sexta-feira, outubro 31, 2008

Entre a música e a fotografia

É sem dúvida um dos acontecimentos na música pop neste final de 2008. Uma versão de I’m In Love With a German Film Star (clássico de 1980 dos Passions), revista por Sam Taylor-Wood, com a ajuda dos Pet Shop Boys. O single apresenta sete versões da canção, entre as quais uma remistura de Gui Boratto, três de Mark Redeer, uma de Jurgen Paape, além das leituras coordenadas pelos Pet Shop Boys, uma delas com travo sinfonista. O single terá distribuição nacional.
E quem é Sam Taylor-Wood, podem alguns perguntar? Inglesa, fotógrafa e realizadora, com trabalho em diversas frentes. Já esteve ligada à Royal Opera House. Expôs em nome próprio. Dirigiu várias curtas, essencialmente na área do filme de arte. Venceu o Turner Prize em 1997. E trabalhou já por diversas vezes com os Pet Shop Boys. Realizou o teledisco de Somewhere (e o filme sobre os concertos no Savoy Theatre) e colaborou vocalmente em duas gravações anteriores, embora escondida atrás de um pseudónimo. Aqui fica um auto-retrato, integrado numa série de fotos nas quais Sam Taylor-Wood explorava a noção do corpo suspenso.
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"Self Portrait - Suspended VII"
(2004)

Beirut e... quase Beirut

Zach Condon vai lançar em Fevereiro de 2009 dois EPs, cada qual através de um projecto distinto. Como Beirut apresentará March Of The Zapotec. E, como Realpeople, editará Holland.

E depois das baladas...

Discografia Duran Duran - 39
'Too Much Information' (single), 1993

Lançado em Agosto de 1993, o terceiro single extraído do álbum que acabou genericamente reconhecido como The Wedding Album, afastou-se do modelo da balada ou canção mid-tempo para gosto mais adulto que tinha assegurado ao grupo um renascimento popular meses antes. A canção, que devolvia o grupo à essência pop com apelo dançável dos seus tempos “clássicos” e revelava uma vontade em caminhar no sentido da integração de linguagens da “música alternativa” (que caracterizaria etapas subsequentes na obra do grupo) era essencialmente suportada por um trabalho de guitarras de Warren Cuccurullo e pela insistente trama rítmica criada pelo baterista Steve Ferrone. A letra falava do estado de progressiva transformação da música numa indústria e criticava, logo nas primeiras palavras, a crença (injustificada) que o estatuto conquistado pelo grupo não era mais que uma sequela da sua exposição na MTV... Este foi o primeiro single dos Duran Duran a não conhecer edição no formato de sete polegadas nem no Reino Unido nem nos EUA. As faixas adicionais das edições em CD single ora incluíram remisturas de Too Much Information e de Drowning Man, assim como gravações ao vivo recentes. O som menos polido do single travou a escalada nas tabelas de vendas, não tendo ido além do número 35 no Reino Unido e número 46 nos EUA.



Novamente sob realização de Julien Temple, o teledisco de Too Much Information mostra uma banda novamente capaz de explorar o poder da (sua) imagem, documentando ainda os ambientes de palco da então presente Dilate Your Mind Tour. As versões do vídeo disponíveis online são de má qualidade visual.

A BBC em guerra

Estes são os protagonistas de uma guerra que está a abalar a BBC e, mais do que isso, o mundo mediático inglês — and beyond...
Resumidamente, conta-se assim — aliás, é contada pela própria BBC: na BBC Radio 2, Russell Brand [primeiro à esquerda] utilizou o seu programa produzido por Jonathan Ross [segundo a partir da esquerda] para reproduzir chamadas telefónicas por ele feitas para a casa do actor Andrew Sachs [terceiro a partir da esquerda], com considerações obscenas sobre a sua neta, Georgina Baillie [à direita].
Consequências práticas, de acordo com as últimas notícias: Ross foi suspenso por três meses, sem vencimento, Brand abandonou a BBC e Lesley Douglas, directora daquele canal de rádio, demitiu-se. A BBC fez publicar um comunicado oficial sobre os eventos, sublinhando a necessidade de manter o mais alto nível de "padrões editoriais".
Conhecíamos, infelizmente, a irresponsabilidade mediática de que Russell Brand era capaz — basta lembrar a sua infeliz intervenção nos últimos Video Music Awards da MTV. Daí que este disparate "jornalístico" não tenha nada de surpreendente (seja como for, importa dizer que, na sequência da sua demissão, Brand já pediu desculpas dos seus actos, através da Sky News — video aqui em baixo). O que importa sublinhar é a salutar contundência da reacção da BBC, separando as águas: uma coisa essencial é, em todos os momentos, saber reforçar as virtudes de um espaço democrático de expressão e comunicação; outra, completamente diferente, é confundir esse espaço com um território de arbitrariedade em que os detentores do poder de emissão, a começar pelos jornalistas, podem utilizar os outros, seja quem for, como instrumento de manipulação, difamação e logro.
É uma exemplar lição de gestão cuja significação ecoa em todos os contextos em que o jornalismo é substituído por ataques à dignidade humana. Mais do que isso: é uma atitude que se afirma inequivocamente contra os efeitos correntes da degradação humana promovida pela reality TV, efeitos sensíveis em todas as áreas do labor jornalístico.



quinta-feira, outubro 30, 2008

Clint Eastwood: dois filmes nos Oscars

Clint Eastwood é, de facto, um caso invulgar de longevidade e vitalidade criativa. Por esta altura, tem dois filmes que, tudo assim o indica, estarão na corrida para os próximos Oscars: o fabuloso Changeling, com Angelina Jolie, estreia esta semana nos EUA; entretanto, Gran Torino tem lançamento agendado para Dezembro nas salas americanos, precisamente a tempo de ainda ser considerado para os Oscars — neste filme, Eastwood volta a acumular as funções de realizador e actor, o que já não acontecia desde Million Dollar Baby (2004); eis o trailer.

Marte ataca!

Foi há precisamente 70 anos. A 30 de Outubro de 1938, um programa de teatro radiofónico apresentava uma dramatização adaptada do romance A Guerra dos Mundos, de H.G. Wells, publicado 40 anos antes. Comandada por Orson Welles, uma equipa de actores e técnicos de som transformavam o texto de H.G. Wells na forma de uma emissão de rádio, com simulações de flashes noticiosos e reportagens em directo. A história, que no livro é relatada na Inglaterra rural de finais do século XIX, era transposta para os Estados Unidos, com primeiro incidente algures em New Jersey, e no tempo presente (na verdade, no início da emissão era revelado que se tratava de uma ficção, com acção projectada no ano seguinte, ou sejam 1939). A emissão começou com uma apresentação do programa e uma contextualização da história. A ficção entrava então em cena na forma de uma emissão de rádio com um boletim meteorológico e, logo depois, música em directo de Nova Iorque. Um primeiro noticiário interrompe a emissão para relatar explosões verificadas na superfície de Marte. E, pouco depois, supostamente “em directo” de um observatório, um astrónomo (na verdade Orson Welles) explica o que está observado e tranquiliza os ouvintes, sublinhando que não crê existir vida inteligente em Marte... Todavia, minutos depois, nova interrupção dá conta do que se julga ser a queda de um meteorito numa pequena cidade de New Jersey. O repórter, em directo, descreve a cena e a chegada de populares. Mas acaba por dar a notícia, em primeira mão, do que, afinal, se revela como um ataque marciano. A invasão começou... Aqui fica esse segmento do programa:



