
terça-feira, junho 30, 2009
A Rainha Vermelha de Tim Burton

Pina Bausch (1940 - 2009)

>>> Extracto de Mazurca Fogo.
As luzes da cidade
Novo disco ao vivo dos Blur
Vinte anos depois

Em Chiang Mai (2)



Crónicas da Tailândia (5/10)

Nas margens do rio há vestígios dessa presença portuguesa, os mais visíveis nas fundações de uma igreja dominicana, hoje musealizada, ao lado da qual estão preservados corpos de membros da comunidade que ali fazia o seu quotidiano. Mesmo ao lado, numa casa à beira rio com um barco arrumado sob os pilares que a sustentam e elevam do chão, vive André. De porte elegante e sorriso permanente, tem 75 anos, foi em tempos pescador e vive casado há já 55 anos com Maria. Tem nove filhos, mostrando a sua casa uma multidão de fotos de família entre os santos de sua devoção. André explica, em thai, que é um dos poucos descendentes de portugueses que permaneceram em Ayutthaya depois do ataque birmanês e da posterior mudança da capital para o que hoje é Banguecoque. Cristão, vai todos os domingos à missa a uma igreja ali perto, construída pelos franceses no século XVII. Das três igrejas portuguesas da velha cidade restam hoje as ruínas da dominicana, estando as das outras duas (uma jesuíta e uma franciscana) por reencontrar. Da primeira, escavações no local esperado revelaram o que parece ser um templo budista. Da segunda, agricultores encontaram recentemente (numa propriedade hoje privada) ossos onde se crê estarem enterradas as suas fundações. O desafio é reconhecido pelos arqueólogos. Resta assegurar o financiamento para continuar os trabalhos.
Godard em reportagem

Por desentendimento entre Godard e a direcção do Pompi-dou, "Collages" nunca se concretizou, dando origem a uma expo-sição "alternativa" — de nome Voyage(s) en utopie, Jean-Luc Godard, 1946-2006 [cartaz em cima] —, embora conservando o espírito do projecto inicial, projecto que pressupunha uma certa lógica "tradicional", com várias salas temáticas, do mito ao real, passando pela câmara, traçando uma espécie de fábula trágica sobre os desígnios, apoteoses e agonias da história do cinema.
>>> De l'Origine du XXIè Siècle e The Old Place estão editados num DVD do catálogo ECM que inclui Je Vous Salue Sarajevo (1993), curta-curtíssima (2 min.) que, em Réportage Amateur, Godard refere como um dos videos previstos para passar, em loop, num dos ecrãs da exposição — estes são os primeiros 7 minutos de De l'Origine du XXIè Siècle.
segunda-feira, junho 29, 2009
Errol Flynn: memória e esquecimento

