segunda-feira, junho 30, 2008

Jolie, Angelina

>>> Detectamos a sua presença não pelo seu rosto, que ele sabe obscurecer ou tornar vulgar como só as celebridades sabem, mas pelo modo como reagem as pessoas à sua volta — os círculos na água. Apresenta-se com uma estranha dignidade, como se fosse emissária de uma ordem secreta, mensageira de um reino perdido.<<<
São palavras de Rich Cohen, na sua entrevista a Angelina Jolie, publicada na Vanity Fair com data de Julho — chama-se 'A woman in full'. Com fotografias de Michael Roberts, reminiscentes do glamour clássico de Hollywood, trata-se de uma viagem através da própria condição de estrela e de todos os elementos que excedem o seu estatuto mítico: dos conflitos com o pai (Jon Voight) à vida de casados (sem casamento) com Brad Pitt, da gravidez ao trabalho humanitário, do filme do Oscar em 2000 — Girl, Interrupted/Vida Interrompida, de James Mangold — ao recentíssimo papel no blockbuster Wanted [trailer aqui em baixo]. É um retrato exemplar de uma vedeta exemplar, não confundindo a fama com a cedência à mediocridade jornalística. Diz ela (quando Cohen lhe pergunta se procura os tablóides para ler histórias de outras estrelas): "Nunca faria tal coisa. Estaria a ler sobre alguns bons amigos e nem sequer quero isso na minha cabeça... uma fábula invertida sobre pessoas de que gosto. Não quero pensar nisso. Devo-lhes isso, não prestar atenção. Sei que não é verdade. Mais de 95 por cento do que se diz sobre nós é totalmente falso."

Camané: no interior do fado

Não é todos os dias que um álbum português de música (ou de música portuguesa) surge com uma edição especial que inclui um making of das próprias gravações. Assim acontece com Sempre de Mim, de Camané, que, por assim dizer, se completa através de um DVD que inclui As Gravações de Sempre de Mim, filme de 30 minutos assinado por Bruno de Almeida.
Bruno de Almeida — que também o realizou o teledisco de Sei de um Rio [aqui em baixo] — instala-se no estúdios da Valentim de Carvalho, em Paço d'Arcos, não tanto para fazer uma "reportagem", mas sim para sentir o trabalho interior da música. Na sua relação com o produtor José Mário Branco, descobrimos a singular energia criativa de Camané, sempre na fascinante corda bamba entre uma fragilidade exposta e uma obstinada procura de rigor. Se Sempre de Mim é um momento emblemático para pensarmos o(s) futuro(s) do fado, o filme que o acompanha permite pressentir as encruzilhadas desse trabalho em que a verdade da tradição se combina com as peculiaridades do nosso presente.

A agonia da imprensa desportiva

Não dá para acreditar!!!...
... Mas é um facto absolutamente chocante: estas são as primeiras páginas de hoje, dia 30 de Junho de 2008, dos três principais diários desportivos portugueses. Já sabíamos que, depois da histe-ria "patriótica" em torno da selecção portuguesa, a imprensa despor-tiva reduzira o Euro 2008 a um acontecimento irrelevante — basta recordar o que tinha acontecido ontem. Seja como for, ninguém poderia imaginar que a indiferença chegasse a este ponto: três modestíssimas chamadas de capa para aquele que é o maior evento futebolístico do continente europeu e, objectivamente, o segundo maior do mundo. Veja-se, por contraste, o que faz um jornal de referência no mundo do jornalismo desportivo, para mais de um país (França) cuja selecção nem sequer foi além da fase de grupos.

Assim vai agonizando um espaço fundamental, não apenas do jornalismo, mas da cultura popular — a imprensa desportiva —, transformando os seus leitores em corretores imaginários dos negócios dos empresários do futebol... E não se julgue que se trata de "hierarquizar" jornais e jornalistas entre "sérios" e "fúteis", muito menos de julgar as competências seja de quem for. Trata-se, isso sim, de perguntar o que pensa a classe jornalística desta perda dos mais simples, e também mais nobres, valores editoriais.
Acima de tudo: o que pensam os jornalistas desportivos quando, através de inequívocas escolhas escritas e iconográficas, vêm dizer aos seus leitores, sem qualquer ambiguidade, que o Euro foi coisa sem importância... Ironicamente (mas é uma ironia que magoa), foram os outros jornais a prestar o mais básico serviço público, dando ao jogo da final o destaque que se impunha.

[SUGESTÃO: clickar nas imagens para ver melhor os títulos].

Tom Waits entrevista Tom Waits

A pretexto da sua recente passagem por Edimburgo, o jornal britânico The Independent solicitou uma entrevista a Tom Waits. Assim se fez, com o pormenor não exactamente secundário de ser uma... auto-entrevista. Artistas que moldaram a sua vida criativa? Kerouac, Dylan, John Ford, Weegee, Jagger... Que está errado com o mundo? Estamos enterrados sob o peso da informação, confundindo-o com conhecimento. Coisas notáveis encontradas em lugares inesperados? O sítio com mais lojas de presentes: Fátima, Portugal. Enfim, não dá mesmo para resumir... É um exercício de encenação, exuberante e exuberantemente paradoxal, porque muito confessional — vale mesmo a pena ler.

