segunda-feira, outubro 31, 2011

Uma canção, uma banda... e uma actriz


A despedida foi anunciada há já algumas semanas, em meados de Setembro. Agora anuncia-se a chegada de um best of (Part Lies, Part Heart, Part Truth, Part Garbage: 1982- 2011, the definitive R.E.M., a editar dia 15 de Novembro) que revela o que serão os últimos inéditos dos R.E.M.. Um deles é este We All Go Back To Where We Belong, que tem direito a edição em single e que surge acompanhado por dois telediscos, um deles protagonizado por Kirsten Dunst.


Novas edições:
David Lynch, Crazy Clown Time


David Lynch 
“Crazy Clown Time” 
Sunday Best 
4 / 5 

Bastava-nos ir ao cinema para reconhecer que David Lynch gosta de música. E de som em geral... Desde o ruído opressivo que domina Eraserhead à cena da “profecia” de Dune ao som de Brian Eno, encontrando depois a parceria perfeita ao lado de Angelo Badalamenti (com exemplos maiores de excelência nas bandas sonoras para a série Twin Peaks e o filme Mulholland Drive), David Lynch foi afirmando, juntamente com a revelação de uma das mais ímpares personalidades da história do cinema, um cuidado com importante protagonismo na hora de pensar que sons e músicas a levar aos seus filmes. A canção mora também desde há muito entre as suas esferas de interesse, com exemplos de escolhas certas nas horas certas ao levar Chris Isaak a Wild at Heart ou David Bowie a Lost Highway. Esta é uma relação que se aprofundou ao trabalhar som, sem imagem, quando, juntamente com Angelo Badalamenti, criou dois álbuns em trabalho de colaboração com Julee Cruise (cuja música levaria a Twin Peaks e para quem rodou depois o filme-concerto Industrial Symphony – Vol 1). Rodou telediscos para os Sparks ou Moby, entre outros. Há poucos meses realizou a transmissão, em directo, de um concerto dos Duran Duran para a Internet... Aos discos, em nome próprio, chegou em 2001 através da parceria com John Neff, sob a designação BlueBob. Em 2010 via a luz do dia uma outra colaboração, desta vez com Danger Mouse e Sparklehorse, com o título Dark Night of The Soul... E há cerca de um ano o seu nome surgia pela primeira vez na capa de um disco, assinando a música. Acontecia ao som de Good Day Today / I Know, um single double A Side que, afinal, não era senão o cartão de visita para o álbum que agora é lançado. Crazy Clown Time não nasce, por isso, do nada. David Lynch chama-lhe “blues modernos”... De facto há aqui toda uma vontade em encontrar ecos e caminhos para a guitarra eléctrica e toda uma arquitectura rítmica, lenta e melancólica, que carrega em si genéticas dos blues. Mas a visão de Lynch não se esgota aqui. E se as guitarras, efeitos cénicos (que conferem uma interessante noção de espaço) e vozes são veículo dessas memórias, a verdade é que caminham para um espaço novo, algo assombrado, onde as electrónicas são frequentemente convocadas. Karen O (dos Yeah Yeah Yeahs) é parceira de valor acrescentado em Pink’s Dream (que abre o alinhamento) com sabor a espaço e Oeste reinventado... Vozes processadas via vocoder (mais faladas que cantadas) traçam cenários diferentes entre Strange and Unproductive Thinking e She Rise Up. Air e Moby surgem como eventuais termos de comparação, respectivamente em Noah’s Ark e Stone’s Gone Up (este o momento de maior luminosidade pop do álbum). Não faltando esse momento magnífico feito de electrónicas que é Good Day Today... Pelo disco passa ainda uma permanente noção de atmosfera, por vezes até mesmo com efeitos de sonoplastia. Cinema, portanto, apenas sem imagem. Afinal, David Lynch mantém-se fiel aos seus caminhos. E Crazy Clown Time é quase como um novo filme seu (ou uma colecção de 14 curtas), contando histórias bizarras e em climas definidos pelo som, a cada ouvinte cabendo a liberdade de criar (ou nem por isso) as suas imagens.

Um músico pelas suas palavras

Uma biografia que já fez correr muita tinta. Contada na primeira pessoa, mas através do trabalho de parceria com James Fox, um velho amigo, jornalista já com outros livros publicados. O método de trabalho colocou um frente ao outro em longas e muitas sessões de trabalho. Keith Richards, de microfone da lapela e guitarra nas mãos, contando o era uma vez da sua vida, passando (naturalmente) pelos Rolling Stones, por episódios vários da sua vida privada, mas deixando claro que a sua paixão maior é mesmo a música, muitas sendo as referências feitas aos nomes e discos que mais admira (e que, na verdade, não só o formaram como foram inclusivamente o motor para a conversa que o juntou pela primeira vez a Mick Jagger, já lá vão longos anos). Numa segunda etapa, e já com as entrevistas transcritas, James Fox leu ao guitarrista dos Rolling Stones os episódios que este recordara, Keith editando então as sequências... Nasce assim um livro. E com ele mais uma importante contribuição para a história escrita do rock’n’roll, através das palavras directas e sinceras, umas vezes mais cruas, outras plenas de grande sentido de humor, por um dos seus maiores vultos. Life acaba de ser colocado nas livrarias portuguesas em tradução de José Luis Costa para a Theoria, uma nova chancela da Cavalo de Ferro. São 574 páginas (sim, é muita página) com histórias que ajudam a contar a história dos últimos 50 anos da música popular.

Para recuperar um disco perdido


Se há coisa que não falta nesta recta final de 2011 são as chamadas edições especiais... É o “clássico” Nevermind dos Nirvana que faz 20 e anos, e vai de o reeditar com extras. O mesmo se pode dizer de Achtung Baby, dos U2, que surge numa série de formatos que ajudam a contar a história de um disco que soube (de facto) reinventar o percurso de uma banda. E para ajudar a fazer a festa, chega hoje aos escaparates (pelo menos lá fora, que por cá da editora ainda não se ouviu nada nesse sentido) uma edição que recupera um dos mais célebres discos perdidos de sempre: o mítico Smile, disco de 1966/67 dos Beach Boys. Esta caixa inclui cinco CDs (o primeiro tentando recriar o álbum original, os restantes juntando takes alternativos para várias das faixas), uma versão do álbum em vinil, dois singles (Vega-Tables e Heroes and Villains), e um booklet de 60 páginas com textos, imagens e uma cronologia dos acontecimentos. Para os interessados, aqui fica a lista completa do alinhamento dos cinco CD:

Disco 1: 
1. Our Prayer 2. Gee 3. Heroes And Villains 4. Do You Like Worms (Roll Plymouth Rock) 5. I'm In Great Shape 6. Barnyard 7. My Only Sunshine (The Old Master Painter/You Are My Sunshine) 8. Cabin Essence 9. Wonderful 10. Look (Song For Children)