No sábado, dia 20, a RTP2 dedicou várias horas da sua emissão a Errol Flynn. Motivo: o assinalar do centenário da data do seu nascimento. Assim, foi possível ver um documentário sobre o lendário actor de Hollywood e ainda dois dos títulos mais emblemáticos da sua vasta filmografia: O Gavião dos Mares (1940), de Michael Curtiz, e O Rebelde Aventureiro (1952), de William Keighley.
Na devastada paisagem do cinema nos nossos canais generalistas, este acontecimento serviu também de lembrança do muito que deixou de se fazer (e programar). Não são apenas os filmes que, com pouquíssimas excepções, passaram a ser “imagem para canhão”, umas vezes preenchendo heróicas madrugadas, outras amontoando-se em tardes de critério inconsistente. De um modo geral, o cinema passou a ser entendido (e programado) como um resto mais ou menos irrisório, porventura dispensável, em tudo e por tudo contrário ao lugar que continua a ocupar nos mercados e no imaginário popular.
O exemplo de Errol Flynn é tanto mais interessante quanto, de facto, está longe de se esgotar na sua dimensão estritamente cinéfila. Será um dado irrelevante para programadores, mas a procura de clássicos ou filmes mais ou menos “antigos” tornou-se uma componente importante do mercado audiovisual. Em particular no DVD, tem-se registado em todo o mundo (e Portugal não é excepção) um crescimento exponencial nas edições de títulos clássicos da história do cinema. E não consta que sejam apenas três ou quatro obcecados críticos de cinema que fazem o sucesso de muitos desses títulos...
Infelizmente, o drama é mais vasto, superando o problema específico do cinema e respectiva difusão. O que está em jogo é o metódico apagamento das memórias, sobretudo do prazer de descoberta e do gosto de conhecimento que essas memórias possam envolver. Tal prática tende a favorecer alguns lamentáveis preconceitos, a começar por esse, obsceno entre todos, segundo o qual os filmes a preto e branco são um acidente mais ou menos anedótico da história do cinema... Tudo isso só pode multiplicar o valor prático e simbólico de acontecimentos como este reencontro com Errol Flynn.
Sócrates/Moniz
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"Network" (1976), de Sidney Lumet
O caso PT/TVI veio prolongar a saga de temas e tabus em torno da televisão que (não) se faz em Portugal — este texto foi publicado no Diário de Notícias (28 de Junho), com o título 'Os tabus em torno de José Eduardo Moniz'.Podemos admitir que, apesar da competência e seriedade das pessoas que administram a PT, essas mesmas pessoas foram subitamente assaltadas pelo vírus da ingenuidade e não pensaram que qualquer movimento financeiro em direcção à TVI teria imediatas e inevitáveis conotações políticas. Podemos até supor que José Sócrates, alvo automático de uma grande parte da comunicação social (entrará para a história como a “nova saga Santana Lopes”, agora com outro actor), tenha cometido o pecado supremo da arrogância distraída, encarando a entrada da PT na TVI como um simples dossier esquecido em cima da sua secretária.
Podemos especular infinitamente sobre tudo isso, transformando o país num imenso jogo de video, frenético e surreal, em que disparamos automaticamente contra qualquer rosto que apareça a espreitar à esquina de uma rua ou numa janela entreaberta. É o que está a acontecer, aliás, fazendo triunfar esse glorioso argumento de “produção de verdade” que é o: “Eu acho que...”.
Não, não estou a sugerir que se apague o ocorrido (seja como for que tenha ocorrido). Sou mesmo dos que pensam que, em qualquer caso, a simples aproximação da PT à TVI é uma atitude discutível do ponto de vista económico e pueril no plano da acção política. O que, mais uma vez, me surpreende e desconcerta é que a actualidade da televisão entre, assim, nas nossas casas sem que, nem por um milionésimo instante, algum dos nossos comentadores enuncie uma dúvida metódica. A saber: quando se discutem as dinâmicas económico-financeiras da televisão, não será também importante questionar que televisão se faz em Portugal e que valores nela se produzem e promovem?Atrevo-me a supor que José Eduardo Moniz olhará para toda esta agitação com uma ironia eivada de prazer. Nas muitas crises do nosso país, ele é o protótipo do homem feliz e realizado (e merece que o respeitemos enquanto tal). De facto, a saturação económica da vida política, social e, agora, mediática, tem como consequência directa uma ferida simbólica que, nas últimas décadas, apenas gangrenou: discutir o que a televisão é e aquilo que a televisão faz ao país são dois imensos tabus.
Porquê esses tabus? Porque se resiste à discussão da fulanização populista do jornalismo da TVI, à sua celebração regular da reality TV (desde os tempos do sinistro Big Brother), enfim, ao triunfo imposto da telenovela como único padrão nacional de ficção? Por uma razão muito simples, quotidianamente transparente: tais princípios contaminaram muitas áreas da televisão que se faz em todos os canais generalistas.Lembro-me do filme americano Network, com Peter Finch, Faye Dunaway, William Holden e Robert Duvall, realizado por Sidney Lumet. A partir de um argumento do genial Paddy Chayefsky, nele se mostrava, de forma muito simples e directa, que a televisão estava a evoluir através da inquietante conjugação da fulanização grosseira das vedetas e de um processo de esvaziamento mental que sobrepunha a histeria do “espectáculo” a qualquer visão serena, ponderada e construtiva das relações humanas. Vale a pena sublinhar que se trata de um filme de 1976. Não que a televisão dos EUA tenha passado a ser o paraíso na Terra. Só que a discussão dos valores televisivos era algo que, há mais de 30 anos, já integrava o imaginário popular.
Crocodilos em Londres

Último ensaio de Jackson em CD e DVD?
Nico Muhly no Maria Matos em Novembro

Em Chiang Mai (1)



Crónicas da Tailândia (4/10)

