sexta-feira, julho 31, 2015

Mats Gustafsson abre Jazz em Agosto

Nome grande da cena free do jazz contemporâneo, o saxofonista sueco Mats Gustafsson está no cartaz de abertura do Jazz em Agosto 2015 (hoje, 21h30, no Anfiteatro ao Ar Livre da Fundação Gulbenkian). Gustafsson traz aquele que é, por certo, um dos seus projectos mais ambiciosos: a Fire! Orchestra, um ensemble alargado que, a partir do trio Fire! (formado por Gustafsson, Johan Berthling e Andreas Werliin, respectivamente em baixo eléctrico e bateria) desenvolveu um leque se sonoridades, exuberantes e sofisticadas, capaz até de aceitar alguma contaminação do rock psicadélico.
Aqui fica um video/retrato de 10 minutos da Fire! Orchestra; em baixo, o spot promocional do Jazz em Agosto 2015.



O abismo de Chelsea Wolfe

Podemos hesitar perante a crueza da música da americana Chelsea Wolfe (nascida em Sacramento, California, em 1983). Em qualquer caso, ela terá sempre legitimidade para nos dizer: "eu bem vos avisei...". Afinal de contas, o seu álbum de 2013 chamava-se Pain Is Beauty. Agora, para evitar confusões, achou por bem condensar tudo numa palavra: Abyss.
Digamos que, se PJ Harvey e Kurt Cobain alguma vez se tivessem encontrado num estúdio cuja mesa de misturas tivesse sido ocupada por Trent Reznor... então o resultado talvez se parecesse com este turbilhão de sons, incluindo as distorções, as experimentações e o metódico impulso surrealista. Sem que nada disso, entenda-se, exclua uma tocante depuração poética, estranhamente contemplativa.
Abyss pode ser escutado, na íntegra, na NPR; entretanto, aqui fica o teledisco de Carrion Flowers, tema de abertura do álbum.

quinta-feira, julho 30, 2015

"Mínimos" — a grande fábula (2/2)

Um caso sério da animação contemporânea: os Mínimos relançam, com alegria e inteligência, a fábula infantil — este texto foi publicado no Diário de Notícias (22 Julho), com o título 'Não percam os Beatles!'.

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Os Mínimos a promover uma aspirador de alta pressão? Ou uma caixa de lenços de papel? Não são meras hipóteses, mas sim dados verídicos de uma lógica de marketing que transformou os hiper-simpáticos bonequinhos amarelos em figuras omnipresentes do consumo global... Quem veio denunciar os equívocos de tal conjuntura não foi um qualquer crítico de cinema, mas o próprio Pierre Coffin (nas páginas da revista Premiere), co-realizador deste filme e dos dois anteriores centrados na figura de Gru, o Maldisposto.
O episódio reflecte a dinâmica perversa de alguns sectores da indústria cinematográfica: por um lado, há espantosas energias criativas que se traduzem na criação de universos como o dos Mínimos, por certo dos mais complexos e fascinantes da actual animação; por outro lado, tendem a prevalecer os valores de uma tecnocracia do marketing que confunde os mecanismos de promoção (cuja importância ninguém contesta) com a gestão automática, artisticamente cega, de uma “marca”.
O caso dos Mínimos é tanto mais interessante quanto há neles as ambivalências (também elas perversas, hélas!) das grandes fábulas. É verdade que se sentem atraídos por todos aqueles que detêm algum poder acima do comum dos mortais; ao mesmo tempo, não é menos verdade que a sua solidariedade resiste a todos os percalços simbólicos ou políticos. Em qualquer caso, a inteligência do seu humor é, por certo, infinitamente mais pedagógica que a tristeza “juvenil” de Morangos com Açúcar e seus derivados. Além do mais, permitam-me que recorde que o filme só acaba mesmo... no fim! Isto porque, depois do genérico, Kevin, Stuart e Bob reaparecem para interpretar uma espantosa versão de Revolution, dos Beatles. E se o público infantil não sabe quem são os Beatles, é tempo de começar a aprender.

Sontag (sob o signo de Woolf)

SUSAN SONTAG
Olhando o Sofrimento dos Outros, de Susan Sontag, é um livro fascinante sobre as imagens e os seus contextos — este texto foi publicado no Diário de Notícias (26 Julho), com o título 'Ser espectador segundo Susan Sontag'.