Disco 2:
1. Our Prayer "Dialog" 19/9/66 2. Our Prayer 4/10/66 3. Heroes And Villains: Verse (Master Take) 20/10/66 4. Heroes And Villains: Barnyard (Master Take) 20/10/66 5. Heroes And Villains: I'm In Great Shape 27/10/66 6. Heroes And Villains: Intro (Early Version) Circa 12/66 7. Heroes And Villains: Do A Lot 3/1/67 8. Heroes And Villains: Bag Of Tricks 3/1/67 9. Heroes And Villains: Mission Pak 3/1/67 10. Heroes And Villains: Bridge To Indians 3/1/67

Disco 3:
1. Do You Like Worms: Part 1 18/10/66 2. Do You Like Worms: Part 2 (Bicycle Rider) 18/10/66 3. Do You Like Worms: Part 3 18/10/66 4. Do You Like Worms: Part 4 (Bicycle Rider) 18/10/66 5. Do You Like Worms: Bicycle Rider Overdubs (Heroes And Villains Part 2) 5/1/67 6. My Old Sunshine: Parts 1 & 2 14/11/66 7. My Only Sunshine: Part 2 (Master Take With Vocal Overdubs) 10/2/67 8. Cabin Essence: Verse 3/10/66 9. Cabin Essence: Chorus 3/10/66 10. Cabin Essence: Tag 3/10/66

Disco 4: 
1. Vegetables: Fade 12/4/67 2. Vegetables: Ballad Insert 14/4/67 3. Holidays 8/9/66 4. Wind Chimes (Version 1) 3/8/66 5. Wind Chimes (Version 2) 5/10/66 6. Wind Chimes (Version 2 Tag) 5/10/66 7. The Elements: Fire 28/11/66 8. Da Da (Taped Piano Strings) 22/12/66 9. Da Da (Fender Rhodes) 22/12/66 10. Love To Say Dada: Part 1 16/5/67

Disco 5: 
1. Good Vibrations: Gold Star 18/2/66 (The Pet Sounds Session) 2. Good Vibrations: Gold Star 9/4/66 3. Good Vibrations: Western 4/5/66 (First Chorus) 4. Good Vibrations: Western 4/5/66 (Second Chorus & Fade) 5. Good Vibrations: Sunset Sound 24/5/66 (Part 1) 6. Good Vibrations: Sunset Sound 24/5/66 (Parts 2 & 3) 7. Good Vibrations: Sunset Sound 24/5/66 8. Good Vibrations: Western 27/5/66 (Part C) 9. Good Vibrations: Western 27/5/66 (Chorus) 10. Good Vibrations: Western 27/5/66 (Fade Sequence)

Mês Tintin / Spielberg (29)
Uma aventura incompleta


A derradeira aventura de Tintin a chegar a livro é, na verdade, um pouco como as sinfonias incompletas. Com a vantagem de que se mostra apenas o que está feito e não uma tentativa de completar o que ficou por fazer. Surge assim, em 1986 (três anos após a morte de Hergé) o livro em que o criador de Tintin trabalhava mas que não conseguiu já terminar. Tintin e a Alph-Art leva o protagonista a um outro patamar narrativo, numa história no mundo das galerias de arte. O livro resulta de uma reunião dos esboços deixados por Hergé.

Para lá dos livros:


Ao longo deste mês aqui recordámos os 24 álbuns de Tintin, os filmes, algumas edições em livro e, naturalmente, acompanhámos a estreia do novo filme. Para continuar a (re)descobrir o universo de Tintin, fica a sugestão de uma visita ao seu site oficial.

domingo, outubro 30, 2011

Tele-Kadhafi

LUIS BUÑUEL / SALVADOR DALÍ
Un Chien Andalou (1929)
Em televisão, quantos são os jornalistas que já deixaram de pensar nas imagens que difundem e comentam? Infelizmente para todos nós, o tratamento noticioso da morte de Kadhafi voltou a a confirmar que o não-pensamento é mais forte que tudo o resto — este texto foi publicado no Diário de Notícias (28 de Outubro), com o título 'Pornografia de Kadhafi'.

As imagens do espancamento de Muammar Kadhafi e da romaria em torno do seu cadáver voltaram a desencadear o pior das televisões e, em particular, o pior do jornalismo que se faz no espaço televisivo (nacional e internacional).
Por mais que se queira colocar o problema no seu domínio específico (que é o domínio das linguagens), há nele uma dimensão friamente humana. Mesmo resistindo à sua banal fulanização, importa perguntar: que pensam os jornalistas que apresentam de forma absolutamente abjecta, como se estivessem num mercado de obscenidades, a degradação de um corpo, para mais filmada do ponto de vista de uma turba destruidora? E como é que esses jornalistas avaliam o facto de tratarem com o mesmo entusiasmo a morte de Kadhafi ou o rebentamento de uma conduta de água em Alguidares de Baixo?
Falemos de violência. Entenda-se: de violência televisiva. Há uma demagogia militante, insultuosa da inteligência de qualquer espectador, que lida com tudo isto em nome de uma suposta verdade transcendental: aquilo que está em jogo, neste caso o fim de um ditador, legitimaria todos os desmandos de linguagem. Na prática, tal demagogia não hesitará em sugerir que tentar pensar tais desmandos pode ser um sinal de cumplicidade com as atrocidades do regime de Kadhafi.
O que está em jogo é bem diferente. Tem a ver com o facto de continuarmos a assistir a uma informação com muitas componentes pornográficas, promovida como se o seu trabalho fosse a transcrição de um evangelho jornalístico cujos métodos e narrativas não podem ser questionados.
Que é, então, a pornografia? Um sexo dentro de outro sexo? Talvez, por vezes. Mas apenas algumas das vezes: a existência pornográfica das imagens tem a ver com essa violência que transforma o cadáver de um homem num ritual audiovisual em que apenas se adora a equívoca autoridade de um sistema de comunicação. Além do mais, parece que, em televisão, são cada vez menos os que sabem que nenhuma imagem existe fora de um contexto. Será que ninguém viu Blow-up (1966), de Michelangelo Antonioni? No limite, a mesma imagem, em contextos diferentes, pode ser grosseira ou sublime.

Erwin Olaf x 2


Quantas imagens são necessárias para fazer um portfolio? Digamos que podem bastar duas... É essa, pelo menos, a austera e fascinante proposta do holandês Erwin Olaf: o seu novo trabalho, intitulado No Name, apresenta-nos duas figuras enigmáticas, de rosto oculto, num ritual cuja significação permanece indecifrável. Em jogo a singularidade dos olhares (do fotógrafo, das personagens e de quem olha tudo isso) e o assombramento da noção de duplo. Masculino/feminino, eis outro título possível.


Sibelius, segundo Inkinen



Quarto (e derradeiro) volume da integral sinfónica de Sibelius pela New Zeland Symphony Orchestra, dirigida por Pietari Inkinen. Edição pela Naxos. 