"Woodstock negro"

Wattstax é o nome por que ficou conhecido um festival de música afro-americana realizado a 20 de Agosto de 1972, no Los Angeles Coliseum. Com a participação de Richard Pryor, Isaac Hayes, Rufus Thomas, Carla Thomas e The Staple Singers, entre muitos outros, o evento acabou por entrar na história como um "Woodstock negro", evocando as memórias dramáticas da agitação social que tinha varrido a zona de Watts, L.A., sete anos antes. Sobre o festival existia um filme — Wattstax (1973) — dirigido por Mel Stuart. Agora, surge esta especialíssima edição da banda sonora, numa caixa com três CDs. São momentos exuberantes de uma genuína celebração colectiva.
O trailer que aqui se reproduz é de 2003 e diz respeito ao relança-mento do filme, comemorando o 30º aniversário da sua estreia.

domingo, junho 29, 2008

Jakob Dylan em tom intimista

Uma excelente oportunidade de escutar, ao vivo, várias canções do primeiro álbum a solo de Jakob Dylan, Seeing Things. Trata-se de um concerto gravado no passado dia 31 de Maio, em Filadélfia, no âmbito da NON-COMMvention, promovida pela rádido da Universidade da Pensilvânia, WXPN — são cerca de 40 minutos em ambiente de contagiante initimismo.

Vergílio Ferreira inédito

>>> Évora, 16 de Dezembro [de 1948] — De-pois de treze anos, voltaram. Eu tinha ido, na bagagem da sua memória, um jovem magrizela, rabugento. Agora eu estava ali, não bem um homem talvez, mas decerto um rapaz diferente. Meus pais olharam-me várias vezes, chorando provavelmente na desgraça de perderem o filho antigo e de terem de aceitar um filho novo. Por mais que se tente, não há literatura que ponha de pé esse trágico instante do choque entre a imobilidade do desejo e da recordação e o imparável fluir da realidade.<<<

Um grande acontecimento literário: o início da publicação dos inéditos de Vergílio Ferreira (1916-1997), precisamente com Diário Inédito 1944-1949 (Bertrand Editora), organizado e anotado por Fernanda Irene Fonseca. Pelo seu carácter fragmentário, mas obstinado, este é um exercício de escrita que antecipa muitas caracteríticas dos volumes de Conta-Corrente. Além do mais, pelas circunstâncias peculiares da vida do autor — o casamento, o trabalho como professor, o desencanto face ao Portugal do pós-guerra —, encontramos também aqui os ecos de um tempo de profunda reflexão e transformação pessoal. Nesta perspectiva, é particu-larmente interessante perceber como a leitura de vários filósofos, sobretudo Jean-Paul Sartre, vai moldando a personalidade de um dos maiores escritores portugueses do século XX.
A ter em conta que este é apenas o primeiro sinal de uma (re)descoberta de Vergílio Ferreira, uma vez que, como refere Hélder Godinho na apresentação do volume, "o espólio, além deste diário, contém romances inéditos, ensaios ou fragmentos de ensaios ou de romances (de que destacaria uma primeira versão, quase completa, de Alegria Breve), peças de teatro, notas de toda a espécie e os inevitáveis poemas, alguns dos quais inéditos e outros dispersos por obras inéditas diversas."

>>> Vergílio Ferreira no site do Instituto Camões.
>>> Blog da Biblioteca Municipal Vergílio Ferreira (Gouveia).

O Euro 2008 nunca existiu

Assim vai o mundo do desporto... É bem verdade que hoje é o dia da final do Euro 2008 — por mero acaso a segunda maior competição planetária do futebol —, mas não parece que as manchetes dos jornais desportivos portugueses o considerem como pouco mais do que um microscópico incidente. Daí que importe perguntar: depois da histeria "patriótica", que resta?... Nada — um imenso buraco negro em que o simples gosto do futebol não tem lugar.

Cascatas em Nova Iorque

Quem passar por Nova Iorque este Verão tem mais um motivo de interesse. O dinamarquês Olafur Eliasson criou quatro cascatas artificiais, neste momento em exposição em pleno East River. Uma delas, como mostra a imagem, dá outra vida à mítica Brooklyn Bridge.

A arte de comunicar

Uma das mais bem sucedidas compositoras de todos os tempos, a norte-americana Joan Tower (n. 1938) tem uma longa carreira que tem conciliado o ensino da música com o trabalho criativo, com várias residências já assinadas em orquestras e centros (neste momento estando ligada à Chamber Music Society do Lincoln Center). Em 2001 foi desafiada por um fundo de apoio a 65 pequenas orquestras norte-americanas (financiado pela Ford) a criar uma obra que todos esses músicos pudessem tomar como sua e apresentar pelas salas de concerto de todo o país. Assim nasce Made In America, um assombroso exemplo de capacidade de comunicação através da música e, acima de tudo, raro exemplo de adaptação da forma à função e seus executantes por parte de um compositor. Ciente do desnível de preparação que encontraria entre os muitos músicos destas 65 orquestras, sabendo entre eles haver muitos amadores com horas de trabalho antes das noites de ensaio, e não menos atenta à diversidade de públicos para quem esta obra seria dirigida, Joan Tower criou uma peça concisa, claramente americana na identidade (com o hino “não oficial” America The Beautiful como inspiração) e inevitavelmente cativante. Made In America é um interessante exemplo da vontade de comunicação do compositor com quem o interpreta e quem o escuta. Traduz contemporaneidade, sugere o contexto e, acima de tudo, cumpre a missão de servir espaços adiante dos circuitos mais restritos e fechados nos quais muita da produção é pensada, estreada e, frequentemente, arrumada. Uma atitude quase pop, que em nada afasta a autora da sua linguagem, viva, plena de interesse pelo ritmo, como se verifica nas duas outras peças integradas neste disco: Tambor (de 1998) e Concerto Para Orquestra (1991). O disco representa ainda mais uma manifestação do fundo de apoio à música criado pela mesma companhia que desafiou a criação da obra que aqui, pela Sinfónica de Nashville (uma das 65 orquestras deste programa), conhece primeira gravação.

