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O futuro da televisão passa pelo Hulu. Da televisão e do cinema. Do espectáculo e do espectador — este texto foi publicado no Diário de Notícias (15 Julho), com o título 'Como será o novo espectador?.
Será que o leitor conhece a palavra “hulu”? Passo a explicar os resultados da minha breve investigação. É um termo usado pelos chineses e pode ter, em mandarim, dois significados: primeiro, como designação de alguém que é detentor de objectos preciosos, de elevado valor simbólico; depois, pode também querer dizer... gravação interactiva.
Pois bem, nos últimos anos, a palavra adquiriu um novo significado no mercado dos EUA: Hulu é o nome de um site da Internet que disponibiliza os mais diversos conteúdos audiovisuais, incluindo programas de televisão e filmes, uns em sinal aberto (streaming), outros através de um preço específico (por exemplo, a assinatura “Hulu Plus” garante um mês de acesso à maior parte dos conteúdos). Consultando a página principal, rapidamente somos confrontados com uma barreira informativa: “Lamentamos, mas de momento a nossa biblioteca de video só pode ser acedida no interior dos EUA” (através de um link complementar, ficamos a saber que, entretanto, já chegou ao mercado japonês). Mas podemos ficar com uma noção geral da oferta. Por exemplo: entre as séries mais populares, incluem-se Family Guy, The Office e South Park; é possível rever os “melhores momentos” de Tina Fey e Amy Poehler no programa Saturday Night Live; há uma galeria só de programas de culinárias; outra com celebridades entrevistadas por Ellen DeGeneres; enfim, estão disponíveis cerca de duas dezenas de adaptações célebres de livros, desde a versão de Ana Karenina (1948) com Vivien Leigh, até Jackie Brown (1997), de Quentin Tarantino.
Ora, o que importa sublinhar é o facto de o Hulu surgir no centro das especulações sobre o futuro do consumo audiovisual nos EUA (com inevitáveis consequências nos mercados internacionais). Propriedade de um poderoso triunvirato – 20th Century Fox, NBC-Universal e Walt Disney Company (todos com ligações muito fortes a cinema e televisão) –, o Hulu hesita entre a manutenção da respectiva oferta ou o alargamento a mais conteúdos, incluindo exclusivos. Discute-se também o intervalo de tempo (a chamada “janela”) a aplicar entre a primeira difusão (nas salas escuras, num canal de televisão, etc.) e a sua disponibilização na nova plataforma. E, claro, questiona-se o tipo de difusão: mais conteúdos livres ou mais conteúdos pagos?
Que o assunto não é banal, provam-no os números envolvidos. Assim, há vários compradores, incluindo a Time Warner Cable, dispostos a pagar pelo Hulu nada mais nada menos que mil milhões de dólares (cerca de 765 mil milhões de euros). Na prática, o que está em jogo é a consolidação de sistemas de difusão que envolvem necessariamente os avanços conjugados da produção audiovisual, dos circuitos informáticos e da Internet. Por mim, continuo a acreditar que as salas de cinema não vão desaparecer, mas é um facto que está a nascer um novo paradigma de espectador.