domingo, julho 30, 2006
Pop e vestidos às bolinhas
Ver e ouvir aqui
sábado, julho 29, 2006
"Rio Bravo" para intelectuais
Como é possível que a noite de sábado da RTP seja abrilhantada (?) por um programa como A Canção da Minha Vida, uma espécie de "Serão para Trabalhadores" moralmente requen-tado, esteticamente desastroso e artisticamente nulo, tudo servido com o aparato de coisa popular e, mais do que isso, fiel à nossa identidade mais funda?
E que faz com que, ali ao lado, na 2:, passe o sublime Rio Bravo (1959), não apenas uma das obras-primas de um dos génios da idade clássica de Hollywood — Howard Hawks —, mas também uma expressão modelar, consagrada por quase meio século de história da nossa civilização, da mais cristalina arte popular?
Porque é que As Canções da Minha Vida é servido como espelho da nossa maneira de ser, desse modo obrigando-nos a aceitar que somos pueris, falhos de ideias e sempre em festa com a nossa falta de imaginação? E porque é que Rio Bravo surge programado como coisa "especializada", certamente vocacionada para intelectuais e outros monstros mais ou menos suspeitos?
Não que eu queira lidar com uma questão destas (que, em boa verdade, se repete todos os dias) procurando nomear culpados — não quero, além do mais, satisfazer essa Cultura Generalizada da Culpa que a televisão dominante impôs ao país, abominando o acto de pensar e fabricando bodes expiatórios por tudo e por nada. Não me interessa nomear ninguém como culpado e até estou disposto a acreditar que a maioria dos envolvidos com a fabricação e a difusão de As Canções da Minha Vida age na mais límpida seriedade profissional.
O problema não é esse. O problema é que se, pelo menos, não perguntarmos, então estamos a demitir-nos da nossa própria inteligência — como chegámos aqui?
Stones em versões "alternativas"
* Faultline, com Joseph Arthur // Wild Horses
* Johan Asherton // No Expectations
* Billy Bragg // She Smiled Sweetly
* Neal Casal // Shine a Light (ao vivo)
* Claudine Longet // Let's Spend the Night Together
* Lambchop // Backstreet Girl
* Silver Jews // Cocksucker Blues (ao vivo)
* LB // Angie (miniatura digital)
* Johnny Thunders // As Tears Go By (ao vivo)
Em caso de dúvida, procure-se a língua original.
Discos Voadores, 29 de Julho
Amy Millan “Skinny Boy”
Joan As Policewoman “Real Life”
Semifinalists “You Said”
Supernova “Candy Girl”
Regina Spektor “On The Radio”
Lisa Germano “In The Maybe World”
Philip Glass “Changing Opinion”
Thom Yorke “Analyse”
U-Clic “Like”
Infadels “Girl That Speaks No Words”
The Killers “When You Were Young”
The KBC “Not Anyone”
Justice Vs Simian “We Are Your Friends”
Franz Ferdinand “Eleanor Put Your Boots On”
The Strokes “Ask Me Anything”
Pop Dell’Arte “Mrs Tyler”
Philip Glass “Liquid Days (Part One)”
Philip Glass “Lightning”
Marisa Monte “Ao Meu Redor”
Ute Lemper “Streets Of Berlin”
Philip Glass vs David Bowie + Brian Eno “Heroes”
Pierce Turner “The Answer”
Philip Glass vs Sebastian Escofet “Tirol Concerto (remix)”
Philip Glass “Freezing”
Bernardo Sassetti “Alice”
Philip Glass + Aphex Twin “Three”
Discos Voadores – Sábado 18.00 - 20.00 / Domingo 22.00 - 24.00
Radar 97.8 FM e radarlisboa.fm
Scorsese em Boston
Olhar com a Magnum
sexta-feira, julho 28, 2006
Soderbergh (só) com legendas
Com Bubble, Steven Soderbergh arriscou uma estratégia cujos efeitos práticos e simbólicos ainda não podemos medir: o lançamento simultâneo, nos EUA, em sala, DVD e na televisão por cabo. Em Portugal, o filme sai apenas em DVD, o que, não deixando de ser positivo (antes isso que o completo esquecimento comercial), impede que o descubramos num grande ecrã para o qual, obviamente, também foi concebido.
Ponto muito negativo da edição em DVD é o facto de a opção de legendas... não existir. Isto porque só é possível ver o filme... com legendas. Não é caso único no panorama recente do mercado, o que faz temer que se esteja a desenhar mais uma "tendência" típica do novo-riquismo que invade todos os campos da vida cultural. Sendo o DVD, por princípio, um sistema que favorece a multiplicação das opções do consumidor, obrigar esse mesmo consumidor a ter sempre legendas num filme é um absurdo que, em última instância, o poderá repelir — até porque no mundo global em que vivemos, a maior parte dos interessados tem acesso automático a compras noutros mercados, capazes de satisfazer as suas opções de consumo.
O mapa de Iñárritu
A estreia americana tem data marcada para 27 de Outubro. Por cá, ainda está por anunciar.
Candy, aliás Abbie Cornish
Candy é a história de Dan e Candy, ele viciado em heroína, ela por amor disposta a experimentar o que ele usa. Daí nasce uma narrativa dilacerada que, se é verdade que nem sempre consegue escapar a um certo determinismo dramático, não é menos verdade que se sabe manter próxima das suas personagens, respeitando a sua complexidade sem as submeter à condição de caso "sociológico". É o próprio realizador, Neil Armfield, que o sublinha, quando recorda que esta não é uma história de amor vulgar, nem uma tragédia vulgar.
Baseado no romance homónimo de Luke Davies, Candy tem, sobretudo, a seu favor um cast homogéneo, dominado por Heath Ledger e Abbie Cornish, respectivamente como Dan e Candy. Cornish, em particular, impressionante de intensidade emocional e delicadeza expressiva, parece poder vir a ser um caso muito sério no panorama internacional do cinema de língua inglesa. Encontrá-la-emos, lá mais para o final de 2006, no novo filme de Ridley Scott, A Good Year, contracenando com Russell Crowe, Marion Cotillard e Albert Finney.
quinta-feira, julho 27, 2006
Von Otter canta Abba: sublime!
