservar a transparência de uma ilusória espontaneidade. Entretanto, já com data de 2009, os Bon Iver têm um magnífico EP que dá pelo nome de Blood Bank. Do álbum, este é o tema For Emma.



>>> Site oficial: Bon Iver.
>>> Bon Iver:
MySpace.
>>> Página da editora americana:
Jagjaguwar.
>>> Página da editora europeia:
4AD.

Música para Sam Mendes

O compositor Thomas Newman continua a ser o aliado musical de Sam Mendes, tendo composto as bandas sonoras das suas quatro realizações: Beleza Americana (1999), Caminho para Perdição (2002), Máquina Zero/Jarhead (2005) e, agora, Revolutionary Road. Adaptado do romance de Richard Yates, Revolutionary Road é um daqueles diamantes cinematográficos que vive da sábia confluência de uma visão contundente do amor com uma paixão visceral pelo labor dos actores — em todo o caso, vale a pena sublinhar que a sua música constitui uma espécie de personagem invisível, desenhando uma teia melódica estranhamente ritmada, expondo as zonas de luz e sombra de um mundo (conjugal e social) que tem dificuldade em lidar com a sua própria verdade. Para ver, quer dizer: para escutar.

Um pássaro, uma abelha e o futuro

The Bird and the Bee: são uma dupla de Los Angeles, que edita através da Blue Note. O álbum de estreia, lançado há dois anos, revelava um discreto travo jazzy numa pop elegante, com gosto pelo experimentar das electrónicas. De então para cá, este último ingrediente parece ter ganho maior protagonismo… Agora estão prestes a lançar um segundo disco. Terá por título Ray Guns are Not Just The Future. O aperitivo chega neste Love Letter To Japan

Bowie em Berlim? Não...

Afinal era mesmo mentira! David Bowie negou ter uma conta no Twitter e, daí, se conclui que não tenha qualquer fundamento o “rumor” sobre a eventual gravação de nova música em Berlim que chegou a circular como “notícia” em alguns blogues e sites… O músico afirmou também não estar na sua agenda uma actuação em Coachella, na qual se chegou a dizer que reactivaria a figura de Ziggy Sytardust… Na verdade, o que de mais “artístico” fez nos últimos dias foi assitir, em Sundance, à estreia de Moon, a primeira longa-metragem do seu filho, Duncan Jones.

Os tempos de Harvey Milk

Chega hoje às salas de cinema Milk, o biopic sobre Harvey Milk, assinado por Gus Van Sant que tem coleccionado prémios e nomeações (oito delas para os Óscares). Seguindo opções narrativas mais “convencionais” que nos mais recentes Gerry, Elephant ou Paranoid Park, o filme evoca a vida do primeiro homem abertamente gay eleito para um cargo político nos EUA, assassinado alguns meses depois de tomar posse por um antigo colega de trabalho. Van Sant toma como coluna vertebral da narrativa uma série de memórias que Milk (brilhantemente interpretado por Sean Penn) regista numa cassete. Palavras que grava temendo a morte, uma das sombras que sempre o perseguiu desde que ganhara visibilidade política. A história segue, depois, o percurso como o tempo o acompanhou. Começando em Nova Iorque, em inícios da década de 70, revelando um homem a chegar aos 40 anos, frustrado por de nada até então a sua vida ter servido. Mudando-se para São Francisco, transformado pelos ecos da contracultura de 60, descobrindo em si uma motivação activista, lutando pelos direitos dos homossexuais primeiro à volta de um espaço de bairro, acabando a falar para a cidade, com repercussões pelo país. Sean Penn tem sido frequentemente citado pela composição de uma personagem que incorporou com impressionante realismo. Protagonista, sem dúvida. E num dos melhores papéis da carreira de Penn. Milk não é, contudo, um filme de actor. Mas de actores. E a sua força resulta do relacionamento de Sean Penn com todo um elenco igualmente notável. Um corpo comum que envolve actores como James Franco, Josh Brolin, Emile Hirsh ou Diego Luna. Na realização mora outra das peças fulcrais no relatar de uma história real, mostrando Van Sant saber usar com conta, peso e medida pontuais citações de época, com imagens reais, evitando todavia as soluções mais lineares dos retratos biográficos que muitas vezes conhecemos nas recriações em registo docudrama.

