terça-feira, fevereiro 16, 2021

Carmen Dolores (1924 - 2021)

Amor de Perdição (1943)

Com uma carreira vivida sobretudo no teatro, é também uma figura emblemática na história do cinema português: a actriz Carmen Dolores faleceu no dia 15 de fevereiro, em Lisboa — contava 96 anos.
Quando concluiu simbolicamente a sua carreira teatral — com a peça Copenhaga, de Michael Frayn, encenada por João Lourenço no Teatro Aberto —, Carmen Dolores foi retratada, sobretudo, e muito justamente, como uma grande senhora do teatro. Para lá da excelência do seu trajecto, havia também uma razão quantitativa para tal destaque: de facto, ao longo de seis décadas de carreira, a sua filmografia não chega a uma dezena de títulos.
O certo é que a sua estreia no cinema permanece como uma referência incontornável de um tempo de romantismo cinéfilo que não tem nenhum equivalente (artístico ou comercial, político ou ideológico) neste nosso presente: aos 19 anos, a sua composição de Teresa de Albuquerque em Amor de Perdição (1943), sob a direcção de António Lopes Ribeiro, encarna uma ideia de representação em que teatro e cinema se cruzam através da inspiração da literatura.
Nesse período de alguma intensidade de produção do cinema português, gerada pela aposta falhada do Estado Novo no sentido de consolidar uma indústria de dimensão europeia, Carmen Dolores voltou a filmar sob a direcção de Lopes Ribeiro, em A Vizinha do Lado (1945), destacando-se também em Um Homem às Direitas (1945), de Jorge Brum do Canto, e Camões (1946), de Leitão de Barros, reencontrando António Vilar, o Simão Botelho de Amor de Perdição.
Mais tarde, já depois do período transformador do Cinema Novo, surgiu em O Princípio da Sabedoria (1975), de António de Macedo, Balada da Praia dos Cães (1987) e A Mulher do Próximo (1988), ambos de José Fonseca e Costa, e Retrato de Família (1991), de Luís Galvão Teles. Registou as suas memórias em três livros: Retrato Inacabado (1984), No Palco da Memória (2013) e Vozes Dentro de Mim (2017).


>>> Obituário no Diário de Notícias.