Susan Sontag (1933-2004) impôs-se na dinâmica do pensamento moderno através de um ensaio de 1966 intitulado Contra a Interpretação (existe uma tradução portuguesa, de 2004, com chancela da editora Gótica). O título envolve todo um programa cultural, mediático e político: há uma dimensão da linguagem que excede a “intelectualização” dos significados, abrindo para uma experiência que, na sua sensualidade, não pode ser formatada de uma vez por todas. Dito de outro modo: dizer o que as coisas significam é também respeitar o que nelas permanece como indizível.
Muita coisa mudou de 1966 para cá, mas a inteligência argumentativa de Sontag continua a ser um instrumento precioso que nos ajuda a pensar, a não ter medo de sentir. O derradeiro livro que publicou, Olhando o Sofrimento dos Outros (agora editado pela Quetzal, numa rigorosa tradução de José Lima), constitui um momento fascinante do seu trabalho, em especial pelo modo como discute a vida das imagens no mundo contemporâneo.
Sontag recua aos tempos primitivos das imagens fotográficas e, muito em particular, ao modo como a fotografia representou as guerras ocorridas há um século ou mais (incluindo, claro, o primeiro conflito mundial, essa “guerra para acabar com todas as guerras”). Daí a incontornável ambivalência: é verdade que a história das imagens (fotográficas, antes do mais) envolve um importante valor de testemunho; ao mesmo tempo, é preciso não alimentar demasiadas ilusões sobre as respectivas potencialidades pedagógicas. Evocando o livro Os Três Guinéus (1938), de Virginia Woolf, empenhado, justamente, em reflectir sobre uma conjuntura pejada de augúrios de guerra, Sontag formula um desencantado reconhecimento: “Durante muito tempo, houve pessoas que pensavam que se fosse possível dar uma imagem suficientemente vívida do horror, a maior parte das pessoas acabaria por tomar consciência da barbaridade, da insanidade da guerra”.
VIRGINIA WOOLF
O livro de Sontag não caminha no sentido de enunciar normas que, de uma vez por todas, nos garantam uma “boa” gestão da pluralidade de significações em que uma imagem pode estar envolvida — até porque há nela a consciência muito aguda de que vivemos sobre o efeito quotidiano, não poucas vezes pesadamente “moralizante”, do fluxo televisivo. Se há lição simples, mas essencial, que podemos condensar a partir das suas palavras é a da absoluta necessidade de pensar o contexto em que as imagens são conhecidas (ela evoca mesmo o modo como, no início das recentes guerras dos Balcãs, a “mesma fotografia de crianças mortas” serviu de arma de propaganda a diferentes facções).
Daí o continuado desafio de ser espectador, trabalhando a memória na sua dimensão eminentemente individual, resistindo à utilização das imagens reduzidas a ícones, funcionando como sound bites (por exemplo, um cartaz com o cogumelo de uma bomba atómica) e desencadeando “pensamentos e sentimentos previsíveis”. Diz ela: “Felizmente, não há nenhuma imagem ícone dos campos de morte nazis”.

Sølve Sundsbø — contenção e elegância

Nascido na Noruega, sediado em Londres, Sølve Sundsbø é um exemplo modelar de uma atitude criativa no campo da moda que sabe integrar as mais modernas tecnologias sem alienar algumas componentes deliciosamente clássicas. O seu portfolio para o nº14 da revista Love alia a máxima contenção e uma serena elegância — pode ser visto no seu site ou no FashionProduction.

SOUND + VISION MAGAZINE — hoje na FNAC

O nosso Magazine regressa hoje à FNAC, para mais uma sessão sobre a actualidade de cinema, música e livros. Em foco estarão, em particular, algumas das mais recentes propostas dos desenhos animados, cruzadas com memórias da história da animação e também do mundo dos telediscos — é no Chiado, a partir das 18h30.

Ver + ouvir:
Ratatat, Abrasive



Um dos singles extraídos do novo álbum da dupla norte-americana Ratatat tem teledisco de animação feito com desenhos assinados por Evan Mast, um dos elementos do grupo. Abrasive chama atenção para a utilização da animação nos telediscos, que será um dos focos da edição de hoje do Sound + Vision Magazine, que decorre logo, a partir das 18.30, na Fnac Chiado.

A Imagem

"Hotel", N.G., 2015

Nos 50 anos de "Help!"

Faz esta semana meio século que “Help!”, o segundo filme com os Beatles, realizado por Richard Lester, chegou às salas de cinema. Apesar do tom ligeiro nasciam ali ideias que teriam consequência.


Como nota Martin Scorsese, no pequeno ensaio que foi publicado na edição em Blu-ray do filme, Richard Lester, em Help!, “foi tão ousado, à sua maneira, como Resnais o havia sido poucos anos antes em O Último Ano em Marienbad”, observando em concreto o trabalho de montagem e dos movimentos de câmara. Quanto à utilização da cor lembra que era algo “que todos estavam a experimentar naquela altura”, dando como exemplo Blow Up de Antonioni ou Farenheit 451 de Truffaut.

Help! pode ainda ser reconhecido como um importante espaço de primeira exploração de ideias daquilo que anos mais tarde seria o teledisco. As sequências que acompanham You’ve Got To Hide Your Love Away ou Ticket To Ride poderia viver mesmo sem um filme ao seu redor e são claras indicadoras de um registo na relação das imagens com a música que parte do cinema mas aponta horizontes a outra lógica narrativa e de encadeamento de imagens e até mesmo ritmo de montagem.

Podem ler o texto completo aqui, na Máquina de Escrever.

Para ler: um retrato de Marlon Brando

Um documentário sobre o ator, realizado por Steven Riley, recebe um aplauso no Guardian. Fica aqui a opinião de Nigel M Smith.