O magnífico edifício branco, de arquitectura colonial, que hoje mora na margem esquerda do Chao Phraya, tem uma pré-história que remonta à segunda metade do século XVIII e à destruição da antiga capital, em Ayutthaya, pelos birmaneses. Em 1786, no momento em que uma nova capital do Sião (o antigo nome da Tailândia) ganha forma, o rei siamês, agradecendo o esforço militar dos muitos portugueses que tinham combatido ao seu lado, cedeu-lhes uma concessão na margem direita do Chao Praya, onde assim nasce a comunidade de Santa Cruz, bairro cuja origem ainda hoje os habitantes de Banguecoque conhecem. Em 1820, outra mudança, desta vez com a doação de um novo terreno, agora na margem esquerda do rio e para o qual se pensa construir um edifício consular que é projectado em Goa, com materiais, ferramentas e artífices daí enviados por barco para Banguecoque. O navio afundou-se já no golfo da Tailândia. Salvou-se a tripulação, mas com o naufrágio foi-se o projecto original. Começou por levantar-se, provisoriamente, um primeiro edifício de bambu e gesso. Houve atrasos, faltas de verba… E actual embaixada foi finalmente concluída em 1875, sendo hoje frequentemente descrita como a primeira alguma vez aberta na Tailândia. Não o foi por qualquer decisão tomada nesse sentido. Mas depois de terem sido os primeiros ocidentais a visitar a Tailândia (em 1511), os portugueses acabaram por ser também os primeiros a ali estabelecer uma missão diplomática.
Um trono que fica vazio

O mundo da música popular gosta de distinguir os seus com títulos (ou por vezes cognomes) que assim definem uma certa aristocracia entre a elite dos mais bem sucedidos. Elvis Presley era, para todos, o "rei" (do rock'n'roll, como naturalmente se subentendia). Madonna, ainda é, e já com mais de 25 anos de segura presença no trono, a incontestada "rainha da pop". James Brown ficou conhecido como o "padrinho da soul". Benny Goodman era o "rei do swing". O argelino Khaled é, ainda sem rival à sua estatura, o "rei do raï". Já houve quem chamasse a Bob Dylan o "rei da folk" e a Bob Marley o "rei do reggae", se bem que semelhantes títulos de modo algum se enquadrem no perfil (nada monárquico) da personalidade de ambos os músicos... Sem subtexto nobiliário, o norte-americano Bruce Springsteen é, para os seus admiradores, "the boss" (o patrão) e Frank Sinatra foi muitas vezes referido como "the chairman of the board" (algo como o presidente da administração).
Michael Jackson também viveu sob o peso de um título. E, a partir de determinada etapa na sua vida fez saber que gostaria de ser reconhecido como o "rei da pop"... Houvesse leis dinásticas na música, e o título de rei ter-lhe-ia chegado, "consorte", com o casamento com Lisa Marie Presley, a filha de Elvis.
Na verdade, e antes do casamento, autodesignou o seu próprio título, mas de certa forma reinava já, com invulgar unanimidade e aceitação geral, desde que, em inícios dos anos 80, o impacte do álbum Thriller dele fez um caso de sucesso maior, de proporções nunca antes vistas, à escala planetária. O certo é que, mesmo sugerido pelo próprio, o título acabou mesmo universalmente aceite. Tanto que esta semana, perante a notícia da sua morte, raros foram os títulos que evitavam a palavra "rei". Como que a vincar que, mais que apenas uma vida, um reinado chegava ao fim.
A morte de Michael Jackson deixa agora um trono vazio, porém sem candidato evidente à sucessão. Além do veterano Prince (hoje sem a aura de outros tempos), poderíamos pensar em nomes como os de Justin Timberlake ou Robbie Williams. Mas estes são outros tempos. Na idade da Internet há hoje muitos pequenos/grandes feitos para vários pequenos/grandes nichos. O acesso à informação alargou o espectro de propostas e cada qual escolhe os seus ícones. A idade das super estrelas (que, com a ajuda dos telediscos, garantiu o ceptro real a Michael Jackson) é coisa do passado. E "reis" desta dimensão não mais serão coroados.
Os números, de facto, não falam contra Michael Jackson. Não só é um recordista de vendas de discos (Thriller é referência difícil de ultrapassar, com vendas que hoje devem ultrapassar os 100 milhões de exemplares à escala global), como ao longo de uma carreira de 40 anos somou prémios atrás de prémios. Venceu 19 Grammys, 22 American Music Awards, 12 World Music Awards... Só os Beatles (29), Elvis Presley (36) e Madonna (37) têm mais que os 28 singles no top ten norte-americano de Michael Jackson. Foi o primeiro a ter uma canção a entrar directamente para o top americano (com You Are Not Alone). Tem o teledisco mais caro da história (sete milhões de dólares foram gastos em Scream, dueto com a irmã Janet). Presenteou-se com luxos, entre os quais o Oscar de Melhor Filme de E Tudo o Vento Levou por um 1,5 milhões de dólares... Números, conquistas e gastos... de rei.
Se imaginássemos uma "família real" na música pop, teríamos de apontar a Madonna o título de "rainha". O sucesso, todos os anos renovado, faz de si a voz feminina de maior sucesso na história da música popular. Um reinado longo, que remonta à primeira metade da década de 80 e que, sem intervalos nem períodos menores, dela faz ainda hoje a mais bem sucedida das estrelas do firmamento da música pop. O trono da "rainha da pop" está seguro nas suas mãos. E, apesar das concorrências (Mariah Carey, Kylie Minogue ou Beyoncé), nenhuma outra parece capaz de disputar a posse do ceptro real da pop no feminino a Madonna.
E os pretendentes são...