A mezzo-soprano sueca volta a mostrar como é — e porque é —, não apenas uma das mais extraordinárias intérpretes contemporâneas, mas também uma personalidade criativa para quem o fulgor da contaminação estética não é apenas uma hipótese teórica da arte contemporânea, mas um verdadeiro campo de trabalho onde é possível redescobrir e refazer os modelos, clássicos e modernos, da própria beleza das formas.
quarta-feira, julho 26, 2006
Raridades dos R.E.M. em antologia
Versão 1: 'And I Feel Fine... The Best of the I.R.S. Years 1982-1987' (CD):
Begin the Begin
Radio Free Europe
Pretty Persuasion
Talk About the Passion
(Don't Go Back To) Rockville
Sitting Still
Gardening at Night
7 Chinese Bros.
So. Central Rain (I'm Sorry)
Driver 8
Can't Get There from Here
Finest Worksong
Feeling Gravity's Pull
I Believe
Life and How to Live It
Cuyahoga
The One I Love
Welcome to the Occupation
Fall on Me
Perfect Circle
It's the End of the World As We Know It (And I Feel Fine)
Extras da Versão 2: 'And I Feel Fine... The Best Of The I.R.S. Years 1982-1987 (Collector's Edition)'
Pilgrimage
These Days
Gardening at Night (maquete inédita)
Radio Free Europe (versão alternativa)
Sitting Still (versão alternativa)
Life and How to Live It (ao vivo no Muzik Centrum, Utrecht, Holanda 9/14/87, inédito)
Ages of You (ao vivo no Paradise, Boston 7/13/83, inédito)
We Walk (ao vivo no Paradise, Boston 7/13/83, inédito)
1,000,000 (ao vivo no Paradise, Boston 7/13/83, inédito)
Finest Worksong (mistura alternativa)
Hyena (maquete inédita)
Theme from Two Steps Onward (inédito)
Superman
All the Right Friends (inédito)
Mystery to Me (maquete inédita)
Just a Touch (ao vivo em studio, inédito)
Bad Day (outtake de 1986, inédito)
King of Birds
Swan Swan H (acústico, ao vivo)
Disturbance at the Heron House
Time After Time
E, agora, o DVD:
Wolves, Lower
Radio Free Europe
Talk About the Passion
Radio Free Europe (The Tube, 11/18/83)
Talk About the Passion (The Tube, 11/18/83)
So. Central Rain (I'm Sorry)
Left of Reckoning
Pretty Persuasion (The Old Grey Whistle Test, 11/20/84)
Can't Get There from Here
Driver 8
Life and How to Live It
Feeling Gravity's Pull
Can't Get There from Here (The Tube, 10/25/85)
Fall on Me
Swan Swan H
The One I Love
It's the End of the World As We Know It (And I Feel Fine)
Finest Worksong
Este fim de semana na Radar
Sábado 12.00 / Domingo 19.00
Álbum de Família. Esta semana ouve-se Rio, dos Duran Duran, o álbum que partiu dos estímulos new wave que haviam dominado a sua etapa 1980/81, e os fez partir rumo a novos desafios pop.
Hoje, 14.00 / Domingo 12.00
Discos Voadores. Uma edição de ‘discos perdidos’, recuperando o clássico Songs From Liquid Days de Philip Glass (1986), recordando ainda algumas das colaborações do compositor com os universos pop.
Sábado 18.00 / Domingo 22.00
terça-feira, julho 25, 2006
Digital chique
Patrick Wolf com single em Outubro
Chris 007 Cornell?
segunda-feira, julho 24, 2006
Discos da semana, 24 de Julho
Sobras serão sempre… sobras. E este é um disco de sobras. De caixote de lixo de primeira, é verdade. Mas, e sempre, sobras… Há um ano, o segundo volume do ambicioso projecto de retratar em música os 50 estados dos EUA, um álbum por cada estado, revelava definitivamente em Sufjan Stevens um visionário compositor capaz tanto do diálogo entre a voz e o dedilhar de cordas e a construção monumental de pequenas sinfonias. Illinois foi, na verdade, um dos melhores discos que escutámos em 2005. Todavia, em vez de assumir que férias são férias, ou de regressar ao trabalho para retratar novo estado, ou novo disco exterior a este projecto megalómano, Sufjan Stevens optou por editar, em disco, os outtakes de Illinois, ou seja, as sobras… A audição de The Avalanche revela, sem dúvidas, que Sufjan Stevens escolheu as melhores canções que tinha para o alinhamento oficial de Illinois. E, agora, limita-se a gerir o que acabou de fora, alinhamento no qual ainda encontramos alguns momentos magníficos mas no qual não mora nem a coerência conceptual nem mesmo a excelência de conjunto de Illinois. Ouve-se, mas em nada chega aos calcanhares do disco do ano passado..
New York Dolls “One Day It Will Please Us To Remember Even This”
Mais de 30 anos depois de terem editado um álbum de estreia que ficou registado como peça fulcral na história da música popular, alavanca fundamental para a revolução punk que vinha a caminho, is que regressam os New York Dolls com One Day It Will Please Us To Remember Even This, disco de título denuncia a auto-ironia esperada num grupo liderado por músicos que sabem dos anos de vida que já somam e do facto de raras serem as reuniões esteticamente pertinentes. E o que são estes New York Dolls de 2006? São os sobreviventes Sylvain Sylvain e David Johanssen, que resolveram manter a banda viva depois da reunião solicitada há dois anos pelo velho fã Morrissey para actuação no festival Meltdown. O álbum revela-os como naturais herdeiros directos do seu próprio passado, exactamente as mesmas referências convocadas para fazer sólidas canções rock’n’roll de travo clássico. Girl groups dos anos 60, rock’n’roll dos anos 50, viço e energia, formas já ensaiadas e usadas. A voz de David Johanssen não esconde que passaram mais de 30 anos sobre os dias em que berrava Personality Crisis, mas o ânimo pop mantém-se firme, nos mesmos azimutes, talvez com notas mais bem tocadas, produção mais precisa, os ecos dos blues mais presentes e um sentido vintage usado em favor de um coeso conjunto de canções. E com Michael Stipe em dueto em Dancing On The Lip Of A Volcano. Como no último Rolling Stones, aqui vemos veteranos no perfeito domínio dos seus talentos.
Comsat Angels “Waiting For A Miracle”, “Sleep No More”, “Fiction”
Os Comsat Angels foram uma das excepções à regra mais mediazada que fazia crer que todo o pós-punk de Sheffield se manifestava através das electrónicas (casos notáveis nos Human League, Cabaret Voltaire ou Heaven 17). Apesar de integrarem sintetizadores na sua música, o seu som era essencialmente traçado pelas guitarras e baixo, ambientes habitualmente sombrios, sob textura atmosférica e de moldura minimalista nas suas primeiras gravações. Não tiveram nunca o carisma ou mesmo as capacidades visionárias de contemporâneos seus como os The Sound, Chameleons, Felt, Echo & The Bunnymen, Associates, Teardrop Explodes, U2 ou The Cure. Nem mesmo gozaram da adesão da crítica. Mas hoje, em tempo de reavaliação desse passado de muitos feitos e acontecimentos registados entre 1978 e 84, ressurgem como um nome que, mesmo não fundamental, deve ser encarado como uma peça característica e representativa do seu tempo. Waiting For A Miracle (1980), o seu primeiro álbum, era espartana contenção de maquilhagem sobre uma música que ecoava marcas de uns Pere Ubu e Television em canções abstractas nas quais as temáticas características da sua geração (paranóia, dúvida, amor destroçado) estão presentes. As canções são concisas e eficazes, baixo e bateria a suportar o pulsar do sangue, sintetizadores a sugerir ambiente, guitarras e voz a comandar operações. Sleep No More (1981) é o sucessor natural de uma magnífica estreia. As ideias surgem mais arrumadas, as canções mais precisas, a ideia do álbum mais coesa. De resto, este é um monumento de difícil entrada, que se revela a cada audição para revelar, sobretudo nos momentos de menor euforia rítmica um dos melhores discos de dor de corno da sua geração. Fiction (1982) revela uma leveza (não confundir com ligeireza) inesperada, num disco de mais detalhe na decoração e interessante reavaliação do trabalho no baixo. Mas a sombra ainda aqui mora, de resto decorada a rigor, quase que antecipando um registo gótico que faria escola nos Mission.