Gerações técnicas [citação]

>>> Porque as gerações técnicas se sucedem, o homem da escrita (livro, imprensa...) não reconhece o seu filho que é da geração do écrã (cinema, televisão), do mesmo modo que este não reconhece o seu, à mercê da tirania videográfica.

PAUL VIRILIO
ed. Galilée, Paris, 1993

terça-feira, julho 28, 2015

"Mínimos" — a grande fábula (1/2)

Um caso sério da animação contemporânea: os Mínimos relançam, com alegria e inteligência, a fábula infantil — este texto foi publicado no Diário de Notícias (22 Julho), com o título 'A mancha amarela dos Mínimos à conquista do mundo'.

São pequeninos, amarelos e têm dois olhos (em boa verdade, às vezes apenas um...). Dialogam numa língua cuja gramática não está publicada. Ainda assim, isso não nos impede de compreender muitas das suas formas de comunicação, por vezes com bizarras derivações espanholas (?), até porque se exprimem com eloquência no domínio musical, cantando de forma exuberante e, há que reconhecê-lo, bem afinada. Característica fundamental: adoram bananas! Não têm os poderes dos super-heróis dos filmes, mas são capazes de conquistar o mercado global do cinema. No dia 12 de Julho, a revista Variety escrevia mesmo: “Os Mínimos conseguiram dominar o mundo!”. E não era caso para menos: no primeiro fim de semana de exibição (em 56 países, incluindo EUA), as suas aventuras cinematográficas arrecadaram quase 400 milhões de dólares, prevendo-se que possam vir a superar a barreira dos mil milhões.
Digamos que o filme Minions, entre nós chamado Mínimos, já era um fenómeno antes de chegar às salas. Isto porque a sua popularidade está ligada a dois grandes sucessos dos desenhos animados: Gru – o Maldisposto (2010) e Gru – O Maldisposto 2 (2013), ambos realizados pelo francês Pierre Coffin e o americano Chris Renaud. Aí, o super-vilão Gru (com a voz do brilhante Steve Carell) ia multiplicando as suas maldades para dominar o mundo, incluindo um plano para roubar a... Lua, sempre servido pela legião imensa dos Mínimos: na sua festiva mancha amarela, eles são felizes apenas por poderem servir o seu mestre, embora nunca consigam ser um modelo de disciplina.
Agora, os Mínimos têm direito à sua própria aventura: o novo filme relata-nos os tempos que antecederam a sua relação com Gru (como se diz na gíria industrial, trata-se de uma “prequela”). E convenhamos que não tiveram uma existência fácil. A saga dos Mínimos leva-nos até aos momentos mais cruéis da pré-história — ficamos mesmo a saber que terão tido um papel determinante, ainda que involuntário, no fim dos dinossauros, antes de se colocarem ao serviço de personagens tão emblemáticas como Napoleão Bonaparte ou o Conde Drácula... Até que numa convenção de vilões, a bem chamada Villain-Con, parecem encontrar a sua líder ideal: nada mais nada menos que a implacável Scarlet Overkill (voz de Sandra Bullock, impecável), apostada em roubar a coroa de Isabel II...
A promoção dos Mínimos à condição de protagonistas da nova produção dos estúdios Universal amplia ainda mais a popularidade conquistada através dos dois filmes de Gru. Como vários observadores dos mercados cinematográficos já fizeram notar, há neles um humor capaz de transcender fronteiras e linguagens, já que as suas leis decorrem da mais primitiva tradição burlesca (por vezes, aproximando-os do “slapstick” do cinema mudo em que o absurdo pode nascer dos detalhes aparentemente mais banais).
Tudo isso se reforça através da emergência de três “vedetas” dos Mínimos: Kevin, o “irmão” mais velho, com um pequeno tufo de cabelo eriçado, ansiando por provar o seu heroísmo; Stuart, o eterno adolescente (só com um olho), sempre pronto para a festa; e Bob, o mais pequenino e ingénuo que... gosta de toda a gente.
Desta vez repartindo a realização com Kyle Balda, outro animador americano, Pierre Coffin comete a proeza de ser também o responsável pelas vozes dos Mínimos, em particular das nuances expressivas que caracterizam Kevin, Stuart e Bob. Aliás, tem sido referida alguma curiosa semelhança entre os três passarinhos amarelos que integravam Ping (1997), a sua primeira curta-metragem, e os futuros Mínimos. Uma coisa é certa: este universo tornou-se uma das mais rentáveis franchises dos modernos desenhos animados, estando já agendado um Gru – O Maldisposto 3 para 2017.

segunda-feira, julho 27, 2015

"Rebel Heart Tour" — primeiras imagens

A Rebel Heart Tour arrancará em Montreal, Canadá, no dia 9 de Setembro. E tudo indica que terá uma elaborada composição cénica, ainda e sempre apostando forte num grande colectivo de bailarinos — Madonna acaba de divulgar os dois primeiros teasers da digressão.



Como fazer a história do nazismo?

Fazer história não é apenas acumular materiais de arquivo: um bom/mau exemplo dessa ilusão pode ser a série Os Últimos Dias dos Nazis — este texto foi publicado no Diário de Notícias (24 Julho), com o título 'Como fazer história?'.

