Há sempre um risco à espreita sempre que uma sequela se coloca pela nossa frente: o da comparação com o original. Ainda é cedo para tecer uma opinião "definitiva" sobre a nova série Cosmos: A Spacetime Odissey que ontem teve estreia nos nossos pequenos ecrãs (um episódio não faz uma série, naturalmente)... Mas depois de visto o episódio de estreia deste novo Cosmos, a palavra “desilusão” é a que mais bem descreve o cair por terra (não por Terra) das expectativas que a campanha de lançamento fizera antecipar.
É preciso ter em conta que na origem desta nova série está uma outra que representou simplesmente a melhor que alguma vez levou os espaços da divulgação científica para os pequenos ecrãs. Animada pela visão e conhecimento de Carl Sagan, pelos seus dotes de grande comunicador e evidente entusiasmo na partilha do saber, o Cosmos original juntava o state of the art dos efeitos visuais da época não só para nos mergulhar numa viagem imaginária pelo Valles Marineris como pela Biblioteca de Alexandria, muitas das memórias de homens de ciência e descobertas de outros tempos surgindo em reconstituições de época que assim somavam o passado e o futuro a uma história que se contava no presente. E o presente tinha uma data: 1980.
Antes de mais, que fique claro que não tenho nada contra a novidade (pelo contrário). Nem contra as sequelas. Nem mesmo contra os remakes, desde bem feitos e tragam algo de novo ou confiram nova visibilidade à matéria prima na origem das ideias... O Império Contra-Ataca ou Indiana Jones e A Última Cruzada são dois bons exemplos de belíssimas sequelas. E o remake de Smile, pelo próprio Brian Wilson, é uma pequena maravilha da história da canção pop.
Mais de três décadas depois, o novo Comos partilha a co-autoria de Ann Druyan (que claramente vinca a “marca” Sagan no discurso) e recupera algumas das ideias originais, do calendário cósmico à nave da imaginação com a qual o novo apresentador caminha pelo cosmos. Nova tecnologia digital sugere outras imagens da superfície de Marte, de explosões solares, dos anéis de Saturno... E até aqui, tudo até parece correr bem.
Mas por muito que seja uma figura interessante e informada, o novo apresentador Neil deGrasse Tyson não é um Sagan (e ao apresentar um “Cosmos” não se livra de uma comparação desfavorável que, numa série com outro título e talvez outra agenda, seria problema inexistente). Falta-lhe o entusiasmo quase juvenil e familiar com que Sagan fazia das anãs brancas e dos puslares coisas que pareciam lá de casa. A ver como a evolução dos episódios permite ou não a sua “descolagem” das evidentes ligações “gravíticas” a Sagan que, para já, não venceu.
As imagens digitalmente criadas são interessantes. Mas se esse é “o valor maior” da nova série, então vale a pena recordar as propostas do britânico Brian Cox em Wonders of The Solar System ou Wonders of The Universe onde, pelo menos do que podemos comparar com o que se viu neste episódio de estreia, os resultados parecem bem melhores.
O que é mesmo mau neste novo Cosmos é a animação e a música. As sequências que evocam Giordano Bruno são histórica e cientificamente interessantes, mas o registo de animação “clássica” está longe do melhor que o desenho tem levado aos ecrãs. E a música, assinada por Alan Silvestri (que tem coisas do calibre de um Capitão América, G.I Joe e afins) é de pompa sinfonista desinteressante e incaracterística, vincando um contraste negativo na comparação com a presença de peças de Vangelis (sobretudo do álbum Heaven and Hell) na série original. Não havia entre os novos valores da música eletrónica quem desse melhor conta do recado?
Volto a sublinhar que ainda é cedo para assinar uma opinião definitiva sobre a série. Mas convenhamos que não começou lá muito bem...