Esta adaptação radiofónica de A Guerra dos Mundos escutava-se no Mercury Theatre on The Air, um programa de rádio de, habitualmente, pouca audiência. E, portanto, sem pausas para publicidade. Os espectadores que, eventualmente, tenham perdido os minutos iniciais da emissão, tomaram a ficção por realidade. Sobretudo graças ao modelo dramático adoptado, relatando a história como se de uma emissão de rádio se tratasse. E estalou o pânico. Chamadas telefónicas chegaram à CBS e às autoridades. Mas estávamos em 1938. E em pequenas comunidades rurais o telefone estava longe de ser uma presença em todas as casas. O aparelho de rádio era, para muitos, a janela para a informação, para o mundo. A ansiedade instalou-se rapidamente. Houve quem pegasse na família e fugisse de casa. Houve relatos da chegada de populares aos locais da suposta invasão. A confusão foi tal que, com a polícia a intervir nesses locais, o que era fantasia ainda mais parecia ser real... Conta-se que, nessa noite, alguém terá disparado contra um depósito de água, julgando ser um tripod marciano...
No final da emissão, de cerca de 60 minutos, Welles voltou a recordar que se tratava de uma encenação. Mas o terror já morava entre os ouvintes. Os jornais, no dia seguinte, davam conta do sucedido. E, em tempo de temor perante a possível “ameaça” da concorrência da rádio, os jornais aproveitavam para mostrar como, afinal, a imprensa escrita era um meio mais... fiável.

Para escutar a totalidade da emissão de Orson Welles pode consultar o arquivo do Mercury Theatre aqui.

A Guerra dos Mundos é um romance de 1898 de H.G. Wells, o quarto dos seus “romances científicos”, sucedendo-se a A Maquina do Tempo, A Ilha do Dr Moreau e O Homem Invisível editados nos anos anteriores. Algo inspirado pela literatura de guerra do seu tempo, o livro serve um relato, feito na alvorada do século XX, recordando eventos em finais do século XIX, quando uma invasão marciana se abateu sobre a Terra. Uma campanha violenta, que procurava no homem alimento, através de transfusões directas do sangue das gentes capturadas pelos invasores. A “guerra”, contra a qual a tecnologia humana nada conseguiu, acabou vitoriosa para os invadidos pela inesperada “ajuda” de bactérias que, inofensivas para os habitantes da Terra, se revelaram afinal letais para os marcianos.

O livro de H.G. Wells teve já várias adaptações ao cinema, à televisão, à BD, aos jogos de computador, à música (num disco “conceptual” de Jeff Wayne) e a outros meios. Fez história a transposição da história para a Califórnia dos anos 50 na versão cinematográfica de Byron Haskin realizou em 1953. De certa forma, o filme aceitava a sugestão da emissão de Orson Welles e sublinhava o medo colocando a acção na Califórnia.

A mais recente adaptação de A Guerra dos Mundos ao cinema data de 2005, com realização de Steven Speilberg. A acção é desta vez desviada para a costa leste norte-americana. O filme segue na essência as linhas mestras da histórias, mas adapta-as a uma ideia de verosimilhança para a alvorada do século XXI. Reinventa os modelos de chegada dos invasores e usa efeitos visuais para sublinhar a sua ferocidade tecnológica.

A "estrela" e o cinema de John Waters

Roisin Murphy regressa hoje a palcos portugueses. Actua logo à noite no Coliseu dos Recreios, em Lisboa, pelas 21.00. Amanhã, pelas 22.00, estará na Casa da Música no Porto. O aperitivo fica, por aqui, na forma do seu mais recente teledisco, que acompanha o último single extraído do álbum Overpowered. Este é Movie Star, teledisco no qual se presta uma homenagem ao cinema de John Waters.

Sam Taylor-Wood com os Pet Shop Boys

Sam Taylor-Wood, que colaborou já por diversas vezes em projectos dos Pet Shop Boys (entre os quais a realização do teledisco de Somewhere) acaba de lançar um single em parceria com o duo Tennant/Lowe. O disco não é mais que uma versão do clássico I’m In Love With a German Film Star, que os Passions originalmente gravaram em 1980.

"A Turma": de Cannes para o mundo

Da esquerda para a direita, de cima para baixo [fazer click para ver a imagem maior]: Juliette - Chérif - Justine - Lucie - Nassim - Boubacar - Eva - Damien - Carl - Angélica - Samantha - Qifei - Rabah - Wei - Henriette - Laura - Souleymane - Burak - Esméralda - Arthur - Louise - Dalla - Khoumba - Agame (Fotos de Georgi Lazarevski).

São os alunos/personagens de A Turma, no original Entre les Murs, filme de Laurent Cantet que, por assim dizer, nasceu para o mundo no passado mês de maio, em Cannes, onde arrebatou a Palma de Ouro. De facto, desde aí se percebeu que este é um objecto que detém o poder de nos surpreender através de uma prodigiosa mise en scène, por assim dizer a meio caminho entre a precisão da ficção e o imprevisto (e a improvisação) do documentário. Mais do que isso: o trabalho de Cantet impôs-se também como um projecto genuinamente didáctico, empenhado em problematizar e discutir a conjuntura actual da educação e, em particular, o sistema de relações professores/alunos — é um filme que devolve ao cinema francês a sua mais clássica dimensão social, resistindo a todas as generalizações fáceis e oferecendo-nos personagens que podemos sentir em todas as suas emoções, diferenças e contradições.

quarta-feira, outubro 29, 2008

MTV Music: 16 mil telediscos

Por onde anda a MTV?... Infelizmente, vogando num vazio vertiginoso em que as marcas da reality TV se sobrepuseram à dimensão de descoberta e experimentação com que (e para que) o canal nasceu. Seja como for, a music television parece estar a cuidar das suas próprias memórias, valendo a pena visitar o MTV Music, no fundo uma filmoteca de... telediscos — foi lançado ontem, dia 28 de Outubro, e oferece, desde já, mais de 16 mil títulos. Como exemplo, extraído da secção "Vintage" do site, fica Take on Me, do álbum Hunting High and Low (1985), dos noruegueses a-ha: uma deliciosa obra-prima de Steve Barron (colaborou, entre outros, com Madonna, Michael Jackson, Dire Straits, Tears for Fears e Culture Club), premonitória de muitos cruzmentos de imagem "real" e desenhos animados.

The Flaming Lips: missão em Marte

Que faz Wayne Coyne, de The Flaming Lips, em pose de... marciano?! Pois bem, interpreta um papel de marciano numa aventura que se anuncia como um cruzamento paródico entre música e ficção científica. Chama-se Christmas on Mars e, depois de uma passagem por algumas salas "especializadas", está a chegar ao mercado americano do DVD. Por cá... aguardemos. O trailer é assim.

Império do Sol (na Austrália)

Este ano parece que estamos a descobrir a música da Austrália. Na verdade, para já, estamos a conhecer a visita (em disco e nos palcos) da sua nova geração pop electrónica. Mais um nome para juntar aos Cut Copy, Presets e afins: os Empire Of The Sun. O nome é emprestado do romance de J.G. Ballard. E um primeiro álbum vem a caminho, com edição já garantida entre nós. Aqui fica o cartão de visita com o teledisco de Walking On a Dream, rodado em Shangai e realizado por Josh Logue.

Prefab Sprout regressam em 2009

Os Prefab Sprout vão regressar aos discos em 2009. Paddy McAloon está a trabalhar num álbum que deverá ser editado nos primeiros meses do ano novo. O disco deverá ter por título Let’s Change The World With Music – The Blueprint.