O espaço televisivo alimenta-se de muitos lugares-comuns que funcionam como mecanismos de auto-legitimação. A abordagem da história, por exemplo: qualquer amontoado de imagens de arquivo, sustentado por uma voz “descritiva”, tende a ser consagrado como uma inquestionável investigação “histórica”.
O exemplo da série Os Últimos Dias dos Nazis, a passar no canal História, pode ser esclarecedor [aparentemente, a página oficial da série foi desactivada]. De que se trata? De recordar os tempos finais da Segunda Guerra Mundial a partir de depoimentos de figuras que, com mais ou menos evidência, desempenharam alguma função na máquina de morte do nazismo. No site do canal, e de acordo com a lógica especulativa da televisão mais simplista, escreve-se mesmo que a série “transporta o tele-espectador ao interior da mente dos alemães”.
Nada a ver, entenda-se, com as matrizes de ficção que revisitam a guerra e, em particular, o Holocausto, questionando os próprios enunciados nazis (leia-se o recente e prodigioso romance A Zona de Interesse, de Martin Amis). Aliás, a série limita-se a aplicar o cliché dos chamados “docudramas”, combinando filmes de época com situações encenadas, protagonizadas por actores.
Também não se trata de recusar a hipótese de a abordagem histórica contrapor “reconstituições” a imagens de arquivo — toda a obra de um cineasta tão admirável como Errol Morris baseia-se nesse método (veja-se, por exemplo, The Thin Blue Line, de 1988). O que está em causa é a colagem ligeira, puramente especulativa, de imagens totalmente descontextualizadas com momentos encenados de acordo com a dramaturgia do mais rasteiro sensacionalismo.
Na prática, Os Últimos Dias dos Nazis filia-se na mesma estética de “aceleração” visual e produção de “agitação” temática que encontramos, por exemplo, nos programas sobre “famosos” que nos garantem ter encontrado o segredo da felicidade eterna... Podia ser apenas uma anedota infeliz. Infelizmente, é uma prova de irresponsabilidade face à história e à complexidade das suas heranças.

The Weeknd — à espera do segundo álbum

O canadiano Abel Tesfaye — que é como quem diz: The Weeknd — anuncia um segundo álbum (cerca de dois anos depois de Kiss Land). Chamar-se-á Beauty Behind the Madness (bom título...) e promete novas derivações do seu sofisticado R&B em ambiências hip hop (ou talvez o inverso). Para já, o cartão de visita [apenas som], chama-se Can't Feel My Face.

A operação mágica [citação]

>>> Desde o princípio, o divino foi a significação profunda do humano. A operação mágica é a conduta de um homem que empresta ao mundo do fim, divino (ou sagrado), mais força e verdade do que ao mundo laboral dos meios: este homem inclina-se perante um poder que o excede, que é soberano, tão estranho à atitude humana do trabalho como o animal pode sê-lo à expressão.

GEORGES BATAILLE
'O Nascimento da Arte'
Tradução de Aníbal Fernandes (ed. Sistema Solar)

domingo, julho 26, 2015

Amy Winehouse — o filme (2/2)

O filme de Asif Kapadia sobre Amy Winehouse constitui um brilhante exercício documental, desde já com um lugar importante nas relações entre cinema e a paisagem imensa do rock — este texto foi publicado no Diário de Notícias (18 Julho), com o título 'Memórias e fantasmas da música rock'.

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Em entrevistas que deu por altura da apresentação de Amy no Festival de Cannes (extra-competição), Asif Kapadia lembrou que o seu método de trabalho foi, em parte, semelhante ao que pôs em prática em Senna (2010), o filme sobre Ayrton Senna que obteve dois prémios BAFTA (melhor documentário e melhor montagem). Que é como quem diz: encarar a produção do filme, não como a ilustração de um retrato pré-definido, antes como um processo de investigação e descoberta que começa nos materiais mais genuínos de uma vida.
De facto, a definição de Amy Winehouse como uma vítima do consumo de drogas e, em particular, de álcool não bastaria para contar os seus 27 anos de vida (morreu no dia 23 de Julho de 2011, na sua casa de Camden, Londres). Era importante não perder de vista o que se diz em Frank (2003) e Back to Black (2006), os dois únicos álbuns de estúdio que nos legou. Até porque as suas canções, não sendo auto-biográficas no mais banal plano “factual”, surgem sempre enredadas numa tocante dimensão confessional — “as minhas lágrimas secam por si”, diz ela numa canção de Back to Black.
Amy consegue essa coisa rara que é retratar alguém não como uma acumulação de “facetas” (a vida de artista, os problemas familiares, a exposição nos media, etc.), antes através de uma teia de factos e evocações em que tudo comunica com tudo. Nesta perspectiva, importa destacar, não apenas o extraordinário trabalho de recolha de elementos informativos (desde documentos pessoais até registo de performances ao vivo muito pouco vistas), mas também o modo como a sua articulação é feita através da subtil montagem assinada por Chris King (que já tinha sido responsável, com Gregers Sall, pela montagem de Senna).
Amy possui uma fundamental dimensão crítica que, infelizmente, não tem sido das mais ponderadas. Assim, através de espantosos, porque eloquentes, materiais de informação (fotos e reportagens) utilizados por alguns jornais e televisões, este é também um filme sobre a degradação moral de algumas formas contemporâneas de jornalismo.
Não se trata, entenda-se, de “culpar” os media pelas coisas mais terríveis que aconteceram na curta vida de Amy Winehouse — aliás, reduzir tudo o que acontece a uma oposição maniqueísta entre “inocentes” e “culpados” é táctica corrente desse jornalismo mais medíocre. Trata-se, isso sim, de não escamotear o facto de os altos e baixos (sobretudo os baixos...) da vida de Amy Winehouse terem sido vergonhosamente explorados através de imagens de “reportagem” que, agora, no contexto do filme de Asif Kapadia, é possível avaliar em toda a sua violência moral e afectiva.
Não há, de facto, muitos filmes assim, capazes de nos fazer compreender como uma existência individual transporta os enigmas da sua verdade global, reflectida em todos os seus instantes, desde a alegria mais cristalina ao sofrimento mais atroz. Não necessitaríamos de conhecer tais elementos para admirar o génio das canções de Amy Winehouse — o certo é que o filme de Asif Kapadia intensifica, se tal é possível, as emoções do seu universo musical.

