terça-feira, abril 21, 2009

Sob o signo de Ballard (2/2)

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Com o seu romance Crash, publicado em 1973, J. G. Ballard traçou uma espécie de crónica paradoxal, realista e alucinada, das componentes sexuais do culto dos automóveis e, em particular, do fascínio da velocidade. E apesar de tal crónica não ser estranha a um imaginário com raízes cinematográficas e cinéfilas, rapidamente se instalou a ideia de que o labirinto factual e simbólico de Ballard seria impossível de "transpor" para filme. Foi preciso esperar 23 anos para desmentir tal "maldição": no seu genial Crash — com James Spader, Deborah Kara Unger, Elias Koteas, Holly Hunter e Rosanna Arquette —, David Cronenberg desenhou o quadro mitológico de uma civilização de bizarra proximidade da carne e do metal, em última instância construindo uma fábula desesperada sobre a solidão individual e, mais do que isso, sobre a (in)satisfação. O filme esteve no Festival de Cannes de 1996, onde ganhou o prémio especial de um júri presidido por Francis Ford Coppola (a Palma de Ouro foi para Segredos e Mentiras, de Mike Leigh).