Um talento precoce?

Em 2002, quando editou o seu primeiro romance, o norte-americano Nick McDonell tinha apenas 17 anos. Doze (no original Twelve) revelava histórias de violência e consumo de drogas vividas entre adolescentes nova iorquinos, filhos de famílias endinheiradas. Doze foi um sucesso editorial nos Estados Unidos e conheceu depois tradução e lançamento em mais de vinte países. Fizeram-se comparações a Brett Easton Ellis. E elogios ao ritmo e intensidade da narrativa. Nick McDonell era um "novo talento". Restava saber se era hype, fenómeno de um livro só. Ou se em Doze tinha encontrado primeiro capítulo de uma carreira na escrita...

O Terceiro Irmão surgiu em 2005, três anos depois de Doze. Tal como no primeiro romance, o livro sugere traços de afinidade do autor para com os cenários que acolhem a narrativa e os ambientes que recebem as personagens que cria. Construído por pequenos capítulos, definindo o rumo dos acontecimentos pela soma ordenada de fragmentos de acções, pensamentos ou memórias, O Terceiro Irmão divide palcos essencialmente entre Banguecoque (na Tailândia) e Nova Iorque. A vivência asiática, que em parte pode ser fruto de um estágio do autor na Time Asia durante o seu segundo ano em Harvard, define a primeira parte da história. O protagonista Mike é, não muito longe da experiência pessoal Nick McDonell, um jovem jornalista, de 19 anos, a cumprir um estágio em Hong Kong e estudante universitário. Enviado para acompanhar um sénior num trabalho em Banguecoque vê-se imerso num submundo que o força a repensar o seu universo pessoal. A segunda parte do livro transporta-nos para o caos da baixa de Manhattan no dia 11 de Setembro de 2001. O horror do ataque às Torres Gémeas partilha as preocupações do protagonista com os fantasmas que atormentam o irmão mais velho, Lyle, um dos quais não sendo mais que um "terceiro irmão" que, na verdade, não existe. Mas tal como o World Trade Center, a família de Mike é, no fim do dia, um destroço...

Contra o entusiasmo que acolheu Doze, o segundo romance de Nick McDonell dividiu opiniões. Os elogios de uns contrastam com as palavras mais cautelosas de outros. De facto, se a estrutura fragmentada da escrita e a evolução da narrativa em curtos capítulos revelam um gosto pela definição de um ritmo cativante de leitura em tudo fiel à lógica dos tempos em que vivemos, por outro O Terceiro Irmão acaba por transpirar um caso de mais olhos que barriga. A ligação entre as três partes é frágil. E dosear de protagonismos entre figuras e cenários da acção acaba por retirar algum peso ao “terceiro irmão” que dá título ao livro. Mais uma vez vale a pena reflectir sobre se um comportamento precoce é necessariamente indicador de talento futuro. E sobre as consequências do sucesso demasiado rápido.
PS. Versão editada e acrescentada de um texto publicado no DN a 16 de Junho

Obama: uma fotografia apenas

É, por certo, uma capa histórica — desde logo, repare-se, por uma espécie de suspensão da palavra: a fotografia de Barack Obama arrasta todos os sentidos da mensagem; não há títulos, apenas o logotipo da própria revista. Ao mesmo tempo, a Rolling Stone con-firma, assim, um dado vital das eleições presidenciais americanas de 4 de Novembro. A saber: que, para além, de "simpatias" ou "tendências", muitos órgãos de informação vão assumir, sem ambiguidades, o sentido político das suas escolhas editoriais. O dossier da Rolling Stone vai das prioridades de Obama como Presidente ao voto da juventude, passando pela música que está no seu iPod.
Aqui em baixo, podemos ver um outro exemplo da ressonância da candidatura de Obama na comunidade artística americana — tele-disco da canção We Are the Ones, por Will.i.am (que já compusera Yes We Can).

sábado, junho 28, 2008

Música para os 90 anos de Mandela

Hyde Park, Londres, 27 de Junho de 2008 — a fundação 46664, criada por Nelson Mandela para combater a epidemia da sida, particularmente grave em alguns países de África, promoveu um mega-concerto para divulgar as suas actividades, angariar fundos e também assinalar o 90º aniversário de Mandela (que se comemora a 18 de Julho). Perante uma assistência de 50 mil pessoas — e muitos milhões através da televisão — cantaram, entre outros, Annie Lennox, Leona Lewis, Sipho Mabuse, Queen + Paul Rogers, Razorlight, Amy Winehouse e o Coro Gospel do Soweto. No final, Winehouse interpretou Free Nelson Mandela, com Jerry Dammers (autor da canção) e, depois, acompanhada por todas as vozes do espectáculo. Foi um momento vibrante [aqui em baixo] de um espectáculo inesquecível.

Sob o signo de Annie Leibovitz

Demi Moore, Mikhail Baryshnikov, Julia Roberts, Tom Cruise, Angelina Jolie [foto] ou o Presidente Georges W. Bush são apenas algumas das personalidades que podemos encontrar no gigantesco portfolio de Annie Leibovitz — este texto foi publicado no Diário de Notícias (27 Junho), com o título 'Sog o signo de Leibovitz'.

