Continuamos a publicação de uma entrevista com Andrew Bird realizada por ocasião da sua mais recente atuação em Lisboa e da edição de um novo EP.
O seu trabalho é impossível de rotular com precisão. Nem o podemos apontar como sendo um músico de folk nem de rock, nem mesmo de música erudita... Ou seja, alimenta-se de um vasto leque de referências quando procura a forma como soa a sua alma quando procura expressar-se numa canção.
É isso. Acho que não diria muito melhor... (risos)... Sempre tentei andar por mais que apenas uma cena musical ao longo dos anos. Cada vez que me juntava a uma cena sentia as paredes a apertarem-me... Sentia também a insularidade e a competitividade que nela poderia haver e procurava logo afastar-me. A música por vezes é folk ou bluegrass. Ou mais Django Reindhardt.. Ou musica irlandesa... São tantos os elementos de onde a minha música vem, mas não especificamente um ou outro género. Alguém perguntou-me um dia se eu me integrava numa tradição. Mas não... Cresci nos subúrbios, não tenho qualquer filiação em nada. Mas posso tirar ideias de tudo...
Mas sente-se atraído por ideias além da tradição pop/rock. Veja-se o caso de Useless Creatures. Aí afasta-se do modelo da canção.
Esse disco foi um veículo para libertar coisas que estavam reprimidas. Para alcançar aquela marca dos três minutos e meio, que é o que as pessoas esperam, de canções bem trabalhadas, a coisa ficou feita no Noble Beast. Tive de reprimir aí a vontade de ir mais longe e experimentar. Por isso criei depois o Useless Creatures para as mostrar. Mas transformou-se em algo muito compensador. É um pouco como a suite companheira, uma coleção de coisas que surgiram assim que pegava no violino. São baseadas em formas clássicas, mas são as coisas que toco quando me estou a preparar para atuar. E são peças onde tento encontrar outros pontos de aterragem. Quando preparo a voz antes de um concerto canto coisas de gospel, tipo Staple Singers. Com o violino toco estas coisas para encontrar o meu centro.
Usa o violino para compor?
Já usei mais, mas com o tempo mudei-me para a guitarra. Porque a posso puxar, sentar-me num sofá e trabalhar. Mas a guitarra tem armadilhas. Qualquer instrumento tem armadilhas. O violino, o assobio e o canto são mais liquidos, as ideias ficam mas fluídas. Com a guiterra sinto a arquitetura da canção a surgir em primeiro lugar.
Vê concertos e ouve discos de violino, de música folk ou clássica?
Uso-o apenas como um instrumento. Tenho uma longa relação com o violino. Houve fases quem o exilei. Meti-o num canto e só o ia usar quando dele precisasse dizendo-lhe que não teria controlo sobre mim. Ainda é o meu primeiro instrumento e a minha voz principal. Mas uso-o e depois afasto.
Hoje há mais músicos a fazer música com o violino. Levando-o a lugares invulgares na pop, onde em tempos não era tão visível na pop. Estou a falar de um Owen Pallett ou um Patrick Wolf...
Comparar-nos é inútil. É comparar Hendrix e Lennon porque tocam guitarra. Mas o panorama atual está a romper expectativas, sim. Sempre que há muitas regras em volta de um instrumento abrem-se oportunidades para as corromper.
Como surgiu o novo EP, que de certa forma é um disco companheiro do álbum que editou também este ano?
Foi gravado em dias de folga. Em Louisville gravámos numa igreja. E depois da digressão terminada fomos para a minha quinta. O Break it Yourself era já algo anti-produção. Este vai ainda mais longe. É ainda mais elementar, mais cru. As interpretações são mais cruas.