segunda-feira, janeiro 28, 2013

Ascensão e queda de Sarah Palin

Julianne Moore + Sarah Palin
Recentemente distinguido pelos Globos de Ouro, Mudança de Jogo constitui mais um caso exemplar da exigência criativa da televisão com a chancela da HBO: um retrato interior, perturbante e anti-maniqueísta da ascensão e queda de Sarah Palin — este texto foi publicado no Diário de Notícias (25 Janeiro), com o título 'Um notável telefilme'.

É bem verdade que há todo um entendimento plural e inventivo da televisão que vive muito para além das rotinas do populismo e das misérias da reality-TV. Um dos exemplos mais recentes dessa capacidade, e também dessa vontade, de fazer uma televisão realmente envolvida com as grandes questões do seu presente está numa notável produção americana, com chancela da HBO: chama-se Mudança de Jogo (título original: Game Change) e tem estado a passar nos canais TVCine.
Jay Roach, o realizador, revela especial apetência pelos temas eleitorais americanos. É dele outro magnífico telefilme da HBO, Recount (2008), sobre o processo de recontagem dos votos, no estado da Florida, nas presidenciais do ano 2000. Desta vez, trata-se de recordar as eleições de 2008, quando Barack Obama venceu John McCain, fazendo a história da candidatura de Sarah Palin, pelos republicanos, ao cargo de vice-presidente.
Curiosamente, a colaboração política McCain/Palin está longe de ser o fulcro do filme. Ou melhor, o seu relativo distanciamento acaba por ser o primeiro sintoma insólito de um “ticket” político que nasceu menos de um discurso articulado e mais da tentativa de criar um efeito de surpresa, antes do mais visando o eleitorado feminino.


O filme consegue a proeza de colocar em cena uma personagem hiper-caricaturada (é citada a célebre imitação de Palin por Tina Fey, no programa Saturday Night Live), sem a reduzir a um mero instrumento narrativo. Mérito da direcção de Roach, claro, mas mérito também da assombrosa composição de Julianne Moore que, muito para além da perturbante semelhança física, consegue pôr em cena uma Sara Palin de muitos contrastes, desarmante pelas suas muito humanas contradições.
Recentemente, Mudança de Jogo arrebatou três Globos de Ouro: melhor mini-série ou telefilme, melhor actriz (Moore) e melhor actor secundário (Ed Harris, no papel de McCain). É um caso exemplar de uma televisão cuja excelência não pode ser separada de um trabalho de reavaliação das próprias imagens que, de uma maneira ou de outra, pertencem aos seus espaços informativos.