Quem esprera... desespera

A Cavalo de Ferro tem vindo a publicar entre nós a notável obra do escritor italiano Dino Buzzati. Recentemente chegou às livrarias uma nova edição de O Deserto dos Tártaros, romance originalmente publicado em 1940. Centrada na figura de Giovanni Drogo, um oficial do exército que é destacado, em início de carreira, para uma fortaleza fronteiriça, a narrativa é espantosa reflexão sobre uma vida que, dos sonhos de glória e patriotismo acaba reduzida a um discreto e inconsequente nada. A fortaleza, algures numas montanhas no limiar do deserto, vive um dia a dia feito de regras e rotinas, eternamente à espera do inimigo. Inimigo que, supostamente, chegará um dia do deserto para invadir o país, cabendo à fortaleza a primeira resposta de defesa... Como os demais oficiais na fortaleza, também Giovanni Drogo acabará mergulhado numa progressiva apatia e profunda solidão. Uma espantosa narrativa sobre um quotidiano afogado pelo devastador poder do vazio. O livro serviu de inspiração ao romance À Espera dos Bárbaros, de J.M. Coetzee (que depois Philip Glass adaptou a uma ópera). E teve versão para cinema em 1976 sob realização de Valério Zurlini, contando com Jacques Perrin e Max Von Sydow no elenco.

A IMAGEM: Nan Goldin, 1989

Nan Goldin
Self-portrait with eyes turned inward
1989

Educação por telemóvel

Esta é uma imagem que anda por aí. Aparece como pop-up de alguns sites, propondo ao internauta que, através do seu telemóvel, se inscreva para receber toques especiais, jogos e, sobretudo, para fazer um teste sobre a sua "compatibilidade" com alguém que será um potencial parceiro no amor — é, como está escrito, uma "calculadora".
Quando vejo este tipo de promoções, penso sempre nos militantes da pureza dos costumes que, ciclicamente, vêm perorar para a praça pública, preocupados com o "sexo" e a "violência" que vêem na televisão. Nunca os vi reagir a estratégias comerciais deste género, estratégias que, visando sobretudo um público jovem, promovem três imposturas:
1) - que o amor é uma espécie de jogo fútil que se pratica com a facilidade de quem manipula um telemóvel;
2) - que o amor se pode "calcular" e, mais do que isso, "medir", para mais através de dispositivos que desafiam a inteligência de qualquer mortal;
3) - enfim, que podemos (porventura devemos) entregar a gestão do nosso destino amoroso a gadgets que promovem um entendimento pueril das relações humanas.
De facto, quando discutimos os problemas contemporâneos da educação, deveríamos não ignorar os dispositivos educacionais que o quotidiano mediático nos propõe. Como cidadão — e sem menosprezar as graves questões estruturais da educação —, gostava de ver a nossa classe política (governo e oposição) a enfrentar produtos deste género.

EUA: um dia para votar

A poucos dias das eleições presidenciais nos EUA, o candidato Barack Obama tem multiplicado de forma exuberante dois tipos de apelos: primeiro, que os seus apoiantes façam telefonemas para mobilizar outros apoiantes, sobretudo para despertar os indecisos; depois, o mais básico: que o dia 4 de Novembro seja mesmo para votar. Eis um spot a sublinhar esta necessidade — simples, directo e geométrico.

terça-feira, outubro 28, 2008

A América de Oliver Stone

De Platoon a W., passando por Nascido a 4 de Julho [foto], Oliver Stone (MySpace) é um cineasta da América, ou melhor, do obsessivo questionamento da identidade americana — este texto foi publicado no Diário de Notícias (27 de Outubro), com o título 'Através da América de Oliver Stone'.

Se é verdade que os atentados terroristas de 11 de Setembro de 2001 constituem uma viragem decisiva na história da América (e de todo o planeta), então não haverá muitos cineastas que, como Oliver Stone, tenham sabido reflectir sobre o capítulo que aí se abriu. Desde logo, como é óbvio, porque no seu World Trade Center (2006) Stone filmou as memórias ainda muito próximas desse dia trágico vivido em Nova Iorque. Mas também porque com o novo W., dedicado a George W. Bush, o cineasta prossegue uma trajectória de obsessivo sentido analítico: trata-se de reflectir as convulsões do mundo contemporâneo, perguntando o que significa viver nesse mundo e ser americano.
As raízes temáticas e críticas do cinema de Stone estão na sua experiência como soldado no Vietname. Aliás, recentemente, a propósito de uma eventual cumplicidade geracional com o próprio Presidente Bush (ambos nasceram em 1946), Stone lembrava que as grandes diferenças começavam em meados da década de 60: ele foi para a guerra e Bush não. Ao filmar Platoon (1986) e Nascido a 4 de Julho (1989), Stone não se limitou a inserir as memórias do Vietname no padrão tradicional do “filme de guerra”. Bem pelo contrário: o seu trabalho veio mostrar que tal padrão, no essencial ligado à abordagem da Segunda Guerra Mundial, seria sempre insuficiente para dar conta de um conflito que deixou uma ferida muito funda na identidade americana.
No cinema de Stone, a visão da América nasce de uma dinâmica essencial: por um lado, descobrimos os mecanismos colectivos de funcionamento e os valores que os sustentam ou deles decorrem; por outro lado, sentimos que os dramas particular de cada destino individual podem funcionar como espelho perverso das próprias vivências nacionais.
Tudo isso se torna especialmente transparente nos filmes sobre presidentes. O primeiro, JFK (1991), não é, em rigor, um retrato de John Kennedy, uma vez que procura, acima de tudo, revisitar o trabalho do procurador Jim Garrison (Kevin Costner), tentando demonstrar a existência de uma vasta conspiração secreta para matar o Presidente. O segundo, Nixon (1995), encena o principal protagonista do escândalo Watergate para penetrar nos seus medos e fantasmas mais íntimos. Em ambos os casos, a narrativa cinematográfica serve a Stone para repor a questão da identidade americana a partir de uma perplexidade central: afinal, o que é a verdade, quando a aplicamos e quando a dispensamos?
Tudo isto adquire uma nova e impressionante dimensão em W., com Josh Brolin a interpretar aquele que, para todos os efeitos, ainda é o Presidente dos EUA. Essa coabitação entre o Presidente e a sua representação cinematográfica é mesmo um dos efeitos mais desconcertantes do filme. Como se Stone nos dissesse que a abundância de imagens em que vivemos pode ser limitativa do próprio conhecimento. Poderá dizer-se que, em termos meramente políticos, Stone não se identifica com Bush. É verdade que não. O certo é que foi capaz de fazer um filme que devolve a Bush o simples direito à complexidade da sua/nossa história. Nessa medida, W., sendo um filme genuinamente político, é também um reencontro com a pulsão teatral da tragédia.

Os bons selvagens

Um novo single acaba de ser extraído de Limbo, Panto, o álbum de estreia dos Wild Beasts. O sucessor de Devil’s Crayon é este Brave Bulging Buoyant Clairvoyants, que na verdade havia já sido o single de estreia da banda em 2006, e no qual se destaca a voz invulgar de Hayden Thorpe. Aqui fica o novo teledisco.

'O Tal Canal' em DVD

Finalmente!!! A 27 de Novembro, pela Castello Lopes, vai chegar ao DVD aquela que deve ser a melhor série da história do humor televisivo português. O Tal Canal surge numa edição de 4 DVD, que incluem a totalidade dos 12 episódios da série estreada há 25 anos da RTP. Como extras estão incluídas duas featurettes: “O Tal do Canal: À Conversa com Herman José” e “As Inconsequências do Tal Canal”. Os episódios surgem em versão restaurada e remasterizada.