Acharam os ditadores do gosto que a música de Sibelius era coisa que não interessava. Acharam sobretudo os que abraçaram o modernismo que ganhou espaço em muita da produção musical posterior aos anos vinte do século XX. Avançando alguma da nova música europeia para a atonalidade, segundo ideias desenvolvidas pela segunda escola vienense, o compositor finlandês mantivera-se fiel a uma escrita tonal e todo um conjunto de referencias ora escutadas entre a tradição romântica ora escutadas entre uma ideia de “alma” local (que dele fez a voz maior da música do seu país)... Era como se um crítico hoje decretasse que a música de Leonard Cohen era um disparate por não usar as técnicas de produção de um James Blake. Ou que não fazia mais sentido haver orquestras porque a nova música pode ser feita com electrónicas... Nah!... Adorno chegou a escrever em 1938 um artigo onde deixava claro que, se se considerasse como “boa” a música de Sibelius, isso “invalidaria” todos os “padrões de qualidade musicak” desde Bach a Schoenberg... Não foi o único, tendo o musicólogo Frank Leibowitz decretado que Sibelius era “o pior” compositor... Eram as suas opiniões. Respeitadas como quaisquer opiniões. Mas longe de unânimes (e longe de terem razão, mas enfim...).
O tempo acabou por dar a estas atitudes apaixonadas um lugar bem guardadinho nos livros de história da música. E a Sibelius a visibilidade que a sua bela obra de facto merece, os catálogos discográficos e os programas de concertos dele fazendo (justificadamente) um dos mais visitados entre os grandes sinfonistas do século XX.
Não têm faltado por isso novas abordagens à sua música, entre elas destacando-se a integral que, desde 2010 a Naxos tem dedicado à sua obra sinfónica, numa série de gravações pela New Zeland Symphony Orchestra, dirigida pelo maestro finlandês Pietari Inkinen. O quarto (e daerradeiro) volume deste ciclo acaba de ser editado, juntando as sinfonias números 6 e 7 e o clássico poema sinfónico Finlandia (de 1900, um marco na afirmação de uma identidade musical local). De 1923, a Sinfonia Nº 6 é uma obra essencialmente tranquila, pontuada em alguns instantes por motivos que podem ter sido inspirados pela paisagem rural finlandesa. De 1924, a Sinfonia Nº 7 é uma obra desafiante na sua estrutura interna, feita de apenas um andamento (em alternativa à estrutura habitual da escrita sinfónica), não deixando todavia de reflectir espaços de contraste. Foi a última sinfonia que compôs. Sabe-se que chegou a trabalhar numa oitava e que destruiu parte do que escreveu já nos anos 40. De resto, confrontado com o tipo de reacções adversas à sua obra, Sibelius quase nada escreveu nos últimos 30 anos da sua vida e nem da sua música gostava de falar...

DocLisboa 2011 (dia 11)


É Na Terra, não é na Lua, de Gonçalo Tocha, é o grande vencedor da edição deste ano do DocLisboa que hoje termina, com a agenda a incluir a repetição de alguns dos filmes vencedores. O filme, que olha a Ilha do Corvo, o seu ritmo de vida, habitantes e lugares ao longo de 180 minutos repete mais logo, pelas 21.30, na Culturgest. Entre a premiação destaque-se ainda a atribuição do Prémio Universidades a En Engel van Doel, de Tom Fassaert, onde acompanhamos os últimos dias de uma pequena povoação nas imediações de Antuérpia, que a expansão do porto obrigou a que fosse apagada do mapa.

Aqui fica a lista completa do palmarés desta edição do festival:

Competição Internacional:

Grande Prémio Cidade de Lisboa
para melhor longa ou média-metragem
É Na Terra Não É Na Lua, Gonçalo Tocha, 180' Portugal 2011
sessão hoje às 21h30, Grande Auditório

Prémio Doclisboa para melhor curta-metragem
Con la Licencia de Diós, Simona Canonica, 26' Suíça 2010
sessão hoje às 21h30, Grande Auditório

Prémio Especial do Júri Doclisboa
Territoire Perdu, Pierre-Yves Vandeweerd, 75' Bélgica, França 2011

Prémio Revelação Doclisboa
para a melhor primeira longa ou média-metragem transversal à Competição Internacional, Investigações e Riscos
Ami, Entends-tu, Nathalie Nambot, 55' França 2010
sessão hoje às 18h30, Pequeno Auditório

Prémio Universidades
Prémio Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias para melhor longa ou média-metragem da Competição Internacional
De Engel Van Doel, Tom Fassaert, 76' Holanda, Bélgica 2011

Investigações:

Prémio RTP2
para melhor documentário de Investigação
(inclui a compra dos direitos televisivos para Portugal)
Diário de Uma Busca, Flávia Castro, 107' Brasil, França 2010
sessão hoje às 17h00, Grande Auditório

Menção Honrosa do Júri do Prémio Investigações
Rechokim The Collaborator and His Family, Ruthie Shatz e Adi Barash, 84' França, EUA, Israel 2011

Competição Portuguesa:

Prémio Doclisboa
para melhor longa ou média-metragem
Yama No Anata, Aya Koretzky, 60' Portugal 2011
sessão hoje às 19h30, Grande Auditório

Prémio Caixa Geral de Depósitos
para melhor primeira obra
A Nossa Forma de Vida, Pedro Filipe Marques, 91' Portugal 2011
sessão hoje 30 às 21h00, Pequeno Auditório

Prémio Doclisboa e ISCTE-IUL
para melhor curta-metragem
Praxis, Bruno Cabral, 29' Portugal 2011
sessão hoje às 19h30, Grande Auditório

Prémio Escolas
prémio Restart para melhor longa ou média-metragem da Competição Portuguesa
Yama No Anata, Aya Koretzky, 60' Portugal 2011

Prémio C.P.L.P.
para a melhor longa ou média-metragem dos Países de Língua Portuguesa
Diário de Uma Busca, Flávia Castro, 107' Brasil, França 2010


Também hoje é exibido, pela segunda vez o filme Michel Corboz, le Combat Entre le Vrai et le Beau, de Rinaldo Marasco e Jérôme Piguet (passa às 17.00 horas no Cinema São Jorge). O filme toma como protagonista o maestro Michel Corboz (que é também titular do Coro Gulbenkian), que segue de perto durante os ensaios, actuação ao vivo e gravação em estúdio da exigente Missa em Si menor de Johann Sebastian Bach pelo Ensemble Vocal de Lausanne. Apesar do interessante golpe de asa narrativo que os realizadores concebem através de uma série de comentários que o próprio Corboz faz quando vê uma primeira montagem do filme, o que vemos não se afasta muito da lógica habitual em making of de grandes acontecimentos musicais. O olhar das câmaras tem contudo pela frente um veterano cheio de histórias, algumas partilhadas entre conversas, escutadas em entrevistas com colaboradores seus ou descobertas entre muitos ensaios. E nestes últimos a coisa vê-se sem filtro, com as chamadas de atenção, por vezes duras e assertivas, quando os elementos do coro não respondem, como o maestro gostaria, ao programa de trabalhos. Obra maior do repertório da música vocal, a Missa é um desafio para qualquer músico. O filme mostra como Michel Corboz, músicos e cantores a enfrentam. E muito bem, acrescente-se.

Podem ver aqui a restante programação do dia.

Entrevistas de arquivo:
Kraftwerk, 2004


Globalmente reconhecimentos como os pais da música pop electrónica, os Kraftwerk estrearam-se num palco português no Coliseu dos Recreios (Lisboa), a 2 de Abril de 2004. Fundador, em 1969, dos Kraftwerk, Ralf Hütter, habitualmente pouco dado a entrevistas, falou ao DN na véspera do concerto. Esta entrevista foi publicada na edição de 2 de Abril de 2004 do DN. 