E também: Nitzer Ebb (best of), Lilly Allen, Pharrell, Coachella (DVD)
Brevemente:
Agosto: Bob Dylan, Outkast, Pulp (reedições), Heaven 17 (reedições), Frank Black, Joan As Policewoman, Oneida, Forward Russia!, Camera Obscura, I’m From Barcelona, Guillemots, Philip Glass (nova opera), Arthur Russell (reedição)
Discos novos ainda este ano: Spartak, Woman In Panic, U-Clic, Protocol (Verão), B-52’s, Beyoncé (Setembro), Blur, Bryan Ferry, Cornershop, Damon Albarn (Verão), Depeche Mode (ao vivo, Outono), Feist (Outono), Franz Ferdinand (Outono), Hector Zazou, Jarvis Cocker (Verão), Joseph Arthur, The Killers (Outono), Kim Wilde, Michael Franti (Julho), Moby (Verão), Neneh Cherry, Nine Inch Nails, Peter Gabriel, Polyphonic Spree (Julho), Q-Tip, Radiohead, St Etienne, Scissor Sisters (Setembro), Sisters Of Mercy, Clinic (Outono)
Reedições e compilações ainda este ano: Art Of Noise, Frankie Goes To Hollywood, Kate Bush (Novembro), Oasis (Lados B), Propaganda, Byrds (reedição), Clash (reedição), Björk (caixa integral), The Cure, Electronic (Setembro)
Estas datas provém de planos de lançamento de diversas editoras e podem ser alteradas a qualquer momento.
domingo, julho 23, 2006
174 anos de desenhos animados
Adaptado de um romance de Philip K. Dick, o filme A Scanner Darkly retoma a técnica de animação — rotoscopia — que Linklater já aplicara em Waking Life (2001). No essencial, trata-se de um processo tradicional, por exemplo já presente em algumas sequências de Branca de Neve e os Sete Anões (1937): as cenas são filmadas com actores e, depois, retrabalhadas em forma de desenho. Tal como em Waking Life, Linklater aplicou o "rotoshop", mecanismo que integra o método básico da rotoscopia, agora através do uso de técnicas digitais.
Entre outros temas, esta edição da Sight & Sound, inclui trabalhos sobre os cineastas Hou Hsiao-Hsien (Three Times) e Philippe Garrel (Os Amantes Regulares, a estrear entre nós no dia 3 de Agosto). Na secção de crítica, são comentados mais de duas dezenas de filmes, incluindo Carros e The Science of Sleep, o novo trabalho de Michel Gondry.
Vem aí o... Zune!
Está finalmente desfeito o rumor. A Microsoft confirmou que está a trabalhar numa série de gadgets para consumo de música e outras propostas de entretenimento, um dos quais deverá ser lançado ainda este ano. Chamar-se-á Zune, é um leitor de mp3 e é naturalmente apontado como um rival do iPod da Apple (a imagem, que circula na Internet, apresenta este protótipo como o Zune, em design próximo do definitivo). Não será todavia fácil combater o iPod (que detém 50 por cento do mercado de leitores portáteis) como a loja iTunes (com 70 por cento das vendas mundiais). Os especialistas que já se pronunciaram na Internet afirmam que as possibilidades de sucesso do Zune dependerão da sua capacidade em permitir downloads de música e vídeo sem fios… Por enquanto sabe-se que, pelo menos numa primeira geração, o Zune não terá menu de jogos. Que deverá surgir em três cores: branco, preto e castanho. E que Paul Oakenfold poderá ser um dos nomes ligados à sua campanha de lançamento.
Memórias políticas de John Lennon
Pelo trailer do filme, podemos perceber que se trata de uma montagem que recolhe muitos documentos da época, ilustrando a crescente politização da música e do discurso público de Lennon e Yoko Ono. Vale a pena consular também a página que dá acesso ao site do filme, na qual se recolhem muitas informações, nomeadamente de carácter jornalístico, sobre a vida política de Lennon.
A realização de The Us vs. John Lennon pertence a David Leaf e John Scheinfeld, produtores/realizadores com uma vasta colaboração na área da televisão, em particular em documentários sobre personalidades da cena musical — dirigiram, por exemplo, When I Fall in Love: The One & Only Nat King Cole (2003) e Ricky Nelson Sings (2005). Como recorda a publicidade de The Us vs. John Lennon, o novo filme tem a chancela da Lions Gate, o mesmo estúdio que apoiou a produção de Fahrenheit 9/11 (2004), de Michael Moore — a estreia americana está marcada para 15 de Setembro; para já, não consta das listas dos distribuidores portugueses.
sábado, julho 22, 2006
Antonioni, aqui e agora
Com Jack Nicholson e Maria Schneider, Profissão Repórter é a história de um homem que ocupa o lugar de outro — literalmente, assumindo a identidade de alguém que morreu. Nessa medida, ele passa a ser o vazio de outro, sobreposto ao vazio que sobre si mesmo decretou. Tudo isso num mundo de muitas informações cruzadas em que o excesso de mensagens parece gerar um vazio ainda maior — 31 anos depois, os paralelismos com o aqui e agora parecem ter-se multiplicado de forma inquietante, de tal modo a démarche de Antonioni é visionária e premonitória.
No reino das marionetas
Estamos num reino imaginário, assolado pela guerra há gerações sem conta. Um velho rei tirano, carcomido pelo caruncho do remorso, escolhe a morte voluntária, deixando por herança ao filho o desafio de fazer a paz, testamento que redige numa carta. Ora, o mau da fita, o seu irmão cruel e ambicioso (voz de Derek Jacobi), assiste à cena e, em vez de entregar ao sobrinho a carta de despedida do velho rei, apresenta a sua morte como assassinato pelo rival inimigo de sempre, paz novamente adiada. A sede de vingança ensopa a madeira do jovem herdeiro que sai da cidade em busca do assassino imaginário, mal sabendo que está a entregar o poder nas mãos do tio… Vencerá o mal. Ou haverá, afinal, esperança?...