Em estreia: The Portugals

Uma pequena multidão de EPs de novos projectos nacionais chegou às nossas mãos nas últimas semanas. E ao longo dos próximos dias aqui vamos apresentar os mais interessantes desta colheita. Começamos pelo que mais cativou atenções. Eis SETUBAL, dos The Portugals. O primeiro contacto faz-se com a capa, que traduz uma das mais imaginativas soluções gráficas/fotográficas da música portuguesa de 2008. Depois chega a música. O alinhamento, de quatro temas, abre com Give It To Me (agora reduzido às iniciais GITM), já conhecido do CD duplo Novos Talentos Fnac deste ano e com curioso teledisco “lo-fi” já no YouTube. As verdadeiras surpresas chegam depois, seja em Got New Roman, onde se revisitam modelos da herança shoegazer de 90, seja em King Size Broken Heart, envolvente canção de travo ambiental ou ainda em Love Bull, onde suaves guitarras acústicas emergem para revelar outros sabores, todavia em sintonia com as demais canções apresentadas no disco. SETUBAL (ao que parece é assim mesmo que se apresenta o disco, sem maiúsculas e sem acento agudo no “u”) é um dos melhores cartões de visita do ano musical “independente” português. Cantam em inglês, sim. So what? A presente visibilidade maior de uma nova e estimulante geração que adopta o português como língua oficial (e que terá justificadamente o protagonismo da cena rock local, facção “indie” ou como lhe quiserem chamar) não impede o aparecimento de outras opções. Pena que, na hora de trabalhar a comunicação (e é para isso que se abrem espaços na Internet) os The Portugals resvalem para um registo de humor inconsequente. Informações como “indie é a tua prima”, “Bristol/Brandoa” é quase tudo o que se fica a saber depois de uma visita ao MySpace da banda. Para quem faz uma música que parece quer ser levada a sério, e que tem de facto argumentos para isso no EP, convenhamos que esta não será a melhor estratégia de comunicação.

Para ouvir: MySpace

segunda-feira, outubro 27, 2008

3 cenas para 1 detective

Cena 1 - Andava eu a observar a secção de DVD de uma grande superfície comercial (é assim que se diz, não é?), quando deparei com um filme de seu nome Mafia em Paris. Uma daquelas produções de rotina dos franceses, pensei. Por vezes, há que dizer, apoiadas num sólido savoir faire. Mas a foto da capa não correspondia ao protótipo de herói desse género de produção: nela reconheci Johnny Hallyday! Curioso, pensei outra vez: além do genial Détective (1985), de Jean-Luc Godard, Hallyday fez algum policial esquecido...

Cena 2 - Nada disso. O mercado do DVD não pára de nos surpreender: era mesmo Détective!!! É certo que o filme de Godard é uma raridade. É mesmo certo que a esmagadora maioria dos potenciais compradores o conhecem como... Détective. Mas, aparentemente, não se procuram os potenciais compradores: aí vai Mafia em Paris e, na capa, nem sequer se destaca o título original. A surpresa, convenhamos, é escassa, uma vez que, em Portugal, um outro filme raro de Godard, La Chinoise (1967), foi lançado com o título... O Maoísta.

Cena 3 (com a amável participação do leitor) - Enfim, não simplifiquemos: na capa, por baixo do título, está escrito "Colecção Godard". Mas poderá o leitor perguntar: então os jornalistas, ao menos, não recebem informação concisa sobre o que vai ser editado? É preciso andar pelas lojas para, acidentalmente, descobrir as maravilhas que o mercado tem para oferecer? Não quero generalizar e é bem verdade que vários editores, porventura a maioria, tem o cuidado de divulgar os seus produtos com algum cuidado. Seja como for, fica a lição, caro leitor: não se fie nos jornalistas. Afinal de contas, o nosso mercado do DVD pode estar cheio de preciosidades que foram lançadas... sem lançamento. Que preciosidades? Não sabemos. Mas andam por aí [foto do filme: Nathalie Baye].

Viver e morrer com os nomes

Madonna
Oh, Father
Realização: David Fincher
1989

Que é um nome? Que está num num nome? Que significa herdar o nome da mãe? — este texto foi publicado no Diário de Notícias (24 de Outubro), com o título 'Cantar e viver com o nome da mãe'.

Como muitas outras figuras públicas que consideramos “familiares”, Madonna é mal conhecida. Paradoxo? Sem dúvida, mas o nosso mundo mediático funciona assim: muita informação, pouco conhecimento. Aliás, o desconhecimento de Madonna é algo que afecta, antes de tudo o mais, o seu próprio trabalho. De facto, a sua obra está um pouco para além de Material Girl e um livro Sex (e mesmo que fosse só isso...). Entre as suas canções “esquecidas”, há uma que se dirige explicitamente ao pai. Chama-se Oh Father e pertence ao álbum Like a Prayer (1989). É um verdadeiro ajuste de contas simbólico. Há mesmo um verso que diz: “Nunca me amaste”. Ainda assim, a contundência de tais palavras não esgotam a canção. Os versos desembocam mesmo num despojado voto: “Talvez um dia / Ao olhar para trás seja capaz de dizer / Que não quiseste ser cruel / Também foste magoado por alguém”.
De que fala então Madonna, quando fala da família? Deste dominó de mágoas e dores que transmitimos uns aos outros, porventura sem sabermos que o estamos a fazer. No seu sistema criativo (e, em boa verdade, em toda a sua existência), o ponto de fuga é a presença, para sempre ausente, da mãe. Vitimada por um cancro da mama, morreu aos 30 anos, poucos meses depois de Madonna ter completado cinco anos. São muitas as declarações (e canções) em que Madonna nos remete para a memória escassa, mas muito precisa, da sua mãe. Em boa verdade, não seria preciso fazê-lo, já que a mãe se chamava... Madonna. Ou como o nome pode ser esse lugar despido onde nos cruzamos com a morte e sobrevivemos.

Discos da semana, 27 de Outubro

Somam já seis anos de vida mas estão longe de ser um nome referido com regularidade, até mesmo entre os que acompanham mais de perto o cenário indie pop/rock. Os Psapp são um duo londrino essencialmente dado à experimentação das electrónicas no formato da canção. É frequentemente referido o seu sentido de humor como elemento característico da sua personalidade. The Camel’s Back é o seu quarto álbum, dois anos depois do anterior The Only Thing I Ever Wanted, e pode representar o episódio que lhes faltava para chamar definitivamente atenções sobre a sua música. Diferentes de muitos outros projectos dados a cruzar electrónicas diversas sobre canções, os Psapp cultivam um curioso sentido de bizarria algo teatral que tanto estimula os que procuram a surpresa via electrónicas, como mostram uma capacidade em manter firme uma identidade pop, que lhes poderá um dia trazer admiradores entre os que gostam de saborear novas abordagens à clássica forma da canção. Este casamento nunca foi tão feliz na obra dos Psapp como no presente disco. Sem perder as suas marcas de identidade, o disco revela uma ambição para lá do seu terreno habitual. Não só há aqui exemplos de mais sólida composição, como se revelam instantes onde a ousadia nos arranjos (do sinfonismo de Part Like Waves ao minimalismo digital do tema-título) se reflecte na forma final de um álbum essencialmente pop onde o prazer da descoberta se revela a cada tema que se escuta. The Monster Song é um “êxito” pop em potência. E Fickle Ghost revela um aprumo formal “clássico” que ecoa os dias do elegante The Hounds of Love, de Kate Bush. Pode não ser uma uma obra-prima, mas é certamente um dos álbuns pop mais revigorantes de 2008.
Psapp
“The Camel’s Back”
Domino / Edel
4 / 5
Para ouvir: MySpace

