quinta-feira, julho 12, 2012

Em conversa: Perfume Genius (1)


Iniciamos hoje a publicação de uma entrevista com Mike Hadreas, a alma do projeto Perfume Genius, realizada na noite de sábado passado no backstage do Super Bock Super Rock. A entrevista serviu de base ao artigo “A música pode ser uma forma de encontrar autoconfiança” publicada na edição de 10 de julho do DN.

Deu este sábado um concerto num palco de festival, em cenário não urbano, sob a luz do dia... Era destino que adivinhasse para a sua música? 
Acho que há uns anos, quando era muito mais tímido, acabaria aterrorizado... Havia muita luz e eu conseguia ver toda gente que lá estava... Mas agora, e a coisa tem um pouco de desafio e de divertido, gosto desta ideia de algo tão íntimo poder soar como uma grande ópera. Nem sempre isso acontece é certo. Mas quando acontece sabe mesmo bem.

No alinhamento incluiu Helpless de Neil Young e Oh Father de Madonna. Como escolhe as versões que leva aos seus concertos? 
Escolho-as sobretudo pelas palavras. Sobretudo a canção de Madonna. Não a conhecia... Porque nunca tinha ouvido o Like a Prayer. Ela tem algumas baladas bem interessantes. Um pouco cheesy... E se retirarmos as letras do contexto pode soar meio assustador... Muito assombradas, mas ao mesmo tempo doces... São feitas de uma linguagem muito simples e direta, como eu também gosto de escrever.

Sente-se que há mais autoconfiança no músico que faz Put Your Back N 2 It face àquele que há dois anos se apresentava em Learning... 
Sim... Queria sentir-me assim. Para mim era importante não fazer um disco onde estivesse a ter cautela com as coisas... Mesmo que ainda seja tímido, não queria que a música viesse desse lugar. Queria que viesse de algo mais poderoso que eu conseguisse tirar de mim mesmo. E foi o que fiz...

A música é ainda um veículo para algo muito pessoal. Como se sente a partilhar essas memórias e histórias com quem não conhece? 
É-me fácil fazê-lo assim, nem sei bem porquê... Não sei se direi fácil... Acho que o faço bem. Quando estava a crescer achava que não era bom em muitas das coisas que fazia. Não havia nada que fizesse de que me orgulhasse. Ou que me parecesse certo. E quando comecei a escrever canções sobre as minhas experiências, mesmo que por vezes pudesse assustar, acho que senti que estava a fazer algo certo. Sentia-me bem...

Como compõe? E quando compõe?... 
É difícil escrever quando estou em digressão. Porque toco piano e não o posso levar para os quartos do hotel... Acho que poderia apenas escrever letras, mas não o faço assim. Na verdade não faço nada quando estou em digressão. E por isso é algo muito diferente daquele tempo em que vivia com a minha mãe... Agora vivo com o meu namorado. Escrevo quando ele está no trabalho. Ou, mais silenciosamente, quando ele está a dormir... É mais difícil... Este segundo disco foi um pouco mais angustiante, porque sabia que ia mostrar aquelas canções a outras pessoas. Teria de as mostrar à editora, esperar que gostassem, porque sabia que iam ter de investir o seu dinheiro no disco... Todo esse lado do negócio... Por isso foi mantendo essa pressão sobre mim mesmo. Mas creio que encontrei uma forma de fazer de tudo isto algo mais motivador que assustador.

O vídeo que acompanhou Hood deu que falar... Como surgiu a ideia? 
Originalmente eu procurava um homem com uma aparência muito de macho... Butch... Para ser o mais ternurento no vídeo... E depois de procurarmos por culturistas, foi o Arpad [Milkos] quem apareceu. Ele fez o vídeo.

E houve depois aquela situação de censura no YouTube... Ou seja, há preconceitos que ainda estão bem vivos?
Isso foi tão estranho. E fez-me ter a vontade de fazer algo ainda mais gay... Primeiro faço o oposto do que pensam que vão censurar e depois... (risos)... Aquilo foi ridículo. A coisa mais íntima que fizemos naquele vídeo foi abraçar-mo-nos. Mais nada. A Lana del Rey tinha um vídeo promocional em que se via parte do peito... Mas como estava em frente a uma bandeira americana, toda a gente achou que era OK... É ridículo. Acho que muitos homossexuais crescem habituados a ver pessoas a reagir com desconforto perante algo que é absolutamente natural para si mesmos... Porque nos esquecemos que somos gay. Eu esqueço-me que sou gay por vezes... Porque é quem sou... E por vezes há alguém de mente mais curta ou conservadora que nos lembra que há coisas em nós que as assusta... Isso é tão estranho. Por isso nem fiquei muito surpreendido com a história do YouTube...

Como americano como reagiu à posição que Barack Obama tomou recentemente face ao casamento entre pessoas do mesmo sexo? 
Nunca pensei que me poderia casar. E nem pensava nisso... Era uma possibilidade que não se colocava no meu horizonte. Hoje eu e o Alan até brincamos sobre o que usarei quando lá chegar... Naturalmente sabe bem sentir que as coisas estão a progredir. Pelo menos há alguém a dizer qualquer coisa. Mas é estranho ver que parece ser algo tão grande alguém a dizer aquilo...

Acha que é uma posição mais política ou genuína? 
Não sei... De uma forma ou outra vai ser positivo.
(continua)