quinta-feira, abril 25, 2013

Miguel Veloso e o 25 de Abril

1. Na semana em que se comemora (?) o 39º aniversário do 25 de Abril, Miguel Veloso tem estado em evidência na chamada imprensa "cor de rosa" [exemplo aqui em cima].

2. O embaraço é o mesmo de sempre e, como é óbvio, nada tem a ver com os dramas pessoais do futebolista (cuja simples nomeação liminarmente rejeito). É um embaraço que decorre do facto de termos chegado a este ponto — simultaneamente jornalístico e cultural — em que a vida privada é tratada como espectáculo pornográfico para grande consumo. Que haja muitos protagonistas desta imprensa que o são de livre vontade e milhares ou milhões de leitores das respectivas edições, eis um "argumento" demagógico e falacioso. Porquê? Porque, se cada vez que nos confrontamos com um fenómeno de massas, já não podemos problematizar e discutir os valores (ou a falta de valores) que nele se arrastam, então estamos a ceder a um discurso populista, tendencialmente fascizante, que quer obrigar-nos a aceitar a "quantidade" do fenómeno como uma censura a qualquer forma de pensamento crítico.

3. Não foi para isto que se fez o 25 de Abril.

4. A sociedade humanista cujo ideal, com muitas atribulações e contradições, se formulou com o 25 de Abril de 1974 está a ser todos os dias minada por um imaginário social fundado em três horrores ideológicos: a fulanização anedótica de todos os eventos (das festas dos "famosos" aos confrontos políticos); o esvaziamento moral de todas as relações humanas (das festas dos "famosos" ao Big Brother); enfim, o menosprezo militante pelo prazer de pensar o mundo à nossa volta (das festas dos "famosos" à promoção de figuras anedóticas incapazes de enunciar uma ideia, mesmo raquítica, naquilo que dizem).

5. Onde está, então, a classe política portuguesa face a todos estes desmandos que minam a simples crença na imaginação democrática? Muitos dos seus elementos passam o 25 de Abril agarrados à régua e esquadro da sua vulgaridade filosófica, a tirar medidas ao tradicional discurso do Presidente da República, discutindo até ao máximo denominador comum do seu avassalador tédio ideológico se ele mandou ou não "recados", para "quem" e com que "efeitos"... Ensimesmados na sua mediocridade, não admira que assistam a sucessivas eleições em que cerca de 3 milhões de pessoas se abstêm de ir às urnas e continuem... sem dizer nada sobre o assunto. Estarão, por certo, ocupados a discutir se, na querela da família Veloso, apoiam o pai ou o filho.