quarta-feira, outubro 24, 2012

Novas edições:
Philip Glass, Rework

Philip Glass e outros
“Rework”
Orange Mountain Music
5 / 5

É um dos acontecimentos discográficos do ano e um dos mais interessantes (e acessíveis) dos muitos eventos associados à celebração do 75º aniversário de Philip Glass. Sob curadoria de Beck (que nos últimos tempos tem centrado mais atenções na música dos outros que na sua), uma coleção de remisturas e reinterpretações de peças da carreira de Glass surge num disco duplo com um título que traduz a essência do que ali se apresenta: Rework. Não é a primeira vez que um álbum de remisturas aborda a música de Philip Glass e bem mais antiga é até a sua relação com este conceito cujas origens associamos aos universos da música de dança. Em finais dos oitentas Glass foi desafiado pelos S’Express para criar uma visão, por remistura, de Hey Music Lover... Já nos anos 90 vimo-lo a trabalhar com Aphex Twin numa composição para o EP Donkey Rhubarb, a parceria estendendo-se depois a uma remistura de elementos da Heroes Symphony (usando a voz de David Bowie). Em 2005 o álbum Glass Cuts juntava uma coleção de 13 olhares sobre obras suas em reconstruções remisturadas, porém sob a assinatura de nomes relativamente desconhecidos. E é sob uma galeria de notáveis colaboradores que esta segundo conjunto de remisturas agora entra em cena. Além de Beck, que assegurou a curadoria do projeto e contribui com o soberbo NYC 73:78, onde elabora uma “suite” feita de colagens de elementos de composições de diversas formas e etapas da obra de Glass, Rework chama a colaboração de nomes que passam por Amon Tobin, Pantha du Prince, Peter Broderick, Cornelius ou Johan Johansson. Ao contrário das visões abordadas em Glass Cuts, onde se verificava maior presença de peças orquestrais mais recentes, o foco de grande parte das remisturas deste novo disco colhem antes ideias entre peças dos anos 70 e 80, passando por referencias clássicas como Music in 12 Parts, North Star, o álbum Glassworks, Mad Rush ou óperas como Einstein on The Beach e Satyagraha. De abordagens mais próximas das gravações originais (como a que Cornelius opera sobre Opening de Glassworks), passando por exercícios de recontextualização (como o que Peter Broderick promove com ponto de partida em Island, também de Glassworks) até revisões da arquitetura das composições (como em Rubric, de Ty Braxton), Rework é como uma exposição que promove um sentido de expressão de ideias pessoais em figuras que claramente assimilaram e integraram na sua linguagem ecos e importantes contribuições da escrita de Philip Glass. Partindo do espaço da música pop (e periferias), o disco escuta naturalmente os elementos da obra de Glass que mais influenciaram este mesmo universo. Ao ouvirmos Mad Rush, na visão de Pantha du Prince, compreendemos porque foi este mesmo o autor que em tempos nos deu um Saturn Strobe que nunca seria possível sem a compreensão profunda da contribuição dos minimalistas norte-americanos (entre os quais Glass) para a música do nosso tempo. Se a este disco juntarmos Reich Remixed e alguns volumes da série Re-composed da Deutsche Grammophone verificaremos que, na verdade, aquela velha ideia da barreira entre a música erudita e a popular é coisa tão antiga (e já derrubada) como o foi o muro de Berlim. Aqui respira-se um sentido de liberdade que já não tem de ser transgressivo. Porque traduz naturalmente o clima de horizontes largos em que a música hoje flui.