sábado, julho 25, 2015

O mediatismo do Bloco de Esquerda

LUCIAN FREUD
Eli
2002
A. Tornou-se um fenómeno com o seu quê de compulsivo: numa qualquer televisão, alguém lê uma notícia sobre um determinado assunto (p. ex.: o aumento do crédito à habitação e as restrições de crédito às empresas); logo a seguir, a notícia seguinte envolve o Bloco de Esquerda (o BE "pronunciou-se sobre" a situação do crédito...). É mesmo uma espécie de lengalenga mediática: o assunto X emerge na actualidade & o BE comenta o assunto X.

B. É surpreendente que os outros partidos, de esquerda e direita, ainda não tenham protestado, eventualmente até, se tiverem gosto pelas teorias da conspiração, denunciando a ocupação das redacções televisivas por multidões de militantes do BE... De facto, se não o fazem, é apenas por mal disfarçada inveja — gostariam de ser eles a ser evocados a pretexto de todas as atribulações que abalam o nosso paraíso à beira mar.

C. O que se passa é, desgraçadamente, muito básico, não envolvendo corrupções ou desonestidades — apenas o estado das coisas. Acontece que, com evidente perspicácia, o BE compreendeu uma das leis mais fortes do actual jornalismo televisivo: cada vez que há uma matéria noticiosa, importa "criar" qualquer coisa que, logo a seguir, possa gerar alguma agitação em torno dessa matéria — o BE assegura, assim, a prossecução dessa pueril lógica editorial. Em última análise, isso ajuda-nos a perceber porque é que quase ninguém da área política mostra disponibilidade para pensar a televisão em Portugal — a televisão é encarada apenas como um território que importa ocupar.

sexta-feira, julho 24, 2015

Future Islands em tom familiar

A voz densa de Samuel T. Herring + o som alternativo, mas clássico, dos Future Islands trazem-nos mais um teledisco, saborosamente tradicional, em ambiente familiar — com realização de Jay Buim, eis A Song For Our Grandfathers, do álbum Singles.

Pedro Costa, Miguel Gomes & etc.

Alguns filmes portugueses (re)afirmam-se em contextos internacionais: o assunto merece ser valorizado para além dos clichés mais medíocres — este texto foi publicado no Diário de Notícias (19 Julho), com o título 'A globalização dos filmes portugueses'.