Harvey Milk é uma figura com um certo peso na história da política americana. Em finais dos anos 70, depois de uma sucessão de derrotas eleitorais, foi eleito para um lugar na equipa de “supervisores”, cargo de relevância na estrutura autárquica de São Francisco. Longe de ser um ilustre desconhecido, Harvey Milk foi já biografado num livro de Randy Shilts (The Mayor Of Castro Street), assim como sobre ele Rob Epstein rodou, em 1984, o documentário The Times Of Harvey Milk (que este ano terá edição em DVD). Uma outra recente referência a Harvey Milk surgiu no documentário Follow My Voice: With The Music Of Hedwig, de Katherine Linton (2007), que acompanha o tributo que uma série de músicos (entre os quais as Breeders, Frank Black, os Yo la Tengo ou Rufus Wainwright) gravaram a partir canções da banda sonora de Hedwig & The Angry Inch, de John Cameron Mitchell, criando um disco que recolheu fundos para apoiar a Harvey Milk School, em Nova Iorque.

O escritório (parte 4)

Hoje descemos ao piso inferior da West Wing para “visitar” a Situation Room. Na verdade, não se trata de uma sala, mas de um complexo de salas destinadas a reuniões de emergência sobre questões de segurança, havendo todavia alguns espaços essencialmente destinados a videoconferências. Todas estas salas foram remodeladas em 2007. A Conference Room foi dotada de uma série de ecrãs planos nas paredes, permitindo várias ligações. Antes da remodelação, as paredes eram revestidas a madeira. Não era uma boa opção acústica, tendo-se entretanto optado por novas paredes criadas com materiais para servir de forma mais eficaz as comunicações nesta sala.

A Situation Room foi criada por Kennedy, na sequência da crise cubana que então viveu. Para instalar a sala e funcionários adjacentes ao seu serviço decidiu retirar do piso inferior da West Wing uma sala de bowling que ali havia sido mandada construir por Harry Truman.

Harry Truman não era um jogador de bowling, mas deixou que entre os funcionários da Csaa Branca fosse criado um campeonto. Nos anos 70, Nixon construiu uma nova sala de bowling, na cave, exactamente sob a entrada principal na fachada Norte da Residência.

"Slumdog Millionaire": ele e ela

Com muitos prémios já ganhos (incluindo o Globo de Ouro para melhor filme/drama), Slumdog Millionaire surge como um dos mais fortes concorrentes aos Oscars: dez nomeações, incluindo melhor filme e melhor realização, para Danny Boyle.
Acontece que a nomeação para Boyle é, no mínimo, incompleta, uma vez que Loveleen Tandan, directora de casting para as cenas na Índia, acabou por ser integrada na ficha do filme como co-realizadora — coisa que, em boa verdade, o próprio Boyle tem sido o primeiro a sublinhar publicamente (e que a publicidade nem sempre reflecte). Ora, em função de uma das regras da Academia de Hollywood, só uma pessoa pode ser nomeada na categoria de realização.
Tentando contrariar esta lógica, a crítica Jan Lisa Huttner tem chamado a atenção no seu blog The Hot Pink Pen — empenhado na defesa dos direitos de mulheres realizadoras e argumentistas — para o anacronismo da regra, considerando mesmo que se está a perder a oportunidade histórica de nomear a primeira mulher de cor para melhor realização (aliás, apenas três mulheres conseguiram essa honra: Lina Wertmuller, Jane Campion e Sofia Coppola, respectivamente em 1977, 1994 e 2004).
Lisa Huttner defende um grande movimento de opinião e convoca mesmo os que com ela concordarem a enviarem mails para a Academia, perguntando por que razão Loveleen Tandan não está nomeada — está tudo no seu blog.

quarta-feira, janeiro 28, 2009

"A Duquesa": um trailer lamentável

Sabemos que a noção de "qualidade BBC" é um rótulo tão frequente quanto fácil e simplista: é óbvio que a BBC é uma estrutura de produção com uma importância histórica indesmentível — inclusive para muitos momentos de renovação criativa do cinema britânico —, o que não impede que sob tal chancela se concretizem projectos de grande banalidade dramática e formal. É o caso de A Duquesa, filme de Saul Dibb, com Keira Knightley e Ralph Fiennes: o retrato de Georgiana Cavendish (1757-1806), Condessa de Devonshire, cedo redunda num daqueles exercícios de ostentação gratuita, desde o guarda-roupa até às cenas "eróticas", cuja identidade se confunde com as regras da mais banal mini-série "histórica".
Enfim, por aí não viria grande mal ao mundo. Acontece que a promoção do filme é um caso extremo de exploração de uma figura do imaginário britânico cujo poder simbólico será inútil sublinhar: a Princesa Diana (1961-1997). Assim, é certo que Diana pertence à vasta descendência de Georgiana, mas a sua integração na publicidade do filme tem qualquer coisa de obsceno: o trailer de A Duquesa não só utiliza imagens de Diana, como estabelece um paralelo grotesco, referindo-se a duas mulheres "unidas pelo destino" — vale a pena conhecer o trailer, quanto mais não seja para perceber como o marketing pode menosprezar todas as singularidades históricas, apenas para criar uma imagem "apelativa" dos produtos que trabalha.

