L' Éclaircie. Que é como quem diz: uma aberta (no tempo). Talvez uma iluminação (nos pensamentos). Porventura um fogacho (nas rotinas do quotidiano). Em todo o caso, é de amor que se trata. Amor da irmã do narrador que reaparece ciclicamente, dir-se-ia para satisfazer uma compulsão narrativa incestuosa. Amor da mulher que com ele partilha, secretamente, a nitidez de uma entrega que os outros ignoram. Anne e Lucie.
Philippe Sollers continua a escrever livros maravilhosos e desarmantes, desafiando as zonas obscuras de todos os desejos e, ao mesmo tempo, confundindo a aventura das suas personagens com uma dissertação elaboradíssima sobre aqueles que renegaram as fronteiras aprendidas da arte. Manet e Picasso, neste caso, senhores de um tempo em que adorar um cedro, como o narrador/Sollers (C'est immédiat : je ne peux pas voir un cèdre, dans un jardin ou débordant d'un mur sur la rue, sans penser qu'une grande bénédiction émane de lui et s'étend sur le monde.) era já uma filosofia de vida.
Em conjuntura de generalizada degenerescência pornográfica da palavra ("em tempo real", como diriam os ingénuos pivots de televisão), L'Éclaircie confunde-se com a afirmação irredutível da escrita e das suas obstinadas singularidades. Há um humor refinado em tudo isso. Ou, se preferirem, um prudente cepticismo face à grandeza utópica do ser humano.