Alguns filmes portugueses continuam em destaque nos circuitos internacionais. Assim, por exemplo, antecedendo a estreia de Cavalo Dinheiro nos EUA (dia 24), está a decorrer em Nova Iorque, na Film Society Lincoln Center, uma retrospectiva integral dos filmes de Pedro Costa; o texto oficial de apresentação do evento conclui dizendo que “temos orgulho em apresentar um mostra global do universo cinematográfico deste mestre contemporâneo”. Entretanto, a trilogia de Miguel Gomes, As Mil e uma Noites, depois de ter passado na Quinzena dos Realizadores, em Cannes, é um acontecimento na actualidade cultural francesa (o primeiro volume chegará às salas portuguesas a 27 de Agosto).
Vale a pena atentarmos nestes ecos que chegam do estrangeiro. Quanto mais não seja porque continua a não ser possível referi-los sem atrair a demagogia dos discursos que gostam de proclamar que há um “certo” cinema português que só é feito para funcionar em alguns circuitos internacionais...
Não é fácil lidar com tal disparate, quanto mais não seja porque desfruta de um imenso poder mediático. Recorde-se a avalanche de elogios que enquadraram a notícia da morte de Manoel de Oliveira: desde os mais hipócritas membros da cena política até aos mais exaltados repórteres televisivos, muitos se chegaram à frente para dar conta de uma religiosa reverência pela sua obra... Subitamente, foram rasurados anos e anos de difamação automática dos filmes de Oliveira, como se a santificação do trabalho artístico (seja de quem for) correspondesse a uma maneira inteligente de sustentar uma genuína vida cultural.
Não creio, de facto, que fossemos mais felizes e solidários por pensarmos todos o mesmo sobre os mesmos filmes (portugueses ou não). A questão nunca foi essa. Acontece que seria interessante compreender porque é que a produção cinematográfica portuguesa deixou de ser uma opção regular de consumo de muitos sectores da nossa população.
Escusado será dizer que há um sem número de factores que, desde a reconversão da vida urbana até aos problemas financeiros, influencia a dinâmica (ou a falta dela) de qualquer zona do chamado “mercado cultural”. Em todo o caso, vale a pena continuar a enunciar a pergunta mais básica: uma população há quarenta anos servida (?) pela formatação narrativa das telenovelas poderá gerar algum colectivo estável de consumo de filmes portugueses?
Poucos cineastas têm mostrado algum empenho em lidar com tal pergunta, enquanto, por regra, os políticos (de todas as direitas e esquerdas) fazem gala em ignorá-la. Daí o simples destaque que estas linhas envolvem: nenhum filme português é mais (ou menos) digno por causa da sua ressonância para além das nossas fronteiras. Só que falar de globalização é também não esconder este fenómeno: alguns dos nossos filmes mais íntimos (como são os citados) há muito superaram os limites definidos por tais fronteiras — algo da nossa identidade passa por tal fenómeno.

quinta-feira, julho 23, 2015

Amy Winehouse — o filme (1/2)

O filme de Asif Kapadia sobre Amy Winehouse constitui um brilhante exercício documental, desde já com um lugar importante nas relações entre cinema e a paisagem imensa do rock — este texto foi publicado no Diário de Notícias (18 Julho), com o título 'Memórias e fantasmas da música rock'.

Há quase sessenta anos, Elvis Presley estreava-se no cinema como estrela de um “western” recheado de canções cujo título retomava, aliás, um dos seus maiores sucessos: Love Me Tender (1956), dirigido por Robert D. Webb, pode ser considerado o prólogo das multifacetadas relações entre o mundo dos filmes e a paisagem imensa do rock. O acontecimento envolvia mesmo qualquer coisa de predestinação, consagrada numa emblemática frase promocional: “O Sr. Rock’n’roll nasceu para interpretar esta história”.
A estreia de Love & Mercy/A Força de um Génio, de Bill Pohlad, constitui um dos mais recentes capítulos dessa saga cinema/música, tanto mais significativo quanto estamos perante um filme que aposta em revisitar a personagem de Brian Wilson muito para além de qualquer cliché biográfico.
Escusado será dizer que há muito se desvaneceram as ilusões românticas que Presley encarnava (mesmo contra sua vontade, já que nunca escondeu uma enorme insatisfação com a maior parte dos filmes que protagonizou). A história da música popular passou a ser um labirinto de coisas contraditórias, como se cada momento de euforia atraísse um fantasma fúnebre. No limite, parece haver mesmo maldições instaladas, como a dessa impressionante galeria de figuras que morreram aos 27 anos: Brian Jones, Jimi Hendrix, Janis Joplin, Jim Morrison, Kurt Cobain, Amy Winehouse... Esta última é agora tema de um notável documentário, realizado por Asif Kapadia e intitulado apenas Amy.
Mesmo que resistamos a qualquer interpretação maléfica das circunstâncias que enquadraram a vida (e a morte) de tão trágicas personagens, é um facto que a sua existência tem ficado inscrita nos filmes de modo quase sempre invulgar e perturbante. Brian Jones, por exemplo, surge como discreto membro dos Rolling Stones em One Plus One, de Jean-Luc Godard: combinando o olhar documental com a alegoria política, o filme foi rodado em Londres, em meados de 1968, durante as gravações da canção Sympathy for the Devil (para o álbum Beggars Banquet); Jones viria falecer cerca de um ano mais tarde, a 3 de Julho de 1969. Por sua vez, em Last Days (2005), de Gus Van Sant, Michael Pitt interpreta um rocker de nome “Blake” cuja história suicidária é claramente reminiscente de Kurt Cobain. Aliás, podemos encontrar um desvio em parte semelhante num dos títulos centrais da filmografia de Bette Midler: as atribulações da sua personagem de Mary Rose Foster, em A Rosa (1979), de Mark Rydell, são directamente inspiradas na história de Janis Joplin.
O exemplo de Amy remete-nos para uma zona paralela, de raízes e componentes que são, no essencial, de natureza documental. Aliás, vale a pena perguntar se muitos aspectos da dimensão mitológica do rock não são indissociáveis dos ecos que, sobretudo durante as décadas de 60/70, a música encontrou em alguns filmes que, justamente, documentaram personagens, eventos e contextos de invulgar importância artística e simbólica.
Woodstock (1970), de Michael Wadleigh (em cuja equipa trabalhou um cineasta ainda pouco conhecido chamado Martin Scorsese), será o primeiro título que vem à memória. O registo do festival realizado de 15 a 18 de Agosto de 1969, perto da cidade de Bethel, Nova Iorque, transformou-se numa referência emblemática da cultura popular, eternizando performances de Joe Cocker, The Who, Richie Havens, Joan Baez ou Jimi Hendrix, entre muitos outros — encerrando as utopias dos anos 60, o filme estabelecia padrões de rodagem que, de uma maneira ou de outra, influenciaram o desenvolvimento do “filme-concerto”.
Tal sub-género tem persistido em todas as épocas, dando origem a experiências muito variadas, incluindo: Monterey Pop (1968), assinado pelos irmãos Maysles; Gimme Shelter (1970), em que D. A. Pennebaker filma o célebre e trágico concerto dos Rolling Stones em Altamont, a 6 de Dezembro de 1969; e Stop Making Sense (1984), com os Talking Heads filmados por Jonathan Demme. Scorsese viria a ser um dos autores em destaque nessa evolução, registando, por exemplo, o concerto de despedida de The Band em A Última Valsa (1978) ou, mais recentemente, uma performance dos Rolling Stones em Shine a Light (2008).
Paralelamente, assistiu-se ao desenvolvimento de uma outra tendência, de algum modo complementar: o “filme-sobre-uma-digressão”. Pelo menos no plano conceptual, o seu título fundador será Dont Look Back (1967), de D. A. Pennebaker, entre nós lançado como Eu Sou Bob Dylan. Acompanhando os concertos de Dylan em Inglaterra, em 1965, Pennebaker conseguiu a proeza de registar os prós e contras de um ambiente em que espectadores e imprensa discutiam acaloradamente o facto de Dylan ter integrado guitarras eléctricas na sua música (a partir do álbum Bringing it All Back Home, lançado em Março daquele ano), ao mesmo tempo que ele próprio dava sinais de uma obstinada resistência à sua transformação simbólica (ou mediática, como diríamos agora) em “porta-voz” de toda uma geração. Aliás, alguns dos mais brilhantes filmes sobre digressões — como Na Cama com Madonna (1991), de Alek Keshishian, ou Meeting People Is Easy (1998), de Grant Gee (sobre os Radiohead) — funcionam também como metódicas desmontagens da teatralidade que a pose de uma estrela rock pode envolver.