"JL" x 1000

O JL — "Jornal de letras, artes e ideias" — é um caso invulgar no panorama jornalístico e cultural do nosso país: um jornal quinzenal, já foi semanário, que consegue a proeza de estar a comemorar a sua edição nº 1000 (o primeiro número surgiu a 3 de Março de 1981). Parabéns, por isso, ao director José Carlos Vasconcelos e a todos os que lá trabalham — memórias e ideias para o futuro estão, como sempre, no respectivo blog.

"Second Life": um filme de produtor


1. UM FILME DE PRODUTOR. Projectado ontem, dia 27, para a imprensa (estreia amanhã), Second Life é mesmo um filme de produtor — inevitável seria, não apenas porque o produtor Alexandre Valente co-assina a realização com Miguel Gaudêncio, mas também porque ele próprio se assumiu como principal protagonista de um debate que tem tido, pelo menos, o mérito de relançar algumas ideias, incluindo dos que se mantêm fiéis a uma visão maniqueísta, preferindo distribuir culpas pelo campo da crítica.

2. QUE TALENTO? Dito isto, convenhamos que há algo de desconcertante em descobrir Second Life. Porquê? Porque, pelo menos em termos estratégicos, o filme revela algumas opções curiosas — de produtor, precisamente — que poderiam servir para algo de minimamente coerente. Assim, Alexandre Valente foi buscar personalidades como Acácio de Almeida (director de fotografia) e Bernardo Sassetti (autor da música) que não são propriamente destituídos de qualidades. Bem sabemos que um filme, de qualquer nacionalidade, não é uma mera soma de talentos. Em todo o caso, Second Life teria pelo menos fundamentos para ser um objecto de concepção sólida, porventura correspondendo aos modelos de um cinema europeu de raiz popular cujas tradições são mais que respeitáveis.

3. QUE CULTURA POPULAR? Por que é que nada disso resulta?
Primeiro, porque Second Life é um filme obcecado pela criação de cenas de "impacto" (ditas "escaldantes"), opção que neste caso se confunde com alguns banalíssimos momentos de nudez cuja subtileza sexual e densidade erótica conseguem ser menos interessantes que a de um vulgaríssimo anúncio televisivo de desodorizan-te. Há algo de inapelavelmente pueril quando se filmam assim os corpos, esquecendo que, desde O Último Tango em Paris (1972) até aos nossos dias, o erotismo na cultura popular é um elemento tão importante quanto complexo e multifacetado.
Depois, Second Life é um filme que aposta, não nas matrizes do cinema popular que tenta revitalizar, mas sim em modelos de carácter experimental. Dito de outro modo: esta história do homem que "vive-duas-vezes" convoca modelos de experimentação nar-rativa — enraizados nos tempos heróicos do Cinema Novo, em particular na Nova Vaga francesa (Resnais, Godard, etc.) — em que, desde a fragmentação das sequências até à montagem não linear, estão presentes todos os pressupostos habitualmente atribuídos ao cinema que muitos, por menosprezo, chamam de "intelectual". Como é óbvio, uma vez mais, nada disso dá garantias de resultados interessantes, sobretudo quando, como aqui acontece, não há capacidade de construir personagens, de organizar situações dramáticas, enfim, de dirigir actores.

4. QUE ESTRATÉGIA? O resultado é desastroso. Insolitamente, compreende-se que, com outro pensamento e, sobretudo, com outra lógica menos "sensacional", a estratégia de Alexandre Valente poderia ser a base para qualquer coisa de minimamente consistente (e sou o primeiro a ter consciência que a eventual citação desta última frase fora do seu contexto pode favorecer toda a estupidez que continua a querer descrever — e resolver — os dramas do cinema português como uma guerra entre "cinema comercial" e "cinema de autor").

5. MEMÓRIA(S). É evidente que não faz sentido especular sobre todos os "filmes-que-se-pode-riam-fazer". Mas podemos lembrar que grandes tradições populares do melhor cinema europeu, a começar pela italiana dos anos 50/60, se enraizaram numa imensa abertura criativa, sem preconceitos de abraçar todos os géneros e todas as tendências — afinal de contas, Dino de Laurentiis é produtor histórico de Federico Fellini, Mario Monicelli e Dino Risi, e também de títulos de raiz americana como Serpico (Sidney Lumet) ou Dune (David Lynch)...

