Brian Eno + Karl Hyde
“Someday World”
Warp
4 / 5
Os quatro álbuns pop/rock que Brian Eno lançou a solo entre 1973 e 77, depois de ter abandonado os Roxy Music, são das mais belas coleções de canções que a década de 70 nos deu a ouvir. A descoberta de novos caminhos para a música, que encontrou depois do eureka “achado” em Discreet Music (1975) e desenvolveu sobretudo a partir do histórico Music For Airports (1978) levou a sua obra em nome próprio numa demanda pelos sentidos e expressões de uma noção de música “ambiente”. A canção não saiu contudo do seu léxico, mas durante anos trabalhou-a sobretudo na cadeira da produção ao lado de nomes como David Bowie, os Talking Heads e, mais tarde, U2. Projetou um reencontro com a pop na alvorada dos noventas em My Squelchy Life, álbum que acabou por nunca editar – em seu lugar surgindo antes Nerve Net, em 1992 – acabando por editar apenas em 2005 um verdadeiro sucessor para o álbum vocal Before & After Science (de 77) com o magnífico Another Day On Earth. Se em nome próprio a obra “pop” de Brian Eno é apenas um fragmento (mas claramente gourmet) da sua bem extensa discografia, a verdade é que o seu trabalho com canções tem conhecido episódios igualmente excecionais em discos de colaboração. E basta recordar experiências conjuntas como Wrong Way Up (com John Cale, em 1990) ou Everything That Happens Will Happen Today (com David Byrne, em 2008) para verificar que a verve pop de Eno continua vibrante, que é de travo clássico e capaz de verdadeiros momentos de pura excelência. E eis senão chega mais um belo exemplo. Editado há poucas semanas, Someday World é o primeiro álbum que nasce de um esforço de colaboração entre Brian Eno e Karl Hyde (vocalista dos Underworld) e surge após duas outras belíssimas parcerias assinadas ao lado de Rick Holland. A fluência pop da escrita de Brian Eno mostra-se uma vez mais como valor acrescentado na hora em que se entrega à canção, cabendo ainda ao trabalho vocal conjunto a criação de um patamar partilhado que assim define uma identidade peculiar a este disco no quadro das demais parcerias vocais do veterano. Depois há aqui um verdadeiro festim de ideias devidamente assimiladas, sobretudo genéticas rítmicas escutadas em várias tradições e geografias (e que inevitavelmente nos evocam colaborações de Eno com Byrne e os Talking Heads em finais dos setentas e inícios dos oitentas). Ao contrário do que a presença de Hyde poderia fazer supor (e nada, de facto, como pensar que ninguém anda necessariamente de rótulo na testa), Someday World não é um exercício vocal sob arquiteturas techno (e derivados). Aqui ouve-se pop. E de fina estampa.