Tem sempre qualquer coisa de desconcertante encontrar na tele-visão referências ao mundo da fotografia. Quanto mais não seja porque a informação televisiva, estonteada pelo seu pró-prio “movimento”, quase só utiliza as imagens fotográficas como uma espécie de lapso: a câmara (televisiva) não estava lá... Foi, por isso, um prazer muito especial poder ver na madrugada do dia 21 (RTP2) um documentário sobre Annie Leibovitz, fotógrafa que, desde os tempos heróicos da revista Rolling Stone até à sua actual ligação com a Vanity Fair, tem construído uma obra fascinante em que as noções de reportagem e artifício parecem coexistir e até, por vezes, complementar-se em termos criativos.
Produzido pela PBS americana em 2006, com realização da irmã de Annie, Barbara Leibovitz, Annie Leibovitz: Life Through a Lens segue um dispositivo tradicional, combinando uma entrevista central com depoimentos de personalidades e mate-riais de arquivo. Se o seu efeito supera qualquer pendor académico, isso resulta, não apenas da evidente cumplicidade que existe entre as duas irmãs, mas também do facto de o filme ter sido rodado sob o efeito da publicação do livro A Photographer’s Life: 1990-2005, verdadeiro objecto confes-sional em que, pela primeira vez, Leibovitz se dá a ver com a sua família e, em particular, na sua relação com Susan Sontag (1933-2004).
A travessia de um universo como o de Leibovitz é tanto mais estimulante quanto ela foi (e continua a ser) uma das mais brilhantes retratistas de famosíssimas personalidades, em particular da música e do cinema, sem nunca ceder a qualquer simplificação “voyeurista”, muito menos moralista. Entre os muitos momentos marcantes da sua carreira está a lendária fotografia de John Lennon, nu, abraçado a Yoko Ono, imagem que serviria de capa à Rolling Stone publicada logo após o assassinato de Lennon (a 8 de Dezembro de 1980). A evocação, por Yoko Ono, da respectiva sessão fotográfica foi um dos momentos mais intensos, e também mais pudicos, deste documentário capaz de nos ensinar a respeitar as imagens.

O renascimento pop dos Sparks

Mais uma evocação de memórias dos 38 anos de vida dos Sparks, hoje recordando um entre os seus vários episódios de “renascimento” criativo. Em 1994, seis anos depois do ignorado Interior Design, os irmãos Mael resolviam da melhor forma a longa ausência com um álbum que recuperava a sua relação com as electrónicas de No.1 Song In Heaven, de 1979, mantendo firme a identidade pop das suas composições. Um dos melhores álbuns da obra dos Sparks, Gratuitous Sax & Sensekess Violins inscreveu na sua discografia mais um tema clássico. É este When Do I Get To Sing “My Way”, com clara referência a Frank Sinatra. Aqui fica o teledisco.

sexta-feira, junho 27, 2008

Na esplanada da Cinemateca

Com o mês de Julho, regressam à Cinemateca as sessões noturnas ao ar livre. Este ano as 'Noites na esplanada' têm como tema as pin-ups do cinema, com especial incidência nas décadas emblemáticas de 1940/50. Assim, será possível ver ou rever ícones como Betty Grable (The Pin-up Girl), Jean Harlow (Platinum Blonde) ou Veronika Lake (The Blue Dahlia — cartaz). Todas as sessões começam às 22h30 — para ver o calendário do ciclo e a restante programação de Julho, consultar o site da Cinemateca.

Filme sobre Glass no DocLisboa

A edição 2008 do DocLisboa, que decorre de 16 a 26 de Outubro, foi ontem anunciada. Entre as grandes novidades contam-se duas secções novas. Heartbeat, dedicada à música, apresentará, entre outros filmes, Philip Glass: A Portrait In 12 Parts, de Scott Hicks (na foto). Novas Famílias Novas Identidades é a outra secção nova, centrada em retratos da evolução dos costumes. Entre os títulos de destaque na competição conta-se Standard Operating Procedure, filme de Errol Morris sobre Abu Grahib, que venceu o Urso de Prata, este ano, em Berlim. Sérgio Tréfaut é o director do festival.

Ao serviço de James Bond

Discografia Duran Duran - 21
'A View To A Kill' (single), 1985

A última gravação da formação original dos Duran Duran antes da sua reunião em 2001 representou não só um dos seus maiores êxitos mas, também, um dos mais sólidos clássicos da sua obra. A história da canção começou quando, uma noite, e sem grande diplomacia numa primeira abordagem, o baixista John Taylor, grande admirador de James Bond, perguntou ao produtor Cubby Briccoli, responsável pelos filmes, quando poderia ele ver alguém “decente” a compor para o espião 007... Os mais recentes filmes, com canções de vozes como Rita Coolidge, Shirley Bassey (em terceira colaboração Bond em Moonraker) e Sheena Easton (menos mal que as demais) tinham revelado canções muito aquém do filão que outrora gerara clássicos como Goldfinger (da já citada Shirley Bassey), You Only Live Twice (Nancy Sinatra) ou The Man With The Golden Gun (Lulu)... A conversa deu fruto e, pouco depois, os Duran Duran eram convidados a assinar o tema para o novo filme, A View To A Kill. Foram apresentados a John Barry, autor da banda sonora, com quem trabalharam em conjunto na composição e de quem receberam, depois, sumptuoso arranjo de cordas. O single foi editado em Maio, e rapidamente subiu aos primeiros lugares das tabelas mundiais, atingindo o número um em países como os EUA, Canadá, Itália ou Suécia. A View To A Kill é, ainda hoje, o único single de uma canção para James Bond a ter atingido o número um nos EUA. No lado B surge A View To A Kill (That Fatal Kiss), um arranjo orquestral da canção, igualmente presente na banda sonora do filme. A View To A Kill foi um dos quatro temas que o grupo apresentou na sua participação no Live Aid, em Julho desse ano. Esse momento representou a última actuação da formação original do grupo antes do já referido reencontro em 2001.