Bruce: "Reborn in the USA"

O envolvimento de Bruce Springsteen com a campanha de Barack Obama é apenas o sinal mais próximo de uma trajectória artística sempre ligada ao trabalho político como componente visceral da cultura popular. Um quarto de século passado sobre a edição do emblemático Born in the USA, Bruce lança agora um novo e magnífico álbum com um título também carregado de simbologia: Working on a Dream. Este texto foi publicado no Diário de Notícias (27 de Janeiro), com o título 'Springsteen refaz o sonho americano'.

No dia 18 de Janeiro, no concerto “We Are One”, de celebração da tomada de posse de Barack Obama, Bruce Springsteen cantou This Land Is Our Land, com Pete Seeger. Foi um momento de luminosa confluência de símbolos: desde logo porque se tratava de uma canção lendária, escrita por Woody Guthrie, figura tutelar da folk americana; depois porque a companhia de Seeger, à beira de completar uns radiosos 90 anos (3 de Maio), sublinhava esse elo vital com a tradição da música popular; finalmente porque Springsteen ilustrava assim, não apenas o seu apoio a Obama, traduzido na participação em alguns concertos da respectiva campanha, mas também um continuado empenho na vida política dos EUA.
Nascido em 1949, Springsteen sempre foi uma personalidade eminentemente política, e com uma obra contaminada por muitas temáticas políticas, mesmo se isso não permite caracterizá-lo segundo os padrões do “militante” (sobretudo se tais padrões forem de raiz europeia). A sua dimensão política não nasce de formas oficiais de “filiação”, mas sim de um sentido crítico, e de um gosto de intervenção pública, que é inerente à própria tradição folk.
Nesta perspectiva, podemos defini-lo através de um estatuto comum a todos aqueles, de Woody Guthrie a Bob Dylan, cujas raízes estão no vasto mundo da folk: a de um exemplar contador de histórias. E bastará recordar os seus dois primeiros álbuns, ambos de 1973, na altura uma revelação explosiva na música americana: Greetings from Asbury Park, N.J. e The Wild, the Innocent & the E Street Shuffle são, de uma só vez, evocações directas da juventude do seu criador, em New Jersey, e também pequenos contos ou fábulas sobre um tempo de muitas dúvidas e perplexidades (além do mais, com os traumas da guerra do Vietname bem sensíveis).
A partir daí, pode dizer-se que Springsteen não só tinha encontrado a sua identidade criativa, como encetava um processo de introspecção e pesquisa que viria a ter um momento exemplar em The River (1980), álbum que, nomeadamente na canção-título, canta o universo de uma classe operária que, afinal, pouco tem a ver com as cores e os temas do imaginário político europeu, antes surgindo ligada a um profundo romanesco que é indissociável do património literário e cinematográfico dos EUA.
É curioso referir que Nebraska (1982), o álbum que se sucedeu a The River, corresponde a um verdadeiro retorno às origens, com Springsteen a consumar uma extraordinário “one-man-show”: Nebraska foi gravado em casa do próprio Springsteen, com ele a assumir todos os papéis, incluindo a utilização da guitarra acústica e da harmónica (e, esporadicamente, alguns toques de guitarra eléctrica).
Logo a seguir a Nebraska, o álbum Born in the USA (1984) daria a Springsteen aquele que seria, talvez, o mais inesperado dos estatutos: o de estrela pop, em boa verdade uma das primeiras figuras emblemáticas da MTV (criada em 1981). Os telediscos de Born in the USA e, sobretudo, Dancing in the Dark foram peças decisivas para o impacto do álbum que continua a ser o maior sucesso de toda a sua carreira, com mais de 15 milhões de exemplares vendidos (apenas nos EUA).
Agora, com o álbum Working on a Dream, Springsteen reencontra um espírito de exaltação do imaginário popular americano que, como é óbvio, está desde logo presente na canção que lhe serve de título: a ideia de “trabalhar num sonho”, para além de remeter para todo um espírito colectivo de (re)construção, acaba por rimar com o voto de refazer (“remaking America”) expresso pelo próprio Obama.
Afinal de contas, em 2002, com The Rising, Springsteen tinha sido um dos primeiros a lidar com as feridas do 11 de Setembro, cantando a possibilidade de um renascimento que teria que passar sempre pela reavaliação da própria identidade colectiva. Aliás, o concerto para Obama foi, na verdade, um reencontro: em 2006, com o álbum We Shall Overcome: The Seeger Sessions, ele tinha já revisitado as canções de Pete Seeger, reabrindo as portas do sonho.

>>> Do novo álbum, este é o teledisco de My Lucky Day.