A história, está visto, é de banalidade de má carpintaria, não sendo portanto pela narrativa que o filme tem conquistado admiradores. A verdadeira força de O Fio da Vida nasce, antes, da forma imaginativa como as características físicas das marionetas são usadas em favor da sua caracterização, da espantosa fotografia e de uma direcção artística digna de louvor. Geram-se assim quadros visuais deslumbrantes, capazes de nos fazer transcender o primarismo estrutural de um conto de fantasia banal, conferindo-lhe verdadeiros temperos góticos.
Discos Voadores, 22 de Julho
Boy Kill Boy “Civil Sin”
Low Sparks “She Was Always Cool”
Every Move A Picture “Signs Of Life”
TV On The Radio “I was A Lover”
Spartak “King Tubby”
The Knife “Forest Families”
Três Tristes Tigres “Anormal”
Regina Spektor “Fidelity”
Semifinalists “You Said”
Throwing Muses “Ruthie’s Knocking”
Sonic Youth “What A Waste”
The Sounds “Tony The Beat”
Midnight Movies “Blue Babies”
Yeah Yeah Yeahs “Dudley”
Mates Of State “Fraud In The 80’s”
Who Made Who “Space For Rent”
Cindy Kat “Miúdo”
Catpeople “Everyone Can Tell You”
TV On The Radio “Wolf Like Me”
TV On The Radio “Hours”
TV On The Radio “Dreams”
TV On The Radio + David Bowie “Province”
Placebo + David Bowie “Whithou You I’m Nothing”
Kashmir + David Bowie “The Ceptic”
Kirsteen Young + David Bowie “Saviour”
Arcade Fire + David Bowie “Wake Up”
You Should Go Ahead “Melancholic Phantom”
White Rose Movement “Test Card Girl”
Discos Voadores – Sábado 18.00 - 20.00 / Domingo 22.00 - 24.00
Radar 97.8 FM e radarlisboa.fm
quinta-feira, julho 20, 2006
Zoo TV finalmente em DVD
Mais dois Durans remasterizados
Este fim de semana na Radar
Sábado 12.00 / Domingo 19.00
Álbum de Família. Em semana de primeira visita dos Strokes a Portugal, um olhar integral pelo seu fundamental álbum de estreia Is This It?
Domingo 12.00
Discos Voadores. A chegada do segundo álbum dos TV On The Radio leva-nos não só a escutar com atenção o álbum, como a evocar outros afilhados recentes de David Bowie, com mestre presente.
Sábado 18.00 / Domingo 22.00
quarta-feira, julho 19, 2006
Bowie em filme de Nolan
Mais olhos que barriga
O mercado nacional é pequeno e muito limitado. A vontade em ver os grupos de que se gosta existe, claro. E é verdade que os Depeche Mode viveram o seu maior sucesso editorial português com o último álbum. Mas daí a imaginar dois concertos num intervalo de menos de um ano, o segundo em espaço talvez sobredimensionado para a realidade da sua base de fãs, e ainda por cima em tempo de férias e festivais, dá nisto.
O cancelamento dos Depeche Mode, de que Gary Numan, ao telefone ontem de manhã, já me tinha dado sugestão, é má notícia para um país que se julgava já no mapa dos grandes roteiros live europeus. Para todos os efeitos, corre já a notícia, entre agentes internacionais, que um concerto com uma banda de primeira divisão foi cancelado em Portugal. E ninguém se preocupará a explicar, a esses mesmos agentes, o antecedente do desaire, ou seja, casa cheia para 20 mil almas “satisfeitas” alguns meses antes… Não nos admiremos, agora, de cautelas maiores em futuras digressões de nomes de primeira divisão… Antes de assinar uma data lusitana, muitos certamente pensarão duas vezes…
Mercury Prize: os nomeados
Para os interessados, aqui fica a short list:
Arctic Monkeys “Whatever People Say I Am That's What I'm Not”
Isobel Campbell + Marl Lanegan “Ballad Of The Broken Seas”
Editors “The Back Room”
Guillemots “Through The Windowpane”
Richard Hawley “Coles Corner”
Hot Chip “The Warning”
Muse “Black Holes & Revelations”
Zoe Rahman “Melting Pot”
Lou Rhodes “Beloved One”
Scritti Politti “White Bread Black Beer”
Sway “This Is My Demo”
Thom Yorke “The Eraser”
terça-feira, julho 18, 2006
Discos da semana, 17 de Julho
Uma série de álbuns editados na 4AD durante a década de 90, entre os quais os marcantes Geek The Girl (1994) e Excerpts From A Love Circus (1996), revelaram Lisa Germano como uma das mais cativantes cantauroras do seu tempo, arrepiante nas visões pessoais que lança na sua música, profundamente sedutora na voz e instrumentação que a acolhe. Porém nunca teve a visibilidade de uma PJ Harvey, Björk, tendo inclusivamente, a dada altura, abdicado da música como terapia para uma vida saudável de menos confrontos com o insucesso e mais seguro e fixo ordenado ao fim do mês.
Felizmente, para os muitos que a admiram, deu o dito por não dito. E cinco anos depois de um silêncio mergulhado numa livraria de Los Angeles, regressou com Lullaby For Liquid Pig (2003), mais íntimo, mais delicado, mais pessoal, não menos confessional. Três anos depois, In The Maybe World continua a história onde o sublime álbum de 2003 nos deixou. A morte, não como tragédia, mas momento de passagem que nos leva antes a pensar naquilo que viveu (não necessariamente no que desapareceu) domina as reflexões de uma escrita que mantém viva a emotividade crua, sem filtro, que sempre caracterizou a obra de Lisa Germano. As canções são-nos sussurradas aos ouvidos, expressando uma intensidade interior que a alguns assusta, mas que não cede nunca perante uma busca de paz depois de explicada mais uma história de dor e perda. Só, ao piano, pontualmente violino e guitarra, Lisa Germano reúne aqui um notável conjunto de canções de cortante verdade e inequívoca beleza. Será desta que lhe daremos a justa atenção?
Who Made Who “Green Version”
Editado no ano passado, o muito recomendável álbum de estreia WhoMadeWho representou um dos mais estimulantes convites à dança da saison, através de uma reapropriação de modelos captados na memória das noites agitadas de finais de 70 e inícios de 80, funk e derivados do disco em diálogo com a então ‘novidade’ pós-punk. Um ano depois, o não menos apelativo Green Version despe às mesmas canções desse mesmo disco a sua secção rítmica e transforma monumentos de carne e movimento em corpos, não menos reais, feitos de paz e contemplação pop. Não se confunda a operação com a modalidade unplugged dos anos 90. Estas versões “verdes” são apenas ecologia de contenção no ritmo, propondo modos baladeiros de abordagem a uma mesma canção, electricidade e electrónicas presentes.