O teledisco de A View To A Kill assegurou o reencontro do grupo com a dupla Goldley & Creme, que quatro anos antes havia assinado o polémico vídeo de Girls On Film. O grupo surge em situações encenadas na Torre Eiffel, cenário de uma das sequências de acção do filme. A montagem cruza as imagens dos cinco Duran Duran com a perseguição de Roger Moore a Grace Jones, como se todos os acontecimentos estivessem a decorrer em simultâneo, no mesmo lugar.

quinta-feira, junho 26, 2008

"Speed Racer": um clássico do futuro

De onde vem a sedução da imagem? Da harmonia entre uma presença humana (o actor Emile Hirsch) e um contexto virtual. Que é como quem diz: afinal, é mesmo possível!... O que é que é possível? Pois bem, manter uma relação criativa com os mais diversos universos visuais — banda desenhada, desenhos animados e, last but not least, jogos de video —, mas sem abdicar das especificidades do cinema-cinema. A prova aí está: Larry e Andy Wachowski, os irmãos da trilogia Matrix, adaptam a "manga" japonesa Speed Racer para criar um objecto que é, de uma só vez, uma aventura de redenção à boa maneira clássica e um exercício futurista de espectáculo, transfigurando as lógicas tradicionais do tempo e do espaço, do enquadramento e do plano. Tudo como se o cinema renascesse com o espírito de uma arte genuinamente infantil.
>>> Site oficial do filme.
>>> John Gaeta e os efeitos especiais de Speed Racer, no VRMag.
>>> Site oficial da BD [imagens aqui por baixo] e da série de televisão.

Inspirada nas personagens originais, criadas por um dos pioneiros do anime, o japonês Tatsuo Yoshida (1933-1977), a série de animação americana Speed Racer, também conhecida como Mach Go Go Go, surgiu em 1967 — era este o genérico de abertura.

Os americanos de Robert Frank

Eis uma foto que remete para uma idade da televisão que já não é a nossa — uma quase pré-história do audiovisual... É uma das imagens de um dos mais importantes livros da história da fotografia: The Americans (1958), de Robert Frank, com prefácio de Jack Kerouac: com ele, Frank criou um espelho capaz de contornar todos os clichés, nacionais ou pitorescos, propondo 83 fotos que, em última instância, geraram um verdadeiro clássico da cultura americana. Para comemorar o 50º aniversário do livro, acaba de sair uma nova edição, coordenada pelo autor e com chancela da Steidl, em colaboração com a National Gallery of Art (onde está prevista uma exposição de celebração de The Americans, em 2009).

Visões e sensações

O segundo álbum da dupla de Bristol Fuck Buttons acaba de conhecer edição nacional. Street Horrrsing vinca uma atitude experimental cativante, cruzando o disco caminhos para lá das fronteiras das formas mais canónicas da tradição pop/rock, não perdendo de vistas heranças colhidas no psicadelismo ou em genéticas tribais e usando a repetição como o mais frequente recurso de estilo. Aqui fica o teledisco de Bright Tomorrow, um dos temas do álbum.

'Joy Division' estreia a 17 de Julho

Já tem data de estreia marcada para salas portuguesas o documentário Joy Division, filme realizado por Grant Gee (o mesmo de Meeting People Is Easy, sobre os Radiohead). O filme, com distribuição da Midas Filmes, estreia a 17 de Julho em Portugal.

E os melhores discos de Maio foram...

... Santogold, o primeiro álbum de Santogold. E, no departamento nacional, Para Todo o Mal, o terceiro dos Mesa. A votação dos leitores do Spound + Vision destacou ainda o álbum In Ghost Colours, o segundo dos australianos Cut Copy que, brevemente, terá lançamento e distribuição nacional. Nota ainda para as boas classificações obtidas pelos mais recentes discos de Martha Wainwright e Jamie Lidell. E, apesar dos “magros” dois por cento da votação final, não deixa de ser curioso verificar que há quem esteja atento a um dos álbuns mais injustamente ignorados do ano: o disco de estreia, em nome próprio, de Scott Matthew, voz criativa que muitos descobriram há cerca de um ano na banda sonora do filme Shortbus, de John Cameron Mitchell. Seguem-se as votações finais:

INTERNACIONAL:
1º. Santogold “Santogold” - 31%
2º. Cut Copy “In Ghost Colours” - 21%
3º. Martha Wainwright “I Know You’re Married But I’ve Got Feelings Too” - 12%
4º. Jamie Lidell “Jim” - 10%
5º. M83 “Saturdays = Youth” - 7%
....Robert Forster “The Evangelist” - 7%
....Tindersticks “The Hungry Saw” - 7%
8º. Scarlett Johansson “Anywhere I Lay My Head” (*) - 6%
9º. The Whip “X Marks Destination” - 6%
10º.Scott Matthew “Scott Matthew” - 2%

NACIONAL:
1º. Mesa “Para Todo o Mal” - 55%
2º. NBC “Maturidade” - 35%
3º. Rocky Marsisno “Outside The Pyramid” - 10%

(*) Apesar da igualdade no arredondamento, Scarlett Johansson teve mais um voto que os The Whip

quarta-feira, junho 25, 2008

De Hollywood para... Bollywood?