domingo, junho 28, 2009
O socialismo segundo Godard

Mais que apenas os números

Thriller foi, em 1982, o sucessor natural de Off The Wall (1979). Michael Jackson, que assina parte do alinhamento, voltou a convocar Quincy Jones para a produção. E, com ele, trabalhou novamente a construção de uma visão igualmente atenta a legados da música soul e da música de dança, juntando mais evidente contaminação rock'n'roll e uma ainda mais fluente e luminosa alma pop. Os feitos musicais são inequívocos e por si justificam o atribuir a Thriller (talvez em conjunto com Off The Wall) o título de obra-prima de Michael Jackson. Porém, o estatuto que o álbum atingiu muito deveu ao facto de ter nascido num momento em que se descobria o potencial do teledisco como nova ferramenta de divulgação musical, tendo Michael Jacskon sido dos primeiros a compreender qual seria a forma ideal de, através desse novo veículo, trabalhar uma imagem para dar forma física a um som.
Este é o teledisco de Beat It, o primeiro com personalidade narrativa na obra videografica de Michael Jackson. Note-se que, tal como na canção, por aqui passa uma evidente homenagem a West Side Story.
sábado, junho 27, 2009
Rei e Rainha

Méliès: para além dos efeitos especiais

"Transformers": ruidoso vazio

Há quem considere que os efeitos especiais estão a “estragar” o cinema. De facto, semelhante visão peca por simplismo histórico: afinal de contas, com as suas primeiras experiências fantásticas, ainda no século XIX, George Méliès foi o genial inventor do conceito de efeito especial.
Em busca de uma linguagem

sexta-feira, junho 26, 2009
Audrey Tautou: quase Chanel

O título do filme de Anne Fontaine, Coco Avant Chanel (isto é, “Coco antes de Chanel”), envolve uma curiosa sugestão, ao mesmo tempo social e metafórica. Esta é, de facto, a história de uma mulher que, embora consagrada com o seu verdadeiro apelido (chamava-se Gabrielle Chanel), viveu sempre com a marca ambivalente da sua origem (o nome “Coco” foi-lhe dado por causa de uma canção que interpretava, em espaços não muito sofisticados, nos tempos em que alimentava a ilusão de seguir uma gloriosa carreira musical). Como se estivéssemos perante alguém que se transfigurou no seu próprio fantasma: para Gabrielle, foi necessário passar pela falsidade da alcunha (Coco) para conquistar a verdade do seu nome (Chanel).
Dito isto, não deixa de ser desconcertante que, muito cedo, as potencialidades da personagem sejam desbaratadas num registo que deve muito pouco à tradição da biografia cinematográfica, cedendo com grande preguiça criativa aos ditames do telefime biográfico. A crónica histórica vai dando lugar à narrativa teleológica: como se Coco Chanel não tivesse direito a existir, a não ser para confirmar um “destino” que já conhecemos.
Assistimos, afinal, à ilustração de outro tipo de destino. Depois do impacto de La Vie en Rose (2007), sobre Edith Piaf, dir-se-ia que há um cinema francês que está a tentar rentabilizar algumas figuras nacionais, criando uma galeria de “filmes biográficos” para exportação. É uma estratégia que pode gerar algum efeito imediato mas que, a prazo, tende a diluir a singularidade francesa (que continua a existir) num academismo televisivo sem alternativa. Sobram os actores e a sua resistência aos estereótipos televisivos: Audrey Tautou (O Fabuloso Destino de Amélie) e Benoìt Poelvoorde (no papel de Étienne Balsan, amante e protector de Coco) mereciam um filme que aproveitasse de outro modo as suas muitas qualidades.
O legado de "Thriller"