Ao fim de mais de 30 anos de actividade, qual é o motor que faz ainda andar os Kraftwerk? 
Creio que a aerodinâmica, a dinâmica, a energia dos Kraftwerk e uma certa fascinação pelos sons electrónicos. Temos o nosso próprio estúdio, o Kling Klang Studio, que é como que um instrumento para os Kraftwerk. E agora, no seu novo formato digital, é mais portátil, pode viajar... Pela primeira vez podemos tocar a nossa música em sincronismo com gráficos gerados por computador ou imagens vídeo, pinturas electrónicas... Tudo o que a tecnologia hoje permite! Estamos muito felizes porque nesta digressão mundial, podemos apresentar, finalmente, as coisas que queremos segundo uma visão que há muito tínhamos. Essa visão é, agora, para nós, uma realidade.

Quer isso dizer que a tecnologia do século XXI deu finalmente resposta para velhas ânsias vossas? 
Exactamente. Deu-nos ferramentas para poder tornar reais certas visões nossas. E também mobilidade, movimento... Sempre nos interessámos bastante pelo movimento, daí a conhecida velha fascinação pelo ciclismo. Movimento... Movimento...

De que maneira a tecnologia mais recente vos obrigou a encarar de outra formo vosso trabalho musical? Hoje há ferramentas que não existiam nos anos 70 e 80... 
Eu e o meu amigo Florian Schneider criámos o nosso Kling Klang Studio em 1970. Despendemos então muito tempo na sua construção para que assim conseguíssemos ser independentes e autónomos. Mas os nossos primeiros sintetizadores eram enormes e estavam constantemente a desafinar. Eram muito caros... O nosso primeiro sintetizador foi tão caro como o meu Volkswagen, que é o que está na capa de Autobahn. Sendo estudantes, tínhamos então os nossos problemas naturais... O Florian desenvolveu então o nosso primeiro instrumento electrónico de percussão, a partir de um outro órgão meu. Um amigo nosso, que era pintor, trabalhava connosco pintando as capas dos discos... Envolvíamo-nos em inúmeros projectos além da música, num contexto multimédia electrónico. E agora estamos a fazer a estreia mundial do nosso protótipo móvel Kraftwerk 2002. Tocámos em Paris, a cidade da música, e depois passámos pela Austrália, Japão... Em Fevereiro começámos a digressão mundial de 2004 na Escandinávia, seguindo depois para o Reino Unido e a Alemanha, onde não tocávamos há 13 anos. Hoje podemos viajar e ser como pilotos de ensaio para software electrónico relacionado com a música. Continuamos, hoje, a trabalhar com o mesmo engenheiro musical que nos acompanha há mais de 20 anos, desde o The Man Machine... É um processo de continuidade...

Acolheram com agrado a entrada em cena do sampler?
Tivemos o nosso primeiro sampler nos inícios dos anos 80. Ainda não eram de grande qualidade. Eram mesmo lo-fi! Mas tinham o seu charme. No passado tínhamos trabalhado com fitas, que cortávamos com lâminas para gerar padrões, tal e qual fizemos no Metal on Metal, no álbum Trans Europe Express. Tentámos ser sempre independentes dentro do nosso contexto. Hoje em dia temos os instrumentos.

A tecnologia evoluiu na nossa direcção.
Isso faz-nos muito felizes. Esperámos bastante tempo por um regresso vosso aos discos.

Havia alguma ansiedade entre vós enquanto o terminavam? 
Não. Ao mesmo tempo estivemos a trabalhar na adaptação aos formatos digitais de toda a música dos Kraftwerk. Tínhamos fitas muito antigas que se estavam a degradar e havia muito trabalho para fazer. Estivemos a transformar 33 anos de trabalho de arquivo dos Kraftwerk em formato digital. Hoje todos os sons originais estão disponíveis e vamos brevemente lançar versões remasterizadas de todos os nossos álbuns desde Autobahn. Essa edição vai chamar-se The Catalog, em alemão Der Katalog. São gravações digitais de alta qualidade. E o grafismo dos discos vai incluir ideias que não pudemos usar no passado.

Como é que têm reagido perante tantos anos sucessivos de contínuos elogios à vossa música? 
Isso é muito positivo. É um feed back muito positivo, é uma energia que nos é devolvida, vindo das mais diversas culturas e contextos. Vêm de Tóquio, da Bélgica, de Detroit... De situações hi tech...

Um elogio de David Bowie em 1974 ou de um Aphex Twin em 90 desencadeia reacções diferentes entre vós? 
Quando começámos, em 1968, éramos estudantes e não tínhamos acesso à cena musical. Tocávamos, então, em festas de estudantes e em galerias de arte, e aí a nossa música era sempre bem-vinda...Houve, com o tempo, respostas muito positivas de outros artistas que nos deram outro tipo de feed back. E um incentivo a continuar...


Ainda hoje estão atentos à música electrónica que nasce além das paredes dos estúdios Kling Klang? 
Sim, bastante. Quando viajamos, seja para concertos ou nem por isso, saímos com amigos e vamos a clubes onde ouvimos a música de dança electrónica que ali se toca. O som do ambiente também nos interessa. As nossas orelhas são como microfones, e captamos ideias nas nossas experiências do dia a dia.

O vosso site na Internet aposta claramente numa linguagem que promove a interacção. Como desenvolveram as ideias que ali aplicam? 
Nós desenvolvemos entre nós todas as ideias, elaboramos uma espécie de script, e temos depois quem esteja a trabalhar directamente com os programas de computador, a desenhar em flash... Como vê estamos envolvidos em todos os aspectos dos Kraftwerk. Fazemos as capas dos álbuns, pinturas, gráficos de computador, fotografias...Os Kraftwerk são um conceito total. Faço isto com o meu amigo Florian Schneider [o músico entretanto afastou-se do grupo] há mais de 30 anos. O Mr. Kling e o Mr. Klang...Tudo o que está em redor dos Kraftwerk é uma arte total.

Porque houve sempre uma certa aura de mistério em redor dos Kraftwerk, sobretudo na imprensa musical dos anos 70?
Talvez porque as pessoas não nos compreendiam...

Construíram então a identidade do grupo numa espécie de oposição à iconologia tradicional do rock'n'roll... 
Tudo veio do nosso trabalho em estúdio, o nosso trabalho musical.Inventámos nos anos 70 um conceito a que chamámos a semana de 168 horas.

Trabalho e mais trabalho... 
Sim, é a única coisa que fazemos. E quando não estamos a trabalhar em coisas relacionadas com os Kraftwerk gostamos de andar de bicicleta, que nos parece envolver o mesmo nível de energia que a criação musical. E é algo que aponta sempre em frente.

Gostam mais de se apresentar ao vivo num palco ou de passar horas a trabalhar no estúdio? 
Gostamos das duas coisas. Tudo tem a ver com Kraftwerk, e o conceito é o de trazer à vida todas as nossas ideias audiovisuais. E as pessoas compreendem. As evidências falam por si. Caso contrário estaríamos a trabalhar em literatura. Mas a verdade é que escrevemos poucas palavras nas nossas letras. Usamos apenas palavras-chave.