Estará Steven Spielberg a caminho de Bollywood?... Não, não há nenhuma letra errada: é mesmo Bollywood. De facto, o mago de Hollywood poderá estar a traçar um novo caminho que, pelo menos em termos financeiros, o vai fazer passar também pela indústria cinematográfica da Índia.
A situação decorre de uma conjuntura já aqui referida: descontente com a sua integração na Paramount, Spielberg está a tentar refazer a sua própria independência, ou melhor, a DreamWorks quer recuperar a sua autonomia como estúdio independente. Para o conseguir, necessita de um valor que, inicialmente, foi referido como oscilando entre 500 e mil milhões de dólares. Na verdade, a sua aposta cifra-se agora em 2 mil milhões (cerca de 1280 milhões de euros ou, em escudos, 256 milhões de contos) — e uma fonte essencial de financiamento poderá ser um dos mais fortes grupos indianos, a Reliance Entertainment.
Embora se saiba muito pouco sobre as negociações em cur-so (que também envolvem um outro estúdio americano: Universal Pictures), a sua simples existência confirma o interesse, já manifestado no último Festival de Cannes, da Reliance em investir na produção cinemato-gráfica americana — interesse, aliás, também provado pelas negociações em curso com as empresas produtoras de Jim Carrey, George Clooney e Brad Pitt, entre outros.
Aconteça o que acontecer, este poderá ser um movimento vital para a carreira — como realizador e produtor — do cineasta ligado a fenómenos de culto como E.T. [foto] ou as sagas de "Indiana Jones" e "Parque Jurássico". Uma coisa é certa: a globalização é, mais do que nunca, um factor operante no cinema e em todas as áreas do entertainment que com ele se cruzam.

Ry Cooder em tom "retro-futurista"

Bela capa! Esta é a conclusão de uma trilogia cujos primeiros capítulos são Chavez Ravine (2005) e My Name Is Buddy (2007) — com o álbum I, Flathead, Ry Cooder assume-se como a "encarnação" de um músico de ficção, Kash Buk, acompanhado pela sua banda The Klowns. Não por acaso, o título evoca o I, Robot, de Isaac Asimov: é que Kash Buk mantém sólidas relações de amizade com um alien de nome Shakey, em cenários de uma Califórnia insólita, de ficção científica, embora conservando sinais de uma nostalgia muito retro... Vem tudo contado numa novela de 95 páginas, escrita pelo próprio Ry Cooder e incluída na edição especial do álbum. Entretanto, no site da editora Nonesuch, podemos escutar três magníficas canções de I, Flathead, revelando uma miscelânea de sonoridades (incluindo, aqui e ali, um requebro mexicano) típica da démarche criativa de Ry Cooder.

Vieram do outro mundo...

Quem são os Zombie Zombie? São Etienne Jaumet e Cosmic Neman, uma dupla parisiense, com gostos que passam por referências que vão dos Silver Apples a Raymond Scott, de Sonic Boom a Steve Reich, dos Can aos Suicide, dos Neu a Laurie Anderson. Isto sem esquecer John Carpenter (o realizador, frequentemente autor das bandas sonoras dos seus próprios filmes). Os Zombie Zombie acabam de editar o álbum A Land For Renegades, onde mostram como as heranças formais do psicadelismo se podem entender com genéticas da música electrónica... Como aperitivo fica o vídeo não oficial para Driving This Road realizado por Simon Gesrel and Xavier Ehretsmann, usando a sua colecção de bonecos e evidentes referências ao clássico The Thing (Veio do Outro Mundo) de John Carpenter…

Para andar às voltas sem sair do lugar

Foi ontem apresentado em Nova Iorque o primeiro projecto para um edifício giratório. Concebida pelo italiano David Fisher, a primeira Torre Rotativa vai ser construída no Dubai, a segunda em Moscovo. As torres terão 80 andares, cada qual construído em separado em fábrica. Cada andar contém 12 unidades, inteligadas e, em conjunto, cada piso roda sobre os andares adjacentes, podendo o prédio mudar constantemente de forma. Dispositivos entre os andares giratórios garantirão a produção de energia eléctrica que deverá fazer estas torres ser energeticamente auto-suficientes.

Novo disco dos Pop Dell'Arte

Um novo disco dos Pop Dell’Arte está em preparação. O grupo deverá, de resto, apresentar alguns temas novos no concerto marcado para a noite deste próximo sábado, na ZDB. O mais recente álbum do grupo, Sex Symbol, data já de 1995. Depois deste disco lançaram apenas o EP So Goodnight (2002) e a antologia (com dois temas inéditos) POPlastick.

