1. O que é uma genuína cultura popular? Ou quando é que uma dinâmica cultural deixa de ser gerida pelos seus valores narrativos e simbólicos para passar a existir em função das opções do marketing e, genericamente, do mercado?
2. São perguntas que se justificam a propósito da atribulada existência do fenómeno Star Wars. No caso português, aliás, com um sinal inequívoco do poder normalizador desse marketing. Ou seja: a partir de certa altura, a designação "A Guerra das Estrelas" (de facto, o título oficial com que o primeiro filme da saga se estreou no nosso país) foi rasurada do espaço público — triunfou a expressão Star Wars.
3. Curiosamente, esta reconversão mercantil do produto continua a gerar resistências nos mais diversos sectores, a começar pela base de fãs que os filmes geraram em todo o mundo. Há mesmo quem trabalhe sobre as versões "modernizadas" dos primeiros títulos de Star Wars (nomeadamente nas edições em DVD e Blu-ray), criando, ou melhor, recriando os filmes com as componentes, sobretudo visuais, das primeiras cópias.
4. O que está em causa não é qualquer altercação pueril sobre os filmes "bons" ou "maus" que a saga contém — ninguém discute o seu lugar central na transfiguração técnica, temática e simbólica do cinema nas últimas décadas e, em particular, nas suas dinâmicas industriais e comerciais. O que está em causa é, isso sim, a defesa das matrizes originais das obras, aliás de acordo com o ponto de vista de George Lucas que, em 1988, a propósito da "colorização" dos filmes a preto e branco, se mostrava indignado com a manipulação da herança cultural cinematográfica, classificando-a mesmo de barbárie.
5. Há alguns meses, o jornal Le Monde produziu um video eloquente e didáctico, resumindo a complexidade de todas estas questões.