Envelopes “Demon”
Quem são os Envelopes? Uma banda franco-sueca, nascida entre férias enquanto os seus membros, fãs de Pixies, Kate Bush, Mutantes e Talking Heads, estudavam na faculdade. Demon, o seu segundo álbum é mais um fruto da era do mash cultural que nos deu já uns Arcade Fire, Clap Your Hands Say Yeah ou Architecture In Helsinki. Mas, fruto da disparidade dos gostos dos elementos, a colagem sugere desvios ainda mais inesperados nos quais, se escuta ora a acção directa de uns Velvet Underground e o minimalismo de uns Young Marble Giants ou a elaboração multicultural de um Beck, até mesmo a pop visionária dos Stereolab. É um disco desafiante, surpresa a cada faixa, habituação a assegurar, aos poucos, o prazer que se vai instalando. Mais uma boa surpresa com identidade sueca, portanto.
Vários “Happy Endings”
Banda sonora do filme entre nós em exibição sob o título Finais Felizes, é uma colecção de temas colhidos entre discos dos Calexico, Black Heart Procession, a contribuir para uma caracterização desértica, de proximidade mexicana, ao filme de Don Roos com acção algures em Los Angeles. O filme, claro herdeiro do filão Magnólia, serve-se da música como elemento de grande relevância, até porque dois das suas dez personagens centrais passam por uma banda. Destaque-se, aí, a contribuição de Maggie Gyllenhall, que dá a sua própria voz às canções da sua personagem. Canções essas que a banda sonora naturalmente inclui.
E também: Pet Shop Boys (DVD reedição), Seu Jorge (DVD), Black Heart Procession, etc), Gaiteiros de Lisboa, Moloko (best of), Lilly Allen
Brevemente:
24 Julho: Sufjan Stevens, Nitzer Ebb (best of), Comsat Angels (reedições), New York Dolls, Frank Black, Joan As Policewoman
Agosto: Bob Dylan, Outkast, Pulp (reedições), Heaven 17 (reedições)
Discos novos ainda este ano: Spartak, Woman In Panic, U-Clic, Protocol (Verão), B-52’s, Beyoncé (Setembro), Blur, Bryan Ferry, Cornershop, Damon Albarn (Verão), Depeche Mode (ao vivo, Outono), Feist (Outono), Franz Ferdinand (Outono), Hector Zazou, Jarvis Cocker (Verão), Joseph Arthur, The Killers (Outono), Kim Wilde, Michael Franti (Julho), Moby (Verão), Neneh Cherry, Nine Inch Nails, Peter Gabriel, Polyphonic Spree (Julho), Q-Tip, Radiohead, St Etienne, Scissor Sisters (Setembro), Sisters Of Mercy, I’m From Barcelona (Agosto), Clinic (Outono), Coachella (DVD, em Julho)
Reedições e compilações ainda este ano: Art Of Noise, Jesus & Mary Chain, Frankie Goes To Hollywood, Kate Bush (Novembro), Oasis (Lados B, Junho), Propaganda, Byrds (reedição), Clash (reedição), Björk (caixa integral), Siouxsie & The Banshees, Lilac Time, The Cure
Estas datas provém de planos de lançamento de diversas editoras e podem ser alteradas a qualquer momento.
domingo, julho 16, 2006
Discos Voadores, 15 de Julho
Who Made Who “Space For Rent”
Hot Chip “Colours”
Kudu “Hey 50”
Thom Yorke “Analyse
Spartak “Spartak!One”
The Knife “Forest Families”
Regina Spektor “Fidelity”
Patti Smith “China Bird”
Lisa Germano “In The Maybe World”
Laurie Anderson “Coolsville”
Semifinalists “You Said”
Xana “Táxi”
Sonic Youth “What A Waste”
Raconteurs “Broken Boy Soldier”
Sufjan Stevens “The Avalanche”
Syd Barrett “Wined And Dined”
Jorge Palma “Estrela do Mar”
Lisa Germano “After Monday”
Lisa Germano “Geek The Girl”
Lisa Germano “Puppet (album version)”
Lisa Germano “Candy”
Kristen Hersh “Your Ghost”
PJ Harvey “Who Will Love Me Now”
Mimi “Fire And Horses”
Sylvia Hallett “One More Holliday”
Björk “One Day”
Lisa Germano “Too Much Space”
Gaelle Cardoso “Twisted”
Kelley Polar “Vocalise”
Discos Voadores – Sábado 18.00 - 20.00 / Domingo 22.00 - 24.00
Radar 97.8 FM e radarlisboa.fm
quarta-feira, julho 12, 2006
Discos Voadores no Incógnito (o 'set')
Esperando que quem passou pelo Incógnito se tenha divertido tanto quanto me diverti eu na cabine, rodando discos, falando com velhos e novos amigos, água com gás como gasolina única e, claro, usando a provocadora T-shirt “I Am Not A DJ” comprada há poucas semanas no Sonar, aqui deixo o alinhamento integral desta sessão Discos Voadores.
Em Repeat: Incinerate, dos Sonic Youth.
Álbum em exploração: Dying To say This To You dos The Sounds
Fio de Azeite (sempre indispensável): Ciências Sensuais, dos brasileiros Azul 29
Nouvelle Vague “The Killing Moon”
Brian Eno “How Many Worlds”
Fort Dax “Oxenofolly”
Goldfrapp “You Never Know”
Drum Club “Space Angel Station”
The Knife “The Captain”
Kelley Polar “The Rooms In My House Have Many Parties”
Hot Chip “Tchaparian”
Kasabian “ID”
Franz Ferdinand “Walk Away”
The Cloud Room “Beautiful Mess”
Death In Vegas “Aisha”
CatPeople “Everyone Can Tell You”
Interpol “C’Mere”
Jeff Who? “The Golden Age”
Kudu “Magic Touch”
Azul 29 “Ciências Sensuais”
Every Move A Picture “St John’s Night”
Protocol “Where’s The Pleasure?”
Ladytron “Nothing To Hide”
X Wife “Ping Pong”
You Should Go Ahead “Melancholic Phantom”
U-Clic “Like”
Kudu “Hey 50”
Soho Dolls “Prince Harry”
Yeah Yeah Yeahs “Cheated Hearts”
The Sounds “Tony The Beat”
Shut Out Louds “The Comeback”
White Rose Movement “Love Is A Number”
She Wants Revenge “Tear You Apart”
Joy Division “She’s Lost Control”
Sonic Youth “Incinerate”
The Strokes “Heart In A Cage”
We Are Scientists “Nobody Moves, Nobody Gets Hurt”
Raconteurs “Steady As She Goes”
Dirty Pretty Things “Bang Bang You’re Dead”
The Idle Hands “Loaded”
The Sounds “Painted By Numbers”
Blondie “In The Flesh”
Salada de Frutas “Robot”
Franz Ferdinand “Do You Wanna”
Editors “Fingers In The Factories”
The Bravery “An Honest Mistake”
Duran Duran “Careless Memories”
Ultravox “New Europeans”
Bauhaus “Ziggy Stardust”
David Bowie “Rebel Rebel”
Elephant “Lolita”
Arctic Monkeys “I Bet You Look Good On The Dance Floor”
White Stripes “Fell In Love With A Girl”
The Jam “Going Underground”
Pixies “Debaser”
Raveonettes “Love In A Trash Can”
The Sounds “Queen Of Apology”
Ladytron “Disco Traxx”
Infadels “Can’t Get Enough”
The Kills “The Good Ones (Tiga remix)”
Tiga + Jake Shears “We’re Gonna Want Me”
Woman In Panic “A Forest”
Kraftwerk “Radioactivity (1991 mix)”
Vitalic “My Friend Dario”
Mount Sims “9 Voltz”
LCD Soundsytem “Daft Punk Is Playing In My House”
Soft Cell “Tainted Love/Where Did Our Love Go?”
