Na árvore genealógica de Hollywood, Billy Wilder [foto] é um modelo exemplar do grande artesão: versátil e acutilante em qualquer género. Sam Mendes, de quem se estreou recentemente Um Lugar para Viver, gosta de o citar como uma inspiração — este texto foi publicado no Diário de Notícias (31 de Março), com o título 'Refazendo a herança de Billy Wilder'.
Questionado sobre os cineastas que mais admira, Sam Mendes gosta de dizer que está fora do clube a que pertencem autores obsessivos como Alfred Hitchcock, Ingmar Bergman ou Jean-Luc Godard. O seu trabalho pauta-se pelo gosto da diversidade de géneros e modelos de produção. Quando evoca um clássico capaz de simbolizar tal agilidade, o nome que surge é Billy Wilder, o homem que, com a mesma verve, filmou Gloria Swanson na tragédia de Crepúsculo dos Deuses (1950) ou Marilyn Monroe na alegria de Quanto Mais Quente Melhor (1959).
Depois da guerra de Jarhead e das crueldades conjugais de Revolutionary Road, surge Um Lugar para Viver [cartaz], filme mais devedor de uma certa nostalgia on the road enraizada no imaginário dos anos 60 do que da profusão de efeitos especiais (e dólares) que tem dominado Hollywood. Sam Mendes diz, com muita graça, que não acontece grande coisa no filme, pouco se avançando para além da premissa inicial: um jovem casal que vai ter o primeiro filho e parte à procura do lugar ideal para viver... Mas esse “não-acontecer” é profundamente paradoxal: este é um cinema de eventos microscópicos, habitado por uma intensidade emocional que se pode exprimir no tom aparentemente neutro de uma frase ou no silêncio que acompanha uma carícia.
Será, talvez, a mais bizarra das ironias, mas o certo é que um inglês como Sam Mendes aponta assim, ao cinema americano, a necessidade de preservar o melhor do seu património narrativo, em particular a riqueza imensa da tradição (melo)dramática. Dir-se-á que o cineasta desmentiu tudo isso ao assumir as rédeas do próximo James Bond... Mas não: primeiro, porque Bond é inglês; segundo, porque Billy Wilder era homem para fazer o mesmo.
Questionado sobre os cineastas que mais admira, Sam Mendes gosta de dizer que está fora do clube a que pertencem autores obsessivos como Alfred Hitchcock, Ingmar Bergman ou Jean-Luc Godard. O seu trabalho pauta-se pelo gosto da diversidade de géneros e modelos de produção. Quando evoca um clássico capaz de simbolizar tal agilidade, o nome que surge é Billy Wilder, o homem que, com a mesma verve, filmou Gloria Swanson na tragédia de Crepúsculo dos Deuses (1950) ou Marilyn Monroe na alegria de Quanto Mais Quente Melhor (1959).
Depois da guerra de Jarhead e das crueldades conjugais de Revolutionary Road, surge Um Lugar para Viver [cartaz], filme mais devedor de uma certa nostalgia on the road enraizada no imaginário dos anos 60 do que da profusão de efeitos especiais (e dólares) que tem dominado Hollywood. Sam Mendes diz, com muita graça, que não acontece grande coisa no filme, pouco se avançando para além da premissa inicial: um jovem casal que vai ter o primeiro filho e parte à procura do lugar ideal para viver... Mas esse “não-acontecer” é profundamente paradoxal: este é um cinema de eventos microscópicos, habitado por uma intensidade emocional que se pode exprimir no tom aparentemente neutro de uma frase ou no silêncio que acompanha uma carícia.
Será, talvez, a mais bizarra das ironias, mas o certo é que um inglês como Sam Mendes aponta assim, ao cinema americano, a necessidade de preservar o melhor do seu património narrativo, em particular a riqueza imensa da tradição (melo)dramática. Dir-se-á que o cineasta desmentiu tudo isso ao assumir as rédeas do próximo James Bond... Mas não: primeiro, porque Bond é inglês; segundo, porque Billy Wilder era homem para fazer o mesmo.