quarta-feira, outubro 11, 2023

Berlioz na Gulbenkian, ao fim da tarde

John Nelson

HECTOR BERLIOZ
Romeu e Julieta, op. 17

Coro Gulbenkian
Orquestra Gulbenkian
John Nelson, Maestro
Beth Taylor, Meio-Soprano
Julien Henric, Tenor
Vincent Le Texier, Barítono

Fundação Calouste Gulbenkian
06 out 2023 - 19:00

No final da belíssima "Scène d'amour" do Romeu e Julieta, de Hector Berlioz, o próprio maestro, John Nelson, achou por bem quebrar o protocolo e, com um gesto simples mas eloquente, solicitar as palmas dos espectadores para a Orquestra Gulbenkian. Não era caso para menos: para lá da competência dos solistas, a excelência da Orquestra e do Coro Gulbenkian permitiram uma (re)descoberta de uma obra a que apetece chamar "híbrida", de tal modo a sua revisitação de Shakespeare acontece através de um desvio espiritual que, em última instância, suspende o assombramento trágico para convocar o público para uma redenção inequivocamente religiosa.
Nas notas do programa, José Bruto da Costa chamava a atenção para essa pluralidade interior, citando o próprio Berlioz: "Que não haja dúvida ou erro quanto ao género desta obra. Embora vozes sejam utilizadas amiúde, não se trata de uma ópera em versão concerto ou de uma cantata, mas sim de uma sinfonia coral”.
Daí a perene sedução de uma composição cuja primeira interpretação pública ocorreu em Paris, no dia 24 de novembro de 1839 — o mesmo ano da Ballade nº 2, de Chopin. Há nela essa dialéctica fascinante que nasce de uma exposição metódica, "narrativa", quase neutra, que se transfigura em acontecimento celebratório. Com a noite a cair na janela de fundo do Grande Auditório.

JL

>>> "Scène d'amour" (Romeu e Julieta, Berlioz), também sob a direcção de John Nelson, também com o Coro Gulbenkian, num registo da Orquestra Filarmónica de Estrasburgo (Erato, 2023).