domingo, junho 29, 2008

Vergílio Ferreira inédito

>>> Évora, 16 de Dezembro [de 1948] — De-pois de treze anos, voltaram. Eu tinha ido, na bagagem da sua memória, um jovem magrizela, rabugento. Agora eu estava ali, não bem um homem talvez, mas decerto um rapaz diferente. Meus pais olharam-me várias vezes, chorando provavelmente na desgraça de perderem o filho antigo e de terem de aceitar um filho novo. Por mais que se tente, não há literatura que ponha de pé esse trágico instante do choque entre a imobilidade do desejo e da recordação e o imparável fluir da realidade.<<<

Um grande acontecimento literário: o início da publicação dos inéditos de Vergílio Ferreira (1916-1997), precisamente com Diário Inédito 1944-1949 (Bertrand Editora), organizado e anotado por Fernanda Irene Fonseca. Pelo seu carácter fragmentário, mas obstinado, este é um exercício de escrita que antecipa muitas caracteríticas dos volumes de Conta-Corrente. Além do mais, pelas circunstâncias peculiares da vida do autor — o casamento, o trabalho como professor, o desencanto face ao Portugal do pós-guerra —, encontramos também aqui os ecos de um tempo de profunda reflexão e transformação pessoal. Nesta perspectiva, é particu-larmente interessante perceber como a leitura de vários filósofos, sobretudo Jean-Paul Sartre, vai moldando a personalidade de um dos maiores escritores portugueses do século XX.
A ter em conta que este é apenas o primeiro sinal de uma (re)descoberta de Vergílio Ferreira, uma vez que, como refere Hélder Godinho na apresentação do volume, "o espólio, além deste diário, contém romances inéditos, ensaios ou fragmentos de ensaios ou de romances (de que destacaria uma primeira versão, quase completa, de Alegria Breve), peças de teatro, notas de toda a espécie e os inevitáveis poemas, alguns dos quais inéditos e outros dispersos por obras inéditas diversas."

>>> Vergílio Ferreira no site do Instituto Camões.
>>> Blog da Biblioteca Municipal Vergílio Ferreira (Gouveia).