Werner Herzog ainda e sempre à procura das epopeias individuais em ambientes de convulsão colectiva — esta nota foi publicada no Diário de Notícias (9 Junho).
Ao realizar um filme como Rainha do Deserto, compreende-se que o alemão Werner Herzog se tenha interessado pela história de Gertrud Bell (1868-1926), arqueóloga inglesa que, entre os dois conflitos mundiais, desempenhou um papel fundamental no desmantelamento político do Império Britânico e, em particular, nos processos que conduziriam à independência da Jordânia e do Iraque. Ela foi uma dessas figuras maiores que a vida cuja saga encontra o seu primeiro eco simbólico na beleza das paisagens (desérticas) em que se aventurou.
Parece óbvio que Herzog não teve condições práticas para rentabilizar ao máximo esse apelo paisagístico (a rodagem foi marcada por diversos problemas logísticos e de produção). Em todo o caso, o filme consegue reavivar um espírito de epopeia humana que tem uma referência emblemática no Lawrence da Arábia (1962), de David Lean. T. E. Lawrence é, aliás, uma das personagens, interpretado por Robert Pattison, mas a evidência vai toda para Nicole Kidman, emprestando a Bell a grandeza dramática de quem, além do mais, era suposto submeter-se às regras de um mundo totalmente masculino.