Podemos esperar uma edição em DVD desta digressão? 
Sim, estamos trabalhar nisso mesmo. Vamos tocar até Julho, e depois temos convites para fazer festivais. No ano passado fomos convidados para a Volta a França e estávamos por lá ao mesmo tempo que acabávamos o trabalho no álbum. O disco saiu quando a Volta à França chegou ao fim.

Vamos esperar muito tempo por um próximo disco? 
Mal acabe a digressão voltamos ao estúdio para começar a trabalhar em música nova...

Ao serviço de mais uma exposição

Discografia Brian Eno - 46 
"I Dormienti" (álbum), 1998



Uma exposição em Londres, na Round House, em Camden Town, foi o ponto de origem para mais um disco / instalação de Brian Eno. A exposição levou o músico a criar material novo para acompanhar obras do italiano Mimmo Paladino, nome ligado à chamada Transvanguardia italiana. O disco usa uma série de gravações de voz arrumadas em camadas, juntando-se o piano e uma noção de espaço e cenografia.

Mês Tintin / Spielberg (28): De regresso à América Latina


Após um hiato de oito anos, Tintin regressou com uma nova aventura na América Latina, recuperando uma série de personagens que já conhecíamos de alguns álbuns anteriores, nomeadamente de O Ídolo Roubado, cuja acção decorre em espaço semelhante. Em Tintin e os Pícaros o jovem repórter vê-se entre cenário político de equilíbrio instável, o poder local eternamente disputado entre os partidários do Coronel Tapoica e do General Alcazar. De novo surge uma representação de Tintin mais moderna, com um novo tipo de calças. Este seria o último álbum completo que Hergé editaria com aventuras de Tintin.

Para lá dos livros:


Está já patente em espaços do piso superior do Saldanha Residence, em Lisboa, uma exposição dedicada a Tintin. Com modelos, merchandising, livros de várias proveniências, Tintin em Lisboa pode ser visitada até dia 5 de Novembro (sábado próximo). A entrada é livre.

sábado, outubro 29, 2011

Joss Stone: seis anos de canções

Para além da sua colaboração no projecto SuperHeavy, o ano de 2011 fica marcado, para Joss Stone, pelo lançamento do quinto álbum de estúdio, LP1. Oportunidade, por isso, para um balanço e contas. Que é como quem diz: um "best of" percorrendo os quatro álbuns anteriores, publicados ao longo de seis anos de uma carreira de fulgurante recriação da herança soul (2003-2009). E tudo começa, claro, pelo emblemático Fell in Love With a Boy, composto por Jack White — em video, para recordar.


>>> Site oficial de Joss Stone.

Soft Cell, 1982


Regressando aos Soft Cell, procurando mais pistas além dos singles habitualmente revisitados, recordamos hoje aquele que foi o single de apresentação de The Art Of Falling Apart, o segundo álbum de originais da dupla constituída por Marc Almond e Dave Ball. Aqui fica o teledisco que então acompanhou o lançamento de Where The Heart Is.

DocLisboa 2011 (dia 10)


O hip hop é para alguns visto como uma voz para quem não a tem de outra forma. De facto pode não requerer grandes meios, bastando um microfone e um fundo instrumental. Se bem que, não sejamos ingénuos, raros são os acontecimentos musicalmente marcantes, e já mesmo desde finais de 80, nascidos de tão rigorosa dieta de meios. Mas foi assim no início. E no início o que valia era mesmo o verbo. Daí que seja importante encarar o documentário de Joshua Atesh Litle como uma visão de parte desta realidade, estando de resto fora da sua agenda um eventual panorama sobre o vastíssimo espectro de expressões em que hoje o hip hop se manifesta.

Hip Hop, le Monde est à vous, do norte-americano Joshua Atesh Litle (passa hoje pelas 22.00 horas no Cinema São Jorge), é, acima de tudo, um olhar sobre o hip hop como forma de expressão de uma inquietude política e/ou social em vários pontos do globo. Começamos por ver evocações das primeiras expressões no Bronx, nos anos setenta. Mas antes mesmo da história chegar ao patamar de exposição desta música emergente, que fez de Rapper’s Delight o seu primeiro “caso” mediático (em 1979), saltamos para França onde encontramos os primeiros focos de expansão da ideia nos dias dos oitentas. Mais adiante rumamos à Alemanha. E em ambos os espaços é entre emigrantes (em segundas e terceiras gerações) que escutamos narrativas de desajustamento, dificuldade de integração e discriminação que encontram no hip hop uma forma de comunicação. De partilha entre iguais, de crítica e alerta para mais adiante. Vemos depois como o hip hop serve para escutar os que vivem dos dois lados do muro que faz notícias em volta de Ramallah. Ou, mais adiante, como reencontra a raíz remota dos griots africanos no Senegal dos nossos dias.

Hip Hop, le Monde est à vous parece contudo mais interessado em abordar conteúdos que formas (são as palavras e os temas que, na verdade, estabelecem as diferenças geográficas entre os casos que descobrimos no ecrã). E não procura senão figuras que encaram o hip hop como uma voz de protesto. Da música, por sua vez, quase nem sequer se fala... O filme revela uma interessante recolha de depoimentos, mas fecha o ângulo num ponto de vista único. É uma opção. Mas no fim acaba por saber a pouco...

Podem ver aqui a restante programação para hoje.

Mês Tintin / Spielnberg (27):
Uma aventura no Pacífico


Um vôo é desviado... E a bordo seguia Tintin... Este é o ponto de partida para Vôo 714 Para Sidney, o volume originalmente publicado em 1968 que leva, pela primeira vez, Tintin às águas da Oceania. Esta é a história do rapto de um milionário, e que devolve a cena a figura de Rastapopoulos novamente como cabecilha de um gangue. Grande parte da acção decorre numa ilha vulcânica do Pacífico.

Outros livros:

Mais um título a chegar aos escaparates em tempo de estreia da adaptação das aventuras de Tintin ao cinema por Spielberg. Com o título Herge: The Genius of Tintin: A Biography, este livro assinado por Raphael Taylor é uma biografia de 352 páginas sobre Georges Remi, ou seja, o criador de Tintin. A edição britânica, assegurada pela Icon Books, está agendada para dia 10 de Novembro.

Música numa exposição

Discografia Brian Eno – 45 
“Extracts from Music for White Cube, London 1997” (álbum), 1997



Em, 1997 Brian Eno levou a disco a música que criou para uma instalação. Em concreto, teve expressão física na galeria White Cube (em Londres), entre 25 de Abril e 31 de Maio de 1997. O disco era, na verdade, o catálogo da exposição, apresentando o booklet um ensaio sobre a obra em si. A música nasce da mistura de uma série de sons, captados em lugares nas imediações.

sexta-feira, outubro 28, 2011

Nova vida para Frankenwinnie


Foi, em 1984, uma curta-metragem. Agora Frankenwinnie terá nova vida no grande ecrã, novamente com Tim Burton, em formato de longa-metragem, socorrendo-se da mesma técnica de animação usada em filmes como O Estranho Mundo de Jack ou a Noiva Cadáver, adaptando depois a imagem a 3D. O elenco de vozes inclui quatro actores que já trabalharam anteriormente com Tim Burton: Winona Ryder (que vimos em Beetlejuice – Os Fantasmas Divertem-se e Eduardo Mãos de Tesoura), Catherine O’Hara (que participou em Beetlejuice – Os Fantasmas Divertem-se e O Estranho Mundo de Jack), Martin Short (que colaborou em Marte Ataca!) e Martin Landau (que trabalhou com Burton em Ed Wood e A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça). O filme terá estreia em 2012.

