História. Assim mesmo, com maiúscula: H-istória. A imagem da celebração da vitória da França no Mundial de Futebol de 2018, nos Campos Elísios, conclui o pré-genérico do brilhante Os Miseráveis, de Ladj Ly — os jovens que irão estar no centro dos acontecimentos do filme diluem-se na multidão. E dá-se um momento mágico e perturbante: o título sobrepõe-se à imagem [de modo semelhante ao que aqui tentei figurar], numa alusão que está para além do banalmente descritivo; Ladj Ly convoca a memória de Vítor Hugo para nos falar de um país marcado pelas diferenças mais extremadas. A acção segue uma patrulha policial através dos recantos mais problemáticos de Montfermeil (precisamente a zona em o realizador, nascido no Mali, começou a viver aos 3 anos de idade) para nos revelar todo um sistema de convulsões económicas, raciais e simbólicas que questionam a própria noção de comunidade — tudo isto sabendo preservar uma sensação física, dir-se-ia visceralmente documental, dos corpos e dos lugares.