— a relação criativa com o cinema, obviamente cristalizada na reconversão paródica do género de terror, mas também na relação de trabalho com Landis (realizador, por exemplo de Blues Brothers e Um Lobisomem Americano em Londres, respectivamente em 1980 e 1981).
— a passagem da tradicional performance televisiva a uma nova teatralidade do espaço.
— a concepção do teledisco, não como trabalho "ilustrativo", mas sim como assumido objecto de ficção.
Entretanto, o que se perdeu foi a... MTV. De facto, na altura, graças a contributos tão decisivos como o do criador de Billie Jean, a estação era um forum imenso de uma nova idade audiovisual e, mais do que isso, de novos paradigmas da cultura pop. Agora, a MTV favorece o hit instantâneo e está toda ela contaminada pelos horrores da reality TV. Ontem, enquanto canais como a CNN e a SkyNews abriam a sua emissão à avalancha de informações e memórias suscitadas pela morte de Michael Jackson, os vários canais da MTV seguiam, alegremente, a sua rotina de enlatados...
Foi há 30 anos...

Arcade Fire preparam novo disco
Em Damonen Sudak



Crónicas da Tailândia (3)

Andar pelo sempre agitado mercado PaK Khlong Talad, em pleno centro de Banguecoque, é uma experiência invulgar de muitos cheiros e cores. Está aberto 365 dias por ano, e nunca fecha as portas de dia ou de noite, às segundas-feiras evitando contudo ocupar as ruas para uma limpeza geral dos espaços. Ao lado passam táxis de todas as cores, do rosa ao laranja, do azul ao amarelo. Nas várias bancas vendem-se frutas, flores (com o cheiro doce do jasmim a destacar-se), bebidas em garrafa, comidas feitas na hora…
Não faltam os doces. E não há banca de sobremesas que não mostre, devidamente empacotados, deliciosos doces de ovos. Descendentes da doçaria portuguesa, os “foi thong” (fios de ovos) , os “thong yib” (em forma de flor) e “thong yod” (não cozinhados) são muito considerados entre os tailandeses e comprados para ocasiões especiais. Casamentos, a estreia de nova casa, funerais ou a ordenação de um filho como monge são motivo para comprar doces de ovos com genética portuguesa. No centro do mercado, um altar mostrava que esta era também uma opção “cara” para eventual oferenda. São uma comida “abençoada”, explica quem os vende, apontando as semelhanças entre o seu amarelo forte e o dourado dos templos.
Prasit e Boonsri, a sua mulher, são donos de uma venda de doces em plena rua. Sabem que têm origem portuguesa, mas confessam que não são eles quem os confecciona. São feitos em fábricas, onde os compram. Os ovos? De pata e não de galinha (talvez o facto sublinhe a discreta diferença face aos ancestrais portugueses). E são hoje menos açucarados que no passado. “Por causa da diabetes”, explicam… Estes doces de ovos são populares entre os taliandeses. E há mesmo quem, antes de dizer o nome de Figo ou Cristiano Ronaldo, ao ouvir falar de portugueses mencione antes que vêm do país das “boas sobremesas”.