terça-feira, junho 24, 2008

Uma pérola esquecida

Manda a história “canónica” da música pop que se aponte Pet Sounds como a “obra-prima” dos Beach Boys. Nada contra... Manda a memória que se não esqueça também, esse outro monumento, concebido logo de seguida, mas editado apenas na forma de single, sob o título Good Vibrations. E, cortesia das antologias de “êxitos” e das listas de recuerdos mais frequentes no FM, igualmente viva parece estar a memória da banda nos primeiros dias de 60, os hinos de praia e surf dos seus primeiros discos. A grande verdade é que, muita da discografia dos Beach Boys continua a ser para muitos uma ilustre desconhecida. E na qual se escondem pérolas maiores da história pop rock como é o caso de Friends, álbum de 1968 editado faz hoje, precisamente, 40 anos, a 24 de Junho de 1968.
Friends assinalou o regresso da banda ao estúdio após o conturbado colapso desse sonho interrompido que se chamou Smile, disco abandonado a meio, e entretanto transformado em Smiley Smile e no imediatamente seu sucessor, Wild Honey, ambos em 1967. Friends representou o último momento de protagonismo de Brian Wilson nos Beach Boys até meados de 70 e a sua presença é bem evidente num disco curto, feito de visões pop, de certa maneira seguindo algumas das sugestões de Pet Sounds. Talvez o segundo melhor álbum da longa discografia dos Beach Boys, Friends acabou, por razões várias, um dos mais injustamente ignorados discos da sua obra e, na tabela de vendas norte-americana não subiu além do número 128!... 1968 foi um ano agitado, dos conflitos nas ruas de Paris aos protestos contra a guerra no Vietname. Sem esquecer as mortes de Luther King e de Robert Kennedy... Friends, apolítico, tranquilo, com marcas pontuais do envolvimento do grupo com a meditação transcendental, era a banda sonora oposta ao rumo dos acontecimentos. E como se o contexto de época não bastasse, a história pessoal do último ano na carreira dos Beach Boys em nada contribuiu para o benefício da dúvida de um público que, entretanto, caminhara rumo a outros heróis... Friends é um disco curto, elegante, pacífico. O tempo deu-lhe atenção e hoje, mesmo mal amado pelas dietas que reduzem a história da pop a uma soma de sucessos, é reconhecido como um dos mais importantes álbuns dos Beach Boys.



Este é o filme promocional que, na época, acompanhou o lançamento de Friends, tema-título do álbum e único single dele então extraído. O arranjo vocal não deixa dúvidas sobre a presença protagonista de Brian Wilson em estúdio. Apesar dos maus resultados obtidos pelo álbum, o single ainda subiu ao número 47 nos Estados Unidos. Fraco, todavia, para quem anos antes mal saia do top 10

Os bons selvagens

Vêm de Leeds, na Escócia, chamam-se Wild Beasts e propõem no seu álbum de estreia, Limbo Panto, uma pop eloquente, dominada por uma voz invulgar. Aqui fica um cartão de visita, na forma do teledisco de The Devil’s Crayon.

Auto-edição, parte 765

Os The Shins são mais um nome a acrescentar à multidão crescente de bandas que resolveram tomar os seus destinos nas suas próprias mãos. O seu quarto álbum, ainda sem data anunciada, será distribuído pela Sub Pop. Mas a edição caberá aos The Shins.

François Bégaudeau: ressacas do futebol

François Bégaudeau [foto] é professor, actor do filme Entre les Murs (Palma de Ouro em Cannes), aliás inspirado num livro de sua autoria, e cronista de futebol no jornal de Le Monde: também no seu país, faz sentido perguntar o que é, e como funciona, o chauvinismo futebolístico — este texto foi publicado no Diário de Notícias (22 Junho), com o título 'Entre futebol e patriotismo'.

Recordo-me de, há mais de vinte anos, como colaborador do semanário Expresso, escrever regularmente sobre imagens do futebol, tentando trabalhar sobre duas ideias básicas: primeiro, que o futebol estava a abrir novos espaços formais e simbólicos na comunicação televisiva; segundo, que o futebol, enquanto fenómeno mediático, estava a protagonizar muitas transformações dos laços internos da colectividade. Recordo-me também que, com frequência, algumas vozes amigas (dentro e fora do jornal) me vinham dar conta da sua preocupação com a minha sanidade mental: “Então tu perdes o teu tempo a escrever sobre futebol?...”
O meu caso pessoal é, obviamente, irrelevante. Além do mais, é com carinho que recordo esses tempos. Seja como for, não posso deixar de constatar como os tempos mudaram. Hoje em dia, o futebol é uma espécie de “língua franca” da sociedade e todo aquele que, no exercício das suas funções jornalísticas, não manifestar alguma disponibilidade em relação às suas peripécias, corre o risco de ser etiquetado de pretensioso e intelectual (com essa particularidade muito portuguesa de a palavra “intelectual” ser aplicada como uma forma “natural” de insulto).
Depois do afastamento da selecção portuguesa do Euro 2008, tudo isso adquire nova pertinência, quanto mais não seja porque se está a assistir a um curioso fenómeno mediático: com a derrota face à Alemanha, os discursos de exaltação patriótica remeteram-se a um comprometido silêncio. Porquê? A resposta é desoladoramente simples. De facto, tais discursos vivem de uma única “ideia”: a de que a Pátria se afirma através de “vitórias”. Uma simples derrota é vivida como um trágico bloqueio ideológico: literalmente, não sabem que dizer face à evidência (de muitas décadas...) da excelência do futebol alemão.
Mesmo sem esquecer as respeitáveis excepções, vale a pena perguntar: que valores “patrióticos” nos são inculcados através do futebol? Permito-me citar este exemplar resumo de tais valores, neste caso a propósito de alguns comentários televisivos: “Fixação agressiva na arbitragem, imaginário de que todos conspiram para nos prejudicar, progressiva decomposição da voz à medida que o pior se torna certo; e, sobretudo, demissão total da vocação elementar da sua função, a de compreender melhor o jogo.”
Hélas! São palavras que não se referem ao caso português, mas sim ao que aconteceu em França (cuja selecção foi eliminada na fase de grupos). Quem as escreve é François Bégaudeau, notável comentador do jornal Le Monde (edição do dia 20), há muitos anos empenhado em partilhar um gosto real pelo fascínio do jogo jogado, sem que isso o impeça de se demarcar em relação a todas as demagogias televisivas e “patrióticas”.
Bégaudeau é, como agora se diz, uma personalidade transversal. Escreveu o livro Entre les Murs, sobre a sua experiência como professor, tendo interpretado o seu próprio papel no filme homónimo com que Laurent Cantet ganhou a Palma de Ouro do Festival de Cannes. Quando Entre les Murs estrear entre nós (Outubro), e tendo em conta a sua subtil encenação das relações professores/alunos, ficamos todos à espera de saber se os sacerdotes do futebol sentem o mesmo fervor patriótico face aos problemas da educação. E também, já agora, à importância social do cinema.

