quarta-feira, maio 24, 2006

Postal de Cannes, 24 de Maio de 2006

Bela foto, não é? Kirsten Dunst no papel central de Marie Antoinette, o novo filme de Sofia Coppola em competição em Cannes. Ao mesmo tempo, trata-se de uma imagem sintomática do drama interior deste filme — uma personagem devorada pelo look do cenário — que encantara alguns, deixando outros (entre os quais me incluo) com a sensação amarga de que se falhou a possibilidade de construção de uma narrativa em que a revisitação da história acontecesse para além dos clichés tradicionais de abordagem da pré-Revoluçao Francesa.
Dir-se-ia que estamos perante um sofisticado portfolio da Vogue: trata-se de criar uma espécie de imenso palco de aparências em que, para além das memórias da história, tudo se torna possível (incluindo a integração de canções dos Phoenix, New Order, The Cure, Aphex Twin, The Strokes, Kevin Shields, etc.). A liberdade de mobilizaçao das referências é interessante, mas instala um sentimento de arbitrariedade que contamina todo o filme. Incapaz de pensar/mostrar o exterior de Versalhes, o filme faz da história um compêndio mecânico para "justificar" uma deambulação pela superfície dos factos e das memórias. Não é um filme que nos revolte (antes fosse...). Apenas um objecto com dificuldade em convencer-nos de que foi gerado por alguma visão estruturada. Acontece aos melhores.

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