Meses depois de nos ter dado em Let the Blind Lead Those Who Can See but Cannot Feel, álbum de estreia do seu one-man-project Atlas Sound, um dos mais estimulantes discos do ano, Bradford Cox apresenta aquele que é, até agora, o melhor álbum da sua banda “principal”, os Deerhunter. Distinto do aclamado Cryptograms, editado em inícios de 2007, Microcastle (terceiro álbum dos Deerhunter) não se afirma, como se poderia esperar, por uma ostensiva necessidade de demarcação face ao trabalho com Atlas Sound. Na verdade, mais longe está a memória do álbum do ano passado. Ao invés do que escutámos em Cryptograms, no novo Microcastles assistimos a uma mais concreta definição de um plano de trabalhos. A dispersão de ideias do álbum anterior é trocada por uma agenda mais concisa que, sem voltar costas às genéticas de formação da identidade da banda (do noise ao art rock, naturalmente sob protagonismo de um gosto pela revisitação do grande livro do psicadelismo), mostra agora particular interesse pelo experimentar da melodia, pelo gosto pelos micro-acontecimentos, pela forma mais definida da canção. Esboçam-se tapetes de acontecimentos. Texturas repetitivas na cenografia dos temas, ocasionais contemplações pelo poder do discreto, quase do silêncio. Abordagens que, de certa forma, materializam uma vez mais na canção pop/rock ideias desenvolvidas pelos compositores minimalistas e seus imediatos seguidores. O disco traduz uma atitude na composição que procura o trabalho no plano do detalhe, o que não impede, na obra final, a capacidade de sugerir a simplicidade onde, todavia, não deixou de haver ainda todo um vasto oceano se sons. Mas em vez da tempestade, uma nova bonança parece morar agora por estes lados. É portanto na gestão das formas, mais que na dos conteúdos, que se afirma o que de novo nos traz um disco que parece partilhar opções semelhantes às que vimos, por exemplo, na história recente de uns Animal Collective ou Of Montreal: o arrumar das ideias não renega heranças nem apaga linguagens. Mas abre caminho para a chegada de grandes canções!
Deerhunter
“Microcastle”
4AD / Popstock
4 / 5
Para ouvir: MySpace

Uma verdadeira tempestade varreu, a partir de inícios de 2007, as certezas que pareciam lançadas pelas estreias em disco que, de 2004 a 2006, indiciavam o aparecimento de uma nova geração de bandas britânicas, desta feita animadas pela vontade de aceitar as heranças (por muitos esquecidas) da estimulante memória pós-punk. O vendaval, que entre os líderes da nova mensagem poupou apenas os Franz Ferdinand (que entretanto se souberam afastar para pensar o terceiro passo), não mais fez que uma operação de selecção natural (que não se esgotou no Reino Unido). Nomes como os Editors, Maximo Park ou Futureheads acabaram apeados e, mesmo que alguns deles continuem a editar discos, não parecem ter gasolina no depósito para ir mais além. Estranho foi o que então aconteceu com os Kaiser Chiefs, banda que conciliara no belo álbum de estreia, Employment (2005) as genéticas pós-punk com os sabores de festa em pub e no estádio, afinal sabores clássicos (“lad”) da cultura pop/rock britânica. Editado em 2007, o sucessor (e medíocre) Yours Truly, Angry Mob quase enviou o grupo para o grupo dos despromovidos acima citados. E a vasta base de fãs foi o colchão que evitou maior dor na queda. O novo Off With Their Heads, mesmo distante da memória do álbum de estreia, mostra vontade em dar breve passo atrás antes de ensaiar novo mais adiante... Mais próximo do primeiro disco que do anterior (faltando-lhe todavia a pulsão dançante que fez de muitos temas verdadeiros hinos para dançar de caneca de cerveja na mão), o álbum retoma uma relação com os sabores da genética pós-punk e com o tom festivo que os revelara há três anos. Never Miss A Beat, o single, é talhado à imagem dos primeiros hinos. Like It Too Much pisca o olho a Adam & The Ants. Half The Truth soa ao diálogo do presente com uma Inglaterra pop, algures em 1978. Pelo meio há ainda momentos inconsequentes, mas aqui e ali surgem pontos de interesse. Um disco ainda longe da forma ideal, mas claramente melhor que o triste tropeção do ano passado.
Kaiser Chiefs
“Off With Their Heads”

Polydor / Universal
3 / 5
Para ouvir: MySpace

Brooklyn foi o lugar que assistiu ao encontro de mais duas almas migradas para a Big Apple. De Filadélifa chegou Rob Barber. E, de Kalamazoo (no Michigan), Mary Pearson. Os seus caminhos ali se cruzaram em 2006 e, desde então, seguem juntos como High Places de quem, depois de uma compilação de temas originalmente editados em singles em vinil, surge agora um primeiro álbum de originais. A sua música é aquilo a que poderíamos chamar... “house music”. Não por quaisquer eventuais ligações ao som que há 20 anos saiu de Chicago para pôr o mundo a dançar. “House music” não como género, mas como música “caseira”, uma vez que é no seu espaço de vida quotidiano, um apartamento em Brooklyn, que criam e gravam música, socorrendo-se de instrumentos, uns mais outros menos convencionais, entre estes últimos podendo figurar qualquer utensílio de cozinha que gere um som interessante. As características com ambições “experimentais” de uma música que não esconde o gosto pelo som, conhecem em High Places um cativante cartão de visita. A forma “clássica” da canção não parece, de todo, ser o objectivo primordial num álbum que revela mais vontade em explorar os cenários que as personagens que nele habitam. As texturas e drones, que traduzem técnicas de colagem e um interesse pelas estéticas da repetição, definem espaços onde a voz quase fantasmática de Mary Pearsen age como elemento de ligação à ideia da canção. As composições sugerem, na estrutura dos temas apresentados, uma aparente economia de recursos. Esse eventual ascetismo cede, na arte final, sob a edificação de cenários que não recusam vestir sugestões de exotismo, às vezes colhidas em sugestões de músicas de outras latitudes. Não faltam boas ideias. Falta apenas a capacidade de as usar num corpo mais sólido de composições onde a repetição seja opção formal e não apenas uma sensação deixada no ouvinte. Uma banda a acompanhar, sem dúvida.
High Places
“High Places”

Thrill Jockey / Mbari
3 / 5
Para ouvir: MySpace

Depois de um ano criativa e discograficamente agitado, sobretudo reconhecido pelos soberbos álbuns de The Field e Pantha du Prince, a editora de Colónia Kompakt Records, “casa” de referência para os admiradores do techno minimal, tem vivido um 2008 relativamente mais discreto, o que não é sinónimo de perda de relevância. Ainda a tempo de ajudar a fazer a história “electrónica” de 2008 eis que chega The Essence, segundo álbum que o DJ e produtor Peter Kersten (que também se apresenta por vezes como Lawrence) edita como Sten. O título parece indiciar o que a música, de facto, depois sugere: a demanda por um sentido de essência. Contido nas formas, concentrado na definição de caminhos (sem neles procurar pontos de fuga, atalhos ou desvios), The Essence toma como protagonista a estrutura e não os adornos. Os temas, centrados na construção de geometrias feitas de sons, arrumados depois por estratégias de repetição, não procuram prioritariamente a melodia, antes a sugestão de um rumo. Sem momentos de clímax, as composições sugerem-nos encontros com realidades que descobrimos como quem entra, a meio, numa história da qual não se escutou o início, saciando-nos todavia com o que vai acontecendo. Sombrio, The Essence é um disco que olha a parte e nunca o todo (a capa sugere-o desde logo). Minimal nos recursos procura uma intimidade com a estrutura puslante do ritmo e nela encontra o seu destino. O disco revela ainda uma abordagem, que todavia não busca a citação, aos modelos de referência fundamentais do género, nomeadamente as fundações históricas da techno na Detroit de meados de 80. Interessante, mas apenas para “frequentadores” do género.
Sten
“The Essence”