Baptista-Bastos: aqui e agora

>>> Não vivemos — existimos no pe-queno mundo de obcecações que nos cegam. Que nos aconteceu? Quem nos roubou a humanidade que per-mite a clarividência e a energia necessárias para suportar a adversi-dade, a mentira, a infâmia? <<<

São palavras do meu amigo Baptista-Bastos, incluídas na sua crónica de hoje no Diário de Notícias. Intitula-se 'Viver em Portugal'. Na sua paciente elegância de escrita, é um texto capaz de nos tocar muito para além das concordâncias ou discordâncias que a sua visão do mundo possa suscitar. É, acima de tudo, um texto que nos remete para o nosso presente — este inexorável aqui e agora —, perguntado-se (e perguntando-nos) o que é isso de estabelecer uma relação humana. Por todas as razões, incluindo a banalidade de guerrilha que contamina tantos "debates" na blogosfera, vale a pena ler.

Discos da semana, 26 de Janeiro

A obra do mexicano Fernando Corona, através do seu projecto Murcof, conta-se entre as mais inventivas e estimulantes que a música electrónica nos revelou na presente década. Descobrimo-lo em Martes (2002), disco que juntava uma lógica de composição atenta ao pormenor, ao fragmento, revelando sugestões de contemplação onde, por entre as electrónicas, brotava a presença (determinante) de outras paisagens, entre as quais se destacavam samples de obras de Arvo Pärt. Como que a assinalar, desde logo, o seu interesse em lançar a sua curiosidade sobre terrenos mais próximos da música habitualmente rotulada como “erudita”, abrindo assim o horizonte das possibilidades a um espaço mais vasto que o das mais frequentes escolas seguidas por muitos dos artesãos contemporâneos das electrónicas. De então para cá editou discos de remisturas e mais dois álbuns de originais: Remembranza (2005) e Cosmos (2007), que deram novo corpo à mesma demanada. Agora, anunciando para breve a verdadeira continuação desta história em Oceano (a editar em data a revelar), lança um disco que considera exterior a este percurso... Mas que, na verdade, traduz o seu mais profundo e bem sucedido mergulho num espaçlo de confluência de linguagens, dele resultando uma música que é uma verdadeira dor de cabeça para quem gosta de taxonomias, porque impossível de rotular. The Versaillhes Sessions nasceu de um desafio concreto para um espectáculo nos jardins do Palácio de Versalhes. Uma obra site-specific, portanto, criada para o espectáculo Les Grands Eaux Nocturnes uma noite de música e luz frente a uma das grandes fontes (jeux d’eau) que adornam o Jardin du Roi, para a qual Fernando Corona fez questão de juntar a uma composição claramente do presente uma série de ecos dos dias em que esta era “a” casa da mais faustosa corte europeia, na qual trabalharam muitos compositores. O disco junta as seis composições apresentadas. Por elas corre o sentido contemplativo, lento, habitual na música de Murcof. Regressa um claro interesse pela exploração de texturas. Mas mais que nunca Fernando Corona aceitou os desafios lançados a si mesmo. A música, que parece sugerir um espaço abstracto, acaba por ganhar forma, corpo, mesmo um carácter cinematográfico. A presença de instrumentos do século XVII (entre os quais um cravo, viola da gamba ou violinos) e de um soprano sublinham os cenários e lança narrativas que evocam concretamente figuras como Lully ou, inevitavelmente, Luis XIV. Fantasmas e memórias cruzam-se numa série de composições onde passado e presente se diluem. Fosse vivo, Kubrick teria feito um novo filme se escutasse esta música.
Murcof
“The Versailles Sessions”

Leaf / Flur
5 / 5
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Depois da barrigada de boas ideias e belos discos que fizeram de 2008 um dos melhores anos de música portuguesa dos últimos tempos, 2009 entra em cena mantendo em “alta” este clima pop/rock oposto ao da “crise” de que se fala nos jornais e noticiários com a estreia em disco d’Os Quais. É “apenas” um Meio Disco. Um mini-LP, como se dizia em tempos, com um alinhamento de seis temas. Meio disco seja, mas já capaz de nos dar conta de uma ideia inteira. Uma ideia que parte da soma da escrita de Jacinto Lucas Pires (o escritor) à música de Tomás Cunha Ferreira (o pintor), juntando um mundo de canções escutadas que passam por nomes como os Beatles, António Variações, Prince ou Caetano Veloso. Este último, pelo tempero que domina algumas das canções no miolo do alinhamento, ganhará algum protagonismo na lista das citações de referências quando d’este disco d’Os Quais se falar. Mas Caetano é aqui tão assimilado como os demais “ícones” referidos, encarados através da vivencia dos dois músicos que fazem destas canções um local seu, matematicamente talvez algures entre os dois lados do Atlântico, mas com tempo e lugar assinalados claramente no nosso aqui e no nosso agora. As sugestões narrativas, assim como as molduras de som que as envolvem, colocam-nos no Portugal de hoje, pequenas citações servindo a caracterização dos cenários. Entre a linguagem rock’n’roll e a assimilação de modelos mais próximos da canção popular, o Meio Disco dá conta de uma ideia musical aberta ao desafio. De resto, as palavras de José Tolentino de Mendonça e o saxofone de Carlos Martins fazem já, de Caído no Ringue, uma das melhores canções que escutaremos este ano.
Os Quais
“Meio Disco”