A liberdade de Pharrell Williams

A nova canção de Pharrell Williams, Freedom!, é um hino poderoso que encontrou uma expressão exemplar no seu teledisco, dirigido por Paul Hunter — uma digressão global sobre as atribulações da liberdade, em que não falta a mais espantosa recriação de uma imagem emblemática dos tanques na praça Tienanmen.

terça-feira, julho 21, 2015

A IMAGEM: Erwin Olaf, 2013

ERWIN OLAF
Nina Rebecca Jowell
2013

O sonho europeu [citação]


>>> Como é que as coisas acabaram por correr tão mal [na Europa]? A resposta é que isto é o que acontece quando políticos auto-indulgentes ignoram a aritmética e as lições da história. E não, não estou a falar de esquerditas na Grécia ou em qualquer outro lugar; falo dos ultra-respeitáveis homens de Berlim, Paris e Bruxelas que passaram um quarto de século a tentar dirigir a Europa a partir de uma economia fantasista.

PAUL KRUGMAN
'O sonho impossível da Europa'
New York Times, 20 Julho 2015

Recordando Charles Harbutt

Exemplo modelar de um foto-jornalismo atento às transformações do quotidiano americano, Charles Harbutt faleceu a 30 de Junho, contava 79 anos. Foi membro da agência Magnum entre 1963 e 1981, deixando uma obra que se pode ler, afinal, como um testemunho histórico de cerca de quatro décadas de vida social — a Magnum, justamente, celebra o seu legado, dando a ver uma série das suas admiráveis fotografias [portfolio e informações sobre as imagens no site da agência].


>>> Obituário no New York Times.

segunda-feira, julho 20, 2015

Telenovelas e outras coisas virais

1975
A telenovela tornou-se o exemplo máximo, quer dizer, mais poderoso, da televisão que se repete infinitamente — este texto foi publicado no Diário de Notícias (17 Julho), com o título 'Ser ou não ser viral'.

1. A presença de telenovelas nas grelhas de programação tornou-se viral. Quase sempre utilizada a propósito dos fenómenos mais anedóticos — por exemplo: uma queda acrobática de alguém que atrai milhares de visitantes no YouTube —, a palavra “viral” pode e deve ser aplicada aos modos de organização da linguagem televisiva dominante. As telenovelas, precisamente: além do poder devastador de ocupação dos horários nobres (poder que não partilham com nenhuma outra matriz televisiva), são também conteúdos que estão sempre a ser repetidos. A cultura não se faz de “ópera” e “bailado”, mas sim dos valores que dominam o espaço da comunicação... Daí a renovada pergunta (cultural, precisamente): quem tem coragem para discutir a telenovela como o padrão narrativo dominante na sociedade portuguesa?