segunda-feira, junho 23, 2008

George Carlin (1937 - 2008)

A voz de Fillmore, a carrinha VW do filme Carros (2006), foi um dos seus derradeiros trabalhos — George Carlin, nome grande da stand-up comedy americana, morreu com 71 anos. A sua herança poderá ser resumida como a de um permanente questionador das palavras, seus significados oficiais e suas significações selvagens. Sintomaticamente, o seu número mais célebre e mais polémico (inclusivé pelo processo legal que desencadeou), dá pelo nome de 'Seven Words You Can Never Say on TV'. Carlin tinha sido recentemente eleito pelo Kennedy Center para receber o Prémio Mark Twain — a sua atribuição póstuma ocorrerá num espectáculo marcado para 10 de Novembro. Recordamo-lo, aqui, tecendo algumas pedagógicas considerações sobre as pequenas atribulações desencadeadas pela morte.

Você disse Tippi Hedren?...

Como nos podemos proteger dos promotores de um mundo asséptico e sem vida? E também sem morte, convém acrescentar... Como reagir à "enésima" tentativa de pintar a existência — incluindo a existência dos filmes — como uma espécie de pureza sem carne, sem sangue e sem desejo?
As perguntas podem soar alarmistas. E podem crer que são. Em todo o caso, não é possível olhar de forma indiferente para a nova boneca Barbie (anunciada par Outubro), "representando" Tippi Hedren nessa sublime personagem que é a 'Melanie Daniels' filmada por Hitchcock em The Birds/Os Pássaros (1963) — chama-se o produto 'Alfred Hitchcock The Birds Barbie Doll'.
Face a tamanho desaforo, o bom cinéfilo só pode perguntar: que varia o velho Hitch face a esta apropriação iconográfica? Não andaremos longe da verdade se dissermos que ofereceria a cada prendada criança uma imagem como esta aqui em baixo, aproveitando para contar uma fábula com gente realmente viva e medo muito a sério — tudo devidamente encerrado com um carinhoso beijinho de boa noite.

Banho de Lua

Um dos nomes de quem mais se fala este ano tem novo single. São os MGMT que, depois de Time To Pretend, retiram agora um segundo single do alinhamento do seu álbum de estreia Oracular Spectacular. Sem surpresa a escolha recaiu sobre Electric Feel. Aqui fica, com novo teledisco.

O regresso de Grace Jones

Grace Jones regressou aos palcos na passada semana, num concerto integrado na edição deste ano do londrino Meltdown Festival, programada pelos Massive Attack. Agora com 60 anos, Grace Jones prepara-se para regressar também aos discos. Corporate Cannibal, que será o seu primeiro álbum desde Bulletproof Heart, de 1989, tem edição prevista para Setembro.

Gelo marciano

Uma das mais importantes descobertas da presente missão Phoenix, em Marte, teve lugar no final da última semana e assinalou a descoberta de gelo sob o solo do planeta. Mais curiosa ainda foi a observação da evaporação de pedaços de gelo revelados pela escavação de um buraco pelo braço robotizado. O buraco (na imagem), ao qual foi já atribuído o nome Snow White (Branca de Neve) revelou, no canto inferior esquerdo, à sombra, pequenos pedaços de gelo logo após a escavação. Quatro dias depois (imagem da direita), o mesmo gelo ter-se-á sublimado.

Há, mas são verdes... (4)

Originalmente publicadas em 1950, as Crónicas Marcianas de Ray Bradbury (n. 1920) são, mais que um romance de ficção científica, uma colecção de contos que, em conjunto, traçam uma narrativa. Os contos surgiram, na sua maioria, de colaborações do escritor com revistas nos anos 40, acabando assim reunidos, juntamente com alguns inéditos, num único livro. Seguindo o modelo frequentemente citado junto dos leitores de ficção científica como “future history”, os contos que aqui se reúnem contam a história de uma colonização do planeta vermelho por seres humanos. As visões marcianas são diferentes de conto para conto, uns mais com sabor a aventura, outros a enigma, alguns ,mesmo ensaiando um humor com travo nonsense (como é o caso de Os Homens da Terra), fugindo aos cânones habituais na ficção científica. Em grandes traços, as histórias acabam inevitavelmente a reflectir sobre as relações que se desenham entre os colonizadores e os povos autóctones marcianos. E com inesperadas surpresas e revelações pelo caminho, num quadro de acontecimentos cronologicamente ordenado entre 1999 e 2057. A tradução portuguesa (pela Europa América) inclui apenas os contos da versão de 1950 do livro. Há, contudo, uma versão recente, publicada em 2005 pela Hill House, que junta a estes contos alguns mais, assinados por Bradbury, com Marte por cenário.

Amy Winehouse: regresso a "Frank"

Já o tínhamos aqui noticiado: o regresso do primeiro e prodigioso álbum de Amy Winehouse, Frank (2003), na sua "Deluxe edition". E o objecto em causa é, de facto, um luxo de surpresas, com um segundo CD que apresenta algumas versões "demo", "b-sides" e vários registos ao vivo, incluindo Stronger Than Me, na BBC, no programa Later with Jools Holland [clip aqui em baixo]; há ainda quatro remixes, incluindo uma, deliciosa, de F**k me Pumps, assinada por MJ Cole.