BRIGADOON (1954) Gene Kelly e Cyd Charisse |
Uma nova idade do musical graças a La La Land? Será preciso ver para crer — este texto foi publicado no Diário de Notícias (23 Janeiro), com o título 'Será possível um renascimento do musical?'.
Quem diria que, no começo de 2017, haveria em Hollywood cerca de duas dezenas de filmes musicais em fase de pré-produção ou rodagem? Desde a adaptação de sucessos da Broadway, como Wicked, até uma nova versão do clássico Mary Poppins, o género musical vai ter, no mínimo, uma muito maior visibilidade no mercado global.
Embora não seja o único factor a ter em conta, o sucesso comercial de La La Land não pode ser desligado deste fenómeno. Afinal de contas, o filme de Damien Chazelle custou “apenas” 30 milhões de dólares (orçamento típico, em contexto americano, de um sólido projecto independente), tendo acumulado, para já, 140 milhões de dólares de receita global. Resta saber se poderá renascer uma ligação do público com o musical, na certeza de que a esmagadora maioria dos espectadores já nasceu depois da respectiva idade de ouro.
Pensemos nas coreografias clássicas de Busby Berkeley, por exemplo em As Goldiggers de 1935 (1935). Ou no encontro de Frank Sinatra, Gene Kelly e Kathryn Grayson em Paixão de Marinheiro (1945), de George Sidney. Ou nos bailados de Fred Astaire e Cyd Charisse em A Roda Fortuna (1953), de Vincente Minnelli. Ou ainda em Gene Kelly e outra vez Cyd Charisse em Brigadoon (1954), de novo com assinatura de Minnelli. O que liga tais filmes não é apenas a “curiosidade” de serem cantados e dançados, mas sim um sólido conceito de produção, profundamente enraizado no sistema clássico de Hollywood.
Os novos filmes serão melhores ou piores... O certo é que a possibilidade de um renascimento do musical envolve uma transformação dos mercados, no mínimo, difícil de conceber. Isto porque, nas últimas duas décadas, grande parte das receitas de Hollywood têm sido sustentadas por uma ideologia promocional em que (para o melhor e, sobretudo, para o pior) os valores mais fortes são os “super-heróis” e os “efeitos especiais”.
Mesmo ficando por musicais do século XXI, convém não esquecer os desastres comerciais de títulos como Nove (2009), de Rob Marshall, A Idade do Rock (2012), de Adam Shankman, ou ainda o admirável Jersey Boys (2014), de Clint Eastwood. Neste contexto, o impacto de La La Land constitui uma excepção, apenas contrariada pelo sucesso de muitos desenhos animados que envolvem importantes componentes musicais. Aliás, nestes casos, o que persiste é um modelo de espectáculo — o filme de animação — que, com ou sem música, nunca desapareceu das salas de cinema.