Elvis Costello + The Roots
“Wise Up Ghost”
Blue Note / Universal
4 / 5
Nascido discograficamente em tempo da estimulante libertação de ideias que chegou entre as sequelas das primeiras manifestações da revolução punk, Elvis Costello sempre gostou de abrir alas a diálogos (e desafios) com outros músicos (e outras músicas). Pela sua obra encontramos, por exemplo, instantes de consequentes incursões pelos espaços da música “clássica” seja quando se juntou ao Brodsky Quartet para, em 1993, gravar as Juliet Letters ou quando assinou com a soprano Anne Sofie Von Otter o jogo de encontros que ambos registaram em For The Stars (em 2001). Gravou com a pianista de jazz Marian McPartland o álbum Piano Jazz em 2005 e, com a lenda do R&B Allen Toussaint, registou The River in Reverse em 2006. Mais próximo do centro gravítico da canção popular residiu o álbum criado com Burt Bacharah, Painted From Memory, editado em 1998. É por isso tudo menos uma surpresa o facto de o vermos agora associado aos The Roots para nos dar em Wise Up Ghost mais um claro exemplo de como o diálogo entre músicos é um exercício de partilha de ideias e não uma mera extensão, sob novos aromas, da linguagem e voz criativa de um deles. Os The Roots, coletivo com importante trabalho na área do hip hop, mas com um saber musical que alarga horizontes aos espaços do R&B e mesmo de algum jazz, revelam-se afinal um dos mais estimulantes parceiros que Costello encontrou ao longo da sua já extensa discografia. A colaboração emergiu de uma série de passagens de Costello pelo programa de Jimmy Fallon (onde os The Roots são a banda residente). O músico juntou então esforços com o baterista Questolove e o produtor Steven Mandell, os três compondo um disco que ultrapassa as fronteiras de género diluindo linguagens e sonoridades num híbrido que se ajusta à voz de Costello de forma surpreendente. Os arranjos, que assimilam elementos de várias escolas e vivências da música negra, tecem um cenário coerente ao longo de todo o alinhamento que tanto comporta o fulgor de arquitetura rítmica hip hop (sob tempero funk) de Walk Us Uptown ou o espaço da balada como a que se escuta em Tripwire. É contudo impossível não reconhecer um momento maior no arrepio eloquente, sob arranjo orquestral, que se revela em Cinco Minutos Con Voz, que junta ao edifício conjunto um flirt latino e bilingue que alarga mais ainda o espetro visitado sem que tal implique uma pontual descaracterização do espaço comum que aqui se constrói.