Num estúdio de televisão...


O projecto Beirut passou pelos estúdios do programa de Jimmy Fallon para aí apresentar Santa Fe, um dos temas do seu mais recente álbum de originais. Aqui ficam as imagens da actuação.

Reedições:
GNR, Defeitos Especiais


Este texto é uma versão editada (e actualizada) de um outro aqui publicado no Sound + Vision em Janeiro de 2008.

GNR 
“Defeitos Especiais” 
EMI Music Portugal 
4 / 5 

Em Janeiro de 2008 dizia aqui no Sound + Vision que o segundo álbum dos GNR, Defeitos Especiais (EMI, 1984) era, porque até então nunca editado em CD, uma das mais injustamente “esquecidas” pérolas da pop portuguesa de 80. E eis que três anos depois a discografia dos GNR conhece, finalmente, uma integral editada em CD (num lançamento via DN e JN), sem que Defeitos Especiais fique de fora. Sucessor do magnífico Independança (álbum de estreia, editado em 1982), o segundo LP dos GNR reflecte uma opção por caminhos atentos ao que eram as formas pop do seu tempo, seguindo afinal ideias já presentes em canções da face A do disco anterior. Este é também um álbum mais consciente da personalidade (em franca afirmação) da escrita e voz, de grande personalidade, de Rui Reininho. Por outro lado assinala-se um afastamento do grupo face a eventuais novas incursões por terrenos de vanguardismo pop como haviam feito em Avarias, a longa faixa única que dominara todo o lado B do primeiro álbum e que surgira, em versão edit, no single Hardcore (1º Escalão). Defeitos Especiais não é, contudo, um espaço de desistência de uma vontade de manter vibrante uma ideia de invenção pop, reflectindo muitas das suas canções um gosto pelo ensaio de molduras desafiantes, assegurando o alinhamento uma coexistência cativante entre momentos de ensaio formal, como se reconhece no belíssimo híbrido de tempero “mouro”, de travo fadista (com, inclusivamente, uma citação da Canção do Mar) de Muçulmania, na utilização curiosa das electrónicas em A Última Vaga ou na exploração da voz falada no contagiante Pershingopolis. Ao mesmo tempo habita aqui uma tranquila relação com modelos mais radio friendly (mesmo assim atentos aos códigos das linhas da frente do seu tempo), como se escutava em Desnorteado, Mau Pastor ou I Don’t Feel Funky Anymore. Esta última canção, escolhida como single, representa o único instante do álbum não cantado em português. De certa forma, este tema assegura uma ponte directa com o álbum de estreia, nomeadamente com o bem sucedido single dele extraído, Hardcore (1º Escalão). O disco nasceu num momento de mudanças internas para o grupo. Victor Rua saíra para os Telectu. O panorama pop/rock nacional vivia uma certa reacção (quase em jeito de ressaca) ao “boom” de inícios da década. Rui Reininho chegou a apontar este como o álbum “mais Rock Rendez Vous” (nome de um clube lisboeta que então lançava as novas ideias no panorama pop/rock nacional). Na verdade conseguiram aqui um dos momentos mais marcantes da sua obra, um tanto injustamente esquecido pela sua ausência ditada pela falta (até aqui) de uma edição digital. Com essa ordem reposta, eis que volta a cena uma das pérolas maiores do pop/rock made in Portugal na primeira metade dos oitentas.

DocLisboa 2009 (dia 11)


Olhar um continente de noite. É claro que a ideia poderia parecer coisa megalómana a um primeiro olhar, tantos que são os lugares, as gentes, os acontecimentos, que moram entre o ocaso e a alvorada por esta Europa fora. Mas, mais que o traçar de um olhar sistemático sobre a noite europeia, o que Abendland propõe não é mais senão um conjunto de quadros que, somados, permitem um olhar conjunto de cenas vividas por quem fica acordado nas horas em que os lençóis, os cobertores e almofadas chamam a maioria da população ao sono.

O filme de Nikolaus Geyrhalter, que passa hoje às 19.00 horas no Cinema São Jorge, é apresentado como um “poema filmado”. A premissa faz sentido, os olhares que a câmara faz chegar ao ecrã observando figuras e lugares que vivem de noite. Uns entre festa, danças e sorrisos (não faltando as bebedeiras e ressacas), outros em trabalho com agenda de esforço medida a cada segundo que passa. Uns em ritmo acelerado, dançando ao som de techno num grande pavilhão, outros observando, atentos a ecrãs de vigilância. Uns servindo cervejas e frango assado no Oktoberfest que faz a festa em Munique todos os outonos, outros falando com anónimos em linhas de auxílio abertas 24 horas por dia. Uns debatendo, outros traduzindo, em sessões nocturnas de instituições políticas, outros acautelando a segurança em linhas de fronteira...

Com uma cuidada direcção de fotografia, Abendland é assim uma soma, aparentemente aleatória, mas com texto de certa forma arrumado no contexto, de fragmentos de episódios protagonizados por vidas comuns. O realizador parece, por um lado, não comentar nem mesmo procurar uma lógica narrativa entre as imagens que aqui recolhe. Mas de certa forma deixa passar uma sugestão sobre um omnipresente peso de uma noção de desejo de segurança que atravessa o continente, das fronteiras de Espanha às da Ucrânia, passando pelas ruas de Londres, por uma comunidade de emigrantes em Itália ou por uma ocupação de uma via férrea na Alemanha.


Imagens do trailer de Abendland

Podem ver aqui a restante programação para hoje.

125 anos depois




Faz hoje 125 anos. Foi um presente dos franceses aos americanos, destinado a assinalar o centenário da revolução (a declaração da independência ocorreu em 1776). Acabou por ser inaugurada dez anos mais tarde que o suposto, mas é desde 1886 o ex líbris da cidade e representou, para muitos dos milhares de emigrantes que nas últimas décadas do século XIX e primeiras do século XX, um primeiro olhar sobre terras americanas, logo que os navios entravam na baía do rio Hudson, antes mesmo de atracarem em Ellis Island.

A Estátua da Liberdade (de quem podemos ver um modelo reduzido numa das pontes sobre o Sena, em Paris) foi projectada por Fréderic Bartholdi mas viveu um período de financiamento complicado, com duas primeiras partes (a cabeça e a mão com a tocha) respectivamente expostas em Paris e em Nova Iorque antes da construção ter ordem para avançar definitivamente. Foi então constriuída em França, enviada por barco através do Atlântico e montada na pequena ilha onde desde então mora, à vista do Battery Park, na ponta mais a Sul de Manhattan.

