sábado, julho 25, 2015

O mediatismo do Bloco de Esquerda

LUCIAN FREUD
Eli
2002
A. Tornou-se um fenómeno com o seu quê de compulsivo: numa qualquer televisão, alguém lê uma notícia sobre um determinado assunto (p. ex.: o aumento do crédito à habitação e as restrições de crédito às empresas); logo a seguir, a notícia seguinte envolve o Bloco de Esquerda (o BE "pronunciou-se sobre" a situação do crédito...). É mesmo uma espécie de lengalenga mediática: o assunto X emerge na actualidade & o BE comenta o assunto X.

B. É surpreendente que os outros partidos, de esquerda e direita, ainda não tenham protestado, eventualmente até, se tiverem gosto pelas teorias da conspiração, denunciando a ocupação das redacções televisivas por multidões de militantes do BE... De facto, se não o fazem, é apenas por mal disfarçada inveja — gostariam de ser eles a ser evocados a pretexto de todas as atribulações que abalam o nosso paraíso à beira mar.

C. O que se passa é, desgraçadamente, muito básico, não envolvendo corrupções ou desonestidades — apenas o estado das coisas. Acontece que, com evidente perspicácia, o BE compreendeu uma das leis mais fortes do actual jornalismo televisivo: cada vez que há uma matéria noticiosa, importa "criar" qualquer coisa que, logo a seguir, possa gerar alguma agitação em torno dessa matéria — o BE assegura, assim, a prossecução dessa pueril lógica editorial. Em última análise, isso ajuda-nos a perceber porque é que quase ninguém da área política mostra disponibilidade para pensar a televisão em Portugal — a televisão é encarada apenas como um território que importa ocupar.