2012
2. Faço um zapping sobre noticiários e encontro uma referência ao acordo “histórico” sobre o programa nuclear do Irão. Desta vez, curiosamente, ninguém se lembra de entrevistar algum político indignado que profira alguma diatribe automática contra a administração Obama... Em todo o caso, fico com uma estranha sensação de duração. Não cronometrei, é um facto, mas a notícia não terá durado uns escassos 30 segundos. Notícia seguinte? Os feridos nas festas de San Fermin, em Pamplona, com exuberantes detalhes sobre a velocidade dos touros e o número de feridos — e assim se cumpre um minuto de colorida informação.

3. Em nome do “Verão” e do “divertimento”, as televisões estão cheias de espectáculos ao ar livre em que desfilam as mais patéticas mediocridades musicais, tudo misturado com a promessa de muitos prémios em dinheiro... Há uma curiosa perversão simbólica nesta poderosíssima cultura do “entretenimento”: por um lado, durante a tarde, convidam-nos a usufruir e celebrar a sedução e os privilégios do dinheiro; por outro lado, à noite, esmagam-nos com a tragédia grega, o apocalipse da Europa e as angústias da moeda única — sistemas virais de um pensamento sobre coisa nenhuma.

domingo, julho 19, 2015

7 canções de "Sticky Fingers" (4)


[ Dead Flowers ]  [ Brown Sugar ]  [ Wild Horses ]

Em todo o alinhamento de Sticky Fingers, Can't You Hear Me Knocking será, talvez, o exemplo mais puro do mais puro rock'n'roll, cristalizado numa clássica demanda de amor:

Can't you hear me knockin' on your window
Can't you hear me knockin' on your door
Can't you hear me knockin' down your dirty street
Help me baby, ain't no stranger

Com uma duração superior a 7 minutos (é o tema mais longo do álbum), tem sido objecto de diversas recriações em palco. Esta é, por certo, uma das mais poderosas: gravada em 2003 no Madison Square Garden, em Nova Iorque, excede os 11 minutos e quase se poderia classificar como uma sessão jazzística: o fabuloso saxofonista que foi Bobby Keys (1943-2014) toca o primeiro solo (ele que já integrava a gravação original do álbum), seguindo-se Mick Jagger, na harmónica, com Ronnie Wood  a fechar no longo e admirável solo de guitarra.

A saudação nazi de Isabel II

1. Foi tema de capa do jornal The Sun deste fim de semana: uma imagem de 1933 ou 1934 em que a futura Rainha Isabel II surge, aparentemente, a fazer a saudação nazi — no título, o jornal propõe um trocadilho entre a palavra "Highnesses" (Altezas) e a expressão "Heil Hitler".

2. A imagem fixa é extraída de um pequeno filme amador (17 segundos), da colecção privada da Rainha, nunca tornado público, obtido no castelo escocês de Balmoral. A Rainha Mãe faz o mesmo gesto, surgindo ainda Margarida, irmã de Isabel, e o futuro Rei Eduardo VIII — parece ser ele que sugere às crianças que procedam assim (Isabel teria 6 ou 7 anos, Margarida 3 ou 4).


3. A divulgação das imagens tem sido objecto de inúmeras notícias e comentários — eis apenas três exemplos: The Guardian + Le Monde + CNN.

4. Vale a pena tentar colocar a questão um pouco para além da lógica dominante nas reacções à publicação de The Sun. Dito de outro modo: não se trata de recalcar o facto (bem conhecido e analisado) de Eduardo VIII ter manifestado inequívocas simpatias por Adolf Hitler; nem se pretende fechar a discussão na responsabilidade política atribuível a uma criança de 6 anos (mesmo uma futura Rainha), para mais num contexto em que a atitude de muitos governos e instituições face à ameaça nazi foi, no mínimo, apática (recorde-se que, em 1935, o filme O Triunfo da Vontade, de Leni Riefenstahl, objecto de propaganda do III Reich, foi distinguido com o prémio de melhor documentário no Festival de Veneza). Trata-se, isso sim, de questionar a mecânica deste tipo de jornalismo.

5. As preocupações de The Sun com a "verdade histórica" não passam de uma monstruosa hipocrisia. Na prática, publicações deste teor não procuram mais do que aquilo que, infelizmente, quase sempre conseguem: gerar um processo de multiplicação "social" da sua própria existência, obviamente apoiado pela proliferação automática dos circuitos da Net — é o triunfo do burburinho quotidiano contra a possibilidade de contextualização que qualquer matéria informativa pode e deve exigir. No limite, esta ideologia tablóide prejudica os valores e a deontologia do jornalismo que contesta a transparência "automática" dos factos, não abdicando de uma permanente avaliação das suas nuances e contextos.

sábado, julho 18, 2015

Usar o telemóvel a conduzir...


Como explicar a um cidadão que utilizar o telemóvel enquanto conduz o seu carro é, no mínimo, um disparate? No estado do Novo México, os responsáveis pela circulação nas estradas (New Mexico Department of Transportation) optaram pelo máximo pragmatismo: há mensagens que justificam a mais severa contundência — eis o respectivo spot.