Amor Fúria / Mbari
4 / 5
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Por muitas razões o regresso dos Franz Ferdinand aos discos era aguardado com expectativa. Era inevitável. A sua estreia, em 2004, revelou a mais entusiasmante colecção de canções que a pop britânica conhecia em vários anos, assinalando ainda aquela que se afirnaria como a obra central a uma nova geração de bandas que reencontrou como referência memórias (algo esquecidas) da new wave de finais de 70. Confirmaram o estatuto ao segundo álbum, numa altura em que alguns dos seus contemporâneos editavam segundos discos menores, alguns deixando o comboio logo nessa estação... E resolveram sair de cena. Alex Kapranos escreveu no Guardian uma coluna sobre restaurantes (que entretanto deu um livro). Tocaram com músicos africanos. Construiram o seu próprio estúdio. Testaram novas canções em concertos inesperados e nada mediatizados. E agora regressam... Tonight: Franz Ferdinand é contudo, e apesar de uma mão cheia de belíssimas canções (e de bons motivos para dançar), um relativo desapontamento. Não um tiro ao lado. Nem um desaire. Mas um retrato de uma aparente indecisão, parecendo o grupo querer estar em terreno seguro e, ao mesmo tempo, tactear ideias novas que, apesar de materializadas numa ou outra canção, não ganham nunca espaço para se afirmar em pleno. Live Alone pisca o olho à pop, com sabor electrónico. Send Him Away acolhe temperos afro. Bite Hard assimila heranças art rock de 70. E Lucid Dreams dá ideia de quão aliciante poderia ter sido o disco, caso este tivesse sido o caminho adoptado... Ao terceiro disco, os Franz Ferdinand mostram que souberam resistir à erosão que apagou do mapa ou magoou algumas outras carreiras nascidas na presente década. Mas ao jogar à defesa perdem a vantagem com que se apresentavam, como potenciais protagonistas, em 2009.
Franz Ferdinand
“Tonight: Franz Ferdinand”

Domino / Edel
3 / 5
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Editado lá fora há já algum tempo, chega agora a estas paragens o álbum de estreia do colectivo Clare & The Reasons. A Clare do nome da banda é filha do guitarrista de blues Geoff Muldaur e reuniu à sua volta, pelo bairro de Brooklyn, em Nova Iorque, um “combo” que consigo partilha esta aventura pop com travo jazzy. Longe do apelo mais contemporâneo da dupla jazz pop The Bird & The Bee (que edita pela Blue Note), o álbum de estreia de Clare & The Reasons procura pistas em memórias da canção pré-rock’n’roll, não escondendo um gosto por referências retro que passam pela música do teatro musical e pelos domínios da pop orquestral. Não espanta a presença, entre a lista de colaboradores, de Van Dyke Parks, que assina arranjos. Mais inesperada é talvez a também mais discreta participação de Sufjan Stevens... O álbum apresenta uma colecção de canções delicadas, de formas polidas. Voz frágil, orquestrações luxuriantes, todavia cientes de que desenham um cenário. É um disco que pode cruzar gostos e públicos, firme numa linguagem popular, mas com algumas raízes firmes em terrenos menos “unânimes”. O alinhamento abre com Pluto, o momento maior do álbum, que regressa a fechar o disco, numa versão (com arranjo distinto) em francês. The Movie não é um álbum ousado ou aventureiro. É até uma experiência reveladora de um sentido de contenção. E talvez more nessa mesma contenção aquela dose adicional de entusiasmo que poderia ter transformado uma razoável de canções num momento surpreendente...
Clare & The Reasons
“The Movie”

