sexta-feira, junho 13, 2014

Em conversa: Arcade Fire (parte 1)

Inicio aqul a publicação (em duas partes) da conversa que fiz com o Richard Reed Parry dos Arcade Fire nos camarins do Palco Mundo do Rock in Rio, pouco antes da sua magnífica atuação em Lisboa.

Como conseguiram, em dez anos, passar do patamar de um projeto indie canadiano a um fenómeno de expressão global sem que isso tenha implicado quaisquer cedências no plano da criação musical?
Creio que é uma questão mais difícil de responder que o que inicialmente parece. Porque julgo que se tem de equacionar o fazer bem as coisas e o ser popular. E isso não é uma coisa fácil de conseguir, mas é também algo sobre o qual não temos controlo. Que as pessoas ainda gostem daquilo que estamos a fazer é ótimo. Ainda estamos a tentar chegar às pessoas, a trazer o que conseguimos aos nossos concertos e a procurar algo que seja cool, bonito, bom e que tenha significado. Não costumamos aceitar oportunidades que surjam e que têm apenas a ver com dinheiro. Não licenciaremos as nossas canções a todos os que queiram fazer um anuncio de um automóvel ou algo no género. Mas temos a sorte de sermos populares como somos, por isso nem temos a pressão para ter de fazer nada assim. No fundo não sei bem qual será a resposta, mas acho que tentamos fazer com que cada decisão nossa nos seja confortável e faça sentir bem.

A popularidade é volátil...
As pessoas podem deixar de gostar de nós amanhã. Alguém dirá que fizemos algo errado, que tomámos o passo errado. E talvez não fosse o passo errado, mas apenas o passo errado para manter um estatuto de superpopularidade. Mas enfim...

São um grupo grande. Como se mantém uma certa disciplina de trabalho com tanta gente envolvida?
Não é difícil manter a disciplina, mas é mais difícil manter as coisas focadas e todos num mesmo comprimento de onda, fazendo com que sintam que estão a trabalhar na mesma coisa ao mesmo tempo. É como um casamento a seis que depois se transforma num casamento a dez.

A mais evidente presença das eletrónicas em Reflektor, por exemplo, surgiu depois de todos estarem nesse mesmo comprimento de onda face ao seu maior protagonismo?
Não foi uma coisa súbita para nós, mas antes um processo gradual de evolução. Já havia, por exemplo, muitas electrónicas no The Suburbs, nós é que não as puxámos tão para a frente. Mas lá estavam de vez em quando. Nada foi não natural.

Novas ferramentas, ou seja, novos instrumentos, fazem a diferença na história da evolução da música de um grupo?
Algo que seja natural e que nos faça sentir que estamos a evoluir no sentido de qualquer coisa deixa-nos com a vontade de continuar a experimentar com esses sons. E parece-nos certo. Não queremos que as roupas nos vistam a nós. Queremos ser nós a vestir as roupas.

Há uma ideia de necessidade de desafio que lancem a vós mesmos quando embarcam no processo de criação de um disco novo?
Tentamos. Mas às vezes não funciona. Não há uma fórmula... Veja-se, por exemplo, o caso do Normal Person, canção de que gosto muito com a forma com que surgiu no álbum. Na origem era bem diferente. Era muito mais lenta, muito mais cheia de sintetizadores. Parecia mais uma coisa de uns Primal Scream ou Ride, ou algo assim... Mais brit pop, uma coisa mais solta... E não estava a resultar. O Win veio depois com ideias. E quanto mais as tocávamos mais parecia uma coisa dos Rolling Stones ou Nirvana... E a canção foi-se ajustando. E no fim funcionou. Neste caso os sintetizadores, que poderiam soar a algo novo, não funcionaram para nós. Precisamos da tecnologia para avançar. Mas neste caso avançar não era o que precisávamos. O que o cérebro aponta, o que faz sentir bem, é por aí que vamos.