Como está pensado o comércio dos filmes na Net? Se considerarmos o caso do Google Play, a resposta, para já, parece ser: não está pensado... — este texto foi publicado no Diário de Notícias (23 Março).
Face às alternativas para ver filmes na Net, não faz sentido alimentarmos fundamentalismos cinéfilos. Podemos lamentar que haja toda uma geração de espectadores que não foi educada para procurar os prazeres e singularidades da sala escura. E é inevitável reconhecer que a pirataria se tornou um problema tanto mais grave quanto, para muita gente, passou a ser vivido com obscena naturalidade. Seja como for, é também um facto que a diversificação do consumo através das plataformas virtuais constitui um dado incontornável da actualidade — e, por certo, por vezes, permitindo aceder a obras mais ou menos raras e preciosas.
Vêm estas considerações a propósito de um facto obviamente importante: a abertura de uma nova loja portuguesa de filmes, lançada pelo Google Play. E o mínimo que se pode dizer é que as limitações da oferta são frustrantes. É certo que a iniciativa está no princípio e podemos admitir que, num prazo mais ou menos curto, irá adquirindo uma fundamental diversidade. Seja como for, a primeira sensação é de muitas misturas sem nexo, obedecendo a uma grelha de géneros (“acção e aventura”, “família”, “comédia”, “drama”, “terror”) convencional e preguiçosa. As notas informativas são quase sempre abreviadas e mais ou menos inócuas, com zero de contextualização histórica, estética ou económica; umas em inglês, outras num português abrasileirado... O sistema de pesquisa está cheio de imprecisões grosseiras (por exemplo, se procurarmos filmes com Paul Newman, até nos aparece o DVD de Yellow Brick Road, de Elton John) e a antologia de textos críticos, incluindo os do público (?), é um glorioso disparate: a par de links para coisas muito sérias, escritas, por exemplo, por jornalistas dos EUA, pode aparecer um qualquer nómada das “redes sociais” que, sob um pseudónimo mais ou menos divertido, espirra este profundíssimo pensamento sobre um filme: “Cool!”.
Infelizmente, nada disto se esgota num eventual atraso no aperfeiçoamento técnico da loja. E dificilmente será corrigido através de um mero (e, em qualquer caso, desejável) aumento da oferta de títulos. Acontece que a sensibilidade cinéfila está, de facto, em crise. Sob o efeito de uma cultura televisiva de “formatos” e “reality TV”, o cinema é encarado como coisa pitoresca, superficial e anedótica, sem história, sem memória e, em última instância, sem dignidade.
Confiando na “democracia” do vale tudo, o Google Play integra mesmo, com serena indiferença, as classificações dadas pelo público, o que faz, por exemplo, com que qualquer título da saga American Pie ou o Psico, de Hitchcock, sejam consagrados com as mesmas alegres quatro estrelinhas... E não se julgue que eu estava à espera de grandes pensamentos “universitários”. O que me parece é que tudo isto reflecte uma dramática ausência de qualquer pensamento genuinamente comercial.
Vêm estas considerações a propósito de um facto obviamente importante: a abertura de uma nova loja portuguesa de filmes, lançada pelo Google Play. E o mínimo que se pode dizer é que as limitações da oferta são frustrantes. É certo que a iniciativa está no princípio e podemos admitir que, num prazo mais ou menos curto, irá adquirindo uma fundamental diversidade. Seja como for, a primeira sensação é de muitas misturas sem nexo, obedecendo a uma grelha de géneros (“acção e aventura”, “família”, “comédia”, “drama”, “terror”) convencional e preguiçosa. As notas informativas são quase sempre abreviadas e mais ou menos inócuas, com zero de contextualização histórica, estética ou económica; umas em inglês, outras num português abrasileirado... O sistema de pesquisa está cheio de imprecisões grosseiras (por exemplo, se procurarmos filmes com Paul Newman, até nos aparece o DVD de Yellow Brick Road, de Elton John) e a antologia de textos críticos, incluindo os do público (?), é um glorioso disparate: a par de links para coisas muito sérias, escritas, por exemplo, por jornalistas dos EUA, pode aparecer um qualquer nómada das “redes sociais” que, sob um pseudónimo mais ou menos divertido, espirra este profundíssimo pensamento sobre um filme: “Cool!”.
Infelizmente, nada disto se esgota num eventual atraso no aperfeiçoamento técnico da loja. E dificilmente será corrigido através de um mero (e, em qualquer caso, desejável) aumento da oferta de títulos. Acontece que a sensibilidade cinéfila está, de facto, em crise. Sob o efeito de uma cultura televisiva de “formatos” e “reality TV”, o cinema é encarado como coisa pitoresca, superficial e anedótica, sem história, sem memória e, em última instância, sem dignidade.
Confiando na “democracia” do vale tudo, o Google Play integra mesmo, com serena indiferença, as classificações dadas pelo público, o que faz, por exemplo, com que qualquer título da saga American Pie ou o Psico, de Hitchcock, sejam consagrados com as mesmas alegres quatro estrelinhas... E não se julgue que eu estava à espera de grandes pensamentos “universitários”. O que me parece é que tudo isto reflecte uma dramática ausência de qualquer pensamento genuinamente comercial.