É, por certo, um dos álbuns mais misteriosos e mais envolventes surgidos ao longo dos últimos meses — por mim, confesso que com ele tenho convivido entre a perplexidade mais radical e o puro fascínio. A reunião do francês Matthieu Donarier (saxofone) e do holandês Albert van Veenendaal (piano) faz-se em nome do mais radical tudo é possível que, de uma maneira ou de outra, sinaliza a história do jazz; ao mesmo tempo, tudo nele parece confluir no sentido de gerar uma arquitectura primitiva, fiel a padrões de rigorosa monumentalidade. A sugestão animal (explicitada na capa, através de uma Polaroid de Monique Besten) está longe, por isso, de ser excessiva ou deslocada — tudo se passa como se a visibilidade que o título convoca, The Visible Ones (Clean Feed), coexistisse com a sedução de uma dimensão invisível que permanece inacessível às palavras, mas não às notas de música. Em termos simples, assumidamente panfletários: uma obra-prima sem concessões, uma espécie de grau zero da música a partir do qual qualquer impossível volta a ser relativo.