Vale a pena ler um post escrito por Margarida Gil — realizadora, entre outros títulos, de Adriana (2004), Rosa Negra (1992) e Relação Fiel e Verdadeira (1989) — sobre o clima que se está a viver em torno da promoção do filme Second Life, os seus pressupostos e a sua ideologia.
Num post publicado no blog da Associação Portuguesa de Realizadores, intitulado Corrupção no Cinema em Portugal e em português, a autora tece, entre outras, as seguintes considerações:
>>> A maneira mais fulminante, embora insidiosa de acabar com ele de vez, coisa que até agora não conseguiram, por existir muito forte um desejo de filmar, uma diferente forma de ver o mundo, e de o ouvir, e personalidades que o defendiam, com a própria vida se fosse o caso, como o faria João César Monteiro, o Manoel de Oliveira, e outros, o golpe fulminante está a acontecer perante os nossos olhos. Filmes só para quem eles querem, de preferência sem realizador, em inglês ou num linguajar televisivo-publicitário audiovisual. Produtores que são uma espécie de Zanuks da Picheleira, malandros que aprenderam os truques para vender um “produto” para o mercado à conquista da tal indústria que atrás do nevoeiro é paga pelo contribuinte, esse sim cada vez mais estúpido, graças a Deus e à ausência de crítica. <<<
>>> A maneira mais fulminante, embora insidiosa de acabar com ele de vez, coisa que até agora não conseguiram, por existir muito forte um desejo de filmar, uma diferente forma de ver o mundo, e de o ouvir, e personalidades que o defendiam, com a própria vida se fosse o caso, como o faria João César Monteiro, o Manoel de Oliveira, e outros, o golpe fulminante está a acontecer perante os nossos olhos. Filmes só para quem eles querem, de preferência sem realizador, em inglês ou num linguajar televisivo-publicitário audiovisual. Produtores que são uma espécie de Zanuks da Picheleira, malandros que aprenderam os truques para vender um “produto” para o mercado à conquista da tal indústria que atrás do nevoeiro é paga pelo contribuinte, esse sim cada vez mais estúpido, graças a Deus e à ausência de crítica. <<<
Esta é a maneira mais ingénua de não discutir coisa nenhuma e, sobretudo, de tentar caracterizar os problemas do cinema português em função dos outros. Na prática, não se sai do clima de frases mais ou menos agressivas que caracteriza o modelo televisivo (dominante) de discussão de ideias.
Aliás, sintomaticamente (e exactamente como eu previ no texto que se pode ler, acima, no segundo link), tudo é explicado, em última instância, pelo papel nefasto da crítica — ou, pelo menos, por alguém que se escolhe como alvo. Leia-se:
>>> E ainda o inenarrável João Lopes agora armado em virgem púdica e luminária, grande educador da classe cinematográfica, ele que foi provavelmente o primeiro a trabalhar neste logro, que esmagou o que pôde de tudo o que lhe parecia para além dele próprio, e sobretudo o que fosse frágil e indefeso. O que o Cinema em Portugal sempre foi, frágil, e singular, agora, não tem nem quem o faça nem quem o defenda. Porque agora eles podem. <<<
Os insultos têm sempre este problema ontológico: não ajudam a compreender as ideias do insultado e possuem um cruel efeito revelador sobre o discurso do insultador.
De facto, nunca fui entusiasta do trabalho cinematográfico de Margarida Gil e, como qualquer interessado pode verificar, sempre exprimi os meus pontos de vista sobre os seus filmes sem qualquer fulanização (muito menos qualquer insulto). Como é óbvio, Margarida Gil apenas me odeia — e isso impede-a de ver seja o que for à volta do seu próprio ódio. Tudo bem, não sou eu que vou sequer tentar contrariar o seu direito ao ódio.
De facto, nunca fui entusiasta do trabalho cinematográfico de Margarida Gil e, como qualquer interessado pode verificar, sempre exprimi os meus pontos de vista sobre os seus filmes sem qualquer fulanização (muito menos qualquer insulto). Como é óbvio, Margarida Gil apenas me odeia — e isso impede-a de ver seja o que for à volta do seu próprio ódio. Tudo bem, não sou eu que vou sequer tentar contrariar o seu direito ao ódio.
O que é espantoso — e espantosamente banal — é que Margarida Gil faça supor que a eventual consideração dos seus filmes como uma colecção de obras-primas (por mim ou por qualquer outro profissional da crítica de cinema) teria sido uma contribuição decisiva para ajudar a resolver os problemas estruturais e financeiros da produção cinematográfica em Portugal.
Aliás, a sua ingenuidade é tal que nem sequer se apercebe que o uso deste tipo de discurso num espaço que, para todos os efeitos, pertence a uma das mais importantes associações de realizadores do nosso país está a reduzir drasticamente o próprio espaço de intervenção dessa associação.
Por mim, como sempre, continuo a defender o direito de filmar para alguém como Margarida Gil. Mesmo com filmes péssimos. Tenho consciência das profundas limitações — políticas, práticas e simbólicas — da minha intervenção pública. Mas já é tarde para desistir.
Por mim, como sempre, continuo a defender o direito de filmar para alguém como Margarida Gil. Mesmo com filmes péssimos. Tenho consciência das profundas limitações — políticas, práticas e simbólicas — da minha intervenção pública. Mas já é tarde para desistir.