Autor de filmes cuja sedução começa na sua condição "fora-de-moda", Jason Reitman propõe, agora, uma bela variação melodramática — este texto integrava um dossier sobre o filme Um Segredo do Passado, publicado no Diário de Notícias (14 Fevereiro).
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Não sei se Jason Reitman alguma vez se exprimiu publicamente sobre um mestre do classicismo de Hollywood como Jacques Tourneur (1904-1977). Escusado será dizer que ignoro também se, por alguma razão, ele considera Tourneur uma referência inspiradora. Não quero, por isso, sugerir qualquer determinismo estético, quanto mais não seja porque cada um deles é indissociável de um muito específico contexto de produção. Ainda assim, creio que não será abusivo considerar que existe uma ponte simbólica entre o novo e fascinante filme de Reitman, Um Segredo do Passado, e um certo romanesco clássico de que Tourneur foi, justamente, um dos expoentes máximos.
De facto, a inserção de Tourneur na tradição do cinema de terror — através de títulos de culto como A Pantera (1942) ou Zombie [trailer] (1943) — tende a escamotear a componente onírica que perpassa nos seus grandes filmes, mesmo os que apostam em elementos mais “realistas”. Penso, por exemplo, em títulos como O Arrependido (1947) ou Estrelas da Minha Coroa (1950) que, a partir de clichés da época (a relação com uma mulher fatal ou o desenlace da Guerra Civil, respectivamente), criavam um ambiente de inquietante instabilidade, desafiando as fronteiras da própria realidade.
São memórias clássicas que Um Segredo do Passado parece prolongar. O seu bizarro trio — uma mulher, o seu filho e um homem que fugiu da prisão — envolve uma ambígua nostalgia da unidade familiar que, ao contrário do cinismo do nosso tempo, não teme a hipótese de um desenlace emocionalmente gratificante. Por alguma razão, esta é uma história narrada pela personagem do filho — neste tempo em que prolifera uma imagem fútil e irresponsável da “juventude”, é bom encontrar um filme cujo motor dramático é o amor pela mãe.