Depeche Mode “A Pain That I’m Used To (Telex remix)”
Vive La Fête “Exactement”
Every Move A Picture “Signs Of Life”
Cloud Room “Hey Now Now”
The Smiths “What Difference Does It Make?”
Sonic Youth “Incinerate”
Richard Hell & The Voidoids “Love Comes In Spurs”
Television “See No Evil”
The Hives “Hate To Say I Told You So”
Kaiser Chiefs “Everyday I Love You Less And Less”
Bang Bang Machine “Breathless”
Deee-Lite “What Is Love?”
Juliette “Avalon”
Vendas 'online' crescem 77 por cento
O relatório mostra ainda que, como se esperava, os consumidores estão a optar pela compra de faixas avulso, em vez de adquirir álbuns na sua totalidade.
Discos da semana, 9 de Julho
Não era por acaso que este era um dos mais aguardados álbuns deste Verão. O seu disco de estreia, Desperate Youth, Blood Thirsty Babes (2004) revelara uma torrente de ideias à espera de tempo e rodagem para as ordenar e delas fazer nascer mais num estimulante híbrido, representativo portanto das tendências artísticas do tempo em que vivemos. Assim foi e em Return To Cookie Mountain não só a casa está arrumada, como à face esteticamente actual e interventiva o grupo de Brooklyn acrescenta uma postura política que sabe pensar acima dos clássicos (estafados e cada vez mais anacrónicos) duelos entre esquerda e direita, procurando antes uma nova forma de pensar o presente, onde vivemos, com quem vivemos, o que nos rodeia. De resto, os TV On The Radio já nos tinham mostrado serem capazes de uma postura política interventiva, menos panfletária, mas mesmo assim eficaz, quando, no rescaldo do furacão Katrina, compuseram, gravaram e colocaram no seu site uma canção denunciando a má gestão dos eventos pela administração Bush. Sem travar a intensidade das ideias, a força dos acontecimentos ou o volume da música, um sentido de calma parece atravessar um disco mais claro, sem receio de assumir claramente as suas influências, experimental ainda, mas de evidente sangue pop. Samples de guitarras, pianos, baixos distorcidos, texturas elaboradas, ritmos que não temem o hip hop ou outros ventos, overdubs vocais (a lembrar, à distância, e noutro contexto, a complexidade de eventos de uns Beach Boys em meados de 60)… E também a voz convidada do confesso admirador David Bowie, em Province. Este é um disco que sabe bem ir descobrindo aos poucos, Um mundo de detalhes que se desvendam a cada audição. Uma recomendável sugestão para acabar de vez com a ideia que o Verão é silly.
Regina Spektor “Begining To Hope”
Depois dos sinais encorajadores do anterior Soviet Kitsch, o novo disco da jovem cantaurora russa crescida e educada em Nova Iorque promete dela fazer uma das cantauroras de referência para a geração 00. Filha de um pai que escutava discos ocidentais às escondidas e de uma professora de piano de Moscovo, herdou tanto um travo de rebeldia nas ideias como um sentido de aprumo e exigência nas formas. A Perestroika permitiu-lhe sair de Moscovo com a família, e aos nove anos de idade viu-se em Nova Iorque, onde a exposição à música de Joni Mitchell e Ani di Franco se mostrou determinante paleta de iniciação a novas influências. A sua música hoje revela ainda a presença de Billie Holliday, Tori Amos e Patti Smith, cruza genéticas captadas na música clássica, na folk, na alma russa, revela um gosto pela literatura que se descodifica em referências a nomes como Scott Fitzgerald, Hemingway ou Boris Pasternak… Regina Spektor escreve assumidas ficções, luminosidade ou introspecção projectadas em personagens não necessariamente autobiográficas. O novo disco traz a revelação de outras ambições, uma delas a de evidente desejo de transcender ao circuito free folk ao qual esteve em tempos associada, sem que tal implique um processo de ruptura. Pelo contrário, as marcas dos trilhos que percorreu nos últimos discos encontram aqui uma produção mais meticulosa, arranjos depurados, mais exactos. Máquinas e instrumentos “reais” em diálogo frutuoso. E uma voz que conquista. Depois das cartas de intenções dos discos anteriores, este é o disco que nela confirma grandes esperanças nesta que é uma das cantautoras da geração actual na qual mais podemos acreditar.
Thom Yorke “The Eraser”
Enquanto os Radiohead trabalham num disco novo (espera-se que em rota de afastamento do passo no sentido da banalização do seu som que se escutou no apenas mediano anterior Hail To The Thief), Thom Yorke edita um primeiro disco a solo. É essencialmente electrónico, claro herdeiro de experiências levantadas nos excelentes Kid A e Amnesiac, mas sem a culinária de temperos variados que o colectivo soube então acrescentar à matriz nascida entre máquinas. Mas na verdade, pouco de ostensivamente novo ou diferente mora nestas canções. Estão aqui as mesmas obsessões, a mesma aparente necessidade compulsiva de projectar ideias em canções. Estão aqui as marcas da produção texturalmente meticulosa de Nigel Godrich. Estão aqui as projecções inevitáveis de uma eventual opressão pela fama e sucesso. Mas não vamos muito mais longe. Estão aqui as canções que se imaginavam depois de Kid A e Amnesiac. Num registo semelhante, plim plim plim e muito sofrimento encenado (não dizemos que não seja verdadeiro). Argumentos e personagens repetidos. E sem a escrita superior que fez desses dois discos dos Radiohead duas referências da presente década. Um mais-do-mesmo. Que cansa e não estimula muito…
Vários “Paint It Black”
Paint It Black não é um tributo aos Rolling Stones. É, antes, uma colecção de versões de originais da banda, gravadas desde meados de 60. Reúnem-se assim históricos seus contemporâneos (e confessos admiradores) como Otis Redding, Aretha Franklin, David Bowie ou a dupla Ike & Tina Turner, ou discípulos de várias gerações, de Bryan Ferry aos Thunder. É uma galeria interessante de leituras, sobretudo no departamento soul (no qual se amplificam as raízes bluesey de Jagger, Richards e Brian Jones) ou em aventuras de visão maior como o faz Bryan Ferry num Simpathy For the Devil de 1973. Mas é uma recolha irregular, muito cheia de lixo banal e incompleta. Há por aí mais e melhor, bastando evocar o (I Can’t Get No) Satisfaction dos Devo, para ver que muito ficou por contar.