Fargo Records
3 / 5
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Apesar das ocasionais excepções, o universo pop/rock britânico - facção alternativo, com guitarras, e claras ambições de querer ir mais longe - tem gerado poucas revelações decididamente marcantes nos últimos anos. E o álbum de estreia dos Glasvegas, apesar dos clamores que gerou “em casa”, está muito longe de ser o disco para fazer a diferença. Na base das ideias deste quarteto, nascido em Glasgow e com obra editada em singles desde 2004, está uma mão cheia de referências, as mais frequentemente citadas referindo as memórias de uns Jesus & Mary Chain ou o revisitar de modelos que colocaram na história o produtor Phil Spector... Mais uma pitada de Kasabian... E por perto também as presenças tutelares de uns Oasis... A música não esconde uma ambição épica de criar hinos. Hinos que sucedem, faixa a faixa, em doses de pompa oca que faz das canções pretensos monumentos pouco ou nada convincentes. O Beethoven emprestado a S.A.D. Light, convenhamos, não ajuda... No fim, o contraste entre a grandiosidade épica das formas e os retratos cantados, em aparente piscar de olho a supostos cenários de realismo social, sublinha o estranho sabor que nos deixa a audição do álbum. Um pouco como se o argumento para um filme de Mike Leigh acabasse nas mãos de um John Woo... É certo que evitam o baralha e volta a dar que nos últimos tempos fazia parecer que não havia saída para uma pop inglesa musculada (ler com guitarras) fora das esferas da reinvenção do legado new wave. Mas não deixam de transparecer uma vontade em seguir as piores opções das etapas menos estimulantes da obra de uns U2... E apesar da conta certa de dez temas, Glasvegas é daqueles discos que parece que nunca mais acaba...
Glasvegas
“Glasvegas”
Columbia / Sony
2 / 5
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Também esta semana:
Bruce Springsteen, Future of the Left, The Bird and The Bee, Johnny Cash (remixes), Of Montreal (EP), Six Organs of Admittance, Swing Out Sister, Titus Andronicus

Brevemente:
2 de Fevereiro: Doismileoito, Andrew Bird, Benjy Ferree, Jim White, Lloyd Cole, Dakota Suite, A Camp, Burt Bacharah (best of)
9 de Fevereiro: Lilly Allen, Van Morrission (live), Erasure (remixes), Frida Hyvonen, A.S. Mutter (Mendelssohn), Emmy The Great, Pet Shop Boys (reedições)
16 de Fevereiro: Beirut, Morrissey, M Ward, Empire Of The Sun, Dark Was The Night, Jah Wobble, Ultravox (reedições), Visage (reedição), REM (reedição), Graham Nash (reedição),

Fevereiro: Björk (DVD), Casiotone for the Painfully Alone, Kate Bush (DVD), Asobi Seksu, Dean & Britta (DVD), Vetiver, Grandmaster Flash, Pearl Jam (reedição), Robert Wyatt (caixa), John Hassel, J.E. Gardiner (Brahms), Sound of Arrows
Março: U2, Grizzly Bearl, Neko Case, White Lies (ed nacional), Xutos & Pontapés, The Prodigy, Mexican Institute of Sound, Mirah, Bonnie 'Prince' Billy, William Orbit, The Decemberists, PJ Harvey + John Parish, Arcade Fire (DVD), MSTRKRFT, Frank Black, VV Brown, Bell Orchestre, Fever Ray
Abril: Tortoise, Art Brut, Vitalic, Bill Callahan

O escritório (parte 3)

Durante muito tempo, salvo excepções, os vice presidentes não tinham escritório de trabalho na West Wing, encontrando antes o seu local de trabalho no edifício adjacente, o Eisenhower Executive Office Building. Nas últimas administrações, o papel do vice presidente tornou-se mais activo, sendo frequente a sua instalação num gabinete de trabalho na West Wing, numa sala que partilha um pequeno vestíbulo com o escritório do Chief Of Staff.

O ganinete de trabalho do vice presidente, como a maioria das salas da West Wing, ocupa uma divisão relativamente pequena. Sem o aparato (nem as tradições) da Sala Oval, inclui à mesma uma secretária e sofás para reuniões com o staff e visitantes. A grande diferença face à Sala Oval é a presença de um grande armário com livros, que Al Gore (na imagem) manteve por detrás da sua secretária.

Imagem de 1987, com o então (ainda) vice presidente George Bush no seu gabinete de trabalho. Tal como na Sala Oval, a decoração (sobretudo os estofos dos sofás) vai variando...

terça-feira, janeiro 27, 2009

John Updike (1932 - 2009)

>>> Em geral, as igrejas que visito demasiadas vezes durante os dias de semana têm, para mim, a mesma relação com Deus que os painéis de publicidade com a Coca-Cola: promovem a sede sem a satisfazer. <<<
J. U.
in A Month of Sundays (1975)