Kompakt / Flur
3 / 5
Para ouvir: MySpace


Também esta semana:
Of Montreal, Mitsouko Uchida + Christian Tetzlaff (Bach), Morgan Geist, Lou Reed (live), Arthur Russell, Bloc Party, Los Campesinos, The Cure, The Move (best of), Hank Williams (caixa), Kitsuné Maison (vol 6), Best of James Bond, ZTT Records (caixa), Ryan Adams, A, Schiff (Beethoven – vol 8), Maria João + Mário Laginha, Shed, Cazals

Brevemente:
3 de Novembro: Johann Johansson, Fall Out Boy, Elvis Presley (duetos de Natal), Paul Weller (BBC sessions), Bob Dylan (DVD), Megapuss, Q-Tip, Razorlight, Stephen Sondheim (caixa), Ry Cooder (best of), Herbert, Luomo, Burnt + Jacki, Girl Talk
10 de Novembro: Grace Jones, Flaming Lips, The Smiths (best of), Genesis (caixa), Stereophonics, Tracy Chapman, Metro Area, Murcof
17 de Novembro: David Byrne + Brian Eno, Belle & Sebastian (BBC Sessions), Simon Bookish, Parenthetical Girls, Casiotone For The Painfully Alone (EP)

Novembro: The Killers, Neil Young (live), Philip Glass (caixa – edição nacional), John Adams (edição nacional), Marc & The Mambas (reedição), Momus, Doors (live), Max Richter
Dezembro: Dakota Suite, Yelle (remix), Shirley Bassey (reedições), The Smiths (caixa), Motown 50

domingo, outubro 26, 2008

A caixa de vidro

Qual será a porta ideal para a descoberta da música de Philip Glass? Em célebre entrevista, no documentário American Composers, o próprio admitiu que havia quem gostasse da sua música porque não era clássica. E quem gostasse porque, pelo contrário, era clássica. Ainda quem gostasse porque era popular. E ainda quem a admirasse porque, precisamente, não era popular... Nesta encruzilhada podemos sugerir, mesmo assim, eventuais atalhos que conduzam à “revelação”. Por Songs From Liguid Days para quem chega da pop, via Koyaanisqaatsi para os mais familiarizados com as electrónicas do presente, através da sua Sinfonia Nº 5 para os mais habituados a repertório clássico, com passagem por Mishima para os cinéfilos, via Einstein On The Beach, aqui apelando aos espectadores mais habituados às artes performativas, e por aí adiante... Na verdade, cada um pode encontrar o seu caminho (ou nenhum, que ninguém obriga a isso). E o que a GlassBox agora editada permite é, acima de tudo, o garantir deste processo, destes encontros, pelos caminhos e ritmos que cada um bem entender. Convenhamos que, para o habitual seguidor (e comprador de discos) da obra de Philip Glass, a “caixa” quase nada traz de novo. Uma regravação de Floe e um outro excerto de Glassworks ao vivo são os breves inéditos em 10 CD que visitam muita da obra do compositor entre os anos 60 e a actualidade.

O modelo da caixa segue o que, em tempos, a mesma Nonesuch aplicou a Steve Reich e a John Adams, que com Glass completam a “santíssima trindade” minimalista que a editora a si chamou nos anos 80. Com bem mais de cem discos editados (e muitas mais peças ainda por registar), a obra de Glass é aqui evocada através de referências-chave das suas mais variadas áreas e géneros já abordados. Das peças minimalistas que definiram a base da sua linguagem ao trabalho para o cinema, da ópera à sinfonia, da música de câmara a peças instrumentais, o panorama traduz um retrato relativamente abrangente do trabalho de um dos mais importantes compositores do nosso tempo. Estão aqui exemplos da etapa, entre meados de 60 e meados de 70, na qual traçou bases linguísticas, logo depois as primeiras experiências no teatro musical, as frestas de abertura à comunicação com outros públicos e, depois, sinais de progressivo interesse por um lirismo que veio a dominar a sua música, sem perder nunca uma relação com o presente e o gosto pela descoberta (e assimilação) de novas músicas. As falha maior do alinhamento da caixa revela-se na ausência do importantíssimo trabalho de Glass na área da canção, abarcando os ciclos Songs From Liquid Days (1986) e Book Of Longing (2007), assim como composições pontuais que entregou a vozes como as de Mick Jagger, Nathalie Merchant ou Suzanne Veja, algumas ainda por editar em disco. Na verdade, há na obra de Glass material para uma segunda caixa antológica... E apesar da ausência da canção, esta revela um conjunto expressivo de obras, bem como um boooklet de 190 páginas com ensaios e depoimentos por figuras como, entre outros, Laurie Anderson, David Bowie, Martin Scorsese, Errol Morris, David Byrne ou Suzanne Veja. Abaixo ficam os conteúdos dos dez CD desta caixa:

CD 1: Music In Contrary Motion (1969) + Music With Changing Parts (edit) (1970) + Music In Similar Motion (1969)
CD 2: Music In 12 Parts (partes VII, VIII, IX e X) (1971-74)
CD 3: Einstein On The Beach (excertos) (1976)
CD 4: Glassworks (excertos, incluindo regravação de Floe e registo ao vivo de Closing) (1982) + Etoile Polaire (excertos) (1977) + Dressed Like An Egg (partes IV e V) (1977) e Mad Rush For Organ (1979)
CD 5: Satyagraha (excertos) (1980)
CD 6: Koyaanisqatsi (excertos) (1982) e Powaaqatsi (excertos) (1987)
CD 7: Quartetos de cordas números 2 (1984), 4 (1989) e 5 (1991) e Études For Piano (2, 3, 5 e 9) (1994)
CD 8: The CIVIL wARS (prólogo) (1983) + Hydrogen Jukebox (excertos) (1990) + Sinfonia Nº 5 (VII) (1999) + Akhnaten (excertos) (1983)
CD 9: Sinfonia Nº 3 (1995) + Sinfonia nº 8 (2005)
CD 10: Bandas sonoras – excertos da música dos filmes Mishima (1984), The Thin Blue Line (1988), Anima Mundi (1992), Candyman (1992), La Belle et La Bête (1994), The Secret Agent (1996), Kundun (1997), The Truman Show (1998), Dracula (1999), The Fog Of War (2002) e The Hours (2002)

Filhos de uma cidade cinzenta

Já conhecíamos Grant Gee de um magnífico documentário sobre a vida dos Radiohead na estrada depois da aclamação global do álbum OK Computer. Dez anos depois, Joy Division usa a mesma curiosidade, mas toda uma nova estratégia narrativa, para evocar uma das mais marcantes bandas da história, tomando-a como consequência da cidade que a viu nascer: Manchester. Reúne novas entrevistas a antigos elementos da banda, velhos colaboradores e admiradores. Mas tem a cautela de não se esgotar, como cinema, numa interessante sucessão de depoimentos. De resto, a demanda que o filme toma, procurando na história sociológica de Manchester (cidade "cinzenta" no centro de Inglaterra, com história operária que remonta aos dias da Revolução Industrial) marcas que se cruzam com a vida do grupo acaba por fazer de Joy Division mais que apenas uma biografia musical. Interessante é ainda a forma como se recusa o encarar das mitologias associadas ao grupo, apostando antes num racional retrato de ideias e felizes acasos. A edição em DVD acrescenta 43 minutos de entrevistas a figuras que vemos no filme.
PS. Texto publicado no suplemento IN, da revista NS, a 25 de Outubro

sábado, outubro 25, 2008

Nova Iorque em Londres

Este mês dedicámos parte das atenções aos Blondie, assinalando assim os 30 anos da edição do álbum de 1978 Parallel Lines. Hoje a viagem no tempo leva-nos novamente a 1978, mas para evocar um período de tempo durante o qual a banda, nova iorquina de gema, apontou azimutes a Londres em busca de uma porta de entrada na primeira divisão da música pop. A porta abriu-se com Denis, o single que anunciou o segundo álbum da banda, Plastic Letters. E coube ao single seguinte a confirmação de que não se tratava de uma corrente de ar oacsional, mas de um nome a ter em conta daí adiante. Assim foi, com (I Am Always Touched By Your) Presence, Dear a manter o estatuto entretanto conquistado em solo europeu. Curiosamente, o single nunca foi lançado no mercado norte-americano. Aqui fica, em "vídeo" da época...



