É um dos nomes maiores da história moderna do cinema americano: o realizador Jonathan Demme faleceu no dia 26 de Abril, em Nova Iorque, vitimado por um cancro no esófago — contava 73 anos.
Tal como Francis Ford Coppola ou Martin Scorsese, Demme começou a trabalhar sob a égide do produtor Roger Corman. Alguns títulos de pequena produção, como Crazy Mama (1975), versão paródica dos tradicionais filmes de gangsters, permitiram-lhe adquirir um know how que seria decisivo para a sua futura inserção máquina de produção de Hollywood. Tal inserção consolidou-se através de duas comédias mais ou menos negras que, além do mais, ilustram a sua capacidade de construir invulgares personagens femininas: Selvagem e Perigosa (1986) e Viúva... Mas Não Muito (1988), com Melanie Griffith e Michelle Pfeiffer, respectivamente.
A sua consagração ocorreria através de dois títulos que já pertencem ao mais universal imaginário cinéfilo: O Silêncio dos Inocentes: (1991), adaptação do romance de Thomas Harris com os prodigiosos Anthony Hopkins e e Jodie Foster, e Filadélfia (1993), obra pioneira na abordagem dos temas sociais e morais relacionados com a sida, centrada numa fabulosa composição de Tom Hanks.
Sempre ligado ao universo musical, tendo colaborado várias vezes com Neil Young, por exemplo em Heart of Gold (2006), é dele uma das referências nucleares na história dos "filmes-concertos": chama-se Stop Meaking Sense (1984) e evoca de modo exuberante três noites dos Talking Heads no Pantages Theater, em Nova Iorque.
Nas últimas duas décadas, o impacto comercial dos seus filmes foi diminuindo, mas não a sua criatividade e arrojo. Na fase final da sua filmografia encontramos, por exemplo, O Candidato da Verdade (2008), um extraordinário thriller político que adapta e actualiza a história de O Enviado da Manchúria (John Frankenheimer, 1962), ou O Casamento de Rachel (2008), brilhantíssima reinvenção das matrizes clássicas da comédia/drama familiar, com Anne Hathaway no melhor papel da sua carreira.
Ricki e os Flash (2015), com Meryl Streep, retrato terno e cruel de uma veterana cantora rock, ficaria como o derradeiro título de ficção de uma filmografia que nunca se fixou em qualquer género ou temática, afinal mantendo-se disponível para uma diversidade típica, justamente, da "série B" em que Demme se formou. Se a palavra artesão ainda pode ajudar a definir tal agilidade criativa, ele foi, nas últimas décadas da produção made in USA, um dos mais genuínos.
>>> Obituário no New York Times.