Morreu John Updike, o autor dos livros do 'Coelho' (mais precisamente Harry 'Rabbit' Angstrom), dois deles distinguidos com o Prémio Pulitzer (Rabbit Is Rich e Rabbit at Rest, respectivamente em 1982 e 1993) — nascido no dia 18 de Março de 1982, em Shillington, Pensilvânia, Updike faleceu hoje, 27 de Janeiro, num hospital de Beverly Farms, Massachussetts, vitimado por cancro nos pulmões.
Os seus temas poderão resumir-se em dois vectores por ele próprio nomeados: as "pequenas cidades americanas" e a "classe média protestante". Romances como The Centaur (1963), Couples (1968) ou The Witches de Eastwick (1984) transformaram-no numa referência muito popular, em especial dos leitores norte-americanos — o último foi adaptado ao cinema, em 1987, numa realização de George Miller, As Bruxas de Eastwick, com Jack Nicholson, Cher, Susan Sarandon e Michelle Pfeiffer nos principais papéis.
Porventura um dos seus romances mais atípicos é o fascinante Seek My Face (2002), sobre o diálogo de uma pintora com uma jornalista que a "obriga" a rever a sua vida. Depois disso, Updike publicou ainda os romances Villages (2004) e Terrorist (2006), este um espantoso retrato do pensamento de um potencial terrorista, e duas colectâneas de ensaios, Still Looking: Essays on American Art (2005) e Due Considerations: Essays and Criticism (2007). Vários dos seus títulos existem em edição portuguesa com chancela da Civilização. O seu derradeiro romance, The Widows of Eastwick (sequela das Bruxas) foi lançado em Outubro de 2008 pela Knopf/Random House.

>>> Obituário em The New York Times.
>>> John Updike entrevistado por Dwight Garner (
Salon).
>>> Colaborações de John Updike em
The New York Review of Books.

À procura do tempo digital (4)

[1] [2 [3]
Taraji P. Henson (nomeada para o Oscar de melhor actriz secundária) segura Benjamin Button — "bebé-velho" ou "velho-bebé". Em qualquer caso, aquilo que ela segura é um ser cujo hibridismo tecnológico reflecte a própria ambivalência da actual idade do cinema: é ainda um corpo que, milagre da narrativa, ainda se adequa a outro.
Sabemos, assim, que quase todas as figurações de Brad Pitt em O Estranho Caso de Benjamin Button passam por alguma fusão do trabalho específico do actor com a transfiguração, também ela específica, das imagens. A imagem deste cartaz é apenas um sucedâneo do mesmo processo figurativo — mas será que a palavra "figurativo" ainda basta para descrever o que está a acontecer? Uma coisa é certa: a iconografia maternal persiste para além dos modos da sua encenação. O que quer dizer também que é preciso relativizar o preconceito que, por vezes, emerge contra as práticas técnicas das imagens contemporâneas — se o humano resiste, é porque o humano ainda conta na gestação das imagens.

Memória do Holocausto

Foi a 27 de Janeiro de 1945 que as tropas soviéticas libertaram o campo de concentração de Auschwitz-Birkenau, o maior montado pelo regime nazi para a aniquilação do povo judeu — faz hoje 64 anos. De acordo com uma resolução das Nações Unidas, tomada em 2005, 27 de Janeiro é o Dia Internacional da Memória do Holocausto. Este símbolo, ligando a memória e o trabalho efectuado sobre a sua herança resume a força simbólica do dia: não esquecer, pensar o futuro a partir do passado, de todos os passados.

"Cahiers": a acção cultural

>>> Este ano abre-se com sinais de uma mobilização sem precedentes — e não só o ano cinematográfico. Seria difícil encontrar num passado, mesmo relativamente distante, uma tal vaga de inquietudes e revoltas face a um conjunto de fenómenos heterogéneos, mas em que as decisões de política pública desempenham um papel central, por agora terrivelmente destruidor. Trata-se aqui do ensino, do audiovisual público, da liberdade de imprensa, do conjunto de dispositivos de solidariedade colectiva e de apoio à cultura. <<<

São as palavras de abertura de Jean-Michel Frodon no editorial ('Action!') do número de Janeiro dos Cahiers du Cinéma — em discussão estão as questões específicas da acção cultural, em geral, e da valorização da cultura cinematográfica, em particular. Che, de Steven Soderbergh, é o principal tema da capa, numa edição que oferece, entre outros temas, uma reportagem sobre a rodagem de Shutter Island, de Martin Scorsese (pela realizadora argentina Celina Murga), e ainda os tops de 2008. Vale a pena citar os três melhores do ano para os Cahiers:

1- Redacted, de Brian De Palma
2 - Juventude em Marcha, de Pedro Costa
3 - Cloverfield, de Matt Reeves

E para os leitores dos Cahiers:

1 - O Silêncio de Lorna, de Luc e Jean-Pierre Dardenne
2 - Este País Não É para Velhos, de Jole e Ethan Coen
3 - Valsa com Bachir, de Ari Folman

>>> Site oficial dos Cahiers du Cinéma.