Que fazer com as salas IMAX? Sobretudo, que fazer perante a óbvia decomposição temática e formal dos super-heróis que, durante algum tempo, foram os seus ocupantes privilegiados? Eis algumas interessantes e, de algum modo, urgentes questões artísticas e comerciais — este texto foi publicado no nº109 da revista Metropolis (agosto).
No dia 30 de julho, na sua edição online, a Variety publicou um artigo de Carolyn Giardina cujo título, apesar de invulgarmente longo, vale a pena tentar traduzir na íntegra. A saber: “As projecções dos Jogos Olímpicos em salas de cinema sublinham a necessidade dos exibidores terem conteúdos alternativos.”
A conjuntura é esta: nos EUA, 137 salas IMAX transmitiram as cerimónias de abertura das Olimpíadas de Paris, e também eventos de diversas modalidades, sobretudo ginástica e natação. O acontecimento é tanto mais significativo quanto envolveu mais de metade dos ecrãs IMAX que existem no país (são 216, segundo a estatística mais recente, divulgada em julho). Além do mais, tais transmissões reflectem uma genuína disponibilidade do público: um estudo de The Cinema Foundation sobre a frequência das salas revela que 77% dos espectadores estão interessados em “experiências televisivas nos ecrãs de cinema”.
São dados reveladores de algumas questões cristalinas que, já agora, convém lembrar, ao longo da última década têm sido problematizadas, de forma serena e construtiva, por alguns críticos de cinema. Não se trata, entenda-se, de repetir a lengalenga paternalista que proclama o valor insuperável do conhecimento dos filmes no ecrã de uma sala de cinema. Claro que isso envolve uma verdade insubstituível que, em qualquer caso, não anula o valor prático de outras alternativas — assim aconteceu com as cassetes e o DVD, assim acontece com as plataformas de “streaming”.
A crise do cinema nas salas não pode ser reduzida a uma compulsiva vitimização dessas mesmas salas, apenas lamentando o poder efectivo que as plataformas passaram a ter nas nossas opções de consumo. Acontece que as salas não podem — e, sobretudo, não devem — ficar barricadas na noção simplista segundo a qual estão apenas a servir de “montra” para os filmes que, três ou quatro meses depois (ou menos!), vão surgir nas plataformas.
Trata-se de saber se os exibidores — dos EUA ou de pequenos mercados periféricos como o português — arriscam ou não pensar o seu próprio lugar no mercado, recusando uma postura de mera instrumentalização gerida por produtores e distribuidores. Como todas as crises do género, também esta envolve uma oportunidade para repensar opções pontuais e estratégias globais. Na certeza de que os espectadores estão disponíveis para alguma diversificação da oferta.
>>> Trailer de promoção dos Jogos Olímpicos de Paris em salas IMAX (EUA).