sábado, abril 21, 2012

Filmes pe(r)didos:
Little Odessa, de James Gray,
por Nuno Carvalho

Memórias de filmes afastados daquelas listas habituais que fazem a conversa de todos os dias. Filmes "perdidos". Ou se preferirem, "filmes pedidos"... Hoje lembramos Little Odessa, filme de 1994 de James Gray, que aqui é evocado por Nuno Carvalho, jornalista do DN e autor do blogue O Reino das Sombras. Um muito obrigado ao Nuno pela colaboração.

Viver e Morrer em Little Odessa (Little Odessa, 1994) é o filme de estreia de James Gray, um realizador “bissexto” que, até ao presente (num lapso temporal de 18 anos), assinou apenas mais três filmes, todos eles de excelente qualidade – Nas Teias da Corrupção (The Yards, 1999), Nós Controlamos a Noite (We Own the Night, 2007) e Duplo Amor (Two Lovers, 2008). Por vezes comparado com Martin Scorsese, James Gray (n. 1969) está na verdade mais perto de um cineasta como Francis Ford Coppola (embora prefiramos dizer que está, na realidade, mais perto de si mesmo e de um cunho autoral idiossincrático e pessoal). Este thriller sombrio e trágico surpreende desde logo pela sua maturidade, uma vez que se trata de um filme de um autor com apenas 25 anos (a mesma idade que tinha Orson Welles quando realizou Citizen Kane).

Produzido por Paul Webster (nome ligado a filmes como Expiação, de Joe Wright, e Promessas Perigosas, de David Cronenberg), Viver e Morrer em Little Odessa é um retrato romântico (na acepção sepulcral do termo) de uma família disfuncional de imigrantes russos de ascendência judaica radicados em Brighton Beach (Brooklyn) que enfrenta de formas diversas o regresso de um dos seus elementos, banido do clã pelo patriarca. Joshua Shapiro (Tim Roth), um assassino profissional, volta a Little Odessa na sequência de um “trabalho” que lhe é encomendado, mas esse regresso (o do anjo rebelde que virou exterminador) promete arrastar toda a família para a inevitável tragédia. O patriarca, duro e abusivo (Interpretado por Maximilian Schell), é confrontado com a frieza do seu filho mais velho, que não compreende como se tornou aquilo que é, enquanto a matriarca (papel que cabe a Vanessa Redgrave), na última fase de uma doença terminal, representa o amor incondicional que nada vence afinal, uma vez que tudo está há muito perdido para Joshua – a sua única possibilidade de conexão emocional encontra-se em Reuben (Edward Furlong), o seu dócil e manso irmão adolescente. Aliás, Viver e Morrer em Little Odessa é um filme de um outro tempo do cinema (e como era diferente em relação ao presente o cinema que se fazia na primeira metade dos anos 90…) O próprio elenco é constituído por actores que foram perdendo a sua visibilidade no grande ecrã, sendo o caso mais triste o de Edward Furlong, um actor notável que foi sendo abandonado à sua solidão no seio de Hollywood, depois de ter encarnado, com apenas 13 anos, uma das personagens mais icónicas e populares do cinema americano dos últimos 20 anos – a de John Connor no pioneiro e apocalíptico Exterminador Implacável 2 – O Dia do Julgamento. Mas se Viver e Morrer em Little Odessa é um filme que nos inspira um humor melancólico, o destino de actor de Furlong, uma das grandes promessas do cinema norte-americano do anos 90, dá que pensar. E apetece-nos fazer-lhe justiça, dizendo: “Too good for Hollywood…”