Nascido em Brooklyn, Nova Iorque, em 1969, Noah Baumbach impôs-se como uma referência marcante da produção independente americana, na dupla condição de argumentista e realizador. A Lula e a Baleia (2005) valeu-lhe uma nomeação para o Oscar de melhor argumento original. Entre os seus títulos mais conhecidos incluem-se ainda Margot e o Casamento (2007) e Greenberg (2010); neste último, Greta Gerwig já participava como actriz. Na dupla condição de actriz e co-autora do argumento, Gerwig surge, agora, como a musa de Frances Ha, o mais recente trabalho de Baumbach — este texto faz parte de um dossier sobre o filme, publicado no Diário de Notícias (20 Outubro).
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Vemos a personagem de Frances Ha, aliás, Greta Gerwig a correr pelas ruas de Nova Iorque, ao ritmo de David Bowie (Modern Love), e não podemos deixar de recuar a 1977, pensando em Woody Allen e na sua exuberante e misteriosa Annie Hall, interpretada por Diane Keaton. Mais do que isso: o facto de o filme de Noah Baumbach ser rodado em imagens a preto e branco remete-nos de imediato para Manhattan, dirigido dois anos mais tarde também por Woody Allen. Aliás, na sua condição de argumentistas, Baumbach e Gerwig são os primeiros a reconhecer a importância de tal herança.
Em todo o caso, seria precipitado classificar Frances Ha como um banal exercício de imitação “cinéfila”. É, isso sim, um trabalho perfeitamente consciente do facto de os cenários novaiorquinos existirem sempre como um misto de verdade material e vocação mitológica. A personagem central é alguém que integra os sinais de tal ambivalência, ao mesmo tempo que a vive de modo desconcertante, contrariando o espírito dos heróis clássicos de Hollywood que existiram quase sempre na ânsia de “regressar a casa”.
Tanto em termos materiais como no plano simbólico, Frances Ha é alguém que não tem casa aonde possa regressar. Não por falta de abrigo, antes porque o seu ziguezague decorre de um nomadismo existencial e afectivo que, melhor ou pior, passou a contaminar o tecido vital das grandes metrópoles contemporâneas. O filme sabe acompanhar essa errância como um exercício poético de “suspense”, ora eufórico, ora cruel, a ponto de o nome que lhe serve de título apenas adquirir consistência na belíssima e redentora imagem final.