A Estátua da Liberdade transformou-se num símbolo, que a cultura popular visitou já por diversas vezes. Aqui ficam três entre as muitas representações da Estátua da Liberdade em capas de discos. Na primeira, na capa de I Stand Alone, álbum de 1968 de Al Kooper. Depois, numa leitura livre, em Breakfast in America, dos Supertramp, em 1979. E a fechar, em Statue of Liberty, um single de 1978 dos XTC.

Mês Tintin / Spielberg (26):
Tintin na idade da televisão


As Jóias de Castafiore é uma aventura de Tintin essencialmente centrada em redor do castelo onde vive o capitão Haddock, explorando sobretudo as características de algumas personagens centrais à série, juntando pelo meio uma intriga com uma esmeralda da cantora Bianca Castafiore. As Jóias de Castafiore, livro originalmente publicado em 1963, reflecte também sobre o poder dos media.

Outros livros:

Ao mesmo tempo que estreia em sala a nova adaptação assinada por Steven Spielberg, aos escaparates das livrarias chegam novos livros dedicados a Tintin, um deles - The Art of The Adventures of Tintin - directamente relacionado com a direcção artística desta nova visão digital, em 3D.

quinta-feira, outubro 27, 2011

Uma questão de classe


São um trio de Brooklyn, mas editaram um álbum de estreia com título em francês. Chamam-se Class Actress e do alinhamento de Rapprocher editam no formato de single o tema Weekend. Aqui fica o teledisco, assinado por Bek Andersen.

Mês Tintin / Spielberg (25):
Tintin, segundo Steven Spielberg


Há 30 anos, a primeira aventura de Indiana Jones levou aos ouvidos de Steven Spielberg o nome de Tintin... Havia afinidades. Suficientes para levar Spielberg a querer conhecer Hergé (cuja obra nuna conheceu grande exposição junto do público norte-americano). E a desejar desde logo uma adaptação ao cinema das aventuras do jovem repórter. Bastava ver os filmes de animação já realizados (e esse não é o campeonato de Spielberg) ou as experiências de imagem real concretizadas nos anos 60 para entender que nem um caminho nem o outro seria o destino para uma nova vida de Tintin no cinema. A tecnologia, só longos anos depois permitiu o “eureka” que o levou, finalmente a arregaçar mangas e avançar pelo projecto. Aconteceu ao ver como a nova técnica de motion capture permitia um híbrido novo entre o trabalho com actores reais e a construção digital de um universo mais próximo do desenho (afinal, o espaço que viu nascer Tintin). De Polar Express para Monster House notaram-se avanços impressionantes no recurso a esta nova tecnologia (usada ainda por Peter Jackson, parceiro de Spielberg nesta aventura, para a criação do Gollum, na trilogia do Senhor dos Anéis). E, 30 anos depois... volià. Temos Tintin de volta ao cinema. E pelas mãos de Steven Spielberg.

A obra de Hergé mora claramente na medula do filme. De resto, na sequência de abertura vemos Tintin numa feira de antiguidades, a ser desenhado por alguém que não é mais senão uma representação do próprio Hergé, o desenho que logo a seguir nos mostra ilustrando a visão clássica que temos do protagonista. A história evolui então tomando o livro O Segredo do Licorne como espaço narrativo central, juntando elementos, lugares e personagens de O Caranguejo das Tenazes de Ouro e um final encontrado nas páginas de O Tesouro de Rackham, o Terrível. Pelo caminho, e não deixando nunca de respeitar a caracterização (física e psicológica) das personagens criadas por Hergé, há espaço para alguma liberdade, juntando elementos que garantem ao filme uma ligação entre os elementos procurados na BD e uma condução segura da história, com os ingredientes necessários a um bom filme de aventuras. As Aventuras de Tintin – O Segredo do Licorne não é, por isso, uma adaptação, quadradinho a quadradinho, dos álbuns de Hergé ao grande ecrã.

Tecnicamente a opção procurada por Spielberg e Peter Jackson (parceiro, neste primeiro filme, como produtor) resulta em pleno. Há uma verdade nos movimentos, na interpretação, cabendo à fantasia a criação de outra realidade sobre os seus corpos e sua colocação nos espaços que, assim, vivem algo entre o mundo físico e um sentido de imaginação que nasce da BD. Valeu a espera. Spielberg, de facto, encontrou finalmente o caminho certo para a expressão viva da obra de Tintin no grande ecrã. Venham as sequelas... E não falta por onde escolher...


Imagens do trailer do filme

Discos pe(r)didos:
Leslie Winer, Witch


Leslie Winer
"Witch"
Transglobal Records
(1993)

Quantos nomes a história acaba por esquecer porque, ou não deram continuidade aos seus projectos ou porque, de tão afastados dos focos mais mediáticos na origem, nunca emergem devidamente a um patamar de maiores (e justificadas) atenções. Leslie Winer sentiu na pele estes dois cenários. Com carreira iniciada como modelo, trabalhou depois com nomes como William S. Burroughs ou Jean Baptiste Basquiat... Até que, em inícios dos noventas, se aventura pela música, criando um álbum que, apesar de na altura nunca ter ido além do espaço vivencial de alguns seguidores mais atentos de realidades nascidas nas periferias do hip hop, acabou na realidade por traduzir uma visão algo familiar à que, por essa altura, os Massive Attack criavam nos seus primeiros discos (daí ter sido apontada, a dada altura, como a madrinha do trip hop).
Na verdade há pontos em comum, sobretudo na lógica de construção de uma música que toma a tranquila soma de samples como tijolos estruturais e um clima dub como cenário. Mas há caminhos que ao mesmo tempo afastam Witch do que então escutávamos em Blue Lines ou Protection. Há uma postura vocal que aceita heranças nova iorquinas, da prosódia vocal de um Lou Reed ao gosto pelo contar de histórias, em regime spoken word, de uma Laurie Anderson. A instrumentação é escassa, as composições essencialmente assentes numa arquitectura de elementos rítmicos e samples (um de Captain Beefheart domina o irresistível 1nce Upon a Time) e o trabalho vocal. Sendo todavia notória, e estruturalmente significativa, a presença do baixo, com alma tranquila, de Jah Wobble.
Leslie Winer saiu de cena pouco depois, não dando nunca continuidade ao projecto encetado em 1993 com Witch, limitando as suas escassas experiências posteriores na música a colaborações pontuais. Entretanto, há poucas semanas regressou ao activo, através do projecto Purity Supreme, que co-protagoniza com o produtor francês Christophe Van Huffel.

Percursos entre imagens


Um espaço para fotografia de minha autoria (que não sou profissional da coisa!). Chamei-lhe I Am A Camera, mora num tumblr e tem agora nova imagem gráfica. Podem ver as imagens aqui.