(I Am Always Touched By Your) Presence, Dear
Blondie, Abril de 1978

sexta-feira, outubro 24, 2008

Histórias de anjos e demónios

Salvo erro, estes cartazes de W., de Oliver Stone, não chegaram ao mercado português. Constituem um magnífico exercício de ironia iconográfica, afinal sublinhando a dimensão bíblica (anjos, demónios e sua dramática coexistência) da personagem e, mais do que isso, o modo como as respectivas ambivalências ecoam no trabalho narrativo de Stone. E porque é altura de insistir na complexidade — visual, dramática, temática, política e simbólica — desse trabalho, sugiro a revisão de uma cena de Nixon (1995), com Anthony Hopkins. Aqui, Stone encena um momento particularmente tenso na Casa Branca, com Richard Nixon a revoltar-se contra a imprensa, a família Kennedy e, em última instância, confrontando Henry Kissinger com as possíveis implicações do caso Watergate.

Nos domínios do medo

O cinema de John Carpenter mora, a partir de hoje, na Cinemateca Portuguesa. Um dos “mestres” do cinema fantástico, Carpenter vai ter a sua obra praticamente toda disponível num ciclo que se prolongará pelo mês de Novembro. São flimes mostram em Carpenter um insistente explorador do medo como tutano de narrativas que apresenta sob linguagens de género (nomeadamente a ficção científica e o terror), mas com o engenho de por vezes sobre elas cruzar outros códigos, nomeadamente os do western, como se pode evocar nos dois títulos em que usou como protagonista a figura de Snake Pliskin (interpretado por Kurt Russell). Na filmografia de Carpenter é ainda importante referir o seu trabalho enquanto compositor, assinando frequentemente as bandas sonoras, nas quais cruza códigos do thriller com electrónicas, procurando uma música com características eminentemente cénicas, raramente ensaiando um protagonismo da melodia. O ciclo, que abre hoje, pelas 21.30, com Halloween – O Regresso do Mal (1978), inclui clássicos como Eles Nevoeiro (The Fog, 1980), Nova Iorque 1997 (Escape From New York, 1981, na imagem), Veio do Outro Mundo (The Thing, 1982), Christine (1983), O Homem das Estrelas (Starman, 1984) ou Eles Vivem! (They Live, 1988). Menos conhecido, e integrado no ciclo é Elvis, filme de 1979 centrado na figura do “rei” do rock’n’roll. Em baixo fica o trailer original do clássico Drak Star (1974), também incluído no ciclo.

R.E.M. reeditam 'Murmur'

Os R.E.M. vão lançar em Novembro uma edição especial comemorativa dos 25 anos do seu álbum de estreia, Murmur. O disco surgirá em formato de CD duplo, juntando ao alinhamento do álbum um concerto, inédito, registado no Larry’s Hideaway, em Toronto, três meses depois da edição do álbum, em 1983.

Consolidar um estatuto reconquistado

Discografia Duran Duran - 38
'Come Undone' (single), 1993

Editado poucos meses depois de Ordinary World, o segundo single extraído do ‘The Wedding Album’ manteve em alta o estatuto entretanto reconquistado pelo grupo. Come Undone foi, curiosamente, uma surpresa durante a própria gravação do álbum, entrando no seu alinhamento já depois de uma primeira versão terminada. A canção nasceu em sessões caseiras na sequência de uma tentativa de Warren Cuccurullo em criar uma versão alternativa para o tema First Impressions, do álbum Liberty (que teria sido o terceiro single extraído desse álbum para o mercado norte-americano, caso a editora não tivesse dado ordem para não o trabalhar mais). Com John Taylor ausente, Nick Rhodes e o produtor John Jones criaram uma linha de baixo electrónica para suportar uma canção que recebeu uma letra que Simon Le Bom havia oferecido como presente à sua mulher. Come Undone é mais um exemplo da face tranquila dos Duran Duran, na qual se herdam marcas da etapa de inícios de 80 dos Roxy Music, nomeadamente uma demanda de elegância. Canção mid-tempo, suportada por uma estrutura rítmica criada ao gosto dos anos 90, manteve os Duran Duran nas tabelas de vendas tendo, nos EUA, atingido o número 7 e chegado ao número 2 no Canadá. O single europeu apresentou uma versão acústica de Ordinary World no lado B. Nos EUA, para a cassete-single e CD single nos EUA foram estreados três inéditos (Time For Temptation, Falling Angel e Stop Dead), mais tarde reunidos num repackage do álbum.



O teledisco de Come Undone assinalou o reencontro dos Duran Duran com figuras “clássicas” da história do vídeo musical, nomeadamente o veterano Julien Temple. O grupo é filmado no London Aquarium, usando roupas que evocam o seu passado neo-romântico.

A IMAGEM: Gérard Castello Lopes, 1956

Gérard Castello Lopes
Évora
1956

quinta-feira, outubro 23, 2008

Elogio de "Entre os Dedos"

Faz parte da triunfante cultura da estupidez proclamar que a crítica serve para destruir o cinema. Em Portugal, pelo menos, esse é um discurso velho e caquético que sempre teve adeptos — e muito convictos, há que reconhecer. De facto, "a" crítica (singular) não existe, pela simples razão de que, com talento ou sem ele, os críticos (plural) defendem pontos de vista diversos, contrastados, na maior parte das vezes inconciliáveis. Existe, isso sim, uma normalização televisiva — através das telenovelas — que, todos os dias, há décadas (desde 1978, em rigor), vai formatando tudo e todos, desde os olhares à própria economia do audiovisual.
Felizmente, algum cinema, naquilo que tem de mais específico, tem sabido resistir a essa escola de banalidade que são as telenovelas e seus derivados. Entre os filmes que já se afirmaram nessa resistência, surge, agora, Entre os Dedos, de Tiago Guedes e Frederico Serra, drama pungente de um quotidiano que se expõe em imagens cruas e precisas como a que aqui podemos ver [Isabel Abreu].
É um drama ferido por uma urgência feita de carne, sangue e emoções: primeiro, porque se trata de olhar para as nossas vidas recusando, ponto por ponto, essas chagas contemporâneas que são a ironia que esmaga qualquer seriedade, a exaltação histérica do pitoresco e a moralização determinista das relações sociais; depois, porque um povo cuja complexidade existencial é sistematicamente ocultada pelo insidioso labor das ficções dominantes é um povo preso das formas que alguns lhe impõem.
Sim, é preciso voltar a falar das formas, apesar (ou melhor: por causa) dos lugares-comuns que tentam abafar a discussão política das nossas formas de ficção. E será também útil que percamos o medo de usar a palavra povo, mesmo não esquecendo as aplicações mais soezes que dela se fizeram. Entre os Dedos é um filme para nos ajudar nesse imenso trabalho.

