1. As recentes opiniões expressas por Martin Scorsese sobre os filmes do chamado MCU (Marvel Cinematic Universe) são tudo menos irresponsáveis. Decorrem, aliás, de um profundo amor pelo cinema. O que ele discute está muito para além de qualquer guerra de polegares ao alto para esgotar os filmes num conflito de "bons" e "maus"... No limite, trata-se de reflectir sobre o poder devastador que os filmes da Marvel passaram a ter nos mercados de todo o mundo, chamando a atenção para a perda cultural e económica (sublinho: económica) que será o eventual esvaziamento dos valores narrativos e de consumo (sublinho: consumo) enraizados em mais de um século de história do cinema.
2. Já sabíamos que o IMDb funciona como megafone promocional dos filmes da Marvel e, de um modo geral, de todos os modelos que, com resultados melhores ou piores, estão associados ao mercado dos super-heróis. Como se isso não bastasse, agora, o site dá-se ao luxo de descontextualizar e manipular as declarações de Scorsese para as reduzir a um esquematismo estúpido e, pior um pouco, para sugerir que podemos encontrar uma avalanche de pontos comuns entre os seus filmes e os filmes do MCU.
3. A provocação pueril do IMDb vai ao ponto de argumentar (?) que, entre outras "semelhanças", o facto de as técnicas de rejuvenescimento digital dos actores terem sido previamente usadas no MCU transforma O Irlandês numa variação de matrizes... da Marvel. É como se se dissesse que todos os filmes a preto branco são descendentes directos de Citizen Kane! Só vendo (e escutando) é possível acreditar que a futilidade "informativa" tenha chegado a este cinismo — brincar com coisas sérias passou a ser a lei da cultura mediática dominante.