sábado, novembro 02, 2013

Uma semana a recordar Lou Reed


Este texto foi originalmente publicado na passada quinta-feira no meu espaço semanal de opinião no site 'Dinheiro Vivo', com  o título: "O que estamos a ouvir de Lou Reed?".

Houve quem, com um sentido de humor negro, um dia disse que a morte é uma das melhores jogadas de carreira para um músico. A frase já foi tantas vezes repetida que lhe perdemos as marcas de autor, transformando-se num daqueles ditados que todos entoamos quando o cenário se volta a repetir. Convenhamos que Lou Reed não “precisava” de semelhante acontecimento para fazer da sua discografia uma presença regular nas vendas de fundo de catálogo. Mas a notícia da morte do músico, no passado domingo, levantou a sede de memórias que inevitavelmente acontece nestes momentos, e uma mão-cheia de discos clássicos da sua obra surgiram entre os mais vendidos, sobretudo entre os territórios da Europa e América do Norte.
De facto não é surpresa que este ressurgimento de vendas aconteça. Ainda no ano passado a morte de Whitney Houston gerou o regresso às tabelas de vendas de singles marcantes da sua obra como ‘I Will Always Love You’ e ‘I Wanna Dance With Somebody’, que subiram novamente, respetivamente ao nº3 e nº 25 nos Estados Unidos. Já em 2013 o seu ‘The Greatest Love of All’ atingiu o nº 41. Mais recentemente assistimos a um foco de atenções há muito não visto sobre os discos de Michael Jackson após a inesperada notícia do seu desaparecimento (a poucas semanas de uma digressão que o ia devolver aos palcos).
Lou Reed não fugiu à regra. Ainda sem as informações definitivas do que serão as tabelas de vendas desta semana (que chegarão a partir de amanhã), uma consulta aos sites com serviços de venda online (tanto em formato digital como em títulos em suporte de vinil e CD), revela-nos já um panorama do que foram os eleitos pelo desejo de reencontrar as canções de Lou Reed. Nos serviços que medem as vendas por canções as mais compradas eram ‘Walk on The Wild Side’ ou ‘Perfect Day’. Ambas datam de 1972 e, no Reino Unido, nunca ‘Perfect Day’, na gravação original de Lou Reed, tinha surgido entre o Top 40 de singles, o que deverá acontecer esta semana (na tabela medida a meio da semana figurava em 33º lugar). Os discos (completos) mais procurados foram, de longe, o álbum ‘Transformer’ (1972) e o disco de estreia dos Velvet Underground ‘The Velvet Undreground & Nico’ (1967). O primeiro, coproduzido por David Bowie e Mick Ronson, e com um alinhamento onde surgem clássicos como ‘Walk On The Wild Side’, ‘Perfect Day’, ‘Satellite of Love’ ou ‘Vicious’ ajudou a definir um rumo para a sua obra a solo e acabou por ser reconhecido de forma unânime como uma obra-prima da discografia do século XX. O segundo foi aquele disco que levou Brian Eno a dizer que, na altura, poucos o compraram, mas que cada um desses compradores acabou por criar a sua banda... É outra referencia e representa o momento em que nasce aquilo a que chamamos hoje o rock alternativo.
Uma consulta às listas de vendas das lojas iTunes ou Amazon mostrava que, juntamente com estes dois álbuns, muitos procuravam um panorama mais amplo na forma de um ‘best of’. De resto, a meio da semana, o Top 10 das vendas de álbuns na loja iTunes de quase todos os países europeus ali representados mostrava a presença destes discos de Lou Reed. E as tabelas de vendas de discos de rock acrescentavam outros como ‘Berlin’ (1973), ‘Rock and Roll Animal’ (disco ao vivo de 1974), ‘New York’ (1989) e, dos Velvet Undreground, os álbuns ‘Velvet Undreground’ (1969) e ‘Loaded’ (1970) nos quais Lou Reed ainda colaborou. Pessoalmente juntaria o genial ‘The Raven’ (2003) para completar a lista de “essenciais”, mas este não mora ainda entre os discos mais “pedidos”...
Serão estes os seus clássicos populares? O tempo ajudará a responder melhor a esta pergunta (mas parece que sim). Nota final apenas para o que parece ser uma expressão natural de uma tendência do presente: na sede de busca rápida, a procura online superou as faltas de stock das lojas físicas onde, cada vez mais, a memória nem sempre está devidamente representada.