Marie-France Pisier, actriz francesa nascida no Vietname (filha do governador colonial Georges Pisier), foi encontrada morta na piscina de sua casa, não estando ainda esclarecidas as circunstâncias do seu falecimento. Foi aberto um inquérito (que não é de natureza "criminal", esclareceu uma fonte policial), enquanto se aguardam os resultados da autópsia; os primeiros dados parecem afastar a possibilidade de um quadro depressivo, já que a actriz estava envolvida em vários projectos profissionais, tendo recentemente confirmado a sua presença na cerimónia de homenagem a Jean-Paul Belmondo, promovida pelo Festival de Cannes (11/22 Maio).
Aos 66 anos de idade (completaria 67 no dia 10 de Maio), era uma das mais prestigiadas e respeitadas actrizes do cinema francês, tendo-se estreado aos 18 anos na curta-metragem de François Truffaut, Antoine et Colette (1962), contracenando com Jean-Pierre Léaud [foto a preto e branco] – era a continuação da história da personagem de Antoine Doinel, interpretada por Léaud na primeira longa-metragem de Truffaut Os 400 Golpes (1959).
O thriller de aventuras O Vampiro de Dusseldorf (1965), de e com Robert Hossein, foi o seu primeiro grande sucesso [video em baixo: extractos de uma entrevista recente sobre o filme]. Em todo o caso, através das suas escolhas, teve o cuidado de construir uma carreira multifacetada, nunca presa a um único género ou a um qualquer modelo de personagem. Assim, por exemplo, sob a direcção de um dos "gurus" do Nouveau Roman, Alain Robbe-Grillet, rodou Trans-Europ-Express (1967), participando depois nas quatro primeiras longas-metragens de André Téchiné: Paulina s'en Va (1975), Souvenirs d'en France (1975), Barocco (1976) e As Irmãs Brontë (1979), esta uma preciosidade muito pouco conhecida sobre as irmãs escritoras; pelo meio, participou em Cousin, Cousine (1975), de Jean-Charles Tachella – este filme e Barocco valeram-lhe dois Césares, ambos como melhor actriz secundária.
Em vários momentos da sua existência, Marie-France Pisier envolveu-se nos combates ideológicos, morais e simbólicos do seu tempo. Em 1968, na Universidade de Nanterre, integrou o 'Movimento do 22 de Março'; em 1971, foi uma das signatárias de um documento ('Manifesto das 343') redigido por Simone de Beauvoir, publicado no Nouvel Observateur, defendendo o direito ao aborto – com enorme impacto na sociedade francesa, o documento contava, entre as suas 343 assinaturas, com os nomes de Catherine Deneuve, Marguerite Duras, Gisèle Halimi, Ariane Mnouchkine e Françoise Sagan.
Voltou a trabalhar com Truffaut na saga romanesca de Antoine Doinel, em Beijos Roubados (1968) e O Amor em Fuga (1979), neste também como co-argumentista. Na sua filmografia de cerca de oito dezenas de títulos aconteceram mais alguns encontros de eleição. Entre eles, recordemos: Luis Buñuel (O Fantasma da Liberdade, 1974), Jacques Rivette (Céline et Julie Vont en Bateau, 1974), Jacques Demy (Parking, 1985) e Andrzej Zulawski (La Note Bleue, 1991). Entre os seus títulos mais recentes incluem-se O Tempo Reencontrado (1999), de Raul Ruiz, Ordo (2004), de Laurence Ferreira Barbosa, e Em Paris (2006), de Christophe Honoré. Il Reste du Jambon? (2010), de Anne Depetrini, seria o seu derradeiro filme.
>>> Obituário no Libération.