quinta-feira, janeiro 22, 2009

Washington, 20 de Janeiro de 2009

A tomada de posse de Barack Obama foi uma transferência de poder político e também uma cerimónia de muitas e complexas ressonâncias simbólicas — este texto foi publicado no Diário de Notícias (21 de Janeiro), com o título 'Elogio da cultura popular'.

É certo que vivemos num país que perdeu o amor pelos símbolos e onde, por vezes, as televisões parecem acreditar que uma frase balbuciada por Cristiano Ronaldo representa um acontecimento charneira na história da humanidade... Em todo o caso, não nos ficará mal reconhecer que o poder de produzir e, mais do que isso, administrar uma simbologia própria é algo que merece o máximo respeito. Dito de outro modo: não precisaremos de dizer “amen” a todas as decisões que o Presidente Obama irá tomar para reconhecer que a cerimónia da sua investidura foi um acontecimento de exuberante eficácia simbólica. Afinal de contas, na tribuna oficial do Capitólio estavam duas das personalidades centrais da cultura popular americana dos últimos cinquenta anos: Aretha Franklin e Steven Spielberg (a primeira com intervenção directa no evento).
Mais do que nunca, pudemos ver e sentir como a tradicional teatralidade da cerimónia, com a tribuna a abrir para o espaço imenso do horizonte de Washington, veio dar corpo a uma noção peculiar de continuidade (e contiguidade) entre cena política e espaço do povo. Dir-se-ia até que esse é um dispositivo que as televisões têm dificuldade em filmar e apreender, de tal modo excede as coordenadas convencionais dos pequenos ecrãs. Apetece dizer que a grandeza que Obama quer recuperar para a América está guardada no imaginário do cinema. Ironicamente, para condensar o seu desejo de mudança, ele usou uma palavra enraizada no imaginário cinematográfico: “Remaking America”, diz ele.

>>> Site oficial da toma de posse de Barack Obama.