E também: The Czars, Vitalic, Sebadoh, Michael Franti, Vetiver, Danielson, Peaches, Jesus & Mary Chain (reedições), Ultravox (reedições)
Brevemente:
17 Julho: Lisa Germano, Envelopes, Pet Shop Boys (DVD reedição), Seu Jorge (DVD), Happy Endings (BSO com Calexico, Black Heart Procession, etc), Gaiteiros de Lisboa, Moloko (best of), Lilly Allen, Who Made Who (versões verdes)
24 Julho: Sufjan Stevens, Nitzer Ebb (best of), Comsat Angels (reedições), New York Dolls
Discos novos ainda este ano: Spartak, Woman In Panic, U-Clic, Protocol (Verão), B-52’s, Beyoncé (Setembro), Blur, Bryan Ferry, Cornershop, Damon Albarn (Verão), Depeche Mode (ao vivo, Outono), Feist (Outono), Franz Ferdinand (Outono), Hector Zazou, Jarvis Cocker (Verão), Joseph Arthur, The Killers (Outono), Kim Wilde, Michael Franti (Julho), Moby (Verão), Neneh Cherry, Nine Inch Nails, Outkast, Peter Gabriel, Polyphonic Spree (Julho), Q-Tip, Radiohead, St Etienne, Scissor Sisters (Setembro), Sisters Of Mercy, I’m From Barcelona (Agosto), Clinic (Outono), Coachella (DVD, em Julho)
Reedições e compilações ainda este ano: Art Of Noise, Jesus & Mary Chain, Frankie Goes To Hollywood, Kate Bush (Novembro), Oasis (Lados B, Junho), Propaganda, Byrds (reedição), Clash (reedição), Björk (caixa integral), Siouxsie & The Banshees, Lilac Time, The Cure, Heaven 17 (reedições em Agosto), Lou Reed (reedição), Pulp (reedições em Agosto)
Estas datas provém de planos de lançamento de diversas editoras e podem ser alteradas a qualquer momento.
terça-feira, julho 11, 2006
Morreu Syd Barrett
Gravou apenas um álbum inteiro com os Pink Floyd, mas é impossível falar na história e música do grupo sem o evocarmos, tantas que foram as marcas que acabou por imprimir numa obra que frequentemente abordou a doença mental, por vezes em referência directa a Syd Barrett. Mas consigo, sobretudo entre 1966 e 67 (ver caixa), os Pink Floyd não só se afirmaram como a primeira banda psicadélica britânica, como uma das aventuras musicais mais visionárias desse tempo em que o som ganhou cor e novos sentidos de liberdade. Afastado, primeiro da banda, em 1968, depois da música, pouco tempo depois, viveu as três últimas décadas de regresso à Cambridge que o viu nascer em 1946. Abandonou o nome de guerra, Syd (roubado em inícios de 60 a um amigo baterista da sua cidade), e respondia de novo com o seu nome: Roger Barrett. Voltou a pintar. Aprendeu a cozinhar e começou a colecionar moedas. Saía à rua para fazer compras, mas só falava com as empregadas das lojas. Paparazzi e fãs visitavam-no. Tiravam-lhe fotografias. Não gostava, mas gostava ainda menos que lhe falassem de quando era músico. Em 1998 a irmã, a única pessoa que se manteve por perto, ofereceu-lhe uma aparelhagem áudio, para que pudesse escutar os discos de que mais gostava: Rolling Stones, Booker T & The MG's e compositores clássicos. Pink Floyd não voltou a escutar. E quando a EMI lançou a antologia dos Floyd Echoes, em 2001, não se manifestou. Todavia, viu pouco depois, em casa da irmã, um documentário que a BBC transmitiu sobre a "sua" banda... Gostou, embora o criticasse por muito "barulhento". E saboreou, sobretudo, uma velha canção que lançara em 1967: See Emily Play. Há oito anos foi-lhe diagnosticada diabetes e prescrita uma medicação que nem sempre seguia à risca. E foi uma complicação associada à diabetes que, na passada sexta-feira, lhe roubou a vida. Em casa. Sem aparato. Sem gente por perto.
Syd Barrett teve, na verdade, uma breve vida musical. Gravou três singles e um álbum com os Pink Floyd (e só participou com uma canção no seu segundo longa duração). A solo registou dois álbuns, um terceiro, de "sobras", lançado mais tarde. Mas era um visionário, experimentando novas dimensões na construção das melodias e sobretudo nos seus arranjos, como se fosse possível traduzir por som as teses de um Aldous Huxley ou Timothy Leary. A sua música, quase toda ela composta entre 1966 e 67, traduz ecos de uma infância feliz, até ao dia em que o pai foi ceifado pela morte antes do tempo. A solo, contudo, o canto denuncia sobre estas palavras uma melancolia, quase desespero, solidão que mal comunica, entope e implode. Assim foi.
Os Pink Floyd devem a sua identidade de berço às visões de Syd Barrett, seu principal vocalista, guitarrista e compositor nos primeiros tempos. Oito dos temas de The Piper At The Gates Of the Dawn são seus, e da sua obra e ideias nasceram inúmeras histórias de fascínio e admiração, David Bowie tendo sido um dos primeiros a manifestar a profunda influência que o músico teve em si.
Mas Syd começou a manifestar comportamentos bizarros no mesmo Verão em que o álbum de estreia dos Pink Floyd somava entusiasmos e cativava fiéis. O intenso consumo de drogas, em particular o LSD, é apontado como gatilho de uma série de manifestações, num quadro que se agravou até se tornar insustentável. Num concerto não tocou senão um acorde. Num outro desafinou a guitarra ao som de Interstellar Overdrive. Quando o grupo passou pelo American Brandstand, nos EUA, não abriu a boca durante o play back televisivo. Muitas vezes não tocava em ensaios, e ao vivo as performances eram surpresa que os colegas nem queriam imaginar. A dada altura contrataram o seu velho colega de escola David Guilmour para tocar guitarra. Até ao dia em que, em viagem para novo concerto, resolveram nem passar pela sua porta para o ir buscar. Em Março de 1968, Syd Barrett estava, oficialmente, fora dos Pink Floyd.
Uma breve carreira a solo, da qual contudo nasceram discos devastadoramente belos, terminou em 1972, quando Syd parecia ter perdido todo o interesse pela música. Em 1974 vendeu à editora os direitos sobre os seus discos e, libras no bolso, mudou-se para um hotel em Londres. Esgotada a carteira, regressou para a cave na casa da mãe. Há quem veja nele um caso de esquizofrenia. Há quem o aponte como Asperger. Seja como for, Gilmour explicou, em recente entrevista, que o seu colapso mental seria inevitável. E que as experiências psicadélicas não foram mais que um gatilho que o acelerou.
