Realizador do célebre e polémico O Império dos Sentidos (1976), foi um nome central da geração de cineastas japoneses que começou a filmar a partir das memórias e traumas da Segunda Guerra Mundial: Nagisa Oshima faleceu no dia 15 de Janeiro, em Fujisawa, vitimado por uma pneumonia — contava 80 anos.
Formado na Universidade de Quioto, Oshima começou a trabalhar para a companhia Shochiku em finais dos anos 50, conseguindo com a sua primeira longa-metragem, Uma Cidade de Amor e Esperança (1959), um dos símbolos do movimento de renovação que consolidaria a “nova vaga” japonesa. Alguns dos seus títulos mais admiráveis dessa fase, incluindo O Enforcamento (1968) e Cerimónia Solene (1971), correspondem a uma atitude crítica que envolve duas componentes fundamentais: primeiro, a revisitação dos traumas da Segunda Guerra Mundial; depois, a interrogação das heranças culturais e simbólicas do Japão tradicional.
As muitas polémicas suscitadas por O Império dos Sentidos, além de passarem ao lado da questão fundamental – a aliança entre amor e pulsão de morte –, acabaram por gerar uma “imagem de marca” que, nem de longe nem de perto, faz justiça à riqueza temática e à complexidade narrativa do trabalho de Oshima. A sua herança envolve, assim, uma visão das relações humanas em que as convulsões do desejo se confrontam sempre com um elaborado aparato de leis e normas. No limite, Oshima é um retratista das fronteiras do humano, desembocando num humanismo austero e desencantado, sempre consciente das inconciliáveis diferenças individuais. Exemplo máximo de tal dispositivo será o mais popular filme de Oshima, Feliz Natal, Mr. Lawrence (1983), retrato íntimo de uma relação de fascínio entre o comandante de um campo japonês e um prisioneiro britânico – Ryuichi Sakamoto e David Bowie são os respectivos intérpretes, emblemas exemplares de um objecto de culto inevitavelmente simbolizado pela música do próprio Sakamoto [video: tema do filme, por Sakamoto].
>>> Obituário em The Guardian.
>>> Nagisa Oshima no Senses of Cinema.