ACTO DA PRIMAVERA (1963) |
Se há obra em que o povo existe como entidade, essa é, seguramente, a obra de Manoel de Oliveira. Nada a ver com altivez paternalista ou miserabilismo existencial: o que fascina Oliveira é a espessura simbólica das manifestações populares, enquanto fenómenos anteriores a qualquer formatação mediática. Acto da Primavera, sobre uma representação da Paixão de Cristo na Curalha, aldeia da zona de Chaves, constitui uma expressão modelar de tal postura estética e ética — por vezes, esquecemo-nos que as contaminações "documentário/ficção", tantas vezes assumidas como um sinal da agilidade do cinema digital, já estavam presentes neste filme de 1963. Aliás, pertence-lhe, por direito próprio, um lugar na dinâmica da modernidade europeia, a par de Belarmino (1964), de Fernando Lopes.