PS. Este texto intregra o obituário de Syd Barrett, hoje publicado no DN
segunda-feira, julho 10, 2006
Tudo acaba...
Como subtítulo para a quinta e derradeira época de episódios, Sete Palmos de Terra usou a expressão "everything ends" (tudo acaba). Nada mais que o reafirmar da certeza única que todos temos: a da morte, um dos muitos medos que a série tomou como matéria-prima para cinco anos de histórias em volta de uma família peculiar. Sete Palmos de Terra ganhou notoriedade e adeptos por uma vasta colecção de ingredientes usados na confecção dos seus episódios. Claramente liberal, sem receio de convocar alguns tabus que ainda arrepiam a América mais conservadora (a morte, a homossexualidade, as drogas, a desagregação da família, a noção da vida artística como um destino profissional viável), sem pruridos também na desmontagem de uma sociedade que procura paz no divã do psicanalista, Sete Palmos de Terra tomou como núcleo de "trabalho" a disfuncional família Fisher.
Agentes funerários (a série reflecte e projectou mais ainda o culto do belo-morto nos EUA), os Fisher receberam, semana após semana, defuntos cujas histórias e universos somaram temperos à narrativa da saga familiar que cruzou os 63 episódios. A morte, sem convocação de teses religiosas determinantes, sem leituras obrigatórias, sem misticismos de meia-tigela, é o tutano de Sete Palmos de Terra. E não foi por acaso que Alan Ball, o criador da série, projectou a acção em Los Angeles, cidade que considera ser a "capital mundial da negação da morte". E, inevitavelmente, de morte tratará o último episódio, o mais longo da série (com cerca de 75 minutos).
Tem por título Everyone's waiting, expressão dita numa aparição do falecido Nate num diálogo com a irmã Claire. Esta será a figura central do episódio, num debate entre um sonho de carreira em Nova Iorque e um "dever" familiar em casa... Alan Ball fez questão de terminar a saga com incontornáveis pontos finais. O ecrã branco surgirá, revelando a lápide de... E ao som de Breathe, de Sia Furler.
PS. Este texto integra um pequeno dossier sobre 'Sete Palmos de Terra' hoje publicado no DN.
domingo, julho 09, 2006
Discos Voadores, 8 de Julho
Muse “Take A Bow”
The Idle Hands “Loaded”
Kudu “Magic Touch”
Double D Force “Let Yourself Go”
Hot Chip “Colours”
Regina Spektor “Fidelity”
Wise In Time “The Fox”
Herbert “Birds Of A Feather”
Divine Comedy “To Die A Virgin”
The Zombies “Time Of The Season”
Raconteurs “Intimate Secretary”
Envelopes “I Don’t Like It”
Spartak “King Tubby”
Sonic Youth “Incinerate”
TV On The Radio “I Was A Lover”
You Should Go Ahead “Melancholic Phantom”
CatPeople “Everyone Can Tell You”
Wise In Time “Crazy Chair”
The Sandals “We Don’t Want To Be The Ones Who Take The Blame”
Wise In Time “Nine”
Air “Talisman”
United Future Organization “On Est Ensemble Sens Se Parler”
De-Phazz “Cut The Jazz”
Coldcut “Chocolate Box”
Wise In Time “Firing Line”
Wordsong “Opiário”
The Knife “Forest Families”
Discos Voadores – Sábado 18.00 - 20.00 / Domingo 22.00 - 24.00
Radar 97.8 FM e radarlisboa.fm
sexta-feira, julho 07, 2006
'Into The West' favorita nos Emmys
Actor principal em Série Dramática:
Peter Krause – Sete Palmos de Terra
Denis Leary - Rescue Me
Christopher Meloni - Law and Order: Special Victims Unit
Martin Sheen – Os Homens do Presidente
Kiefer Sutherland - 24
Actriz principal em série dramática:
Frances Conroy – Sete Palmos de Terra
Geena Davis - Commander In Chief
Mariska Hargitay - Law and Order: Special Victims Unit
Allison Janney – Os Homens do Presidente
Kyra Sedgwick - The Closer
Actor principal em mini-série ou tele filme:
Andre Braugher - Thief
Charles Dance - Bleak House
Ben Kinglsey - Mrs Harris
Donald Sutherland - Human Trafficking
Jon Voight – João Paulo II
Actriz principal em mini-série ou tele filme:
Gillian Anderson - Bleak House
Kathy Bates - Ambulance Girl
Annette Benning - Mrs Harris
Judy Davis - A Little Thing Called Murder
Helen Mirren - Elizabeth I
Actor secundário em série dramática:
William Shatner - Boston Legal
Oliver Platt - Huff
Michael Imperioli - Os Sopranos
Gregory Itzin - 24
Alan Alda – Os Homens do Presidente
Actriz secundária em série dramática:
Candice Bergen - Boston Legal
Sandra Oh - Grey's Anatomy
Chandra Wilson - Grey's Anatomy
Blythe Danner - Huff
Jean Smart - 24
Melhor série dramática:
Grey's Anatomy
House
Os Sopranos
24
Os Homens do Presidente
Melhor mini-série:
Bleak House
Elizabeth I
Into the West
Sleeper Cell
Melhor comédia:
Arrested Development
Curb Your Enthusiasm
The Office
Scrubs
Two and a Half Men
Leituras 'smithicas'
As melhores estreias, versão 'Uncut'
quinta-feira, julho 06, 2006
Coisas pequenas
Numa visão rápida, podemos descrever Eu e Tu E Todos Os Que Conhecemos como um conjunto de vidas que se encontram em volta de um núcleo familiar constituído por um pai divorciado e seus dois filhos, estes dois frutos da idade da Internet, o mais pequeno entrando em chats mesmo sem ainda dominar a escrita, usando técnicas de cut and paste (os seus diálogos online, e eventuais consequências, são dos momentos mais espantosos do filme). Em volta mora uma muito jovem rapariga que colecciona electrodomésticos para um enxoval de sonho, um adulto de barriga já pronunciada que é alvo da provocação de duas adolescentes. Mais distante fisicamente, mas cruzando-se a dada altura com o “pai” acima citado, na sapataria onde este trabalha, uma jovem taxista (que apenas transporta idosos), que nas horas vagas sonha (e realiza) projectos artísticos em vídeo. Esta figura é interpretada pela própria Miranda July, num papel com evidentes traços autobiográficos e uma história artística que não deixa de parodiar o circuito das elites intelectuais, nomeadamente na figura de uma directora de museu que terá de enfrentar para tentar levar o seu projecto do anonimato do seu T zero de paredes cor de rosa às salas de exposição. Um olhar crítico, mas positivo, saudável, luminoso, sobre o mundo urbano em que vivemos, elixir saudável num momento em que a maior parte das visões do mundo moderno em cinema parecem casos de depressão a pedir urgente psicoterapia. Uma das revelações do ano!