segunda-feira, dezembro 29, 2014

Os melhores filmes de 2014 (N.G.)


Já o tinha visto em 2013, integrado então no programa de um festival de cinema. Mas mesmo assim não houve competição possível para o mais recente filme de Jim Jarmusch, a mais inventiva abordagem dos últimos tempos ao universo temático das “histórias com vampiros”, procurando olhar para pontos de vista diferentes. Ao colocar a narrativa entre Detroit (mostrada como cidade moribunda) e Tânger e, chamando nomes como os de Tilda Swinton ou John Hurt ao elenco, Jarmusch dá-nos acima de tudo uma narrativa noturna de almas diferentes. Marginais, de certa maneira, um dos protagonistas tendo na sua relação com a música a razão de existir ao longo dos séculos, a galeria de figuras que conheceram tendo-os alimentado sobretudo de ideias. O melhor do ano inclui ainda a mais interessante produção de ficção científica desde o Moon de Duncan Jones, confiormando em Jonathan Glazer um talento que alguns dos seus telediscos já sugeriam e, em Scarlett Johansson, uma atriz de versatilidade bem maior que muito do cinema para o qual a chamam por vezes não explora. Mais um belíssimo filme de Kelly Reichartd, uma surpresa vinda da Polónia (em Ida), com um olhar diferente sobre ecos de uma época que o cinema já visitou tantas vezes e esse espantoso exemplo de grande escrita, direção de fotografia e interpretação que se revela em Nebraska completam o lote de topo das escolhas do ano. Há ainda um filme de cortante (mas luminosa e esperançosa) atualidade pelos irmãos Dardenne, uma história de solidão (e luta) com apenas um ator (Robert Redford, em Quando Tudo Está Perdido), uma confirmação do talento de Xavier Dolan, mais um belíssimo olhar sobre a identidade de género chegado da América Latina e um novo exemplo de narrativa suportada por um rigoroso trabalho visual via Wes Anderson. Do melhor do ano podíamos referir ainda o filme sobre Nick Cave que esbate a fronteira entre o documentário e a ficção, o olhar sobre o crescimento/envelhecimento de uma família segundo Linklater, um dos melhores filmes de Scorsese nos últimos anos com o melhor papel de DiCaprio ao seu serviço, a prequela de Heimat, o assombroso Ilo Ilo ou magníficos documentários em O Acto de Matar e A Imagem Que Falta.

1. Apenas os Amantes Sobrevivem, de Jim Jarmusch
2. Debaixo da Pele, de Jonathan Glazer
3. Night Moves, de Kelly Reichardt
4. Ida, de Pawel Pawlikowski
5. Nebraska, de Alexandre Payne
6. Dois Dias, uma Noite, de Jean-Pierre e Luc Dardenne
7. Quando Tudo Está Perdido, de J.C. Chandor
8. Tom na Quinta, de Xavier Dolan
9. Pelo Malo, de Mariana Rondón
10. Grand Hotel Budapest, de Wes Anderson




Festivais / sessões especiais

Como sempre as programações dos festivais abrem espaço a outras cinematografias e a muitos títulos que (muitas vezes) esgotam ali a sua presença em sala entre nós. Sendo certo que entre o lote de filmes da lista que se segue há pelo menos um com estreia já certa entre nós (o de Bruno Dumont) e um outro teve uma breve vida em sala em sessões especiais (o de David Lynch), muitos dos títulos que aqui recordo foram experiências “festivaleiras” que é pena que não possam ser partilhadas por mais plateias. Talvez seja ainda cedo para dar como encerrado o ciclo “em sala” de muitos destes filmes, mas poucos destes títulos teráo hipótese de regressar a um grande ecrã perto de nós. Se se compreende que Will You Dance With Me?, de Derek Jarman, estreado no London Flare este ano, seja sobretudo uma peça de aquivo que assim tem oportunidade de ser vista, já o belíssimo Stand Clear of The Closing Dorrs (passou no Indie), a história de um autista que se perde durante dias no metro no Nova Iorque, merecia mais. E foi mesmo um dos grandes filmes do ano.