Bush/Stone: pensem, por favor!

Em mais de 30 anos a escrever regularmente sobre filmes, confesso que nunca me habituei a um preconceito de muitos especta-dores/leitores: o de que se escreve (crítica de cinema) à espera de que os outros concordem connosco. Como? Se há valor que decorre da convicção pessoal é esse, muito simples e muito desarmado: os outros são também pessoas de convicções e é raro haver coincidências ou sobreposições de ideias.
Dito isto, há momentos em que chega a ser exasperante observar como algumas pessoas decidem... não pensar! Está a acontecer, agora, com o filme W., de Oliver Stone [cartaz francês]. Assim, por aquilo que vou ouvindo e lendo, percebo que circula uma pergunta: "O filme é a favor ou contra Bush?"
Deixem-se disso, por favor! Eu considero o filme uma extraordinária peça de cinema [a ele voltaremos], mas sou o primeiro a reconhecer que pode haver interessantíssimas leituras que não partilhem o meu entusiasmo. O problema não é esse. O problema é que partir dessa pergunta maniqueísta, típica daqueles debates muito gritados e "pedagógicos" que as televisões gostam de nos oferecer, é passar ao lado da disponibilidade humana e da complexidade argumentativa do próprio filme.
De facto, ver W. não é o mesmo que votar nas eleições americanas. Respeitemos a inteligência de Oliver Stone — mesmo que, em última instância, seja para pensarmos inteligentemente contra ele.

Rufus promete disco de piano e voz

Rufus Wainwright promete um álbum de piano e voz para 2009. O disco, como revelou à Billboard, não é mais que uma reacção ao trabalho épico que se materializou em Release The Stars, o seu mais recente disco de originais. O álbum representará aquilo que o músico descreveu como um “momento de intimidade” entre si mesmo e o piano. O álbum só verá a luz do dia depois de estreada a ópera Prima Donna. Esta será apresentada, pela primeira vez, a 10 de Julho, em Manchester.

Pop para fazer a festa

A canção já a conhecemos há algum tempo. Agora chega o teledisco. Falamos de Id Engager, o single de avanço para o novo álbum dos Of Montreal, Skeletal Lamping. O vídeo é realizado por Marc Reisbig e Hanne Berkaak.

Vozes de escritores em CD

A British Library vai lançar CDs com gravações de vozes de escritores ingleses e americanos do século XX. Arthur Conan Dolye, John Steinbeck, E M Forster, Rudyard Kipling, W. Somerset Maugham, J R R Tolkien, Aldous Huxley, Noel Coward, Evelyn Waugh, Doris Lessing, J G Ballard, Harold Pinter, Anthony Burgess, Gertrude Stein, F Scott Fitzgerald, William S Burroughs , Tennessee Williams, Gore Vidal, Patricia Highsmith ou Graham Greene são alguns dos nomes a ouvir nestes discos que serão apresentados no formato de dois CD triplos: Spoken Word: British Writers e Spoken Word: American Writers. As gravações, que apresentam as vozes de 30 escritores ingleses e 27 americanos, provém de fontes como a BBC, estações de rádio norte-americanas e registos particulares. Nestas gravações os escritores falam da sua obra, das artes em geral e de questões políticas. Conan Doyle fala da importância da espiritualidade. Steinbeck explica o que o levou a escrever As Vinhas da Ira. E Raymond Chandler é ouvido numa entrevista conduzida por Ian Flemming. A maior das preciosidades desta série é aquele que se crê ser o único registo áudio da voz de Virgínia Woolf, até agora nunca editado em disco. Cada CD triplo será colocado à venda a 19.90 libras.

Rumo à lua (em sânscrito)

A primeira missão lunar indiana já vai a caminho do seu destino. A Chandrataan-1 (o nome da nave não quer dizer mais que “veículo lunar” em sânscrito) levantou ontem do centro espacial de Sriharikota, no sudoeste indiano. A missão, que deverá durar dois anos, tem com objectivo central a construção de um novo mapa da Lua. A bordo do satélite que a nave transporta segue equipamento (aqui numa joint venture com a Nasa) que permitirá a obtenção de um mapa de alta definição da superfície lunar, assim como a determinação dos minerais que a constituem. A Índia é o terceiro país asiático na corrida lunar, juntando-se assim à China e Japão, estes já em ótbita. Os EUA, que lideraram a exploração lunar nos anos 60 e 70, deverá regressar à Lua em 2009.

Esta carta mostra as etapas da viagem, das órbitas terrestres à órbita lançada, que projectará a Chandrataan-1 rumo à Lua. Aí atingirá uma posição estacionária, a 100 quilómetros de altitude.

Oasis sob o signo de Lennon

São sons que nos relançam na incurável nostalgia dos Beatles, mas são também sons de uma energia muito presente, magoada, selvagem e sem remorso — a canção I'm Outta Time, do novo disco dos Oasis, Dig Out Your Soul, é um explícito tributo a John Lennon (no álbum inclui mesmo algumas palavras por ele gravadas poucos dias antes da sua morte). Este registo, extraído da MTV, foi feito há poucos dias, 16 de Outubro, na Wembley Arena — dir-se-ia que o evidente cansaço que se sente na voz de Liam Gallagher acrescenta um desencanto grave ao momento, emprestando-lhe o sentimento paradoxal de um ritual muito íntimo sancionado por guitarras muito eléctricas.

quarta-feira, outubro 22, 2008

Que jornalismo televisivo?

Há sinais de que o espaço da informação televisiva pode estar a entrar num importante capítulo de renovação. Assim, o modelo do canal de informação, consagrado pela experiência pioneira da SIC Notícias, está a ser objecto de um claro desafio pelas transformações recentes da RTPN, ao mesmo tempo que se volta a falar de um outro projecto na mesma área, neste caso com a chancela da TVI.
É um momento privilegiado para a classe jornalística, em geral, e os jornalistas televisivos, em particular, analisarem e repensarem o seu próprio trabalho. Porquê? Quanto mais não seja porque a contaminação da informação televisiva pelo "espontaneísmo" da reality TV se transformou num fenómeno transversal e, em muitos aspectos, preocupante. Porquê preocupante? Porque igualiza todos os acontecimentos numa agitação mais ou menos "burlesca", por vezes menosprezando mesmo os sinais mais gravosos da actualidade para privilegiar os mais rasteiros fait divers.
Mais do que nunca, importa sublinhar que não faz sentido considerar que tal visão do que está a acontecer apenas existe na cabeça de alguns "especialistas", eventualmente críticos de televisão, que "não percebem" que os conceitos de informação e espectáculo passaram a ter muitos cruzamentos... Claro que passaram (é, por isso, aliás, que gostamos da CNN).
O problema é outro e, acima de tudo, está muito para além dos naturais conflitos de pontos de vista entre quem faz televisão e quem a critica. Mesmo que possamos desqualificar as intervenções de todos os críticos, o problema tem a ver com uma conjuntura que seria pueril ignorar. A saber: a falta de credibilidade de muitas formas de "jornalismo" televisivo passou a ser reconhecida — e criticada — por um número crescente de espectadores. Só uma atitude de avestruz poderá ignorar o desagrado e a saturação inerentes a tal reacção. E se há responsáveis televisivos que consideram que a sua gestão deve passar apenas pelos números abstractos das audiências, lamentavelmente enganam-se — lamentavelmente para eles e para os espectadores, entenda-se.