sexta-feira, julho 13, 2012

Em conversa: Perfume Genius (2)


Continuamos a publicação de uma entrevista com Mike Hadreas, a alma do projeto Perfume Genius, realizada na noite de sábado passado no backstage do Super Bock Super Rock. A entrevista serviu de base ao artigo “A música pode ser uma forma de encontrar autoconfiança” publicada na edição de 10 de julho do DN. 

Pensa que os músicos podem ser referências de vida para quem os ouve e vê? Ser exemplos para outros que estão a crescer... Vê-se como sendo esse tipo de modelo? 
Acho que tento fazer coisas que eu gostava de ter ouvido quando era mais novo. Tento escrever sobre coisas que não ouvi ainda referidas nesses modos específicos. Quando era mais novo eu pensava que não me ajustava, que não pertencia... Por vezes ainda não me sinto ajustado a 100%... Mas hoje isso já não me incomoda.

Teve figuras que o motivaram e inspiraram?
Quando penso nisso reparo que os meus modelos foram muitas mulheres. Como a Liz Phair, quando ouvi o seu disco e reparei como falava das coisas. Foi o que encontrei mais próximo do que sentia. Talvez por ser uma mulher e não se é suposto falar daquela maneira, tão desagradável... Havia outros homens gay a cantar assim, mas eu não os conhecia quando era mais novo... Acho que é um pouco por isso que os homens gay gostam de Madonna e figuras como ela. Porque é o que temos...

E musicalmente, quem o fazia sentir que podia ser mais que apenas um ouvinte?... 
Antes de começar a escrever ouvia Bob Dylan, Cat Power... Música simples... Nada de virtuosos nos instrumentos ou com progressões de acordes muito elaboradas. Músicos que tinham algo para dizer e que escreviam de uma forma simples. Tanto que achei que se calhar conseguiria fazê-lo também. Acho que muitas pessoas que querem fazer música acham que têm de ir à escola ou que têm de criar algo completamente novo... Há quem o faça e depois crie coisas espantosas. Mas não temos necessariamente de seguir esses caminhos.

Tinha piano em casa? 
Sim, tive lições e tudo...

E como do tocar das notas sem rumo certo fez, finalmente nascer uma primeira canção?... 
Tentava e dez segundos depois dizia que não prestava. E o que fazia quando era mais novo, provavelmente não prestava mesmo. Era uma coisa compulsiva. Houve um dia em que acordei e achei que tinha de o fazer...

E encontrou uma voz através da qual conseguiu comunicar... 
Sim. Mas na altura nem o sabia fazer. Porque antes de fazer música vivia com a minha mãe e passava o tempo a jogar jogos no computador. Muitos jogos... Comia muito, chateava a minha família... (risos)... Não era cool. Eu não era nada cool. Mas, e nem sei por que razão, muitas coisas encontraram-se em mim... E aqui estou em Portugal a tocar ao vivo...

Parece outro homem face aquele com quem falei pelo telefone há dois anos... 
A sério?

E encontrou uma personalidade musical... Uma identidade. Já a reconhece? 
Espero que sim... Penso nisso por vezes. Até porque quando escrevo canções penso sobre se devo procurar fazer algo diferente... Mas nunca pensei nisso numa perspetiva de trabalho como negócio. As pessoas gostaram do Hood, que tinha um fundo de percussão... Dou depois por mim a pensar se devia escrever mais canções como aquela. E a refletir sobre o que quero dizer. Mas não sei... É estranho. Penso muito... Mas depois acabo a fazer o que faço sempre. Acaba no fim por resultar como naturalmente deve soar. Ou seja, não faço ideia!... (risos)

Instrumentalmente mantém mesmo assim uma agenda quase minimal de recursos, tanto em palco como no disco. Gostava de experimentar outros caminhos?... 
Acho que gostarei de tentar... Uma guitarra elétrica, bateria... As coisas acabam sempre por mudar sempre um pouco quando estou em estúdio. Se fizesse tudo sempre à minha maneira acabaria apenas com o piano e eu a cantar. O que talvez não seria justo. Seria bom para mim, mas talvez nem por isso para as outras pessoas. Sob o risco de não passar as mensagens que quero passar.

O ritmo de edição atual de discos traduz-se muitas vezes em silêncios de dois anos entre álbuns. Este é o seu ritmo natural? Ou gostaria de lançar discos novos com maior regularidade? 
Creio que gostaria. Acho que não gosto de pensar demasiado nas coisas e gostava de as poder mostrar logo. Seria mais real que estar a refletir demais... Mas a verdade é que na estrada não consigo compor. Em comparação com outras pessoas até fazemos pouca estrada. Mas tenho um ano de estrada... O que gosto mais de fazer é mesmo escrever. Mas a estrada tem também o seu lado positivo. Sinto-me muito mais confiante a falar com as outras pessoas. E a um nível pessoal estou a gostar muito. Sendo que há uns dois anos não o teria conseguido fazer assim.