DocLisboa 2011 (dia 8)


A história dos movimentos musicais deve muito a quem cria a música (naturalmente!). Mas para que a música deste mais daquele mais daquela e daqueloutro somem, juntas, uma ideia de acontecimento comum (e não são isso os movimentos?), faz falta depois um elemento exterior que os une ou junte, captando atenções comuns e dando conta de que alho ali está a acontecer. Assim foi com o punk no mítico CBGB em Nova Iorque, com os neo-românticos no londrino Blitz ou com o psicadelismo (facção Londres) nas noites UFO em 1966. Os singer-songwriters não são invenção de finais dos anos 60. Já os havia, até mesmo com discos editados, conhecendo em alguns bares do Greenwich Village e na própria Washington Square (em Manhattan) alguns focos de atenção... Mas a tomada de consciência (inclusivamente das grandes editoras discográficas e, logo depois, o público maintream) de que ali havia outra escola de canções a seguir com atenção chega quando, entre finais de sessentas e inícios de setentas um bar do Sunset Boulevard (em Los Angeles) os toma como ingrediente único na ementa do seu palco. O The Troubadour tinha história já desde finais dos anos 50, mas é ao som de novas vozes e de canções que contavam histórias que Doug Weston encontra não apenas a chave para o definitivo sucesso do seu bar e, para esse nova geração de músicos, um decisivo palco de lançamento.

Troubadours, de Morgan Neville (passou ontem no DocLisboa) é um olhar sobre essa mesma geração de vozes, tomando o clube de Doug Weston como palco que centra as narrativas que recorda. O filme parte, na verdade, de um reencontro de Carole King com James Taylor nesse mesmo palco onde, há perto de 40 anos, deram importantes passos para o definitivo lançamento das respectivas carreiras. Carole King, a menina que antes escrevia canções para outras vozes no Brill Building em Nova Iorque e James Taylor, que dera primeiros passos no catálogo da Apple Records (sim, a dos Beatles), reinventaram-se ao dar antes voz a sim mesnos e não ao que de si esperavam, a passagem pelo palco daquele bar em Los Angeles tendo acontecido como a opção certa na hora certa. A história que o filme conta passa depois por nomes como os de Joni Mitchell, Jackson Browne, Chris Kiristofferson, Bonnie Riatt... Por Bill Crosby, dos Byrds... Pelo nascimento dos Eagles. Pelo arranque de carreira de Elton John. Pecando por, de tão centrada na vivência daquele bar, passar a leste de outros importantes cantautores da mesma geração como o foram Tim Buckley, Nick Drake (nome com carreira uma realidade bem diferente, é certo) ou mesmo Leonard Cohen.

Com uma linguagem televisiva, Troubadours é mesmo assim um interessante olhar por uma época, contando como valor acrescentado o impressionante lote de depoimentos que congrega. Tem história, tem personagens, tem música. Falta-lhe apenas... cinema.


Hoje o DocLisboa apresenta Abendland, filme de Nikolaus Geyrhalter que é apresentado no site oficial do festival como sendo “um poema filmado sobre um continente à noite”. Passa às 20.00 horas no Cinema São Jorge e repete amanhã, também ali, pelas 19.00 horas.

Podem ver aqui a restante programação para hoje.

quarta-feira, outubro 26, 2011

Um quarteto londrino


Chamam-se Younghusband, chegam de Londres e editam em Novembro um novo EP. Aqui fica um dos temas que podemos encontrar no alinhamento de Crystal. Este é Constantly in Love, em teledisco realizado por Elsa Philippe.

Novas edições:
The Sea and Cake, The Moonlight Butterfly


The Sea and Cake 
“The Moonlight Butterfly” 
Thrill Jockey 
4 / 5 

Podem não ser dos nomes mais vezes citados pelas vagas de entusiasmo que despertam as grandes paixões e geram os fenómenos de que se vai falando, mas a verdade é que nos The Sea and Cake podemos reconhecer uma das mais consistentes entre as carreiras indie rock nascidas na América dos noventas. Naturais de Chicago, começaram por tactear formas em torno de genéticas do indie rock, juntando reflexões instrumentais de alma jazzística, o tempo abrindo espaço ao trabalho com outros sons e outras referências, pelos seus discos correndo sempre um raro clima de frescura que contrasta com os temperos de ansiedade, urgência ou descontentamento que tantas vezes ganham forma pelos arredores de referências semelhantes. A voz pausada e discreta de Sam Prekop pode ser uma das suas mais vincadas características distintivas, o gosto requintado por uma ideia de canção que se saboreia e descobre marcando igualmente a história de uma discografia que soma já uma mão cheia de belos títulos. The Moonlight Butterfly é na verdade um mini LP (são ao todo seis temas, coisa maior que um EP, mas aquém da dose habitual em álbuns). E representa o que parece ser um instante de, sem ideias de ruptura, procurar uma contínua ideia de desafio (que se manifesta sobretudo numa vontade em alargar a canção além das suas fronteiras convencionais, abrindo espaço a um mais evidente protagonismo instrumental onde a repetição, a construção de acontecimentos cénicos sendo elementos que definem aqui os espaços que agora encontramos). Um certo sentido de elegância, transversal a grande parte da obra em disco dos Sea and Cake, mantém-se entre os pontos fixos de uma agenda que tanto abre espaço a uma simples exploração de programações electrónicas no belíssimo instrumental que dá título ao disco como sublinha uma filiação numa escola indie “clássica” (matriz Sonic Youth, mas com poupança na conta da electricidade) que gera outro momento sedutor ao som de Up On The North Shore. Talvez este seja um episódio mais de procura que de novo patamar encontrado. Mas junta mais um belo momento a uma obra que não parece muito preocupada em definir as regras do momento, mas antes em seguir um caminho mais seu, mais tranquilo, mais... gourmet.

Mês Tintin / Spielberg (24):
Qual é o melhor filme de Steven Spielberg?


A um dia da estreia nacional do filme de Steven Spielberg que adapta ao grande ecrã as aventuras de Tintin lançamos um desafio aos leitores do Sound + Vision, pedindo que nos ajudem a escolher qual será o melhor filme do realizador norte-americano. Propomos assim que escolham uma entre as suas longas-metragens para cinema, o que deixa assim de fora alguns dos filmes que antes rodou para a televisão, entre eles o célebre Um Assassino pelas Costas (1971). Podem votar, como sempre, na barra lateral do blogue. E aqui fica a lista completa dos títulos:

Asfalto Quente (1974)
Tubarão (1975)
Encontros Imediatos de Terceiro Grau (1977)
1941, Ano Louco em Hollywood (1978)
Os Satteadores da Arca Perdida (1981)
E.T. – O Extra-terrestre (1982)
Indiana Jones e o Templo Perdido (1984)
O Império do Sol (1985)
A Cor Púrpura (1987)
Sempre (1989)
Indiana Jones e a Última Cruzada (1989)
Hook (1991)
Parque Jurássico (1993)
A Lista de Schindler ( 1993)
Amistad (1997)
O Mundo Perdido – Jurassic Park (1997)
O Resgate do Soldado Ryan (1998)
A.I. – Inteligência Artificial (2001)
Relatório Minoritário (2002)
Apanha-me se Puderes (2002)
Terminal de Aeroporto (2004)
Guerra dos Mundos (2005)
Munique (2005)
Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal (2008)

Do novo filme, com Tintin como protagonista, brevemente aqui faremos um balanço de votos contra e a favor... Mas antes nada como ver o filme, que estreia amanhã.