1. Stand Clear of The Closing Doors, de Sam Fleischner
2. Will You Dance With Me, de Derek Jarman
3. P’tit Quinquin, de Bruno Dumont
4. Duran Duran Unstaged, de David Lynch
5. Lilting, de Hong Khao
6. Rosie, de Marcel Gisler
7. Angels of Revolution, de Aleksey Fedorchenko
8. American Vagabond, de Susanna Helke
9. Kidergarten Teacher, de Nadav Lapid
10. Mouton, de Gilles Deroo e Marianne Pistone



DVD / Blu-ray

Nunca houve tantos lançamentos em DVD de títulos “clássicos” entre nós. Porém, com o Blu-ray a chamar hoje a si a fatia mais gourmet da atenção de quem compõe lançamentos de home vídeo, muitos destes títulos trazem pouco mais que o próprio filme. Os “extras” são coisa que não parece ter mais o mesmo valor de marketing de outrora (pelo menos no DVD). Mesmo assim a mais interessante das edições do ano foi a que, resultado de um programa de restauro do BFI, nos devolveu o belíssimo documentário The Epic Of Everest, relato (em 1924) de uma missão histórica ao pico mais alto do mundo nos anos 20. Com imagem restaurada e uma banda sonora alternativa criada por Simon Fischer Turner, o filme surgiu numa dual edition – ou seja, juntando um DVD e um Blu-ray – tanto avulso como num pack recuperando o documentário The Great White Silence (também de 1924) sobre a missão do Capitão Scott ao Pólo Sul, que em 2011 tinha sido alvo de um processo de restauro e reedição semelhante.

1. The Epic Of Everest, de J.B.L. Noel
2. A Oeste nada de Novo, de Lewis Milestone
3. Coleção Jarmusch, de Jim Jarmusch
4. Biophilia Live, de Nick Fenton e Peter Strickland
5. Série Bergman, de Ingmar Bergman
6. House of Cards (Season 2), de Beau Willimon
7. Asfalto Quente, de Steven Spielberg
8. Charada, de Stanley Donen
9. Monty Python Live Mostly, de Aubrey Powell
10. Visitors, de Godfrey Reggio



Bandas sonoras


Com cada vez menos visibilidade nas prateleiras das lojas de discos, as boas bandas sonoras – as medíocres, essas nunca faltam – são peças importantes para contar as histórias do melhor cinema de cada ano que passa. E em 2014 o melhor disco com música criada para o cinema foi o que juntou o coletivo Sqürl (onde toca o próprio Jim Jarmusch) ao compositor Jozef van Wissim, com a música de Apenas os Amantes Sobrevivem, afinal de contas uma peça fulcral num filme que tem um músico como um dos protagonistas e os discos, as guitarras e até mesmo um clube de rock como espaços que cativam a atenção da câmara. Nota ainda para a confirmação do (brilhante) entendimento entre David Fincher e a dupla Trent Reznor / Atticus Ross no terceiro filme que fazem juntos. E uma outra referencia ainda ao belíssimo trabalho de composição ao serviço de Debaixo da Pele de Jonathan Glazer, num daqueles claros exemplos de como a música pode por vezes ajudar a “falar” quando as palavras pouco dizem e há todo um mundo de sugestões a definir.

1. Only Lovers Left Alive, Sqürl + Jozef van Wisse
2. Gone Girl, Trent Reznor + Atticus Ross
3. Under The Skin, Mica Levy
4. The Epic Of Everest, Simon Fischer Turner
5. Night Moves, Jeff Grace
6. The Congress, Max Richter
7. Eastern Boys, Arnaud Rebotini
8. Palo Alto, Vários artistas
9. Possibilities Are Endless, Edwyn Collins + Sebastian Lewsley
10. Frank, Vários artistas