A foto de cima mostra Boonsri junto à sua banca de venda de doces. Na segunda foto, um olhar de pormenor sobre os doces de ovos, de ascendência portuguesa, que ali vende.
quinta-feira, junho 25, 2009
Michael Jackson (1958 - 2009)
Michael Jackson foi vítima de uma paragem cardíaca na sua casa de Los Angeles — transportado para o hospital da UCLA, viria a falecer às 14h26, hora local, do dia 25 de Junho. O Rei da Pop tinha 50 anos.
>>> Obituário no jornal The New York Times.
>>> Obituário no jornal Le Monde.
>>> Obituário na BBC.
Efeito cruel do nosso mundo televisivo. Há vozes, claro, que insistem em não perder de vista o facto de Michael Jackson nos legar uma imensa, fascinante e, em muitos aspectos, revolucionária herança musical. Em todo o caso, prevalece esse efeito global de "consultório psicológico" a que, por causa da tabloidização do mundo, se vão submetendo muitas formas de jornalismo. Que é como quem diz: a televisão funciona (por vezes por pura candura de quem a apresenta ou encena) como uma máquina que se julga dotada — e, sobretudo, no momento da morte de alguém, automaticamente dotada — para traçar memórias íntimas de outros, difundir rapidíssimos perfis psicológicos e, em última instância, extrair um saldo moral(ista) das singularidades da vida de cada um.
Escusado será dizer que, neste labirinto de factos crus e especulações que podem ir do razoável ao mais grosseiro despudor, o próprio Michael Jackson não emerge como uma figura neutra. Muito pelo contrário, aliás: ele é mesmo uma das encarnações mais genuínas de um tempo em que a globalização do espectáculo acontece através de uma reconversão de todos os parâmetros que definem uma estrela — da criação formal à relação com a tecnologia, da exposição pública ao imaginário privado. O seu génio viveu e conviveu com tudo isso, por vezes em apoteose, outras vezes nas imediações do drama e da tragédia.
Com três canções e três telediscos de 1983 — Beat It, Billie Jean e Thriller —, Jackson entrou para a história como um dos fundadores de um capítulo do entertainment que, com propriedade, podemos chamar de era da MTV (cujas emissões se iniciaram em 1981). Provavelmente, no dia 25 de Junho de 2009, essa era acabou. Com uma tristeza que não cabe em nenhum ecrã.
Farrah Fawcett (1947 - 2009)

>>> Blog de Farrah Fawcett.
>>> Obituário na CNN.
A audácia da pop

O 'Avatar' de James Cameron
Em Banguecoque (2)

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Crónicas da Tailândia (2/10)

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Um som familiar ouvia-se logo no cais. Era um coro, entoando uma melodia não muito distante das que conhecemos das cerimónias religiosas católicas em Portugal. Só a língua era diferente. A igreja de Santa Cruz, na margem direita do rio Chao Phraya (ao longo do qual cresceu a cidade) é peça central de uma pequena comunidade de Banguecoque na qual convivem cristãos (a maioria, cerca de 900) e crentes de outras confissões. Naquele final de tarde celebrava-se a segunda etapa do casamento entre Kowit, um tailandês, budista, de 39 anos e Pham Thi, vietnamita cristã, de 20. Bolos de mármore e banana, garrafas de refrigerantes e saquetas de seda com chá esperavam os convidados para quando terminasse a cerimónia. Os noivos tinham assinalado o ritual budista em Fevereiro e agora completavam o casamento na igreja. “Cristã” e não “chrisitan, como muitas vezes dizem”, comentava um no adro um jovem seminarista tailandês, também ele filho de pais com religiões diferentes (pai budista, mãe católica), sublinhando a herança portuguesa da palavra que define a sua fé.
Construída há 240 anos por um arquitecto italiano a mando de um padre português (sobre terrenos dados pelo rei tailandês quando a capital se deslocou de Ayutthaya para Banquecoque), a igreja de Santa Cruz é o núcleo deste bairro onde também mora uma escola e uma muito artesanal fábrica de “bolos portugueses”.
Em cena entra então Santi. Com ascendência portuguesa cinco gerações atrás é, aos 48 anos, um dos elementos do conselho que une esta comunidade. E fez questão de mostrar os bolos de que fala. Na verdade, descendentes dos queques, juntando-lhes passas de uva, o sabor açucarado das cavacas e a textura seca de um pão de ló… O irmão chegou a ir a Lisboa para comparar os seus bolos com os originais. “Estes são diferentes, mais suaves”, explica. E vinca a “originalidade” das passas de uva. No coração de Banquecoque, esperava tudo menos um lanche feito de queques…



A primeira imagem mostra Santi, com um queque na mão. A série mais abaixo apresenta a Igreja de Santa Cruz, o casamento que nela decorria naquela tarde e a escola que se encontra ali mesmo ao lado.