sábado, maio 02, 2015

Jesus & Lopetegui (ou a miséria cultural)

1. A nossa miséria cultural traduz-se no triunfo de uma filosofia de vida — que é, antes de tudo o mais, uma ideologia mediática — que dispensa pensamento, reflexão ou compaixão. Em boa verdade, o seu valor primeiro é a promoção do conflito. Deixou de se procurar o confronto de ideias, passou a celebrar-se todo e qualquer sintoma de conflito.

2. Continuo a considerar que é abusivo responsabilizar unilateralmente a imprensa desportiva por este tristíssimo estado de coisas — infelizmente, estamos mesmo perante um fenómeno transversal, em muitos aspectos visceralmente televisivo. Mas é um facto que, sobretudo através do tratamento do futebol, assistimos todos os dias a um delírio de mediocridades "argumentativas" que espalha no tecido social uma ideia nefasta: a de que tudo se pode reduzir a um qualquer conflito, mesmo baixamente anedótico, entre pessoas.

3. No limite, isso pode gerar a mais trágica homogeneização dos discursos. Veja-se o que acontece hoje, dia 2 de Maio de 2015, com as manchetes dos três jornais desportivos de âmbito nacional: o mundo gira em torno do debate (?) entre Jorge Jesus e Julen Lopetegui. Mais do que isso: dois desses jornais têm a mesma ideia simbólica — a luta continua —, curiosamente apropriando-se de uma palavra de ordem mais ou menos sindical. Será que o jornalismo desportivo cedeu à unicidade discursiva? Está sob pressão de quê?